Discurso no Senado Federal

TRANSCURSO DOS 24 ANOS DA EMBRAER - EMPRESA BRASILEIRA DE AERONAUTICA, EM CLIMA DE DESESTATIZAÇÃO IMINENTE.

Autor
Nelson Wedekin (PDT - Partido Democrático Trabalhista/SC)
Nome completo: Nelson Wedekin
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PRIVATIZAÇÃO.:
  • TRANSCURSO DOS 24 ANOS DA EMBRAER - EMPRESA BRASILEIRA DE AERONAUTICA, EM CLIMA DE DESESTATIZAÇÃO IMINENTE.
Publicação
Publicação no DCN2 de 04/03/1994 - Página 1050
Assunto
Outros > PRIVATIZAÇÃO.
Indexação
  • COMEMORAÇÃO, ANIVERSARIO DE FUNDAÇÃO, EMPRESA BRASILEIRA DE AERONAUTICA (EMBRAER), POSSIBILIDADE, PRIVATIZAÇÃO, EMPRESA PUBLICA.
  • COMENTARIO, SITUAÇÃO FINANCEIRA, EMPRESA BRASILEIRA DE AERONAUTICA (EMBRAER), REDUÇÃO, INVESTIMENTO, UNIÃO FEDERAL, DESTINAÇÃO, EMPRESA PUBLICA, VALOR, PATRIMONIO, SUPERIORIDADE, DIVIDA, EMPRESA ESTATAL.
  • CRITICA, GOVERNO FEDERAL, CONTRADIÇÃO, ISENÇÃO FISCAL, IMPORTAÇÃO, AERONAVE, IMPUTAÇÃO, TAXAS, FABRICAÇÃO NACIONAL, EMPRESA BRASILEIRA DE AERONAUTICA (EMBRAER).
  • COMENTARIO, ANTERIORIDADE, APRESENTAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, FRANÇA, AERONAVE, FABRICAÇÃO NACIONAL, EMPRESA BRASILEIRA DE AERONAUTICA (EMBRAER), RESULTADO, POSSIBILIDADE, VENDA, PRODUTO NACIONAL.
  • REJEIÇÃO, PRIVATIZAÇÃO, EMPRESA BRASILEIRA DE AERONAUTICA (EMBRAER), NECESSIDADE, RECUPERAÇÃO, PRESERVAÇÃO, PATRIMONIO DA UNIÃO.

    O SR. NELSON WEDEKIN (PDT-SC. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores:

    Sob crise das mais graves, a Embraer, Empresa Brasileira de Aeronáutica, comemorou, em 21 de agosto passado, os seus 24 anos, em clima de desestatização que a ameaça, idéia, aliás, aprovada pela direção da empresa, ao tempo em que, na mesma semana, foi oficializado o “Comitê em Defesa da Embraer - Não à Privatização”. Cinqüenta entidades de todo o País integram esse movimento, hoje expressivamente consolidado de forma nacional. A própria Prefeitura de São José dos Campos, cidade sede da Embraer, e sua Câmara de Vereadores participam do Comitê, e, entre as mais respeitáveis associações que o apóiam, destaca-se também a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência. Sindicatos e parlamentares, igualmente, se alinham entre aqueles que defendem a tese de que o Governo deve salvar a Embraer.

    Ozires Silva, superintendente e fundador da empresa, manifesta-se favorável à privatização, desde que mantida parte das ações em poder da União, distribuindo-se a maioria das ações a empregados e grupos selecionados. O Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos, que encabeça o Comitê, entende, por sua vez, que a relação entre a empresa e a União precisa ser revista, mas o controle acionário não pode passar tão-somente das mãos desta para a de particulares. Teme o Sindicato, bem como o setor aeroespacial do País, que a privatização ponha fim aos projetos nacionais de aeronaves, transforme a Embraer em simples montadora ou depósito de manutenção de aviões da FAB, destarte extinguindo-se parte do patrimônio tecnológico brasileiro.

    É bem verdade que a dívida atual da Embraer é de um bilhão de dólares, mas seu patrimônio está avaliado em pelo menos o dobro. Os prejuízos acumulados somam US$ 764 milhões, mas, contrariamente ao que muitos podem pensar, a União não investiu maciçamente e nem aportou recursos em benefício da Embraer. O Governo, bem observa Joelmir Beting, em O Estado de S. Paulo, de 18/02/93, investiu na Embraer, em seus 24 anos, irrisória quantia, considerando-se ter ela exportado US$ 3,5 bilhões e ter substituído importações de US$ 3,7 bilhões no período. Com qualidade de Primeiro Mundo, situa-se entre as seis maiores empresas de engenharia aeronáutica do mundo, operando nos cinco continentes. Domina 32% do mercado mundial de aeronaves comerciais de transporte regional, e é responsável por 57% do mercado mundial de aparelhos de treinamento militar. Duzentos e seis “Brasílias”, do total de 275 produzidos pela Embraer até hoje, voam nos Estados Unidos. E, pelo terceiro ano consecutivo, esse tipo de aeronave (EMB. - 120) lidera no número de assentos oferecidos na aviação regional nos Estados Unidos, fato que é motivo de júbilo, honra e orgulho para todos nós brasileiros. Não só os Estados Unidos, mas França e Inglaterra, entre outros, são compradores dos aviões fabricados pela Empresa Brasileira de Aeronáutica. Como se trata de países que dispõem de alta tecnologia aeronáutica, tal fato evidencia a competitividade da estatal, que extrapola o mercado interno e a torna imbatível em relação a qualquer outra empresa estatal brasileira, malgrado a recessão, os sucessivos e malsucedidos planos econômicos, e a irresponsabilidade governamental que deixou a descoberto dívidas vencidas e não honrou compromissos assumidos.

    Lamente-se e deplore-se que no Brasil - já foi dito, país de contrastes! - os aviões importados se privilegiem com total isenção fiscal, enquanto os produzidos pela empresa nacional são taxados com a mesma carga fiscal que se aplica aos equipamentos industriais. Para contornar e superar a onerosa incidência da carga tributária que a asfixia, insista-se, como empresa nacional, a Embraer recorreu a uma operação-artifício, de modo a estar habilitada a enfrentar a concorrência em igualdade de condições: é a “exportação- importação”, qual seja, para comercializar seus produtos no mercado interno, a empresa tem que primeiro exportá-los, para em seguida vendê-los ou cedê-los através de leasing a empresas brasileiras. É inominável para a economia do País o reflexo de tal procedimento discriminatório, por parte do Governo, que configura verdadeira xenofilia, pois não se pode perder de vista que a carga tributária representa em média 20% do preço final de um avião, enquanto concorrentes estrangeiros têm isenção total até para aviões usados. Não foi por outra razão que, nos últimos dois anos, o Brasil importou 265 aviões usados.

    A criatividade, Srs. Senadores, tem sido a arma de que tem se valido a Embraer para resistir e tentar se salvar da crise que a ronda. Apesar de todo o descaso governamental, que inibe qualquer possibilidade de otimização dessa empresa tão pujante e altamente competitiva, quando, bem ao contrário, o poder público deveria criar condições para que ela excelesse, a Embraer, em junho próximo passado, participou, de forma marcante e singular, do Salão de Le Bourget, na França, um dos mais importantes acontecimentos mundiais para a indústria aeronáutica e espacial. Lá foi apresentado seu projeto do EMB-145, o primeiro jato comercial para transporte de 50 passageiros produzido na América Latina. Trata-se de jato de novíssima geração para transporte regional, que deverá voar pela primeira vez em 1995. Recebidas já 120 cartas de intenção de compra do EMB-145, que representa a volta ao simples, ao básico, com o abandono da sofisticação encarecedora, estratégia para vencer a crise no mercado mundial, a Embraer como que está “terceirizando”, formando parcerias com outras indústrias do setor, que deverão contribuir com um aporte de US$ 170 milhões de recursos para a concretização do projeto.

    Muito antes de se aderir à privatização pura e simples da Embraer, Srs. Senadores, impõe-se reavaliar, diante dos fatos, com serenidade, sem a tentação da adesão fácil a modismos, o real papel do Estado na economia, tendo em vista a soberania nacional, o desenvolvimento auto-sustentável e a retomada dos investimentos. Não nos esqueçamos de que a Empresa Brasileira de Aeronáutica é estratégica, sob vários pontos de vista: industrial, tecnológico, do emprego e da segurança nacional. Projeto muito bem sucedido, do ponto de vista operacional, são irretorquíveis as perspectivas de sua recuperação e saneamento financeiro, como deflui dos dados que apresentamos.

    Deve o Governo, Srs. Presidente, resgatar os seus débitos com a estatal, exigir o mesmo dos demais parceiros, bem como promover o aporte de capitais indispensáveis à sua completa recuperação. Desde sua fundação, em 1969, a União, sua sócia principal, só aplicou US$ 200 milhões, período em que a empresa faturou US$ 7,2 bilhões (dados do presidente da Embraer em depoimento no Congresso Nacional). Está mais do que comprovada a viabilidade operacional, tecnológica e financeira da Embraer, cujo potencial permite prever faturamento, nos próximos 10 anos, da ordem de US$ 13 bilhões, uma vez que o mercado atual demanda aeronaves de pequeno e médio porte, especialidade da empresa estatal.

    Somos, pelas razões expostas, favorável à aprovação do projeto do Deputado Federal Ernesto Gradella, que retira a estatal da lista das privatizáveis, exigindo, como a sociedade brasileira, signatária do “Comitê em Defesa da Embraer”, através de instituições as mais diversificadas, que haja isonomia da Embraer com as concorrentes estrangeiras, e que se crie um fundo nacional para recuperar a capacidade de investimento em ciência e tecnologia. O acervo tecnológico de um País deve sempre permanecer sob a tutela da organização estatal, meio pelo qual se preserva a própria soberania nacional.

    Portanto, não à privatização da Embraer, pela seriedade e moralização da empresa pública, e pela preservação do patrimônio nacional!

    Muito obrigado!


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 04/03/1994 - Página 1050