Discurso no Senado Federal

APOIO A SUGESTÃO DO PRESIDENTE DO CONGRESSO NACIONAL, SENADOR HUMBERTO LUCENA, DE AGILIZAR O ANDAMENTO DOS TRABALHOS DA REVISÃO CONSTITUCIONAL EM DOIS FINS-DE-SEMANA CONSECUTIVOS DE ESFORÇO CONCENTRADO.

Autor
Esperidião Amin (PPR - Partido Progressista Reformador/SC)
Nome completo: Esperidião Amin Helou Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA CONSTITUCIONAL.:
  • APOIO A SUGESTÃO DO PRESIDENTE DO CONGRESSO NACIONAL, SENADOR HUMBERTO LUCENA, DE AGILIZAR O ANDAMENTO DOS TRABALHOS DA REVISÃO CONSTITUCIONAL EM DOIS FINS-DE-SEMANA CONSECUTIVOS DE ESFORÇO CONCENTRADO.
Aparteantes
Eduardo Suplicy, Esperidião Amin, Jarbas Passarinho, Josaphat Marinho, José Fogaça.
Publicação
Publicação no DCN2 de 22/02/1994 - Página 795
Assunto
Outros > REFORMA CONSTITUCIONAL.
Indexação
  • APOIO, ORADOR, SUGESTÃO, AUTORIA, HUMBERTO LUCENA, PRESIDENTE, CONGRESSO NACIONAL, AGILIZAÇÃO, ANDAMENTO, PROCESSO, REVISÃO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL.

    O SR. ESPERIDIÃO AMIN (PPR - SC. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, desejo fazer o registro do que seria uma sugestão. Ontem, na minha cidade, Florianópolis, conversando com alguns companheiros que já prestaram serviços prestados à causa pública e exerceram mandatos no Legislativo Federal, abordamos esse clima que pesa sobre o Congresso brasileiro, um clima de descrença, em que defeitos da Instituição ou de seu funcionamento são exacerbados em vários juízos, e as eventuais virtudes vão sendo sufocadas pelo lugar-comum do desprestígio.

    Faço questão de mencionar o nome de uma dessas pessoas, o do ex-Deputado Federal por Santa Catarina, Orlando Bertoli, que, ao longo dessa reflexão, salientou que nós, Congressistas, deveríamos ajudar, com algum gesto, a reduzir a antipatia que o povo brasileiro está dedicando a uma instituição que não somos nós. Lembrou que já passou por aqui e que também houve maus momentos na sua época. Todavia, o clima hoje está muito pesado, o julgamento popular sobre o Congresso brasileiro é quase unânime e é cruel, pesado.

    A sugestão que ele me fazia não vou aqui repetir, porque, antes que eu eventualmente a apresentasse, ouvi hoje, quando assistia ao Jornal Hoje, programa de uma das emissoras de televisão, a fala do Presidente do Senado e do Congresso Revisor, Senador Humberto Lucena, ponderando sobre a necessidade de, pelo menos em dois fins de semana, o Congresso trabalhar na revisão, dando uma demonstração pública daquilo que é uma virtude nossa. Nós também somos capazes de decidir. Isso pode até não ser a vocação da Casa, mas somos capazes, diante de uma circunstância imperiosa, de decidir.

    Com isso, faço questão de afirmar que não estou fazendo uma sugestão, estou aqui manifestando, de público, a minha posição, como Senador, a favor daquilo que o Presidente Humberto Lucena aventou, muito objetivamente, como uma forma de recuperação do tempo perdido. E eu acrescento que, além de recuperar o tempo perdido, servirá para prestar uma satisfação à sociedade brasileira, dar um exemplo de trabalho, de capacidade de decisão em um momento tão difícil da vida nacional.

    Como Presidente do Partido não posso antecipar nossa posição, mas já mantive contato com vários companheiros, inclusive com o Líder na Câmara, Deputado Marcelino Romano Machado. Contactarei ainda o nosso Líder no Senado, Senador Epitácio Cafeteira, conversei há poucos minutos também com o Senador Jarbas Passarinho, bem como com o vice-Presidente do Congresso Revisor, Deputado Adylson Motta, que é, para orgulho de todos nós, exemplo da assiduidade que queremos obter. Acredito que na reunião de Líderes que será realizada amanhã, esta sugestão do Presidente da Casa não deverá ser isolada.

    Por isso, torno público, primeiro, o meu ponto de vista, segundo, como já havia sido externado por uma fonte mais credenciada, que é o próprio Presidente da Instituição, o meu apoio. Pretendo gestionar junto ao meu Partido e junto a outros partidos também, na medida do possível, nesta operação desencalhe da Revisão Constitucional, que todos encetaremos com o maior vigor esta semana, elegendo tópicos de uma agenda mínima, o meu partido defende a fixação de um agenda mínima desde o dia do nascimento do partido, dia 4 de abril. A consagração dessa pauta mínima ocorreu num manifesto que lançamos à Nação no dia 21 de outubro do ano passado.

    Defendemos essa agenda mínima, respeitamos a posição dos que são contra - conversei, inclusive, hoje, com o Senador Eduardo Suplicy sobre isso - e concordamos, acima de tudo, que não haja anuência quanto a todos os temas e as formas de como votar tal qual tema de uma Revisão Constitucional, mas certamente Revisão Constitucional não é fazer a Constituição toda de novo, todos sabemos que não é isso.

    Meu Partido tem a visão de que a Revisão Constitucional é uma chance, é uma oportunidade que um time que está perdendo não deve jogar fora. Um time que está perdendo e tem condições de mudar as regras e o conteúdo do jogo, da partida, deve aproveitar essa oportunidade. Pode até aproveitar bem, ou pode não aproveitar integralmente bem e cada um haverá de ter um ponto de vista a respeito da questão.

    Esta é a visão do meu Partido: nós elegemos três pontos, a questão política, a ordem econômica e o ajuste fiscal ou pacto federativo - como se queira chamar - que enfeixam as nossas prioridades. Acredito que nesse esforço que vamos fazer para desencalhar a Revisão Constitucional, esta idéia aventada pelo Presidente Humberto Lucena de, fixada a pauta, praticarmos o gesto de trabalhar além daqueles dias que são convencionalmente destinados à deliberação do Congresso, seria um gesto devido à sociedade brasileira.

    O Sr. Eduardo Suplicy - Permite-me V. Exª um aparte?

    O SR. ESPERIDIÃO AMIN - Concedo o aparte a V. Exª.

    O SR. EDUARDO SUPLICY - Em primeiro lugar, gostaria de dizer que a maior parte dos membros do Congresso Nacional deve, de fato, dar esse sinal ao povo brasileiro. Digo a maior parte porque houve aqueles - aqui está o Senador Jarbas Passarinho, cuja presença foi até documentada - que estiveram presentes durante o período de quarta a sexta-feira da semana passada. Mas acredito que essa sugestão que V. Exª traz e que o Presidente Humberto Lucena hoje transmitiu à imprensa sobre estarmos nos reunindo talvez nos dois próximos finais de semana, para compensar o que aconteceu nas últimas duas semanas, é muito louvável, e creio que o Congresso Nacional, como um todo, deveria, de fato, realizar esse esforço. Houve esforços semelhantes até recentemente, como, por exemplo, durante os quase cem dias de trabalho da CPI do Orçamento, em que um número considerável de parlamentares - até maior do que os 44 titulares e suplentes, porque muitos outros também participaram - aqui estiveram trabalhando quase que ininterruptamente. Poucos domingos houve de interrupção - dois domingos, se tanto, Natal e Ano Novo - mas mesmo assim o trabalho foi praticamente ininterrupto e ali houve um exemplo de dedicação ao interesse público, como é de se esperar, dos membros do Congresso Nacional. Avalio que esse esforço deve ser realizado até além da Revisão Constitucional, porque os trabalhos da Câmara e do Senado também precisam ser acelerados, há muitas coisas que aqui precisamos votar com maior rapidez. Em especial, também devemos dar maior atenção ao próprio Programa de Estabilização da Economia em suas inúmeras fases, e para isso o Senado Federal precisa dedicar maior colaboração e empenho do que o fez até agora, mas os passos já estão definidos nessa direção. Com respeito ao que será discutido amanhã no Colégio de Líderes, aproveito até para já fazer uma sugestão: para que haja esse esforço concentrado nos finais de semana, seria importante que houvesse o aviso prévio aos Partidos e aos Parlamentares. O Partido dos Trabalhadores, por exemplo, programou para os dias 5 e 6 de março uma reunião importante do Diretório Nacional, inclusive sobre os temas que aqui vamos debater no Congresso Nacional, como a questão de como estaremos participando - em que grau, se obstruindo e em que medida - já que houve até agora um empate na Executiva Nacional sobre a melhor forma de o PT levar adiante nossos objetivos, se não seria, inclusive, com a liberdade de votarmos. No nosso entender, gostaríamos de votar, conforme propõe o Senador Josaphat Marinho, que a Revisão seja concluída no dia 15 de março. Também gostaríamos de propor, e isso está no tema, que ela tenha não propriamente uma agenda mínima, mas uma agenda máxima. Esses termos - mínimo e máximo - têm sido colocados em dois sentidos, mas se pudermos estabelecer um máximo, como, por exemplo, a definição do Fundo Social de Emergência e o final da Revisão Constitucional, então, alguns pontos eventualmente poderão ser debatidos, mas disso dependerá inclusive a decisão do Diretório do PT nos próximos dias 5 e 6. Falo isso abertamente, porque entre o máximo e o mínimo, quem sabe, cheguemos a uma situação que seja - espero, - do interesse público. Pois bem, sobre a sugestão de trabalharmos nos finais de semana, proponho que seja no final de semana do dia 12 de março, porque aí seria a forma de bater o martelo até mesmo na conclusão da Revisão Constitucional em termos de, pelo menos, definir até aonde vai. Até porque, Senador Esperidião Amin, nós, do Partido dos Trabalhadores, avaliamos que, quanto à própria questão da legitimidade do Congresso Nacional como um todo de fazer essas modificações, seria muito mais legítimo e mais adequado que o novo Congresso eleito faça uma Revisão de profundidade, por isso entendemos que é o momento, sim, de definirmos uma agenda máxima para a presente Revisão.

    O SR. ESPERIDIÃO AMIN - Nobre Senador Eduardo Suplicy, quero agradecer o aparte de V. Exª que, além de ter sido generoso, foi também alentado, o que demonstra a energia que o PT está represando e que poderia ser utilizada em prol da Revisão Constitucional, não fossem as peias que ainda remanescem nesse processo democrático decisório que o PT desenvolve internamente e que já vai longevo no tempo.

    Mas não quero entrar nos aspectos polêmicos, se é agenda máxima ou mínima, se há legitimidade ou não - a minha posição é conhecida e eu respeito a de V. Exª. O que defendo é que cumpramos a Constituição. Não quero falar sobre como seria a Revisão na próxima legislatura, porque a Constituição não prevê isso. E estando iniciado o trabalho da Revisão, acho que o nosso compromisso é dar o mínimo de densidade a esta Revisão e encerrá-la.

    Na minha opinião, manter sobre o País, sobre as suas instituições a espada de uma Revisão que não tem termo é pior do que não fazer a Revisão. Mas, não desejo polemizar - repito - até porque esse é o cerne, é o fundamento da atividade legislativa que desenvolvemos normalmente.

A finalidade deste meu despretensioso registro é apoiar a sugestão que o Presidente do Congresso aventou, e dizer que entendo que ela seria muito oportuna, não por causa da semana do Carnaval - todos sabíamos que na Quarta - Feira de Cinzas, na quinta e sextas-feiras seguintes não haveria sessão deliberativa, e não é a primeira vez que isso acontece. Proponho, portanto, um esforço para definir essa pauta, seja máxima ou mínima, de acordo com a ótica de cada um, e que, a partir de então, o Congresso mostre essa sua virtude, que é a capacidade de trabalho, que V. Exª muito bem relembrou, como foi, por exemplo, o trabalho desenvolvido pela CPI do Orçamento, presidida pelo nosso eminente Companheiro, Senador Jarbas Passarinho, e que representou uma resposta, sabemos nós, cada qual, com que sacrifício para os seus integrantes, para os seus voluntários, para os servidores da Casa e para a imprensa, que teve de fazer plantão. Mas, acima de tudo, foi uma satisfação tempestiva, competente à sociedade brasileira.

    Nesses momentos, o Congresso se habilita; é em um momento como esse da CPI do Orçamento que entendo se pode materializar, com a fixação de uma pauta de trabalho e com a definição eventual de dois fins de semana para decidir sobre isso que, de comum acordo, se agendar.

    O Sr. Josaphat Marinho - V. Exª me permite um aparte?

    O SR. ESPERIDIÃO AMIN - Como sei que não será exatamente para concordar, concedo o aparte com maior satisfação ainda.

    O SR. JOSAPHAT MARINHO - Na maioria das vezes, concordo com V. Exª. Hoje até que, em parte, também concordarei. Não estou longe de aceitar a sugestão partida do Presidente da Casa. Não sei se dará resultado: pode ocorrer que uma minoria de nós fique e a maioria se ausente, como tem ocorrido em diferentes oportunidades. Mas, no caso, é bem previsível que isso ocorra, porque, na realidade, esta Revisão não expressa uma convicção generalizada do Congresso. É por isso que não há número. Por que houve número na feitura da Constituição? Porque todos os Partidos e todos os Parlamentares estavam empenhados em sair da ilegalidade anterior para a legalidade democrática. Agora, não. Não há entusiasmo, não há convicção no processo de revisão, meu nobre Colega. O esforço poderá ser muito grande, mas não sei se será proveitoso.

    O SR. ESPERIDIÃO AMIN - Sou constrangido a discordar, também. Respeito em gênero, número e grau, pela autoridade, pela origem do aparte, mas não posso concordar com a generalização de que não há convicção. Respeito aqueles que têm dito, como V. Exª desde o primeiro momento, tem anunciado a sua convicção. V. Exª tem uma convicção, que é contrária à minha. Nem a convicção de V. Exª desmerece respeito, nem a convicção de quem acredita na Revisão Constitucional, de quem avalia também os óbices, os antagonismos e a multiplicidade de argumentos que são apresentados; argumentos para diferir a Revisão, lançá-la para outra época, restringi-Ia. Questiona-se a legitimidade do Congresso. Os argumentos são vários, porque a moléstia brasileira é vária, mas, diante de um fato já iniciado, de um processo já iniciado, que deve ser, inclusive, aperfeiçoado, o meu espírito e a minha convicção me impõem dar resposta a uma atribuição que está dentro de mim.

    Entendo que, a partir do momento em que, esgotado até o recurso ao Supremo Tribunal Federal, a Revisão teve início, quem ainda se posta contra a sua realização deve estar seguindo uma convicção muito forte, mas que é questionável, até porque o processo está em curso. É um dever até funcional para o Congressista. A partir do momento do seu início, passou a ser um dever. Não comparecer a esse dever a minha convicção aponta como uma falta. Não coloco adjetivos. É uma falta a um dever que está estabelecido nas minhas obrigações diárias, e entendo que a proposta do Presidente permitiria que o cumprimento dessa obrigação diária tivesse até esse conteúdo de satisfação à opinião pública, independentemente do resultado da votação deste ou daquele ponto.

    V. Exª sabe, tenho também, ainda que com menos luzes, algumas opiniões próprias.

    O SR. JOSAPHAT MARINHO - V. Exª me permite? Complemento, apenas, o aparte.

    O SR. ESPERIDIÃO AMIN - Pois não.

    O SR. JOSAPHAT MARINHO - Note que quando me referi à falta de convicção, é evidente que não me dirigi aos que crêem na Revisão e a defendem, como V. Exª. Os que crêem, os que desejavam a Revisão e querem efetivamente colaborar estão presentes. Sou contra e estou normalmente presente. Presente, às vezes, para contestar, mas, note V. Exª quando num processo de natureza constitucional como este é preciso que os dirigentes da Casa adotem medidas coercitivas, é porque a maioria não está convencida da necessidade da Revisão.

    O SR. ESPERIDIÃO AMIN - Ainda assim não sou tão otimista quanto V. Exª Acho que, há questões operacionais que são evidentes. Primeiro, a fixação de uma pauta que corresponda a necessidades óbvias do País.

    Rediscutir toda a Constituição é algo que certamente não nos empolgará. Há, aí, uma questão de empolgação, de entusiasmo, de causa por que lutar. Agora, discutir esses temas que tomei a liberdade de anunciar, e que, parece-me, ninguém consegue dizer que nada têm a ver com o quadro de dificuldade do País, é imperioso. É a minha convicção.

    O SR JOSAPHAT MARINHO - Mas veja V. Exª - não quero prejudicar o curso de seu pronunciamento - ...

    O SR. ESPERIDIÃO AMIN - Pelo contrário, V. Exª o nobilita.

    O SR JOSAPHAT MARINHO -... que em nenhum momento, até aqui, houve condição para estabelecer a pauta mínima da Revisão.

    O SR. ESPERIDIÃO AMIN - É uma constatação.

    O SR. JOSAPHAT MARINHO - Os trabalhos continuam com emendas que atingem, em volume, toda a Constituição. Não houve um processo de seleção dos problemas, das normas constitucionais que merecessem o esforço maior do Congresso.

    O SR. ESPERIDIÃO AMIN - O que V. Exª diz vem em favor do meu argumento: faltam questões operacionais, como, por exemplo, a fixação desses tópicos e, segundo, o início do funcionamento daquilo que faz com que estas Casas funcionem, que é o Colégio de Líderes. Entendo que o ideal para a Casa é ter um número menor de Parlamentares, tanto no Senado quanto na Câmara. Isso já foi debatido aqui. Com este número, 584, só com o Colégio de Líderes funcionando teremos pauta para Plenário. Sem isso, essa Casa não funciona - a Casa a que me refiro é o Congresso Nacional.

    Então, há duas questões operacionais, que não são, obrigatoriamente, decorrentes de convicção, mas da polêmica que se estabeleceu e de fatos exógenos, como, por exemplo, a CPI ou as CPI de que se têm tratado.

    O Sr. Jarbas Passarinhho - V. Exª me concede ora aparte, nobre Senador?

    0 SR. ESPERIDIÃO AMIN - Desejo ouvir, com grande satisfação, nosso nobre companheiro, nosso Líder e exemplo, o Senador Jarbas Passarinho.

    O SR. JARBAS PASSARINHO - Muito obrigado, nobre Senador Esperidião Amin. V. Exª colocou a questão em termos absolutamente concretos, em mínimos em vez de máximos. Conheço bem a opinião do nosso mestre nobre Senador Josaphat Marinho, porque com ele debati num quartel, ambos livres, nenhum dos dois presos. Já conhecia bem o seu ponto de vista, contrário à Revisão. Constituinte que fui, sabia que desejávamos exatamente, naquela altura, talvez até aproveitando a experiência portuguesa, marcar um prazo de 5 anos para verificar a exeqüibilidade da Constituição nesse período. Todos sabemos que, quando se fez a Constituição, como disse o nobre Senador pela Bahia, havia a transição de um regime autocrático, cadente, para um regime de Nova República, nascente e extremamente frustrante. Entretanto, o Muro de Berlim não tinha caído. Os estatistas estavam no auge de seu poder e impregnaram a Constituição de algumas diretrizes, hoje reconhecidas como absolutamente incompatíveis com a modernidade dos países depois da Guerra Fria. Tenho de me render um pouco em relação ao que disse o nobre Senador Josaphat Marinho a V. Exª quanto à questão de convicções. Por que disse "um pouco"? Porque será que foi por falta de convicção que está há dois anos no Congresso, por exemplo, o Projeto de Lei de Propriedade Industrial? Será por falta de convicção - há uma porção de outros exemplos que poderíamos dar e não só este - que vários projetos estão parados, estagnados, enquanto o Congresso não funciona? Será por falta de convicção que, por exemplo, diziam que o funcionamento de uma CPI, como afirmou há pouco o Senado, Eduardo Suplicy, com apenas 44 membros, dos quais obrigatoriamente somente os 22 titulares tinham de comparecer, prejudicaria os trabalhos da Revisão? De modo algum. Há, sim, Senador, todo mundo viu, todo mundo sabe, a resistência de uma minoria organizada à realização da Revisão. Depois do nosso trabalho de praticamente cem dias, como disse há pouco o Senador Eduardo Suplicy, atravessei a passagem do Senado para a Câmara sob os maiores insultos as maiores vaias, dentro do Congresso Nacional. Naquela oportunidade, quando me dirigi para o plenário da Câmara, Senador, tive a mesma impressão de quando, ao fazer meu cooper, passo por algumas casas que têm cães bravios. Era o que via: cerca de 200 pessoas, acampadas aqui nessa passagem, ofendendo da maneira mais grosseira quem passava para o plenário da Câmara.

    Era um processo de intimidação. Esse processo de intimidação vale, sei disto, todos sabemos. Quantos, na verdade, até por comodidade, não enfrentam essas coisas, preferem ficar lá fora? Não é bem convicção. É uma "convicção" amedrontada, uma falta de convicção, uma falta de coragem de atuar. Naquela época, o Presidente da República era o Senador José Sarney. À medida que votávamos as matérias, para chegarmos ao final da Constituinte, S. Exª dizia que a Constituição ia transformar o Brasil num país ingovernável. Naquela ocasião, houve reações brutais, veementes, do Congresso, que se considerava na Constituinte, ofendido pelo Presidente do Executivo. Quem não sabe que havia coisas que realmente precisavam ser mudadas? Apenas há a velha questão do estatismo versus aqueles que não são estatizantes nesse processo.

    Em primeiro lugar, é isto: os estatizantes não querem, de maneira nenhuma, que a Constituição mude esse processo, que as corporações anuem em favor disso. Defendem isso como se fossem seus campos de caça, e ali não se pode chegar. Então, quando fala em máxima, o Líder do PT já traduz, para mim, exatamente esse ponto de vista. Quando V. Exª fala em mínima - veja como as concepções não são tão contraditórias -, para V. Exª, mínimo é o mínimo em relação ao volume do que se contém na Constituição, nos seus artigos. Já para o PT, isso é o máximo que se poderia fazer. Veja que as duas palavras conjugam-se perfeitamente bem e se articulam. Então, é uma pena que se verifique que a Constituição brasileira deva ficar intocada e deva esperar-se o novo Presidente da República, para, de acordo com a nova composição do Congresso Nacional, fazer-se a Revisão Constitucional. Penso que, desse modo, pode haver complicações muito graves. Poderá haver, mais tarde, um impasse entre o Executivo e o Legislativo, a partir do momento em que a maioria do Congresso seja - vamos admitir a hipótese - conservadora, e o Presidente da República, revolucionário - no sentido político do termo -, possa vir a ser tolhido na sua capacidade de atuação por uma modificação que a Revisão fará então. Tudo indicava, até pela lógica, que a revisão fosse feita agora. Então, penso que V. Exª, quando colocou o mínimo, quis dizer realmente minimum minimorum, isto é o menos que se poderia fazer para tentar uma modificação, isso, já fazendo várias concessões aos contras. É impossível, evidentemente, modificar o pensamento de quem, ao longo de uma vida, sempre foi partidário da estatização, para que, no momento, possa atender, não ao neoliberalismo - nunca eu faria isso -, mas ao social-liberalismo. Defendo uma economia social de mercado, que me parece perfeitamente compatível com o que se fala hoje no mundo inteiro.

    O SR. ESPERIDIÃO AMIN - Senador Jarbas Passarinho, faço minhas as suas palavras, e como vejo que o meu tempo se esgota, desejo apenas fazer uma última reflexão. Estou absolutamente convencido de que a nossa irreverência, traço característico do brasileiro, também opera contra aquilo que imagino ter sido a sentença divina. Quando o Criador desenhou o País, quando aliou os seus recursos à sua diversidade de clima, quando impregnou até, mais do que a alma da Nação, a alma do País do atributo da tolerância - tolerância racial, religiosa, que é quase da alma do País, não só da Nação, é quase patrimônio do Brasil, não apenas da Nação brasileira -, condenou-nos ao sucesso. Estou convencido de que o Criador nos condenou ao sucesso, e a nossa irreverência se manifesta por meio das armadilhas que nós mesmos temos colocado ao longo do nosso caminho: obstáculos, dificuldades, pesos, que fazem com que este País, condenado ao sucesso, esteja vivendo a condição de insucesso de País que não dá certo, segundo todos os parâmetros de avaliação, tanto daqueles que se consideram socialistas quanto dos que se consideram sociais-liberais, ou daqueles outros que se consideram sociais-democratas, ou liberais, ou neoliberais, segundo todas as avaliações, segundo a ótica de todos, não está dando certo. E não está dando certo, também, por regras e imposições que uma Revisão, como chance, deveria ferir.

    Essa era a reflexão que eu gostaria de trazer. Agradeço, sensibilizado, pelos apartes recebidos.

    O Sr. José Fogaça - Senador Esperidião Amin, V. Exª me permite fazer uma observação ao seu pronunciamento?

    O SR. ESPERIDIÃO AMIN - Com a anuência da Mesa, certamente.

    O SR. JOSÉ FOGAÇA - É evidente que V. Exª tocou no assunto mais importante de que este Congresso está tratando no momento. Tenho grande preocupação com esta Revisão Constitucional, porque estou vendo que ela pode ter um caráter muito mais supressor de si mesma do que propriamente de ganho ou de conquista, do ponto de vista institucional, que se poderia obter com ela. Quero lembrar a V. Exª que uma Revisão não tem poder convocatório de outra Revisão.

    O SR. ESPERIDIÃO AMIN - Não tem, também concordo. Eu enunciei isto: ela tem de terminar.

    O SR. JOSÉ FOGAÇA - Ela tem um caráter definitivo, ou seja, uma vez realizada, dá conta daquilo que estabelece a Constituição.

    O SR. ESPERIDIÃO AMIN - No seu poder originário.

    O SR. JOSÉ FOGAÇA - Exatamente. A dimensão político-institucional-econômica desta Revisão será tão acanhada, ou menos acanhada quanto ela, em si mesma, deva ser. De modo que me preocupa, demasiadamente, o fato de que nós não consigamos estabelecer uma pauta mínima. Se não temos essa pauta, não temos objetivos, estamos trabalhando sobre coisas indiscriminadas, extremamente genéricas, incertas e indefinidas. Creio que, com isso, a tendência à inércia acaba por prevalecer, ou seja, se não há objetivos específicos claros, determinados, a tendência é não se fazer nada, porque esta é uma tradicional postura política do Congresso. Se não temos um programa de decisões estabelecido, não vamos decidir nada. O meu temor é que, com isso, venhamos a matar a possibilidade de uma grande e necessária Revisão Constitucional que este País está demandando. Sou favorável à Revisão, penso que é absolutamente imprescindível ao País. O Brasil não chega ao final do século XX com a estrutura moderna de nação preparada para o terceiro milênio se não fizer esta Revisão. O que estou percebendo é que talvez venhamos, por esses impasses políticos que estão aí, a tornar a Revisão uma coisa nula, definitivamente apagada pelo nosso próprio desejo de fazer a Revisão. Ou seja: aprovamos o Fundo Social de Emergência, aprovamos a convocação de autoridades do Governo, fechamos a Revisão e ela não ocorre mais e mantemos a Carta tal como ela está, com todos os conceitos - a meu ver equivocados - que ainda contém e matamos a possibilidade de uma Revisão realmente consistente, profunda, que tenha o tempo e o espaço políticos necessários para o debate. Esta é a minha preocupação central: se esta consciência não se generalizar, ou seja, não tomar conta do Congresso, não mobilizá-lo para, efetivamente, realizar uma agenda mínima, o resultado será Revisão nenhuma, ao invés de uma Revisão mínima. Para mim, muito pior do que a desmoralização e o desprestígio do Congresso é a certeza de que este País caminha para o final do século XX com uma Constituição que não é compatível, pelo menos, com a modernidade, com a idade contemporânea que vivemos.

    O SR. ESPERIDIÃO AMIN - Senador José Fogaça, agradeço pela densidade do seu aparte. Só para concluir, digo: E vai virar o século, portanto, tendo jogado fora uma oportunidade democrática e legítima de encaminhar seus problemas, em prol de qual alternativa? Não sei.

    Ao nos contrapormos à Revisão, estamos semeando o confronto. Por isso, vale a pena fazer um esforço.

    Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente!


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 22/02/1994 - Página 795