Discurso no Senado Federal

DEFENDENDO A NECESSIDADE DA IMPLANTAÇÃO DE PROGRAMAS DE DESENVOLVIMENTO ECONOMICO E DE FOMENTO A AGRICULTURA PARA A REGIÃO AMAZONICA, COMO FORMA DE MINORAR OS DESEQUILIBRIOS REGIONAIS. CONGRATULANDO-SE COM A REVISTA 'CARAS' QUE EM COLUNA ASSINADA PELO PROFESSOR DIONISIO SILVA, CONSAGROU ESPAÇO A DIVULGAÇÃO DA POESIA.

Autor
Aureo Mello (PRN - Partido da Reconstrução Nacional/AM)
Nome completo: Aureo Bringel de Mello
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA AGRICOLA.:
  • DEFENDENDO A NECESSIDADE DA IMPLANTAÇÃO DE PROGRAMAS DE DESENVOLVIMENTO ECONOMICO E DE FOMENTO A AGRICULTURA PARA A REGIÃO AMAZONICA, COMO FORMA DE MINORAR OS DESEQUILIBRIOS REGIONAIS. CONGRATULANDO-SE COM A REVISTA 'CARAS' QUE EM COLUNA ASSINADA PELO PROFESSOR DIONISIO SILVA, CONSAGROU ESPAÇO A DIVULGAÇÃO DA POESIA.
Aparteantes
Amir Lando.
Publicação
Publicação no DCN2 de 05/04/1994 - Página 1550
Assunto
Outros > POLITICA AGRICOLA.
Indexação
  • APOIO, PRONUNCIAMENTO, AMIR LANDO, SENADOR, RELAÇÃO, IMPORTANCIA, DESENVOLVIMENTO, REGIÃO AMAZONICA.
  • SOLICITAÇÃO, IMPLANTAÇÃO, PROGRAMA, DESENVOLVIMENTO ECONOMICO, INCENTIVO, AGRICULTURA, REGIÃO AMAZONICA, REDUÇÃO, DESEQUILIBRIO, DESIGUALDADE REGIONAL, PAIS.
  • ELOGIO, INICIATIVA, PERIODICO, CARAS, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), PUBLICAÇÃO, ARTIGO DE IMPRENSA, AUTORIA, DIONISIO SILVA, JORNALISTA, HOMENAGEM, DIVULGAÇÃO, LITERATURA, POETA.

    O SR. AUREO MELLO (PRN - AM. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, nobres Srs. Senadores, era minha intenção fazer um pequeno registro aqui. Era e é. Entretanto, depois de ouvir as palavras do eminente Senador Amir Lando, resolvi também embrenhar-me um pouco na selva e dizer para os Srs. Senadores um pouco daquelas coisas misteriosas que nos comovem, e como se fôssemos profetas, às vezes falando uma linguagem que não pode ser entendida nem assimilada por qualquer pessoa que não tenha tido contato, mesmo remoto, com aquelas singulares regiões.

    Quando entramos na Amazônia, quando participamos daquela vida é como se entrássemos numa grande caverna, cujas estalactites e estalagmites são feitas de lianas e cipós dágua e cujas abóbadas são verdes, marrons ou acinzentadas em função dos caules das árvores ou dos braços das gigantescas ou pequenas explosões vegetais que ali existem.

    Reparo, sim, depois de ouvir um companheiro de pele branca, um jovem louro que veio lá dos minuanos e das coxilhas para, de repente, se amorenar, sentir os olhos oblíquos, empunhar um remo em águas de todas as cores, negras, verdes, brancas, daquelas áreas e clamar aqui, aos brasileiros, aos seus patrícios do Sul que não esqueçam que lá, na distância, estão trabalhadores esperando assistência e verba para realizarem a muralha agrícola que se faz necessária para o progresso do Brasil naquelas regiões.

    Sr. Presidente, querido amigo, patriota e grande brasileiro, que preside esta Casa, faço meus e da Bancada do Amazonas os apelos formulados pelo Senador Amir Lando, lá do âmago da selva, do coração da grande floresta, da grande teia, dos grandes rios, onde o calor baixa como se fosse uma tentativa demoníaca para remover os moradores dali, que não cedem, persistem, continuam lutando em todas as áreas, nas mais diversificadas camadas de trabalho na sociedade, impedindo que aquela terra seja olvidada, e apontando o rumo de um futuro enriquecido de minérios, de produção industrial e até de produção bélica - sempre friso isso - imprescindível à defesa daquela área e do Brasil, apontando as armas, recusando-se a "entregar os pontos" e não aceitando a imposição da própria natureza castigadora, que requeima os amazônidas, mas que nem por isso os impede de continuar reagindo, por meio dos seus rios, da sua abnegação, do seu sorriso largo, da sua coragem, do seu bom humor e da certeza de que ali é que eles têm de colocar as suas raízes para que cresçam tanto quanto uma cajazeira, tanto quanto uma castanheira, tanto quanto os gigantes da selva e as lianas que se enleiam entre os caules nodosos da região.

    Viva, Senador Amir Lando! Muito bem! Palmas! Congratulações ! Viva, Sr. Presidente do Banco do Brasil! Atenção para isso, Sr. Presidente do Banco do Brasil! Atenção, Ricupero, que agora vieste de lá e aprendeste a amar a Região Amazônica com aquele amor com que nós e os brasileiros que para lá foram e não voltaram mais aprenderam a amar aquela terra e aquela gente, respeitando, sobretudo, aqueles moradores. Evoé, Ricupero! Vai agora, empolga o cetro do Ministério da Fazenda e não te esqueças de que, nas solidões, nos descampados, na floresta úmida, nas extensões imensas dos rios, carentes de embarcações para o transporte daquela gente, há uma grande exclamação brasileira, pedindo ajuda, pedindo apoio, pedindo solidariedade.

    Fomenta aquela agricultura, Beni Veras, que falaste com tanto brilhantismo no dia da tua despedida do Senado, surpreendendo a mim, que não conhecia a profundeza e a largueza dos teus conhecimentos! Insiste, Beni Veras, para recompor aquelas estradas, que Ricupero estava - e estará - interessado em restaurar, fazendo-nos alcançar a região do Caribe, fazendo-nos atravessar a grande Amazônia para que seja realmente um pólo e, ao mesmo tempo, uma plataforma de desenvolvimento brasileiro, de desenvolvimento mundial gerido por brasileiros!

    A Amazônia é mundo, a Amazônia é universalidade, mas o comando da Amazônia é Brasil, porque foi conquistado a duras penas na luta dos portugueses, que levaram sobre os ombros os canhões do Forte do Príncipe da Beira e as lajes fantásticas daquelas fortalezas que ali existem, das fortalezas do Amapá, que formaram o círculo impedidor de que o espanhol, ou estrangeiro de qualquer ordem, holandês ou francês, violasse o âmago daquela imensa laranja, que é a Amazônia.

    Hoje em dia, ele é repetido e imitado de maneira mais sutil pelo glorioso Exército brasileiro, mediante os acantonamentos, as operações Calha Norte, as operações que instalam povoados militares em toda a periferia amazônica, centralizadas pela 8ª Região na Capital amazonense, onde estão os batalhões da selva, onde está uma parcela da Marinha e uma grande facção da Aeronáutica, prontas e prestes a se mobilizarem para defender aquela área e aquela terra.

    Perguntei ao Sr. Ministro do Exército, quando S. Exª aqui esteve, se iria ampliar o orçamento para a manutenção da Amazônia no ano seguinte, que é justamente este ano de 1994. O Sr. Ministro, meio encabulado, não teve outro jeito senão confirmar aquelas palavras que proferi e responder àquela pergunta que lhe fiz dizendo que sim, que a Amazônia seria mais bem suprida, não somente de verbas, mas também de armamentos e de condições de defesa para a sua grande área.

    Então, parabéns a esses homens! Salve essas figuras! Salve esses brasileiros, porque são representantes do resto do Brasil, do Brasil que "dorme em berço esplêndido", do Brasil que não conhece os segredos da grande caverna verde, mas que, desde o momento em que manda seus filhos para lá, como o Senador Amir Lando e outros companheiros, por meio das grandes abóbadas vegetais, acaba compreendendo que aquela região é o tesouro das mil e uma noites, que está guardado para ser dado de presente a este País, predestinado pelos deuses e pelas vibrações do mundo a ser a "pátria expressional", a ser o país expressivo da coletividade mundial, já que a miscigenação, a mistura de todos os povos e de todos as raças é a nossa peculiaridade, é o maior orgulho que temos, porque não somos arianos, não somos africanos, não somos orientais; somos um pouco de todas essas proveniências. E aqui estão louros. morenos...

    O Sr. Amir Lando - O nobre orador permite-me um aparte?

    O SR. AUREO MELLO - Com muita honra, Senador.

    O Sr. Amir Lando - Nobre Senador Aureo Mello, V. Exª foi sumamente generoso para comigo ao tecer comentários elogiosos a que não faço jus, pois não tenho nenhum mérito para recebê-los.

    O SR. AUREO MELLO - Não apoiado!

    O Sr. Amir Lando - Mas, de qualquer sorte, V. Exª introduziu-me no aprendizado da Amazônia, ajudou-me a dar os primeiros passos. V. Exª foi o homem mais experiente - colega de trabalho no então Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - de quem recebi as primeiras aulas. Esse foi um longo aprendizado, que recolhi, aos poucos, na sabedoria dos costumes, que recolhi nos remansos das águas paradas, que constituem a memória dos mais velhos, dos seringueiros, que foram para lá como objetos atirados nos confins da floresta, para salvar a Nação durante a Segunda Guerra Mundial; que aprendi com os seringalistas que também iniciaram, através de seus antecessores, uma ocupação do princípio do século. E, recolhendo esses fragmentos de uma memória que se perde com espantosa facilidade, como dizia Rui Barbosa, a Amazônia é uma terra sem memória, porque tudo ali cresce e morre numa rapidez espantosa. Ninguém mais do que Euclides da Cunha, quando lá esteve, em 1904, teve oportunidade de descrever a Amazônia com tintas às vezes escuras da verdade, mas sempre com tintas clarividentes de quem via, naquela imensidão, uma área enorme para o Brasil crescer. De tudo isso, eu queria dizer a V. Exª que aprendi a amar aquela terra, ouvindo o homem simples que tem uma visão cósmica diferente, fora do comércio, que tem uma relação imensa com a vida intensamente que se adquire, a cada dia, sem a idéia de projeto, porque a vontade é ato iminente e o desejo é exercício. Esta é a visão do homem da Amazônia, que, isolado numa relação com a natureza, também debruça seus valores na mesma ordem natural. É exatamente tudo isto que me fez acreditar na região, amar a sua gente e aquela terra e, sobretudo, respeitá-la, pois é em si uma entidade própria, exótica e desconhecida que viveu sempre no desprezo e no abandono. Esta mudez dos séculos que V. Exª traduz em voz e em idéias faz com que eu procure imitá-lo, sendo esta voz do silêncio dos séculos até o gênese. Muito obrigado.

    O SR. AUREO MELLO - Muito obrigado, Sr. Senador Amir Lando. V. Exª realmente é um protótipo dos nossos conterrâneos. Por seu temperamento, às vezes imprevisível, V. Exª. adquiriu as características e as peculiaridades dos homens-salamandras, dos homens-botos, dos homens-sucurijus que vivem naquelas áreas, pois demonstrando a coragem de ir até lá revelou a sua grandeza pessoal. V. Exª e os milhares e milhões de patrícios brasileiros que tiveram a coragem de transpor os umbrais daquele pórtico incendiado e molhado e que, depois de entrarem nesse terreno mirífico, nessa região encantada, saem dela para logo voltar, porque ali é que eles ouvem os cantos das uiaras; é ali que eles sentem o ritmo das embarcações à noite, dos motores que passam, fazendo um telégrafo singular de mistério e de coragem; é ali que eles soltam o pensamento e sonham um dia ver aquela terra transformada num reduto altamente povoado e freqüentado. E ri o morador, antecipando a surpresa do corajoso que foi até lá e de repente se depara com as praias de Maués, as plantações de guaraná, a produção de pimenta-do-reino, os segredos da selva, as confissões das águas verdes, com o sorriso das praias.

    Acabo de apresentar - e foi aprovado por unanimidade nesta Casa e vem sendo aprovado, também, em todas as comissões técnicas da Câmara - uma proposição que torna o Arquipélago das Anavilhanas um parque nacional para ser colonizado, cultivado e visitado por todo o mundo.

    O Parque Nacional das Anavilhanas fica a apenas 25 minutos de Manaus. É formado por um entrelaçar de ilhas, circundadas de praias, cobertas de florestas. Segundo o depoimento de distinta senhora, esposa de colega nosso, que viajou pelo mundo inteiro, é o lugar mais lindo que ela já visitou, em toda a sua vida, na sua terra e em toda a parte.

    Sr. Presidente, eu pretendia falar nesta Casa, e o estou fazendo agora, pedindo até a atenção dos distintos jornalistas que fazem o programa A Voz do Brasil, para um assunto extremamente singular. Entusiasmado pelo que o Senador Amir Lando representa, eu entrei a falar de Amazônia. Mas quem quiser saber mais sobre a Amazônia, que nos procure, porque estamos aqui prontos para dizer.

    Eu ia falar, Sr. Presidente, da iniciativa da revista Caras, uma das melhores em circulação no Brasil, dirigida pelo Professor Dionísio Silva, da Universidade Federal de São Carlos, e jornalista profissional. Esta revista dedicou uma página inteira à poesia.

    Poesia é essa arte hoje em dia considerada démodé, ou decadente, que os grandes jornais não divulgam mais; é esse compartimento da cultura. E parece que há até um Ministério da Cultura, neste País, que não tem verbas, que não é assistido, que é abandonado, que é relegado assim como se fosse - vamos dizer - um cogumelo que nasceu no caule de uma árvore.

    No entanto, Sr. Presidente, esta arte, a poesia, é idêntica à música que aglutina multidões nos estádios e nas casas de arte. É idêntica à pintura, que tem ainda os seus museus e suas casas de exposição. Ela é uma arte que não se divulga e que se procura matar. Mas ela é a palavra sonora que os aedos da antiga Grécia diziam para deleite dos ouvidos daqueles que os escutavam, e que nos tempos em que não havia televisão nem rádio era a arte mais procurada nas avenidas, nas casas de chás, nos salões das grandes famílias.

    Aí, vamos nos lembrar das histórias de José de Alencar; vamos nos lembrar das histórias de Machado de Assis; vamos recordar Olavo Braz Martins dos Guimarães Bilac - cujo nome era um alexandrino perfeito; vamos recordar episódios de Paula Ney e de Emílio de Menezes; vamos recordar Moacir de Almeida, e caminhando soturno nas noites aziagas do Nordeste ou do Rio de Janeiro a figura sorumbática e tristonha de Augusto dos Anjos; vamos nos recordar ainda e agora, nos tempos mais modernos, comovendo o coração das moças, das normalistas e de todos aqueles que têm sensibilidade criadora, de José Guilherme de Araújo Jorge, fruto que o Acre mandou para o asfalto e que ali floresceu; vamos nos recordar de Jorge de Lima; vamos nos lembrar de Afonso Schmidt, na coleção das suas extraordinárias poesias.

    Vamos lembrar que esta arte, Sr. Presidente, nem o jornal O Globo, nem o Jornal do Brasil, nem a Folha de S. Paulo, nem O Estadão, nem a Revista Manchete, nem qualquer outro órgão de divulgação promovem mais. E, de repente, surge a Revista Caras, da qual, neste ensejo, quero me afigurar até um promotor. Surge essa Revista e divulga poesia, entregue ao saber e à discriminação do emérito Professor Dionísio Silva que, ao mesmo tempo, faz um dicionário de palavras atuais e originais, esclarecendo e plantando nos espíritos conhecimentos que, realmente, são necessários nos dias de hoje.

    Por isso, Sr. Presidente, esqueçamos por instantes o grande nariz-de-cera da Amazônia, porque tenho certeza de que este já está plantado no coração dos V. Exªs. Esqueçamos que a minha palavra, neste microfone, nesta tribuna, não foi para falar da Amazônia - a fala da Amazônia foi uma emoção arrancada pelo eminente Senador gaúcho Amir Lando -, mas para me congratular com a revista Caras.

    E, por favor, senhores da imprensa, dos grandes jornais, das grandes revistas, digam à revista Caras que aqui, dentro do Senado, existe um Senador que é cultor da poesia, como muitos outros o são, que está profundamente feliz e regozijado no momento em que essa revista divulga, cientificamente, nas suas páginas, a arte da poesia, para todo o Brasil.

    Portanto, Sr. Presidente, encerro estas palavras, na certeza de que elas servem de estímulo para uma iniciativa que, praza aos céus, seja tomada por todos os grandes jornais e revistas desta Nação e venha, sem dúvida nenhuma, a se incorporar ao progresso que o nosso Fernando Henrique Cardoso está pleiteando introduzir na terra brasileira.

    Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente. (Muito bem! Palmas.)

     


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 05/04/1994 - Página 1550