Pronunciamento de Eduardo Suplicy em 02/05/1994
Discurso no Senado Federal
HOMENAGEM DE PESAR PELO FALECIMENTO DO PILOTO AYRTON SENNA DA SILVA.
- Autor
- Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
- Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
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HOMENAGEM.:
- HOMENAGEM DE PESAR PELO FALECIMENTO DO PILOTO AYRTON SENNA DA SILVA.
- Publicação
- Publicação no DCN2 de 03/05/1994 - Página 2055
- Assunto
- Outros > HOMENAGEM.
- Indexação
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- HOMENAGEM POSTUMA, AYRTON SENNA DA SILVA, MOTORISTA PROFISSIONAL, COMPETIÇÃO ESPORTIVA, AUTOMOVEL, ESTADO DE SÃO PAULO (SP).
O Sr. Eduardo Suplicy (PT - SP. Para encaminhar a votação.
Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Sras e Srs. Senadores, como todo o País, como todos os brasileiros, nós, do Partido dos Trabalhadores, também sentimos imensamente a morte de Ayrton Senna da Silva ocorrida ontem.
No primeiro dia do mês de maio de 1994, estávamos realizando, em um momento de grande significado, o IX Encontro Nacional do Partido dos Trabalhadores, para a indicação de Luís Inácio Lula da Silva como nosso candidato a Presidente, ao mesmo tempo em que iríamos apreciar, discutir e aprovar o programa de governo. À tarde, faríamos um ato de comemoração desses fatos com a presença dos candidatos a Governador, a Senador e a Deputado em todos os Estados, mas em especial no Distrito Federal, que se realizaria em frente ao Congresso Nacional. Entretanto, diante da notícia do falecimento de Ayrton Senna, houve a resolução de suspendermos aquele ato em respeito ao momento de tristeza vivenciado por todos nós, brasileiros, pelo impacto da notícia do acidente. Completamos, pois, os trabalhos da Convenção no recinto da Câmara dos Deputados.
Sr. Presidente, por todo o País, houve um pensamento uníssono em relação a tudo aquilo que Ayrton Senna representou para nós, brasileiros. Nos Estádios do Maracanã e do Morumbi, a torcida de alguns dos maiores times que se estavam enfrentando e lotando ambos os estádios, de braços abertos e batendo palmas, cantaram: "Olê, olê, olá! Senna! Senna !".
Aquela imagem do acidente de Ayrton Senna, transmitida para todo o mundo, levou inúmeras pessoas a terem uma preocupação com a vida. Ontem mesmo, uma senhora aqui de Brasília, de nome Cláudia Lessa, encaminhou-me um fax logo após ter assistido àquela cena.
Aqui, leio as palavras dessa brasileira, mãe, diante do episódio:
Quantas vidas valem uma corrida?
Eu sei o que todos os brasileiros sentiram no momento do acidente de Ayrton Senna.
Eu, particularmente, estava assistindo à TV em meu quarto, com minha filha de três meses em meu colo, quando, ao ver o acidente, fiquei desesperada. Deixei até minha pequenina um pouco sufocada e chorei ao presenciar aquele homicídio.
Meu marido, preocupado, ainda falou: - Calma, mulher, não vai acontecer nada. Ele vai ficar bem... - Mas as atitudes dos que primeiramente correram para o carro (os ajudantes de prova, que ficaram indo e vindo, sem nada fazer), a demora no atendimento, e a maneira como os médicos socorreram o nosso campeão, fizeram-me dizer. Ayrton já está praticamente morto, mas eles só irão anunciar isso bem depois da corrida, para não perder o rico dinheirinho aplicado na publicidade do circuito.
Mais indignada fiquei quando ouvi a declaração de que a corrida recomeçaria em dez minutos. Não entendi como os próprios colegas de Ayrton esconderam, naquele momento, a gravidade e a maldade dos fatos. Até então, também não se havia divulgado nada sobre as vítimas em estado grave do primeiro acidente da corrida (além da total indiferença com o acidente do Rubinho e com a morte do piloto austríaco). Era como se o dinheiro fosse colocado acima de todas aquelas vidas, que hoje afirmo, foram assassinadas pela incompetência de todos os que organizam a Fórmula 1.
Depois, escutei pela TV que, um dia antes, o dono da Williams havia mandado um recado para o Ayrton, o chamando de "o nosso campeão".
Ora, faça-me o favor, Ayrton não era campeão da Williams; aliás, ele não era campeão de equipe nenhuma. Se as equipes realmente valorizassem "seus campeões", fariam muito mais pela segurança física dos mesmos. Estariam muito mais preocupadas em preservar a vida de seus "puros-sangues" (parece que eles vêem os pilotos como animais) do que em ganhar dinheiro com uma insensatez maluca, que só os fazem pensar que a tecnologia está aí para servir à velocidade, não às vidas.
Ayrton, Sr. Frank, era sim o nosso campeão, o campeão dos brasileiros, e não o de vocês (insanos), como o senhor quis insinuar. Campeão dos brasileiros, um povo que é tão criticado porque muitas vezes deixa de ganhar dinheiro porque prefere viver.
Ai está a diferença, aí está o porquê de minha revolta: enquanto nós fabricamos a vida, dando-lhes o que temos de melhor em forma de campeões, vocês a destroem com a sua ganância famigerada pelos sabores amargos da fortuna.
Ayrton, você sempre será o nosso campeão!
Este artigo foi escrito por Cláudia Lessa, que é mãe e mora em Brasília, no Distrito Federal.
Ayrton Senna da Silva, você conseguiu trazer felicidade aos brasileiros, a pessoas de todo o mundo, a pessoas da América Latina, como da Argentina, do Uruguai, enfim, aos nossos países vizinhos, que viam em Ayrton Senna, em especial os argentinos, o sucessor de Juan Manuel Fangio, pentacampeão mundial da Fórmula 1.
É preciso que os organizadores da Fórmula 1 respondam aos apelos do próprio Ayrton Senna; que tenham mais cuidado com a vida; que tenham maior preocupação, não apenas em fazer de tudo para que a Fórmula 1 continue sendo um meio extraordinário de arrecadação de recursos, como centro de atenção que possibilita tantas empresas conseguirem realizar uma publicidade tão eficiente, mas que a busca do dinheiro, a busca do lucro não se esteja sobrepondo à vida das pessoas.
É esse o apelo que faço e certamente a lição que fica para todos nós. Para que os ensinamentos de Senna tenham validade, é preciso que haja muito maior cuidado em se preservar a vida humana de todos aqueles que amam a Fórmula 1, de todos aqueles que praticam esse esporte que, sem dúvida, encerra riscos na sua prática.
Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.