Discurso no Senado Federal

PREPOTENCIA DO GOVERNADOR ANTONIO CARLOS MAGALHÃES NO TOCANTE A LIBERAÇÃO DE PRESOS NA BAHIA, EM FLAGRANTE DESRESPEITO A LEI. TRANSCRIÇÃO DE ARTIGOS JORNALISTICOS SOBRE A MATERIA E DE REQUERIMENTO AO PROCURADOR-GERAL DA REPUBLICA, E RESPECTIVA RESPOSTA A IMPLICAÇÃO DAQUELE ATO DO GOVERNO ESTADUAL.

Autor
Jutahy Magalhães (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/BA)
Nome completo: Jutahy Borges Magalhães
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ESTADO DA BAHIA (BA), GOVERNO ESTADUAL.:
  • PREPOTENCIA DO GOVERNADOR ANTONIO CARLOS MAGALHÃES NO TOCANTE A LIBERAÇÃO DE PRESOS NA BAHIA, EM FLAGRANTE DESRESPEITO A LEI. TRANSCRIÇÃO DE ARTIGOS JORNALISTICOS SOBRE A MATERIA E DE REQUERIMENTO AO PROCURADOR-GERAL DA REPUBLICA, E RESPECTIVA RESPOSTA A IMPLICAÇÃO DAQUELE ATO DO GOVERNO ESTADUAL.
Aparteantes
Eduardo Suplicy, Josaphat Marinho, Odacir Soares.
Publicação
Publicação no DCN2 de 12/04/1994 - Página 1706
Assunto
Outros > ESTADO DA BAHIA (BA), GOVERNO ESTADUAL.
Indexação
  • CRITICA, ATO ARBITRARIO, ANTONIO CARLOS MAGALHÃES, GOVERNADOR, ESTADO DA BAHIA (BA), LIBERAÇÃO, PRESO, PROTESTO, IMPUNIDADE, PAIS, AUSENCIA, RESPEITO, JUDICIARIO.
  • TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, ARTIGO DE IMPRENSA, AUTORIA, MARCELO BERABA, CLOVIS ROSSI, JORNALISTA, PUBLICAÇÃO, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), JANIO LOBO, ESTADO DA BAHIA (BA), DENUNCIA, ATO ARBITRARIO, ANTONIO CARLOS MAGALHÃES, GOVERNADOR, LIBERAÇÃO, PRESO.

    O SR. JUTAHY MAGALHÃES (PSDB - BA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, há alguns dias citei, neste plenário, um fato ocorrido na Bahia, ao qual volto hoje a me referir - um gesto insano e irresponsável, que merece algumas considerações e reflexões por parte de todos nós, assim como uma atitude enérgica por parte do Poder Judiciário.

    A imprensa noticiou, a televisão divulgou e a população tomou conhecimento de que o Governador da Bahia, dois dias antes de deixar o cargo, determinou a liberação de 154 presos das delegacias de Salvador e vários outros municípios. Em seguida, prestou declarações sobre os motivos desse feito, como sendo um protesto contra a Justiça, que, segundo ele, não pune criminosos ricos, citando como exemplo o ex-Governador Nilo Coelho, seu adversário político.

    Sr. Presidente, até demagogia tem limites! Fica evidente o desrespeito à Justiça, o abuso de poder, a arbitrariedade com que age e sempre agiu o ex-Governador da Bahia. Mais uma vez, com finalidades, evidentemente, eleitoreiras e maquiavelicamente calculadas, ele simplesmente se deu o direito de aviltar a Justiça, invadir a competência do Poder Executivo e do Poder Judiciário, quebrando a harmonia entre os três Poderes, além de violar a Constituição Federal e infringir as leis vigentes, obstruindo a ação punitiva e educativa, prevista na Legislação Penal brasileira.

    Sr. Presidente, aqui é preciso fazer um parênteses. Digo que o Sr. Antônio Carlos Magalhães é mestre em ir contra o que diz a Constituição Federal e cito aqui o § 1º do art. 37 da Constituição, que diz:

   "A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos.

      Apesar dessa previsão constitucional..."

    Sr. Presidente, além de ter tomado algumas providências, vou pedir a transcrição nos Anais da Casa de um artigo do Sr. Marcelo Beraba, publicado na Folha de S. Paulo, edição de 14 de março último. Em um dos trechos, diz o articulista:

   "Estive em Salvador nos últimos dez dias de janeiro e pude comprovar que o Governador Antônio Carlos Magalhães não brinca em serviço. Ele tinha acabado de inaugurar uma avenida em Ilhéus e preparou uma peça de promoção política tão explícita que a única pergunta possível de ser feita após assisti-Ia era a seguinte: o que estão fazendo o Tribunal Regional Eleitoral da Bahia e o Tribunal de Contas do Estado? Não há qualquer preocupação em dissimular o caráter promocional da peça."

    Tomando por base essa peça e outras divulgadas na Bahia, encaminhei dois ofícios ao Procurador-Geral da República, Dr. Aristides Junqueira, e dele recebi uma resposta. Entretanto, até o momento, nenhuma ação foi feita para evitar esse abuso, mas espero ainda, e, ao contrário do Governador, não vou invadir nenhum escritório da Procuradoria-Geral para fazer com que a lei seja cumprida mais rapidamente. Tenho confiança na Justiça e espero que se respeite a Constituição também no meu Estado.

    Vou encaminhar também à Mesa, para a Casa tomar conhecimento, os ofícios e as respostas que recebi, como vou pedir também a transcrição de um artigo do Sr. Jânio Lopo, da Bahia, e outro artigo do Sr. Clóvis Rossi, intitulado "Escorpião da Bahia".

    Continuo, Sr. Presidente.

    Eis uma afronta à Justiça brasileira, cujas graves conseqüências políticas e sociais não podemos ignorar. Como conter tamanha arbitrariedade? Seja o Governador da Bahia, de Minas, de São Paulo, ou de qualquer outro Estado, em democracia alguma jamais se viu tamanha prepotência. Que tipo de regime é esse em que um déspota se acha no direito de fazer o que bem entende sem sofrer qualquer tipo de restrição aos sucessivos atos abusivos que comete impunemente? Seja o Antônio, seja o Carlos, seja o José, seja qualquer outro que esteja exercendo o poder, a ninguém é dado o direito de colocar em risco a segurança coletiva, simplesmente para satisfazer a caprichos, vaidades e vinganças pessoais.

    Sr. Presidente, Srs. Senadores, ao libertar indevidamente esses presos, o ex-Governador usurpou a competência privativa do Presidente da República de conceder indultos e comutar penas, violando a Constituição Federal em seu art. 84, inciso XII. Trata-se, portanto, de um crime de responsabilidade. Astutamente, porém, o Sr. Antônio Carlos Magalhães decidiu aplicar esse golpe de extrema "generosidade" para com os pobres presos dois dias antes de deixar o cargo, ou seja, agiu calculadamente para não ser condenado à perda de suas funções.

    Nos governos democráticos, não existe governante irresponsável. Nesse sentido, é sempre bom lembrar Paulo Brossard, em seu livro O Impeachment, quando afirma que "só a eleição, ainda que isenta, periódica e lisamente apurada, não esgota a realidade democrática, pois, além de mediata ou imediatamente resultante de sufrágio popular, as autoridades designadas para exercitar o governo devem responder pelo uso que dele fizerem, uma vez que governo irresponsável, embora originário de eleição popular, pode ser tudo, menos governo democrático".

    A História nos mostra que a maior parte dos que subverteram a liberdade dos povos começaram sua carreira como demagogos e terminaram tiranos. Kant já afirmava que um governo fundado na benevolência para com o povo, um governo paternalista, é o pior despotismo que se pode imaginar. Ao concentrar o sumo poder nas mãos de um único homem, torna os súditos incapazes, verdadeiros escravos. Nesses regimes, os dispositivos legais costumam ser estabelecidos segundo as necessidades e as carências, das quais apenas o governante é o intérprete autorizado, sem qualquer fundamentação jurídica ou ética, mas exclusivamente feitos com base na força do poder.

    Sr. Presidente, nenhuma teoria ou doutrina seria capaz de provar que o governo, o poder, pertence exclusivamente a um determinado indivíduo ou classe, com exclusão de todos os outros membros da sociedade. Semelhante idéia pode ser e foi a pretensão ou a crença de algumas dinastias de fanáticos, que se julgaram diretamente escolhidos por Deus para governar os homens. Na presente organização social, em que a liberdade dos indivíduos economicamente mais fortes acarreta a opressão dos menos favorecidos, há que se criar um regime preliminar de limite aos que se favorecem com a extensão abusiva da própria liberdade.

    Por serem necessárias às sociedades, autoridade e liberdade não podem ser ilimitadas, pois uma condiciona e completa a outra. Mesmo porque não existe Direito fora das leis, assim como a liberdade pode ser exercida nos limites do Direito. Pelo simples fato de viverem em comum, os homens têm de obedecer a normas legais, defendidas e aplicadas por um poder permanente, o Poder Judiciário, que não se confunde com os Poderes Executivo ou Legislativo.

    Tocqueville advertiu para uma nova espécie de opressão que ameaça os povos democráticos: - "Uma inumerável multidão de homens símiles e iguais, que nada mais fazem que rodar sobre si mesmos, para procurarem pequenos e vulgares prazeres com que saciar a sua alma". São indivíduos entregues aos próprios instintos, subtraídos a qualquer autoridade, que exorbitam de suas funções e não podem jamais perseverar na ordem, pois constantemente se atiram uns contra os outros.

    Sob o ponto de vista da ação jurídica, os atos cometidos pelo Sr. Antônio Carlos Magalhães se enquadram no Código Penal, art. 319, por prevaricação, ou seja, "retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal".

    Se entre os libertados havia algum já respondendo a processo penal, detido por ordem judicial de prisão preventiva, o Sr. Antônio Carlos Magalhães cometeu, também, o crime de "promover ou facilitar a fuga de pessoa presa ou submetida a medida de segurança", previsto no art. 351 do Código Penal. Se a prisão for ilegal torna-ser ainda, civilmente, responsável por delitos que vierem a ser cometidos pelas pessoas libertadas, devendo prestar indenização às possíveis vítimas.

    Aqui, Sr. Presidente, abro outro parêntese. O jornal Tribuna da Bahia, do dia 3 de abril de 1994, publicou a seguinte notícia:

      "A "boa ação" do ex-Governador Antônio Carlos Magalhães, em protesto contra a impunidade dos criminosos de "colarinho branco" pode ter conseqüências danosas para a população. Uma delas já está sendo apontada pelo motorista da empresa Ogunjá. Embora sem apresentar provas, ele assegurou que um dos marginais envolvidos no assalto ao ônibus Viazul, Placa BJ-9205, é um dos presos libertados na quinta-feira por ACM. A informação foi confirmada por um policial do 5º BPM, deixando a diretoria do Sindicato dos Rodoviários estarrecida e preocupada. Este é o resultado da "boa ação" do Governador."

    Essa é a lei. Aos órgãos jurisdicionais cabe aplicá-la, inclusive contra o Governo e a Administração Pública. O ex-Governador exorbitou de seus poderes, desacreditou publicamente o Poder Judiciário e cometeu crime contra a administração da Justiça. Além de tudo isso, ainda comprometeu a segurança coletiva, colocando em risco a população baiana, ao determinar a liberdade de presos cujo grau de periculosidade nem ele próprio pode avaliar.

    O Sr. Antônio Carlos Magalhães protesta contra a morosidade da Justiça. Porém, quando estava ele próprio sendo processado, tudo fez para protelar a ação até que a mesma prescrevesse. E conseguiu êxito. Por outro lado, atribui-se a função de árbitro supremo, capaz de decidir o que é justo e o que é injusto, julgando, apenas pelas aparências, se uma pessoa que cometeu um delito deve ou não ser mantida na delegacia. Como não estamos diante de um deus nem de um sábio, só podemos concluir que o ex-Govenador usa de dois pesos e duas medidas, manipulando a lei, de acordo com seus interesses pessoais.

    Compete ao juiz processar e julgar. Compete ao delegado de polícia prender aquele que comete algum delito. Compete ao governante respeitar a ação da Justiça, promover a ordem e obedecer às leis. O juiz representa o Estado na instituição da pena, e, ao fixá-la, considera, além do fato criminoso, a personalidade do delinqüente, seus antecedentes, a intensidade do dolo ou o grau de culpa e os motivos determinantes. Investiga, tanto quanto possível, os elementos que possam contribuir para o exato conhecimento do caráter ou índole do réu, suas condições de vida, conduta e periculosidade. Logo, somente à Justiça caberia determinar a liberdade de cada preso.

    A punição é um freio contra o crime. Ao se propor fazer justiça com as próprias mãos, o ex-Governador da Bahia incitou seus governados a procederem da mesma forma, desacreditando a ação da Justiça. Por outro lado, induziu criminosos a cometerem novos crimes, pois a esperança de impunidade, muitas vezes, anima os delinqüentes.

    Sr. Presidente, há um outro aspecto desta questão que não poderia deixar de trazer à consideração deste Plenário. Refiro-me à desmoralização do Poder Judiciário. É bem verdade que fatos como este podem passar despercebidos por alguns e que outros podem fazer uma leitura diferente, de que o Sr. Antônio Carlos Magalhães teria, simplesmente, mais uma vez, utilizado o seu poder junto aos veículos de comunicação para manter-se constantemente em evidência, através da mídia.

    No entanto, Sr. Presidente, Srs. Senadores, bem sabemos aonde nos leva a difamação. Bem conhecemos os resultados de uma campanha sistemática de desmoralização pública e o quanto tem sido difícil o processo de apuração das instituições democráticas. Quantos de nós e quantas vezes temos sofrido injustiças e generalizações, ameaças e humilhações, em virtude de ataques sucessivos dirigidos ao Poder Legislativo. Definitivamente, não tem sido fácil a nossa batalha, até mesmo submetendo-nos a desgastantes processos de inquérito e condenação de Parlamentares, movidos pelo forte desejo do fortalecimento do Congresso Nacional.

    A desmoralização pública não acontece repentinamente. Ao contrário, resulta de pequenos fatos, como este que ocorreu agora na Bahia, tão pequeno que, aparentemente, cai no esquecimento. Aparentemente apenas, pois, na verdade, ficam gravados na memória do povo e vão-se acumulando como uma bola de neve. Quando nos damos conta, torna-se quase impossível desfazer um conceito plantado aos poucos nas mentes de cada um.

    Seria uma mera coincidência, Sr. Presidente, o fato de que na Bahia ocorrem tantos linchamentos? É o Estado onde mais linchamentos temos na história policial deste País. Será mera coincidência?

    Se o Poder Judiciário apresenta falhas em sua estrutura organizacional, se a administração da Justiça precisa ser reformulada, por não atender aos reclamos da sociedade, temos outros meios mais civilizados de buscar a correção dessas falhas, inclusive revendo a legislação penal. Não há de ser com atos demagógicos e irreverentes que vamos construir novas bases para o aperfeiçoamento das instituições brasileiras.

    É por isso, Sr. Presidente, que venho a este Plenário, hoje, alertar a todos, especialmente aos membros do Poder Judiciário, para que não deixem passar em branco essa injúria cometida pelo ex-Governador da Bahia. Que o Sr. Antônio Carlos Magalhães seja responsabilizado por todos os seus atos, respondendo na Justiça por todas as conseqüências de suas leviandades, até mesmo para que tamanha irreverência não sirva de exemplo ou de estímulo a outros delinqüentes. Que aprenda a respeitar a Lei, a Justiça e o Poder Judiciário, princípios basilares de qualquer regime democrático.

    O Sr. Eduardo Suplicy - Permite-me V. Exª um aparte?

    O SR. JUTAHY MAGALHÃES - Ouço V. Exª com prazer.

    O Sr. Eduardo Suplicy - Não conhecendo bem a Constituição do Estado da Bahia, pergunto a V. Exª se há ali alguma referência relativamente às competências, responsabilidades, obrigações e direitos do Governador do Estado. Primeiramente, eu perguntaria sobre qualquer lugar do Brasil; no entanto, ao examinar a Constituição da República Federativa do Brasil, não consegui encontrar qualquer item que pudesse definir, com clareza, que dentre as atribuições de Governador de Estado pudesse estar a do poder de liberar presos que estejam cumprindo alguma pena. O art. 21, inciso XVII, da Constituição Federal diz que "compete à União conceder anistia"; no entanto, nesse sentido, não há qualquer atribuição aos Governadores de Estado. Pergunto a V. Exª se, porventura, na Constituição do Estado da Bahia, há alguma menção explícita ao poder de o Governador - seja em função de seu poder administrativo, ou qualquer outro -, em qualquer momento, dizer: essas pessoas podem permanecer presas, outras, não? Independentemente do fato importante, ressaltado no episódio, de que, em nosso País, são raras as pessoas de posses, as pessoas ricas que, embora tendo cometido delitos dos mais relevantes, estão cumprindo penas nas prisões, nas delegacias ou nos distritos policiais. Infelizmente, é um fato, dentre a população carcerária, estarem aqueles que pertencem às camadas de renda mais baixa, de menor riqueza em nosso País, com uma agravante também do ponto de vista racial, porque, dentre os mais pobres, estão aqueles que não conseguiram se libertar das condições advindas da escravidão no Brasil. Daí a razão de haver, hoje, dentre a população carcerária, uma participação relativamente maior de descendentes de negros. Então, repetindo a pergunta: Na Constituição baiana há alguma menção explicita ao direito ou às atribuições do Governador, relacionada à decisão tomada pelo Governador Antônio Carlos Magalhães?

    O SR. JUTAHY MAGALHÃES - Eu diria a V. Exª, mesmo sem compulsar a Constituição, que isso não existe na Constituição do Estado da Bahia, porque é uma prerrogativa federal da União, segundo consta na Constituição Federal.

    Trago este assunto, porque vejo que essas coisas passam despercebidas, consideradas como um fato menor, sem maior importância. Não tem nenhuma repercussão, a não ser a prevista e desejada pelo próprio Governador do Estado, de fazer com que S. Exª libere 154 presos, manifestando com isso um repúdio à lentidão da Justiça na aplicação de penas contra pessoas mais ricas.

    No caso específico, é relacionado a uma disputa política com o ex-Governador Nilo Coelho.

    Quando trago essas questões aqui, Sr. Presidente, fico preocupado, pois noto que quando começo a falar sobre o Governador da Bahia, ouço dizerem que é uma questão regional. Até no meu partido, nesses últimos dias, tenho ouvido falar em questão regional, quando lutamos contra um acordo, sobre o qual tem-se falado na imprensa.

    Li, por exemplo, uma declaração do ex-Ministro Fernando Henrique Cardoso, em que S. Exª diz que, no Brasil, não se pensa em partidos, e sim em pessoas. Fiquei mais preocupado ainda, porque se fôssemos pensar numa união do PSDB com o PFL, poderíamos considerar inaceitável e inacreditável que isso viesse a ocorrer em algum tempo. Se formos pensar em termos de nomes, será pior, porque a união de Fernando Henrique Cardoso com Antônio Carlos Magalhães seria amoral; não seria possível aceitar tal união, porque ele está representando a impunidade! Vive-se no Brasil na base da impunidade.

    Eu poderia falar aqui a respeito da conta fantasma de Salvador e de fatos ocorridos sobre os quais, até hoje, nenhuma apuração foi feita. Há uma impunidade generalizada sobre tudo o que é feito na Bahia. Nunca se vai até o final das apurações; no entanto, quando o assunto é aqui levantado, ele se torna regional.

    Não, Sr. Presidente, trata-se de um assunto que deveria ser meditado por todos os Srs. Senadores e examinado pela Justiça do País!

    O Sr. Josaphat Marinho - Permite-me V. Exª um aparte?

    O SR. JUTAHY MAGALHÃES - Ouço V. Exª com prazer.

    O Sr. Josaphat Marinho - Nobre Senador, os fatos referidos no ponto nuclear do seu discurso referem-se a atos praticados pelo Sr. Antônio Carlos Magalhães no exercício do cargo de Governador do Estado e já ao fim de seu mandato. S. Exª soltou ou ordenou que se soltassem determinados presos que se encontravam em delegacias. Decerto, S. Exª o fez com a segurança de que nenhum deles tinha culpa formada. Estavam, portanto, submetidos à autoridade policial e, conseqüentemente, ao Poder Executivo. Se, porventura, algum ato, além de sua função, praticou, fique certo de que S. Exª está pronto a responder, no momento em que for convocado.

    O SR. JUTAHY MAGALHÃES - Veja V. Exª a coincidência, Sr. Senador. Nesse mesmo dia em que S. Exª soltava 154 presos, uma advogada da Ordem dos Advogados do Brasil, baiana, de cujo nome não me recordo agora, que representa os interesses dos menores junto à Ordem dos Advogados do Brasil, seção da Bahia, tentava, inutilmente, conseguir das autoridades policiais a permissão para chegar a um menor que estava preso indevidamente. E nada tinha sido feito até o momento. Ela disse que ia tentar falar com o Governador.

    Nobre Senador, foi preciso pedir ao Sr. Governador do Estado da Bahia.

    O Sr. Josaphat Marinho - Permita-me apenas esclarecer-lhe que o que V. Exª agora acentua não infirma a declaração que há pouco fiz.

    O SR. JUTAHY MAGALHÃES - Sim, não infirma a declaração que V. Exª fez.

    Na Bahia, eu estou acostumado a todo tipo de chicana do Sr. Antônio Carlos Magalhães. Até ser processado!

    Ele, que se diz vítima, que diz querer uma Justiça rápida, quando o processei, tomou como testemunhas um prefeito e um ex-prefeito, de Canavieiras e de Barreiras. E o Juiz da Comarca de Canavieiras nunca conseguiu encontrar o endereço do prefeito. Das chicanas que lhe são favoráveis, ele não reclama; ao contrário, apóia.

    São essas farsas que não considero mais admissíveis neste País. Não admito que se considere tal tipo de procedimento como "habilidade". Nunca na minha vida pude aceitar isso. Não admiro esses "hábeis". Gosto daqueles que pensam, dizem o que pensam, mesmo que ajam contrariamente ao meu pensamento; eu os respeito, porque sei que estão agindo de acordo com a sua própria consciência. Mas desses "hábeis", tenho nojo, asco. Para mim, não valem nada. Infelizmente, são vitoriosos. Para mim, nada valem.

    Sr. Presidente, eu me preocupo em trazer essas questões para o Plenário. De nada adianta!

    O Governador do Estado da Bahia vai à televisão, com propaganda paga pelo Estado, e faz comícios. É proibido pela Constituição. A Carta Magna proíbe terminantemente. Mas faz comícios, e as autoridades não vêem. E quando são chamadas à colação, como fiz, com dois ofícios ao Procurador Aristides Junqueira, e como fez o Deputado Jaques Wagner, que entrou com ações no Judiciário, não adianta.

    Quando se identifica os dois autores da conta fantasma no Citibank de Salvador, o Sr. Governador diz que o laudo é forjado. E fica por isso mesmo. Está aqui a declaração do Delegado, Coronel Romão, que recebeu uma reclamação do Governador dizendo que não estava satisfeito com as perguntas que o Delegado fazia às testemunhas a respeito das contas fantasmas. Então, tira o delegado!

    Sr. Presidente, essa é a Bahia. Isso é Brasil. Isso não ocorreria na Bahia, se no Brasil nós não permitíssemos que tal ocorresse.

    Mas antes de encerrar, Sr. Presidente - sei que a luz vermelha está piscando, já ultrapassei o meu tempo -, permita apenas felicitar o nosso companheiro de trabalho, Alexandre Dupeyrat, por ter chegado ao Ministério da Justiça. Foi uma escolha feliz do Presidente Itamar Franco. Sei bem o que representa o Sr. Alexandre Dupeyrat como defensor da ética e interessado nas questões jurídicas. Tenho a certeza, Sr. Presidente, de que vamos ter novidades na área do Ministério da Justiça. Tenho a certeza de que vamos ter alguma ação para tentar impedir esse abuso do poder econômico no nosso País. Não tenho conhecimento de nenhuma medida que ele esteja tomando, mas, por conhecê-lo, sei que irá tomar.

    O Sr. Odacir Soares - V. Exª me permite um aparte?

    O SR. JUTAHY MAGALHÃES - Pois não, nobre Senador Odacir Soares.

    O Sr. Odacir Soares - Eu queria aproveitar a observação que faz quanto ao novo Ministro da Justiça para ratificar as palavras de V. Exª relativamente às qualidades do Dr. Alexandre Dupeyrat, que chefiou a Assessoria Legislativa do Senado Federal por algum tempo e se notabilizou pelo seu alto saber jurídico e pela sua competência. Quero dizer também que no Governo há vários assessores do Senado Federal em postos de alta direção, como o Dr. Antônio Carlos Nantes, Secretário Adjunto da Administração Federal. O Secretário Executivo do Ministério da Educação também é Assessor Legislativo do Senado. O Secretário Executivo e o Chefe de Gabinete do Ministro da Justiça também são assessores do Senado.

    O SR. JUTAHY MAGALHÃES - O Procurador-Geral da Fazenda, Edgard Proença.

    O Sr. Odacir Soares - Exatamente. Eu queria cumprimentar V. Exª pela observação que faz, estendendo essa consignação aos demais servidores do Senado que prestam serviços à Administração Federal em postos importantes.

    O SR. JUTAHY MAGALHÃES - Agradeço o aparte de V. Exª ao fazer justiça ao quadro funcional do Senado, que mostra sua competência no exercício de funções da mais alta relevância na República.

    Sr. Presidente, encerro e agradeço a benevolência de V. Exª Espero que os Srs. Senadores não levem essas questões que aqui trago como regionais, mas que pensem e raciocinem em termos de Brasil, para não acontecer aqui o que já aconteceu em outros países.

    Obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 12/04/1994 - Página 1706