Pronunciamento de Valmir Campelo em 13/04/1994
Discurso no Senado Federal
PROJETO DA FUNDAÇÃO ABRINQ PELOS DIREITOS DA CRIANÇA COM A FINALIDADE DE PERMITIR A ADOÇÃO DE MENORES CARENTES EM INSTITUIÇÃO DE CARATER SOCIAL. A IMPORTANCIA DAS INICIATIVAS PRIVADAS DE CARATER SOCIAL PARA A SOLUÇÃO DOS PROBLEMAS DOS MENORES ABANDONADOS.
- Autor
- Valmir Campelo (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/DF)
- Nome completo: Antônio Valmir Campelo Bezerra
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
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POLITICA SOCIAL.:
- PROJETO DA FUNDAÇÃO ABRINQ PELOS DIREITOS DA CRIANÇA COM A FINALIDADE DE PERMITIR A ADOÇÃO DE MENORES CARENTES EM INSTITUIÇÃO DE CARATER SOCIAL. A IMPORTANCIA DAS INICIATIVAS PRIVADAS DE CARATER SOCIAL PARA A SOLUÇÃO DOS PROBLEMAS DOS MENORES ABANDONADOS.
- Publicação
- Publicação no DCN2 de 14/04/1994 - Página 1794
- Assunto
- Outros > POLITICA SOCIAL.
- Indexação
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- COMENTARIO, EFICIENCIA, PROGRAMA, NATUREZA SOCIAL, FUNDAÇÃO, OBJETIVO, AUTORIZAÇÃO, EMPRESA, PESSOA FISICA, PAGAMENTO, QUANTIA, CUSTEIO, MENOR ABANDONADO, ENTIDADE, PARTICIPAÇÃO, CONVENIO.
- ELOGIO, PROJETO, RESPONSABILIDADE, CESARE DELLA ROCCA, ADVOGADO, PEDAGOGO, ATENDIMENTO, ASSISTENCIA, MENOR ABANDONADO, MUNICIPIO, SALVADOR (BA), ESTADO DA BAHIA (BA).
O SR. VALMIR CAMPELO (PTB - DF. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, dentre tantas notícias ruins, crises, problemas, vez por outra deparamo-nos, também, com alguma coisa boa que nos faz acreditar que este país tem jeito e ainda pode transformar-se numa nação que encha de orgulho os seus cidadãos quando disserem: sou brasileiro.
E não estamos falando de glórias esportivas, como futebol, vôlei, basquete, automobilismo ou até mesmo beisebol, em que o País consegue títulos mundiais, mas nada representam para a melhoria na qualidade de vida de seu povo. Aliás, algumas modalidades de esporte nas quais o Brasil logrou destacar-se sequer são acessíveis ao grosso da população.
Mas uma notícia que nos encheu de esperança é a que apresenta os resultados do projeto que vem sendo tocado pela Fundação Abrinq pelos Direitos da Criança e que tem como finalidade a adoção de menores carentes em instituições de caráter social.
O ponto alto a ser destacado nesse projeto é que se trata de uma iniciativa totalmente particular.
Nesse contexto, o boletim informativo do Grupo de Serviços TICKET, denominado Inovação Empresarial, em seu número 44, referente ao mês de janeiro de 1994, narra uma experiência exemplar, que deveria ser difundida por todos os meios:
Um pequeno empresário instalou uma marcenaria na Vila Madalena, bairro de classe média da cidade de São Paulo, para a produção de móveis e brinquedos. Esse estabelecimento transformou-se em centro de atração para as crianças de uma favela próxima, conhecida como Força e Luz, já que seus barracos foram construídos junto ao muro e sob os cabos de alta tensão de uma subestação da ELETROPAULO (a companhia de energia elétrica que atende à capital paulista).
Desde quando começou a funcionar em 1987, a Marcenaria Pau-Pau, devido à bondade de seu proprietário, Pedro Batista Ranciaro, recebia as crianças das proximidades em seu interior. A princípio, elas vinham movidas pela curiosidade, mas, encontrando ali brinquedos à sua disposição e almoço grátis, passaram a fazer do local um ponto de encontro. Aqueles que demonstravam interesse pelas ferramentas podiam aprender os rudimentos da profissão.
Um deputado italiano, amigo de Ranciaro, tendo conhecimento do trabalho desinteressado e altruísta que vinha sendo desenvolvido, promoveu uma coleta de dinheiro entre os habitantes da cidade de Parma, na Itália, para que não se interrompesse a assistência ao número crescente de crianças da Favela Força e Luz, que procuravam a marcenaria em busca de abrigo, lazer, comida e profissão.
Há dois anos, a iniciativa, que teve cunho pessoal e se desenvolveu mais ou menos devido ao acaso, transformou-se na Associação Pau-Pau Crianças e Cidadania.
Mas a entidade, não dispondo de fonte regular de sustentação, passou, como muitas outras do gênero; a enfrentar uma crônica falta de recursos até receber a excelente notícia em novembro passado:
Ciente do trabalho que vinha sendo desenvolvido pela associação, a Fundação Abrinq pelos Direitos da Criança resolveu destinar-lhe a quantia de 2500 dólares mensais para a manutenção de cinqüenta crianças e adolescentes de 4 a 18 anos na Marcenaria. A ABRINQ montou, ainda, uma brinquedoteca, e o local sofreu uma reforma para que as pias e outros aparelhos tivessem altura adequada aos seus usuários.
A irmã do proprietário da marcenaria, Fátima Cristina Ranciaro, uma das seis pessoas que tocam a instituição (são três voluntárias e três contratadas) não cabia em si de tanto contentamento: "O convênio com a Abrinq representa a garantia de continuidade do nosso trabalho, uma grande oportunidade de oferecermos melhores condições para as crianças e tirá-las das ruas." - disse ela.
A partir daí, as crianças passaram a ter almoço reforçado e, no resto do dia, podem dedicar-se ao aprendizado da marcenaria e serigrafia e praticar teatro e artes plásticas. Além do mais, estão seguras e alimentadas, nos chamados dias úteis, das 9 às 18 horas, e são levadas, duas vezes por semana, para brincar nas praças de Vila Madalena, acompanhadas por voluntários.
Sr. Presidente, e Srs. Senadores, alonguei-me propositadamente com a descrição de detalhes para mostrar que há soluções baratas que funcionam.
E o jornal Correio Braziliense do dia 30 de janeiro de 1994 noticia: "O Governo não sabe quem e quantos são os adolescentes e crianças abandonadas que deve atender em todo o País, e muito menos quais e quantas instituições poderiam ajudá-lo a cumprir sua obrigação". Quem admite essa limitação é a nova presidenta do Centro Brasileiro para a Infância e Adolescência (CBIA), Regina Lúcia de Quadros Bertulli.
No entanto, a Fundação ABRINQ, entidade criada pelos fabricantes de brinquedos em 1990, como objetivo de "defender os direitos básicos de cidadania das crianças", vem tocando o projeto "Nossas Crianças" a um custo muito baixo.
Esse projeto permite que empresas e pessoas físicas "adotem" uma criança numa das instituições selecionadas e fiscalizadas pela fundação pela módica quantia de 50 dólares mensais, sem envolver-se com as crianças "adotadas" e sem perder tempo com burocracia. Pagando o carnê fornecido pela ABRINQ na rede bancária, o objetivo está assegurado e 50 dólares representam menos do que uma peça de roupa (uma calça ou mesmo uma camisa) para quem tem capacidade contributiva nesse valor determinado.
O sucesso do programa pode ser demonstrado através dos números que chegaram ao nosso conhecimento: o objetivo de atendimento de mil crianças em dois anos (300 no primeiro ano mais setecentos no segundo) revelou-se subestimado ou tímido. Lançado em junho de 1993, ao fechar o ano já apresentava contribuições de 70 mil dólares mensais em coisa de seis a sete meses, significando o equivalente a 1400 crianças adotadas.
Só a Associação Paulista de Supermercados (APAS) adotou 50 crianças. Omar Assaf, vice-presidente da associação, diz que o setor está disposto a contribuir com outras iniciativas, desde que sejam boas e bem administradas.
Oded Grajew, diretor-presidente da Fundação ABRINQ e um dos pais da idéia, disse que o receio das empresas era o de um envolvimento maior com os adotados, mas a arquitetura do projeto e a credibilidade da ABRINQ foram fatores decisivos para que a iniciativa fosse coroada de êxito.
Os recursos são repassados integralmente para as instituições selecionadas, que dispõem de pessoal especializado para cuidar das crianças e os custos administrativos, burocráticos e de fiscalização são bancados com recursos da própria ABRINQ, é o que garante Oded Grajew.
A direção do projeto cabe a um conselho formado por representantes do UNICEF, da Pastoral do Menor, do Centro Brasileiro para a Infância e Adolescência e integrantes da Promotoria da Infância e Juventude do Estado de São Paulo.
Para maior confiabilidade, não se descura de fiscalização e auditoria permanentes em todas as entidades, e são emitidos relatórios mensais sobre a situação de cada uma delas para todas as empresas participantes. É uma forma de estreitar os vínculos entre aqueles que contribuem e as crianças adotadas, ao menos no que se refere à aplicação efetiva dos recursos.
O projeto Nossas Crianças só exige das entidades conveniadas que sejam honestas e competentes. Não existe restrição de outra natureza (credo, cor, ideologia ou outra qualquer).
Assim é que sustenta crianças em entidades novas e que se desenvolveram em circunstâncias especiais, como a Associação Pau-Pau Criança e Cidadania, e entidades já tradicionais.
A Associação Santa Terezinha, de Carapiuíba - SP, que abriga filhos sadios de pessoas leprosas, mantém também um hospital e exibe, agora, entre seus feitos, o diploma de graduação universitária de quatro ex-internos. Essa instituição conta com quarenta crianças adotadas através do projeto Nossas Crianças.
O Centro Educacional Comunitário Tabor, no Jardim São Gonçalo, situado ao leste da periferia da capital paulista, fornece alimentação, educação, iniciação ao trabalho agrícola (hortas, pomares e jardins) e à criação de galinhas, porcos e cabras. Aí, cinqüenta menores são mantidos pela Fundação ABRINQ.
Se a idéia dessa fundação prosperou de tal forma, o que não seria possível realizar se outras instituições congêneres passassem a desenvolver trabalhos com o mesmo espírito?
Vamos continuar esperando recursos governamentais, se sabemos que uma grande parte deles acaba morrendo no financiamento de atividades-meio, quando não vão parar no bolso de pessoas desonestas e corruptas, através das chamadas instituições "pilantrópicas", ou outros expedientes igualmente condenáveis?
Segundo o presidente da ABRINQ, todos os dias acontecem ligações de pessoas querendo ajudar e oferecendo-se para executar serviços voluntários do projeto. São professores, médicos, dentistas, psicólogos, advogados, artistas e outros profissionais liberais. Aqueles que não têm uma demanda específica de acordo com a profissão são aproveitados como fiscais e auditores.
Finalizando, quero destacar que qualquer iniciativa de espírito comunitário, se bem conduzida, tem chances de prosperar e de mostrar serviços inestimáveis no campo da assistência social. Exemplo irrepreensível para comprovar essa afirmação é o que abordarei sucintamente.
Já foi amplamente divulgado pela imprensa o sucesso do Projeto Axé, sobre o qual também valeria a pena uma exposição mais detalhada, mas não o farei agora, para não alongar-me indevidamente. Esse projeto, comandado pelo advogado e pedagogo italiano Cesare della Rocca, que há 26 anos mora no Brasil, ampara 2747 crianças de rua da cidade de Salvador, capital da Bahia, e é apontado pelo UNICEF, órgão da ONU para a infância e a adolescência, como um exemplo para o Terceiro Mundo.
O Projeto Axé, criado em 1989, é produto de um convênio entre a ONG (organização não-governamental) brasileira Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua e a Associação Italiana de Cooperação Internacional Terra Nova. Entre seus grandes contribuintes estão a Organização das Nações Unidas, a Organização Internacional do Trabalho e a Comunidade Econômica Européia, proporcionando um orçamento anual de 800 mil dólares, ou 300 dólares/ano por criança atendida, a metade do que vem sendo destinado pela ABRINQ. Não que esta última esteja "soltando dinheiro pelo ladrão, porque 50 dólares/mês mal são suficientes para manter minimamente uma pessoa, mas os projetos, apesar de exemplares em sua atuação e nos seus resultados, têm características distintas. O sucesso acontece, apesar das diferença significativa na quantidade de recursos.
Sr. Presidente, esta minha explanação demonstra que devem ser estimuladas todas as iniciativas sérias de caráter social que venham dos particulares, porque provam que a relação custo/benefício é plenamente correspondida, ao contrário de muitos exemplos que temos tido de programas oficiais.
Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.