Discurso no Senado Federal

NECESSIDADE DE SE NORMALIZAR O FUNCIONAMENTO DO RADIO E DA TELEVISÃO.

Autor
Jutahy Magalhães (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/BA)
Nome completo: Jutahy Borges Magalhães
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
TELECOMUNICAÇÃO.:
  • NECESSIDADE DE SE NORMALIZAR O FUNCIONAMENTO DO RADIO E DA TELEVISÃO.
Publicação
Publicação no DCN2 de 07/04/1994 - Página 1621
Assunto
Outros > TELECOMUNICAÇÃO.
Indexação
  • INFORMAÇÃO, APRESENTAÇÃO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, AUTORIA, ORADOR, ESTABELECIMENTO, DIRETRIZ, DISCIPLINAMENTO, PRODUÇÃO, PROGRAMAÇÃO, RADIO, TELEVISÃO, PAIS, OBJETIVO, PRESERVAÇÃO, VALOR, ETICA, SOCIEDADE.

    O SR. JUTAHY MAGALHÃES (PSDB-BA. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Sras e Srs. Senadores, tenho a grata satisfação de anunciar a este Plenário que estou apresentando propostas de emenda constitucional dando nova redação aos arts. 220 e 221 da nossa Lei Maior, estabelecendo diretrizes disciplinadoras da produção e programação de rádio e televisão em nosso País, com a preocupação de preservar valores éticos de proteção à comunidade, bem como a função social que deve ser inerente às atividades desses importantes veículos de comunicação social.

    Já manifestei minhas preocupações com a excessiva liberalidade de nossa legislação em relação à concessão e uso dos canais de rádio e televisão. Tive a preocupação de mostrar como a realidade é diferente em um país do Primeiro Mundo, como os Estados Unidos, onde um código extremamente rigoroso não apenas zela pela preservação dos valores mais caros à Nação americana, como impede que lá possa surgir um monopólio nesse ramo de vital importância da comunicação social.

    Com a nova redação que proponho ao art. 221, a produção e a programação das emissoras de rádio e televisão atenderão às seguintes diretrizes, sob pena das sanções administrativas pertinentes:

    I - consecução de objetivos educativos e informativos, com destinação de parte da programação, conforme estabelecido em lei, a matéria estritamente educacional, para as diferentes faixas etárias;

    II - promoção de cultura nacional e regional e estímulo à produção independente que objetive sua divulgação, com reserva de percentual estabelecido em lei;

    III - regionalização da produção cultural, artística e jornalística, conforme percentuais estabelecidos em lei;

    IV - vedação de transmissões que, direta ou indiretamente, estimulem a violência, a prática de atos atentatórios a valores éticos e sociais da pessoa e da família e a outros interesses juridicamente protegidos;

    V - Manutenção de assessoramento especializado nas áreas pedagógica e psicológica e especialmente quanto à influência dos programas e da programação sobre as crianças e os adolescentes.

      Como acentuei na justificativa das minhas Propostas de Emenda Constitucional, Sr. Presidente, Srs. Senadores, os dispositivos exprimem a nova ordenação conferida às atividades de comunicação social, consoante valores éticos e irrecusáveis princípios de proteção à comunidade. Ao § 3º e seguintes do art. 220 dei nova redação, estabelecendo que os meios de comunicação exercem função social, constituindo serviço público a radiodifusão sonora ou por sons e imagens. Também deixei claro no texto da Lei Maior que "a informação jornalística, a opinião e a crítica através dos meios de comunicação atenderão aos seguintes preceitos:

    I - a informação será objetiva e veraz, e distinta da opinião e da crítica;

    II - assegurar-se-á ao envolvido, direta ou indiretamente, pelo noticiário, pela opinião e pela crítica, o exercício em idênticas condições do direito de defesa, incluindo a retificação dos fatos que lhe digam respeito e a respectiva apreciação;

    III - não se omitirão, intencionalmente, informações relevantes para a comunidade;"

    O parágrafo 5º do mesmo art. estabelece : "Compete à lei federal regular as diversões e espetáculos públicos, os programas e programações de rádio e televisão, e respectiva publicidade, observado o seguinte:

    I - a distinção entre os eventos que tenham lugar em ambientes circunscritos, e aqueles que se veiculem pelos meios de radiodifusão sonora e de imagens ou em lugares abertos ao público;

    II - o Poder Público informará quanto à natureza das diversões e espetáculos públicos, as faixas etárias a que não serão acessíveis, e os locais e horários em que sua apresentação não seja lícita;

    III - a proibição de propaganda, comercial ou não, direta ou indireta, de produtos, práticas, serviços e comportamentos que possam ser nocivos à saúde e ao meio ambiente, inclusive, e especialmente, de tabaco, bebidas alcoólicas, agrotóxicos, medicamentos e terapias;

    IV - a legitimidade do Ministério Público da União e das associações de caráter nacional, constituídas há mais de um ano, que tenham como finalidade institucional a defesa de direitos difusos para o ajuizamento de ação sumária interdital, com o cabimento de liminar, e que terá o procedimento do mandado de segurança, para impedir a realização, a transmissão, ou a divulgação de espetáculo ou veiculação publicitária que contrarie as disposições deste Capítulo e da legislação pertinente, sem prejuízo da responsabilização civil, penal e administrativa dos infratores.

    § 6º Na efetivação da responsabilização civil e administrativa a que se refere o inciso IV do parágrafo anterior, caberão, respectivamente, a ação civil pública, e o exercício do direito de representação.

    § 7º As medidas judiciais poderão ser ajuizadas na circunscrição judiciária federal do local onde se dá a diversão ou o espetáculo público, ou de qualquer local alcançado pela transmissão.

    § 8º Os meios de comunicação social não podem, direta ou indiretamente, ser objeto de monopólio ou oligopólio;

    § 9º A publicação de veículo impresso de comunicação independe de licença de autoridade."

    Na justificação das propostas de emenda constitucional, enfatizei o notório relevo que os meios de comunicação de massa ostentam na sociedade contemporânea. Acentuei ali a necessidade de se preservar a liberdade de atuação, afastando a possibilidade de qualquer espécie de censura, sem deixar de assinalar a função eminentemente social desses poderosos veículos de comunicação.

    Parece haver consenso no Brasil de que se impõe a defesa da comunidade contra a prática de desvios e abusos por esses meios de comunicação, aproveitando-se das omissões e brechas de uma legislação que já se mostra claramente anacrônica. Minha preocupação é a de oferecer, através de normas de plena eficácia, os meios efetivos de impedimento da prática desses desvios e abusos, estabelecendo, ainda, medidas efetivas para a responsabilização e punição dos infratores.

    Tivemos a preocupação, Sr. Presidente, Srs. Senadores, de fixar nitidamente a diferença que existe, e nem sempre é acentuada, entre a publicação escrita - o livro, a imprensa - de um lado e, de outro, o rádio e a televisão, pelo notório caráter de serviço público desses últimos, e pela sua capacidade de penetração incontrolável nos lares, assim como sua influência sobre a mente de crianças, adolescentes e adultos.

    Distinguiu-se, ainda, a informação, a opinião, a crítica, o lazer, a educação, a cultura, procurando proteger direitos e interesses individuais, coletivos e comuns, levando em conta as necessidades de preservação dos valores éticos e morais mais caros ao nosso povo e aos interesses do próprio caráter nacional.

    Não, há dúvida entre educadores, cientistas políticos e sociais, homens públicos, publicistas e na opinião pública de um modo geral, de que é deficiente e omissa a nossa legislação sobre rádio e televisão, cujas atividades se mostra incapaz de disciplinar de acordo com os superiores interesses do bem comum. Estações de rádio e televisão, no Brasil, com as exceções de praxe, funcionam como meros balcões de negócios, sem qualquer tipo de preocupação social.

    As falhas e graves irregularidades começam pelas próprias concessões desses canais de rádio e televisão. Em passado recente, quando ocupou o Ministério das Comunicações certo político conhecido pelo estilo arbitrário, houve um verdadeiro festival de favores para concessões de canais de rádio e televisão, sem qualquer preocupação em atender ao interesse coletivo. O nosso Código de Telecomunicações, que já tem mais de vinte anos, reclama uma atualização em regra para que se preservem os interesses da Nação e de seu povo.

    Além desse estado anárquico da legislação, temos um mercado televisivo notoriamente dominado por uma rede nacional que assumiu praticamente o caráter de verdadeiro monopólio. Como já adverti em discurso anteriormente pronunciado desta mesma tribuna, em fevereiro de 1992, é impossível surgir em um país civilizado, como os Estados Unidos, uma organização tentacular como a que temos, hoje, no Brasil, em matéria de rede nacional de televisão.

    Nos Estados Unidos, uma mesma pessoa ou afiliada não pode possuir, controlar ou operar, direta ou indiretamente, estações de rádio ou TV se possuir ou controlar um jornal diário publicado na mesma localidade. A legislação norte-americana proíbe que pessoa ou grupo controle, direta ou indiretamente, mais de 14 estações de um mesmo serviço - rádio ou televisão - ou mais do que 12 estações de um mesmo serviço que não sejam controladas por minorias (negros, índios, hispânicos, etc.).

    A legislação norte-americana preocupa-se claramente em evitar a existência de uma rede com total controle da audiência nacional. Assim é que proíbe que um grupo tenha controle sobre estações de rádio e televisão que somem uma audiência nacional de mais de 25%, a menos que sejam controladas por aquelas minorias.

    O Congresso dos Estados Unidos, Sr. Presidente, Srs. Senadores, delegou poderes à Federal Communication Comission para exercer fiscalização e controle sobre todo o complexo universo das telecomunicações. Esse órgão federal, que é composto por cinco membros com mandato de cinco anos (não pode haver mais de três filiados a partido político), indicados pelo Presidente da República e aprovados pelo Senado, tem a permanente preocupação em evitar que determinada organização assuma a dimensão gigantesca da rede de televisão que temos atualmente no Brasil e cujos poderes transcendem o mercado da televisão para ganhar notório poder político.

    Entendo, Sr. Presidente, Srs. Senadores, que uma concessionária ou permissionária de rádio e televisão não tem o direito de fazer uso estritamente comercial da concessão de serviço público com que foi privilegiada, sem levar em conta as necessidades culturais, informativas e educacionais da população por ela atingida. A rigor, uma concessionária ou permissionária recebe um empréstimo do povo com o compromisso tácito de servi-lo. Esta é a razão porque se chama concessão de serviço público.

    Oxalá tenhamos a sensibilidade e o espírito público indispensáveis para aproveitarmos a Revisão Constitucional a fim de inscrever na Lei Maior normas e princípios que devem nortear esse setor tão delicado da comunicação de massa. A reformulação e modernização do nosso anacrônico Código Nacional de Telecomunicações constituem um imperativo do próprio desenvolvimento nacional.

    Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente, Srs. Senadores. Obrigado.

    O SR. PRESIDENTE (Carlos Patrocínio) - Concedo a palavra ao nobre Senador Nelson Wedekin.

    O SR. NELSON WEDEKIN (PDT - SC. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Sras e Srs. Senadores, a Saúde no Brasil está doente!

    Isto já vem sendo dito e repetido há tanto tempo, que ousamos perguntar-nos, agora, por quanto tempo ainda seremos obrigados a ouvir essa triste verdade.

    A Saúde no Brasil está doente, e não parece haver, por parte do atual governo, a intenção de devolver-lhe a higidez.

    Pelo que se deduz das mais recentes medidas que estão sendo impostas à Nação pelo atual Governo, ainda teremos muito de que nos queixar no futuro, pois o quadro orçamentário que se está desenhando, juntamente com a irregularidade do fluxo financeiro, prometem aumentar ainda mais a deterioração das já insatisfatórias condições de Saúde do povo brasileiro.

    O Sistema Único de Saúde, que nos acenava com a possibilidade de solução para o problema e que se esperava, mais que isto, nos resgatasse a esperança em dias melhores, está pedindo socorro pela voz dos Secretários Municipais de Saúde que, reunidos em Blumenau, nos alertam a todos contra os riscos que corremos na medida em que atingimos o Direito de Cidadania que sustém e alimenta a própria Democracia. Sim, pois a Saúde deixou de ser um favor ou mera obrigação dos governos e passou a ser, na Constituição de 1988, um direito do cidadão.

    Um direito cujo exercício, se não é peremptoriamente negado, parece estar sendo enormemente dificultado pela deliberada intenção de cortar, ainda mais, os recursos destinados ao atendimento médico-sanitário da população, invertendo-se uma prioridade que deveria ser dada ao resgate da dívida social.

    Uma inversão de prioridades que repõe essa imensa dívida social do Estado Brasileiro no mesmo derradeiro lugar em que a colocaram sempre os governos da utopia desenvolvimentista, o mesmo descaso para com a saúde do cidadão que nunca nos acostumamos a ver e sofrer nos governos mais elitistas, a mesma indiferença frígida que aprendemos a detestar nos governos mais tecnicistas dentre todos os governos desenvolvimentistas, elitistas e tecnicistas que já tivemos.

    Uma decisão de corte que atinge fundo a nossa espinha dorsal, pois a Saúde, mais que uma dada situação ou estado, é uma condição indispensável para o crescimento, para o desenvolvimento, para a melhoria qualitativa. Sem Saúde nenhum grupo humano progride, sem Saúde nenhuma nação prospera.

    Os argumentos em defesa de tal aberração costumam se valer dos limites de recursos disponíveis sem se aventurarem porém a enfrentar o absurdo de um verdadeiro festival de impostos , pagos por uma reduzida faixa da população. Dizemos isso para lembrar mais uma vez que não será jamais reduzindo os recursos destinados á área de Saúde que o Governo conseguirá equilibrar as suas contas. As contas somente serão equilibradas quando for possível cobrar um menor número de impostos de uma base maior de contribuintes.

    O quadro que se esboça a partir da análise dos cortes orçamentários nas verbas da Saúde é, no mínimo, calamitoso.

    E acredito não exagerar, como não parece estar exagerando o próprio Ministro da Saúde desse mesmo Governo, ao divulgar dados onde, tomando-se por base o péssimo atendimento oferecido ao povo brasileiro em 1993, teríamos para 1994, por exemplo: sete milhões de internações a menos, duzentos e vinte e cinco milhões de atendimentos ambulatoriais a menos, menos um terço das vacinas destinadas à imunização de nossas crianças, além de dois milhões de litros de leite a menos na já precária dieta alimentar das nossas populações carentes.

    Se a mídia nacional pensa que esgotou a sua capacidade de nos chocar com as cenas deprimentes e desumanas das filas e dos corredores da enorme maioria dos nosso hospitais públicos, corre agora o risco de se ver chocada com banalização deste tipo de agressão à dignidade da pessoa humana. A excessiva exposição pode provocar uma saturação capaz de gerar uma insensibilidade, aliás, muito conveniente a quem não quer jamais ver resolvidos tais problemas.

    Mas, enquanto a receita do Tesouro Nacional aumenta, como divulgam orgulhosamente as agências oficiais, diminue o montante destinado à defesa da Saúde do povo, deixando na cabeça do cidadão comum a suspeita de que este aumento de arrecadação parece estar destinado a fins mais distantes das necessidades do cidadão, como, por exemplo, o pagamento dos infindáveis juros da nossa eterna dívida externa junto à banca internacional. De fato, o incremento da receita em relação ao ano passado, foi de dois e meio milhões de dólares, somente nos dois primeiros meses de 1994, justamente às vésperas de um acordo da dívida elogiado e rapidamente aceito pelos banqueiros internacionais.

    Enquanto isto, o Ministério da Saúde teve o seu orçamento reduzido em mais de cinco milhões de dólares para o ano de 1994, o que é um contra-senso, um despropósito, ou, para insistir na mesma imagem, uma verdadeira calamidade pública.

    Uma calamidade que não poderá ser imputada aos municípios brasileiros, pois a municipalização dos serviços de Saúde preconizada pela Constituição de 1988 caminha a passos de cágado. Os municípios brasileiros não podem ser responsabilizados por estes desmandos.

    Neste sentido têm razão os Secretários de Saúde da Região Sul na já citada Carta de Blumenau de janeiro deste ano, quando afirmam que o inimigo da Saúde é o Poder Público, pois preferiu abdicar do seu papel de curador do bem estar do povo para se transformar no vilão da luta contra a doença neste país de doentes. Este País que parece ter se transformado em um legítimo campeão do chamado processo de reurbanização de doenças do terceiro mundo, com o a Dengue, a Cólera, a Febre Aftosa a Febre Amarela, a Filariose e a Doença de Chagas.

    O Poder Público pode até não ser o verdadeiro inimigo da saúde do povo brasileiro, mas vai ter muito o que explicar para tentar justificar a redução para a metade, dos recursos destinados ao financiamento do Sistema de Saúde, de 1988 até hoje. Ironicamente, o mesmo ano em que foi promulgada a Constituição que incluiu o direito à Saúde como um integrante dos Direitos da Cidadania.

    Um grande avanço, uma medida pioneira em termos mundiais, reconhecida pelos legisladores do mundo inteiro, e que não merecia, por isto mesmo, o escárnio de ver a prática contábil e orçamentária em vigor no País, reduzi-Ia a praticamente nada.

    É preciso fazer-se cumprir o que determina a Constituição Federal em vigor e fazer da Saúde um direito de todos e não o privilégio de alguns.

    É preciso apressar o passo da municipalização dos serviços de saúde, para que possamos concluir uma reorganização cujo custo já está por demais oneroso par a o cidadão que se sente excluído e subtraído na sua capacidade de, simplesmente, viver.

    É fundamental que se invista no futuro do País, pois não há futuro para um Pais de doentes, não há esperança para um sociedade de enfermos.

    Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 07/04/1994 - Página 1621