Discurso no Senado Federal

CONSIDERAÇÕES SOBRE OS PARECERES 19 E 20/94 - RCF, DO DEPUTADO NELSON JOBIM, RELATOR DA REVISÃO CONSTITUCIONAL, QUE TRATA DA REMUNERAÇÃO DOS VEREADORES E DA FIXAÇÃO DO SEU NUMERO.

Autor
Alfredo Campos (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/MG)
Nome completo: Alfredo José de Campos Melo
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA CONSTITUCIONAL.:
  • CONSIDERAÇÕES SOBRE OS PARECERES 19 E 20/94 - RCF, DO DEPUTADO NELSON JOBIM, RELATOR DA REVISÃO CONSTITUCIONAL, QUE TRATA DA REMUNERAÇÃO DOS VEREADORES E DA FIXAÇÃO DO SEU NUMERO.
Publicação
Publicação no DCN2 de 10/02/1994 - Página 633
Assunto
Outros > REFORMA CONSTITUCIONAL.
Indexação
  • CRITICA, PARECER, AUTORIA, NELSON JOBIM, DEPUTADO FEDERAL, RELATOR, REVISÃO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, RELAÇÃO, REMUNERAÇÃO, FIXAÇÃO, NUMERO, VEREADOR, CAMARA MUNICIPAL.

    O SR. ALFREDO CAMPOS (PMDB - MG. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, os jornais do dia 26 do mês passado estamparam manchetes bombásticas sobre os pareceres de número 19 e 20 - do Deputado Nelson Jobim, Relator da Revisão Constitucional - que tratam do remuneração dos vereadores e da fixação do seu número. Diziam os jornais, não se sabe com base em que dados que serão suprimidas cerca de 16 mil das cerca de 40 mil vagas de vereador existentes hoje em todo o País, caso seja aceito o parecer na íntegra. Sensacionalismo à parte, o certo é que a proposta mexe bastante com todo o sistema de representatividade dos cidadãos, porque atinge diretamente diretamente sua base, as Câmaras Municipais.

    Na verdade, são dois os pontos mais polêmicos desses pareceres. O primeiro diz respeito à fixação do número de vereadores, cujo mínimo seria reduzido de nove para cinco nas cidades de rarefeita população. Esta redução é que representaria a propalada supressão de 16 mil vagas anunciada com estardalhaço pela mídia. O segundo aspecto refere-se aos vencimentos. Sugere o senhor Relator na sua proposta que sejam remunerados apenas os edis das cidades que tenham mais de 10 mil eleitores.

    Examinando-se desapaixonadamente as propostas do Relator percebe-se que, na sua maioria, serão aceitas sem grandes problemas porque são consensuais, já que representam posições majoritárias dentro do Congresso Nacional. As acima mencionadas, no entanto, suscitarão debates.

    Vejamos, inicialmente, os pontos pacíficos. O Deputado Nelson Jobim propõe, por exemplo, que a remuneração ou não dos vereadores seja fixada com base nos dados do cadastro eleitoral das cidades - que é atualizado permanentemente - e não mais com base na população, já que esta só é aferida de dez em dez anos, nos censos. Não há dúvida de que o melhor indicador nas questões de representatividade política é o cadastro da Justiça Eleitoral.

    Sugere também o Relator que todas as Câmaras Municipais tenham número ímpar de membros, de forma a evitar os impasses que freqüentement e são registrados quando o plenário se divide ao meio, às vezes com graves problemas para as administrações municipais. Essa é outra posição de consenso.

    O Relator quer também que a fixação do número de membros de cada Casa Legislativa seja decidida pelo Tribunal Regional Eleitoral e não mais pela Lei Orgânica dos Municípios. Busca com isso a imparcialidade no julgamento de recursos.

    Há, porém, uma incongruência entre os dois pareceres do Deputado Nelson Jobim - o de número 19, que fixa o número de vereadores, e o de número 20, que trata da remuneração dos agentes políticos municipais. O pagamento ou não dos vereadores será estabelecido tendo como base o cadastro de eleitores; enquanto isso, o número de integrantes das Câmaras será determinado pelo total de habitantes da cidade. Cabe aqui uma pergunta: Por que não se adota um critério único, o do número de eleitores, por exemplo?

    Sr. Presidente, Srs. Senadores, diz o Deputado Nelson Jobim, no relatório que precede seu parecer de número 19, que entre as principais preocupações dos parlamentares que apresentaram emendas sobre o tema estão: a) a fixação do número ímpar de vereadores; b) a redução do número mínimo é de edis.

    Quanto ao primeiro aspecto, nada temos a acrescentar, tendo em vista que oito das vinte e oito emendas apresentadas ao item IV do artigo 29 da Constituição sugerem, realmente, o estabelecimento de um número ímpar de componentes das Câmaras Municipais, o que é o mais sensato.

    No entanto, não logramos entender como pode o Relator - a quem cabe buscar o consenso das opiniões dos parlamentares - sugerir a fixação de um mínimo de cinco edis por cidade. Lendo as propostas de senadores e Deputados, notamos que, das vinte e oito sugestões, treze mantinham o atual mínimo, que é de nove. As emendas sugerindo redução eram apenas sete. Destas, só quatro pleiteavam a redução para cinco; as outras três propunham um mínimo de sete vereadores. Temos, portanto, treze emendas a favor da manutenção do quorum mínimo atual contra sete exigindo diminuição.

    Dessa forma, confesso que realmente não entendi por que o senhor Relator pediu a redução para cinco. Se foi de moto próprio que resolveu reduzir o número de vereadores, por que não sugeriu um mínimo de sete? Esta seria uma postura intermediária, menos drástica, embora - reafirmo minoritária. Eis aqui uma perplexidade que eu gostaria de dividir com meus ilustres colegas.

    Passemos à questão dos vencimentos. Quer o ilustre Relator que sejam remunerados apenas os vereadores das cidades que tenham mais de dez mil eleitores. Alega ele que, em muitos municípios, os vereadores se atribuem vencimentos que são incompatíveis com o volume de trabalho que desempenham e com o caixa do município. Argumenta:

    O Constituinte de 1988 ofereceu um crédito aos membros das Câmaras Municipais; interpondo sua competência para fixar valores de remuneração apenas limites de ordem administrativa e tributária, como indica o disposto no inciso V deste artigo 29.

    E prossegue:

    No entanto, o que se viu foi a desmesurada prática de abusos pelos quais houve vários casos em que a remuneração dos agentes políticos superava não só os valores considerados razoáveis para a realidade local, mas também a de Deputados Estaduais e Governadores".

    O Brasil tem hoje cerca de cinco mil municípios. Na esmagadora maioria deles - na quase totalidade, eu diria -, os vereadores ganham muito pouco. Naquelas cidades de porte médio, bem menos numerosas, a remuneração deve ser maior justamente porque os encargos de representação acabam sendo maiores. Temos, por fim, duas ou três dezenas de grandes cidades.

    Em algumas desses milhares de cidades, sem dúvida, houve abuso ao se fixarem os vencimentos dos edis. Mas esses casos foram pouquíssimos quando se considera que o universo brasileiro é de cinco mil municípios. Infelizmente, no Brasil, existe uma tendência a simplificar as coisas. Se vereadores de dez casas legislativas extrapolaram ao fixar seus vencimentos, generaliza-se. Passam todos os vereadores a ser suspeitos de se locupletarem com recursos públicos. Não é verdade. A esmagadora maioria dos vereadores deste País é de cidadãos sensatos que sabem das dificuldades de suas comunidades e que se contentam com valores irrisórios, simbólicos.

    Segundo dados atualizados do Tribunal Superior Eleitoral, 64,2 por cento dos municípios brasileiros têm hoje menos de 10 mil eleitores. Assim, concluímos que os vereadores de 3.255 cidades perderão seus vencimentos, caso a proposta do Relator seja aceita. Ora, como disse antes, o número de abusos comprovados é insignificante e não justifica a punição dos líderes políticos de mais de três mil cidades deste País. Como todas essas cidades têm hoje o mínimo de 9 vereadores, chegamos a um total de 29.025 vereadores que serão punidos com a perda de vencimentos.

    É bom lembrar aqui que a história mostra que não é recomendável ter agentes políticos não remunerados. A tese de que as pessoas devem se dedicar às tarefas políticas sem vencimentos é falsa. De um lado, é claro, trata-se de uma medida elitista, porque só os mais abastados, em tese, poderiam desempenhar cargos públicos. Como ficariam nas pequenas cidades os artesãos, por exemplo? E os trabalhadores rurais? Na verdade, essa tese pode induzir, de um lado, à corrupção dos vereadores, e, de outro, ao favorecimento dos privilegiados que puderem, sem rendimentos, ingressar nas Câmaras.

    Quero concluir este rápido pronunciamento pedindo a atenção de todos para essas delicadas questões. Acima de tudo não me parece sensato reduzir a base de representação da cidadania nas pequenas cidades. Temos hoje um mínimo de nove integrantes nas Câmaras Municipais e esse número teve o apoio da maioria das emendas apresentadas sobre a questão. Portanto, deve ser mantido.

    Nós, políticos, sabemos o quanto são importantes as Câmaras de Vereadores no processo político nacional. Os vereadores são os olhos e ouvidos dos deputados estaduais e federais e senadores nas pequenas e grandes cidades. São a voz dos cidadãos contra as arbitrariedades do poder Executivo ou do Judiciário.

    Quero lembrar aqui o que escrevi na introdução do Manual do Vereador, livro que editei no ano passado e que distribui a todos os edis do meu Estado, como forma de contribuir no seu trabalho:

    Vereador vem do verbo verear, isto é, velar pelo sossego e bem estar dos munícipes... A vereação era o lugar onde se verdeava (o município) ou o conjunto de vereadores no exercício de suas funções. Modernamente, esse sentido modificou-se, embora não se desligasse do anterior, passando a significar "membro da Câmara Municipal", "o que legisla para o município..." Vereador é sinônimo de edil, um antigo magistrado romano.

    Para concluir, Sr. Presidente, Srs. Senadores, quero lembrar que a tendência no mundo moderno é no sentido da descentralização. Temos que, cada vez mais, delegar poder aos Estados e aos Municípios, em detrimento da União, que deve se restringir às grandes linhas da política econômica ou social. Nesse sentido, ganham importância as Câmaras de Vereadores. Temos que valorizá-las. Não podemos neste momento - quando o Brasil avança celeremente rumo à modernização e moralização da vida pública - enfraquecê-las.

    Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente. Muito obrigado! 


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 10/02/1994 - Página 633