Discurso no Senado Federal

DEFESA DOS MONOPOLIOS DO PETROLEO E DAS TELECOMUNICAÇÕES.

Autor
Odacir Soares (PFL - Partido da Frente Liberal/RO)
Nome completo: Odacir Soares Rodrigues
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PRIVATIZAÇÃO.:
  • DEFESA DOS MONOPOLIOS DO PETROLEO E DAS TELECOMUNICAÇÕES.
Aparteantes
Amir Lando, Josaphat Marinho, Magno Bacelar.
Publicação
Publicação no DCN2 de 10/05/1994 - Página 2123
Assunto
Outros > PRIVATIZAÇÃO.
Indexação
  • QUESTIONAMENTO, INTERESSE, EMPRESA, LOBBY, REFORMULAÇÃO, MONOPOLIO, TELECOMUNICAÇÃO, MOTIVO, LUCRO, EXPLORAÇÃO, TELEFONE CELULAR, TELEVISÃO POR ASSINATURA (TVA), SERVIÇO, COMUNICAÇÃO DE DADOS.
  • QUESTIONAMENTO, PRIVATIZAÇÃO, PETROLEO.
  • NECESSIDADE, ANALISE, CONGRESSISTA, RESULTADO, PRIVATIZAÇÃO, PETROLEO, TELECOMUNICAÇÃO.

      O SR. ODACIR SOARES (PFL - RO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Sras e Srs. Senadores, há cerca de dez dias tive oportunidade de pronunciar-me desta tribuna a favor do monopólio estatal do petróleo.

      Em minha fala dei-me ao meu cuidado, inclusive, de expor as razões que amparam minha condição sui generis de adepto da privatização das empresas governamentais, na maioria dos casos, embora francamente favorável ao monopólio em um número reduzido de situações - as referentes a setores da economia que envolvem interesses estratégicos supra-sensíveis.

      Hoje, volto a este plenário para sustentar, com igual convicção, a intocabilidade dos serviços de telecomunicação, em boa hora confiados à gestão eficiente da Telebrás.

      Quem quiser assumir posição independente na polêmica que se vem travando em torno de monopólios e privatizações tem que cercar-se de muitas cautelas. O lobby campeia na área, cheio de astúcia e armado de mil falácias.

      Não chega, pois, a surpreender, que certo empresário vinculado ao setor da eletrônica e da telecomunicação assim se haja expressado:

      É difícil conseguir eqüidistância e frieza dos participantes, porque o jogo é muito pesado. Este é o melhor negócio do mundo. Está em disputa o destino de dezenas de bilhões de dólares. (Veja, 20-4-94)

      Não nos defrontamos, portanto, nesses debates, com um certame acadêmico, onde os contendores porfiam com igual elevação de propósitos no sentido de demonstrar a excelência das teses que defendem.

      Muito pelo contrário. O lobista da telecomunicação não disputa uma tese, mas um lugar em mercado que vale bilhões de dólares.

      A tese da privatização, a excelência dos postulados neoliberais são por eles brandidos muito mais como instrumentos de batalha do que como expressão de acendradas convicções.

      Como disse, não se luta por uma tese; luta-se por uma fatia de mercado. E é bom que se vá logo dizendo: no caso das telecomunicações, a fatia cobiçada pelo poderoso lobby encabeçado pelo IBDT (Instituto Brasileiro para o Desenvolvimento das Telecomunicações), entidade que congrega principalmente as empresas fabricantes de centrais telefônicas, não é a fatia da telefonia urbana e interurbana. Essa é uma fatia magra para a operação da qual não se nega a competência à Telebrás. A fatia cobiçada - o filé mignon do negócio - chama-se Telefonia Celular, TV a Cabo, Serviço de Transmissão de Dados.

      Noutras palavras, o lobby da "flexibilização" do monopólio quer operar, digamos assim, na Avenida Paulista, e não faz nenhuma objeção a que a Telebrás continue operando no sertão do Cariri e adjacências.

      Acontece, porém, que é com os lucros provindos das fatias gordas do mercado que a Telebrás consegue marcar presença no sertão do Cariri e em inúmeros outros grotões de pobreza do País, onde os que pugnam pela flexibilização jamais investiriam um centavo de dólar sequer, com o abnegado propósito de reduzir a mudez do sertão brasileiro.

      Quando examinamos, pois, os argumentos do lobby, há que mantermo-nos prevenidos contra as contradições, as falácias e os escamoteamentos dos que trabalham melhor com a meia verdade do que com a verdade pura e cristalina.

      Certos argumentos, bons para derrubar o monopólio da Petrobrás, contraditoriamente não o são para "flexibilizar" o ramo das telecomunicações.

      O argumento majoritário é, em geral, bem acolhido no Brasil, sobretudo nos plenários das Casas Legislativas. É bom, pois, usá-lo contra o monopólio estatal do petróleo, alegando que a maioria dos países vem entregando ao setor privado a exploração de suas reservas petrolíferas, no caso da Petrobrás.

      Já para o negócio das telecomunicações, esse argumento deixa de ser utilizado, porque, neste domínio, a maioria dos grandes sistemas de telecomunicação ou é estatal ou é rigidamente controlada pelo Estado.

      Mesmo quando aplicado ao monopólio do petróleo, o argumento majoritário só ajuda quando é escamoteado um dado de suma importância. Invoca-se, então, um fato verdadeiro, o de que a maioria das empresas petrolíferas do mundo pertencem ao setor privado, mas omite-se outro não menos significativo: o de que os seis únicos países que ainda mantêm o monopólio estatal do petróleo detêm mais de 80% das reservas petrolíferas mundiais.

      Para abalar a nossa confiança nas telecomunicações sob a tutela do Estado, alardeiam-se os exemplos da Argentina, do Chile, do México e da Venezuela, que teriam privatizado suas empresas de telecomunicação com total sucesso. Escamoteiam-nos, porém, um dado fundamental, o de que, nesses países, o que houve, realmente, foi a desnacionalização do setor de telecomunicações, já que seus sistemas de telecomunicação passaram a ser controlados por empresas estatais européias ou por consórcios estrangeiros monopolizadores desses serviços.

      Com efeito, na Argentina, os serviços são, hoje, explorados, na área norte do país, por um consórcio formado por estatais estrangeiras: a STET, italiana, e a France Telecon, francesa. Na área sul, uma estatal espanhola opera o sistema e direciona a passagem de todas as ligações DDI pela Espanha.

      No Chile, os serviços de telecomunicações são, hoje, explorados pela CTNE, estatal espanhola, que os monopoliza.

      No México, as ações do governo mexicano foram adquiridas pelos grupos France Telecon, estatal francesa que detém o monopólio dos serviços de telecomunicações na França, pela South Western Bell (uma das sete empresas que enfeixam o serviço local nos Estados Unidos) e pelo grupo privado mexicano, CARSO.

      Sobre os resultados dessas mudanças, discorreremos mais adiante.

      Outro recurso, nada elogiável, mas muito utilizado pelo lobby da flexibilização, é o da manipulação de dados.

      Para provar, por exemplo, que o sistema Telebrás opera a custos bem mais altos do que aqueles praticados por países onde as telecomunicações estão em mãos do setor privado, toma-se isoladamente o custo da instalação de um aparelho na Inglaterra - em torno de U$ 525; na Argentina - U$ 830 e compara-se com o do Brasil - em torno de U$ 1.232. Logo se constata uma diferença a mais, indubitavelmente bastante expressiva, pesando contra o Brasil. O mesmo irá repetir-se, quando cotejados os preços de uma ligação interurbana. Estamos, entretanto, Sr. Presidente, Srs. Senadores, diante de uma meia verdade, tão-somente.

      De fato, tomados isoladamente os custos da instalação de um aparelho telefônico ou de uma chamada interurbana no Brasil, são mais altos do que os mesmos serviços na Inglaterra, no México e na Argentina. Disse meia verdade, porque, para os fins comparativos que se pretende, o correto, para que se esplenda a verdade tarifária, seria tomar como parâmetro toda uma "cesta telefônica", assim chamado o consumo telefônico de um usuário típico, conforme critérios adotados pela Siemens, AG.

      "Cesta telefônica", Sr. Presidente e Srs. Senadores, é, em outras palavras, um somatório ponderado da taxa de instalação, assinatura/ano, ligações locais e interurbanas realizadas pelo usuário. E é aqui que se faz plena luz sobre a verdade dos custos da telecomunicação operada pela Telebrás e pelas suas congêneres "competitivas" da Inglaterra, do México e da Argentina.

      Enquanto no Brasil, em 1993, o custo da "cesta telefônica" era de 189 dólares, na Inglaterra, de 419 dólares, no México, de 360 dólares, e na Argentina, de 390 dólares. Além disso, é bom que se saiba a razão pela qual, isoladamente, certos componentes da "cesta telefônica" apresentam custos mais altos - a instalação de um aparelho telefônico, por exemplo: é que o Sistema Telebrás trabalha com um modelo perfeito de equilíbrio, onde a receita dos serviços mais rentáveis ajuda a sustentar os serviços deficitários, como telefonia rural, telefones públicos, etc.

      Sr. Presidente, Srs. Senadores, para os que se detêm na análise do comportamento do lobby antimonopólio é fácil identificar a estratégia mais utilizada para vender a idéia da necessidade de flexibilizar a exploração dos serviços de telecomunicação.

      O Sr. Magno Bacelar - permite-me V. Exª um aparte?

      O SR. ODACIR SOARES - Com muito prazer, nobre Senador Magno Bacelar.

      O Sr. Magno Bacelar - Nobre Senador Odacir Soares, V. Exª hoje, a exemplo do que fez há poucos dias, discorrendo sobre a Petrobrás e o lobby dos mais caros e atuantes que já se viu nesta Casa e no Brasil inteiro, fala hoje sobre o monopólio das telecomunicações. Aqueles que defendem a flexibilidade não levam em consideração aquilo que V. Exª disse no início do seu discurso, de que o serviço prestado às cidades distantes, longínquas, não tem condição alguma de sobreviver, senão com a assistência do Estado. E para o empresário que pensa na informação de dados, na TV a cabo e outros mais lucrativos ainda, não interessa o sofrimento e as necessidades das cidades mais longínquas do nosso País. Sou daqueles que defendem o monopólio. Congratulo-me com V. Exª, e seria necessário haver mais vozes corajosas, como a de V. Exª, para fazer cessar o trabalho de grandes empresários, sobretudo de comunicações, que hoje dominam este País e influenciam terrivelmente nas decisões tomadas nestas duas Casas. Precisamos reagir, precisamos todos nós saber que, antes do interesse financeiro, há o interesse social e o compromisso com a Nação. Parabéns a V. Exª

      O SR. ODACIR SOARES - Agradeço, nobre Senador Magno Bacelar, o aparte de V. Exª Não poderia esperar de V. Exª outra posição a não ser esta, de defesa intransigente, porém racional e lógica, não apenas da manutenção do monopólio estatal do petróleo, mas também da manutenção do monopólio estatal das telecomunicações. Conforme disse no começo do meu discurso e desejo repetir agora, na realidade, quando o lobby fala em "flexibilização do monopólio" deseja apenas a telefonia celular, a TV a cabo e o serviço de transmissão de dados com os recursos obtidos pelo exercício dessa parte do monopólio que a Telebrás consegue levar à telefonia rural e levar o telefone mesmo para os locais e os rincões mais pobres deste País. O lobby não quer a telefonia rural, não quer a telefonia pública, não quer a telefonia pura e simples, o lobby quer o filé mignon da telefonia.

      De modo que agradeço a V. Exª o aparte, sobretudo oportuno, o que não me surpreende - como eu disse - porque a defesa intransigente dos interesses do nosso País, dos interesses nacionais, tem sido uma permanência na vida pública de V. Exª Muito obrigado pelo aparte.

      Prossigo, Sr. Presidente. Para os que se detêm na análise do comportamento do lobby antimonopólio é fácil identificar a estratégia mais utilizada para vender a idéia da necessidade de "flexibilizar" - esta é a palavra nova - a exploração dos serviços de telecomunicação. Primeiro eles batem. Batem para valer Depois eles sopram as áreas traumatizadas.

      Batem porque é preciso enfraquecer a empresa estatal e precisam enfraquecê-la para mais facilmente poderem arrebatar as melhores fatias dos negócios que ela gerencia. E porque só querem umas poucas fatias, não é bom que sejam irremediavelmente danificadas as demais que ficariam, portanto, em poder da Telebrás.

      É então que se cuida de soprar as áreas traumatizadas aplicando-lhes o ungüento da flexibilização privatizante.

      O Sr. Amir Lando - Senador Odacir Soares, V. Exª me permite um aparte?

      O SR. ODACIR SOARES - Com muito prazer, Senador Amir Lando.

      O Sr. Amir Lando - Nobre Senador Odacir Soares, quero saudar V. Exª por ter abordado tema tão importante e porque V. Exª, dentro do Partido da Frente Liberal, assume uma posição de vanguarda que, às vezes, até destoa da pregação doutrinária, especialmente dentro do Congresso Revisor, dos Líderes do Partido de V. Exª Esse discurso mostra, sobretudo, a sua independência e sensibilidade quando trata de um tema tão importante. Fazendo coro com V. Exª, considero essas questões fundamentais ao interesse nacional. V. Exª abordou muito bem, ainda recentemente, a questão do monopólio do petróleo, e agora o faz com referência a essa flexibilização do monopólio das comunicações, sobretudo aqui da Telebrás. Na verdade, essa matéria tem sido tratada por um lobby muito forte, como com todas as letras V. Exª denuncia, e, até certo ponto, havia o compromisso de algumas Lideranças com a quebra desses monopólios. Isso foi objeto de negociação. Quem observa o que se passou, sobretudo na FIESP, na Confederação das Indústrias em geral e nas federações estaduais, verifica que este tema era cotidiano. Há uma similitude muito grande entre o projeto do Relator, Deputado Nelson Jobim, com a proposta dos empresários. Não quero aqui estabelecer uma relação intrínseca, nem comprometedora, mas é, para o observador mais isento, uma coincidência que realmente causa espanto. De tudo isso, entendo que a Nação, neste momento, venceu; venceu, inclusive, com a posição de V. Exª A isso temos de parabenizar. Neste momento crucial, sobretudo em matéria constitucional, não há partidos; há a consciência do Congressista, daquele que realmente representa a soberania popular. Nisso os doutrinadores são unânimes: nas questões da Constituição não há essa imposição partidária, mas, sim, a consciência do Parlamentar, que está acima até das doutrinas partidárias. Então, eu queria, mais uma vez, saudar V. Exª e dizer que este é o caminho da nacionalidade, este é o caminho que o País quer, porque se trata de duas questões eminentemente de soberania nacional. Veja V. Exª o que aconteceria se as comunicações e, sobretudo, a intimidade das pessoas, os segredos de Estado estivessem nas mãos de pessoas estranhas aos interesses nacionais, que pudessem manipular argumentos, assuntos de extremo sigilo em que, às vezes, reside a própria existência da soberania e da independência do País; além, exatamente, do sigilo pessoal, da intimidade das pessoas, que ficaria sempre, de certa forma, desguarnecida nesta área fundamental das garantias e dos direitos do cidadão. Entendo que V. Exª caminha bem, além dos argumentos colocados com muita propriedade, a par de toda essa mistificação que se faz em torno desse dado. V. Exª está de parabéns mais uma vez. A meu juízo, o Brasil ganha com o discurso de V. Exª

      O SR. ODACIR SOARES - Agradeço a V. Exª, Senador Amir Lando. Graças a Deus, não estou só no PFL, em relação à defesa da manutenção do monopólio estatal do petróleo e da manutenção do monopólio estatal das telecomunicações.

      Na semana passada inclusive, não ouvi, mas li as notas do discurso proferido no plenário do Congresso Revisor pelo eminente Senador Josaphat Marinho, que me acompanhou no discurso que fiz sobre a manutenção do monopólio estatal do petróleo.

      Nas notas do discurso do Senador Josaphat Marinho, retirei inclusive aquilo que deve constituir-se numa lição a todos aqueles que pretendem liderar bancadas parlamentares ou liderar pessoas ou idéias. O Senador dizia, com muita propriedade, que as Lideranças dos partidos no Parlamento, salvo melhor juízo - e pediria a S. Exª que me corrigisse - resolveram, por conta própria, assumir posições em relação a certos temas - e este é também o meu entendimento; em decorrência disso, levaram o Congresso Revisor ao seu total insucesso.

      De repente, começaram a falar pelo PFL, começaram a falar pelo PMDB, começaram a falar por todos os partidos e não se lembraram de auscultar a opinião das suas bases partidárias. Terminamos nesse impasse de já ter de fato encerrado, nesse momento, o Congresso Revisor, porque começaram a inventar, começaram inclusive a criar as chamadas agendas mínimas em função de temas que, eventualmente, interessavam a esse ou àqueles setores empresariais do País, sem se lembrarem de que, por trás de tudo isso, estava o povo brasileiro e, do ponto de vista das Bancadas, os Parlamentares.

      Agradeço o aparte de V. Exª, porque, realmente, é um aparte que instrui e qualifica o meu discurso e também renova a posição de V. Exª com relação a esses temas. 

      Entendo que, depois da queda do muro de Berlim, questões como essa saem do campo da doutrina para o campo das atividades típicas do Estado. Se amanhã verificar que a entrega do monopólio for melhor para o Brasil, do ponto de vista da soberania brasileira, e melhor para o povo brasileiro, não terei nenhuma dúvida em expressar uma nova postura, pois a melhor posição é aquela que transfere recursos das mãos do Estado ou das mãos do empresariado privado para o povo, permitindo a redistribuição eqüitativa da renda nacional.

      O mesmo eu diria em torno do monopólio das telecomunicações. O fato é que, do ponto de vista do monopólio do petróleo, temos que, ao contrário do que dizem os privativistas, 80% das reservas mundiais de petróleo estão nas mãos das quatro ou cinco empresas estatais de petróleo; o mesmo acontece com o monopólio das telecomunicações.

      Na realidade, a flexibilização pretende entregar o filé ao empresariado da eletroeletrônica brasileira. Querem operar na Avenida Paulista, esquecendo-se do sertão do Cariri.

      O Sr. Amir Lando - Ou da nossa Rondônia.

      O SR. ODACIR SOARES - Exatamente.

      O Sr. Amir Lando - V. Exa tem toda razão. O discurso de V. Exª dispensa qualquer comentário. Quero apenas louvar a atitude e a coragem de V. Exª Na verdade, não se trata de privatização simplesmente. O que se quer é fazer bom negócios para o Estado. Não se pensa em prestar serviços de forma a atender ao interesse da comunidade nacional, mas, sim, exatamente extrair essas fatias mais vantajosas dos negócios. Na Argentina, vendeu-se a vinte cents de dólares o barril de petróleo, já cubado, já descoberto que só faltava, evidentemente, ser manipulado, enquanto que, no mercado internacional, esse petróleo corria em torno de 20 dólares o barril.

      O SR. ODACIR SOARES - Na Argentina foi mais grave, Senador Amir Lando, porque a Yacimientos Petroliferos Fiscales foi vendida por um preço hoje em torno de 5 bilhões de dólares, quando valia 20 bilhões de dólares. No dia seguinte, o governo concedeu um aumento no preço dos combustíveis. Com esse aumento, aqueles que adquiriram a estatal argentina pagaram ao governo os 5 bilhões de dólares. É um caso claro de corrupção.

      O Sr. Amir Lando - Esse é o dado. Então, o que se estabelece, nesse processo de privatização, é um verdadeiro saque. Digo isso porque fui Relator de uma comissão e estou incluído em outros trabalhos. Evidentemente, é ali que se percebe toda essa teia de interesses e de corrupção, para se extrair vantagens de qualquer sorte do Estado. Não é esse o objetivo da privatização, de maneira nenhuma. O saque sempre é um delito e nunca um procedimento administrativo louvável.

      O SR. ODACIR SOARES - Inclusive os privativistas colocam primeiro na sociedade os chamados mitos. Então, colocaram, relativamente ao petróleo, o mito de que, entregando a exploração para empresas privadas, os preços dos derivados de petróleo cairiam, seriam menores, e, conseqüentemente, o Brasil teria maiores reservas.

      O mesmo eles fazem em relação ao telefone: criam os mitos. Daqui a pouco vou chegar a essa questão do mito das telecomunicações.

      O Sr. Amir Lando - V. Exª deve ter lido recentemente - todos nós ouvimos - a declaração da ex-Primeira-Ministra Margareth Thatcher, em que ela confessa um arrependimento pela privatização exatamente da companhia telefônica da Inglaterra, porque o serviço piorou em qualidade e aumentou o custo.

      O SR. ODACIR SOARES - Exatamente.

      O Sr. Josaphat Marinho - V. Exª me permite um aparte, nobre Senador.

      O SR. ODACIR SOARES - Pois não, nobre Senador.

      O Sr. Josaphat Marinho - Nobre Senador, quero declarar-me solidário com V. Exª quanto ao monopólio das comunicações, como o fiz anteriormente quanto à defesa do monopólio estatal do petróleo. E quero assinalar até um esclarecimento: que V. Exª e eu estamos sendo fiéis ao programa do PFL, que prevê o Estado contido, como todo Estado democrático. Mas ali não se proclama a necessidade da privatização da exploração do petróleo nem das comunicações.

      O SR. ODACIR SOARES - V. Exª tem razão, Senador Josaphat Marinho, até porque prever isso no nosso Estatuto seria admitir explicitamente vender nosso País. Agradeço o aparte de V. Exª, que também enriquece o meu discurso.

      Continuo, Sr. Presidente.

      Primeiro eles batem; batem para valer! Depois, eles sopram as áreas traumatizadas. Batem, porque precisam enfraquecer a empresa estatal. E precisam enfraquecê-la para mais facilmente poderem arrebatar as melhores fatias dos negócios que ela gerencia. E por que só querem umas poucas fatias, não é bom que sejam irremediavelmente danificadas as demais.

      É, então, que se cuida de soprar as áreas traumatizadas, aplicando-lhes o ungüento da flexibilização privatizante. É neste passo que se dizem maravilhas dos países onde as telecomunicações foram privatizadas. Tudo se passa como na panacéia publicitária: "tomou flexibilização e a eficiência reapareceu... como por encanto."

      Para evitar os efeitos contraproducentes de tão danosas manifestações, Sr. Presidente, Srs. Senadores, parece-me de todo recomendável:

      - uma olhada retrospectiva para os países onde as telecomunicações foram privatizadas;

      - uma olhada retrospectiva para o nosso passado, quando já tivemos a oportunidade de utilizar "os bons serviços" de algumas empresas privadas, quase todas estrangeiras, não apenas no campo das telecomunicações, mas também no de abastecimento de água, luz, energia elétrica, gás encanado, assim como no de transporte urbano e interurbano.

      Estou certo de que assim fazendo estaremos capacitados a tirar nossas próprias conclusões, livres das grandes pressões lobísticas a respeito do que as empresas privadas estrangeiras já fizeram e poderão fazer pelas telecomunicações em nosso País, em confronto com o que já fez e poderá ainda vir a fazer a Telebrás.

      Em nossa mirada para os países que "privatizaram" seus sistemas de telecomunicações iremos descobrir, por exemplo:

      - que, logo após a privatização, as tarifas relativas aos serviços sofreram elevação brutal, correspondente a 219% na Argentina; 132% no México e 58,7% na Inglaterra;

      - os investimentos em novas tecnologias só têm-se verificado para as localidades e serviços mais rentáveis, estando reservado às pequenas localidades e áreas rurais os equipamentos obsoletos e os serviços primários.

      Já o relance retrospectivo para o Brasil do passado fará emergir toda uma história de prestação de serviços públicos executados por empresas privadas, na sua maioria estrangeiras. Haverá de acudir à nossa memória, também, nomes pomposos como o da Canadian Traction Light and Power Company, o da Western Telegraphe and Telephone, o da Companhia Telefônica Brasileira, o da Compagnie du Gaz, o da Leopoldina Railways e os nomes de tantas outras empresas.

      Eram serviços precários que foram úteis ao Brasil no tempo do carro de boi e do Jeca -Tatu.

      Quando, porém, o País começou a crescer, elas não só não tiveram motivação para investir em sua própria expansão e melhoria para acompanhar os anseios de crescimento do País, como até preferiram vender suas plantas físicas obsoletas em negócios nos quais quase sempre levamos a pior.

      Mais especificamente, no campo das telecomunicações, o Brasil caminhou tropegamente até a década de 60 com uma estrutura de comunicações muito pobre, precária e inadequada. Nada que justifique o mito criado, hoje, pelos lobistas da privatização: de que basta a simples presença da empresa privada nos serviços públicos para torná-los eficientes, modernos e competitivos.

      Na época, a Companhia Telefônica Brasileira - CTB, subsidiária da Light, concentrada no eixo Rio-S.Paulo-Minas, operava aproximadamente 62% dos terminais telefônicos instalados no País, sendo os 38% restantes divididos entre mais de 800 entidades: prefeituras, médias e pequenas empresas e cooperativas.

      Somente quatro cidades - Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte e Brasília - estavam interligadas por troncos de microondas muito congestionados. O serviço interurbano, feito pela própria CTB, dentro de sua área de concessão, era suplementado por outras empresas (Western Telegraph, Radional), que operavam linhas físicas, cabos submarinos ou enlaces rádio ponto-a-ponto e que geralmente alcançavam outras capitais com apenas um ou dois canais telefônicos então existentes.

      Esse panorama de irritantes deficiências, o qual constituiu a realidade de nossas telecomunicações antes do advento da Embratel e da Telebrás, precisa ser constantemente revivido pela memória nacional não só para que os desprevenidos não se deixem abalar pelo lobby sedutor acionado pelos inimigos do monopólio estatal, mas, sobretudo, para que os brasileiros saibam apreciar e preservar os magníficos empreendimentos efetuados pela Telebrás nos vinte e dois anos de sua existência.

      Nesse curto período, a Telebrás mudou o cenário das telecomunicações no País, tendo logrado marcar sua presença em 100% das cidades e em mais de 16 mil localidades do Brasil; o sistema Telebrás integrou todo o Território Nacional pelas telecomunicações, praticamente erradicando a mudez em que se encontrava o País, quando o sistema foi constituído.

      Composto por 28 subsidiárias, sendo 27 operadoras estaduais e uma operadora interurbana e internacional, a Embratel, administrando a 11a planta telefônica do mundo, responsável por mais de 89 mil empregos diretos e um faturamento anual da ordem de 2% do PIB, o Sistema Telebrás justifica por que é considerado o maior Sistema de Telecomunicações do Hemisfério Sul.

      E não será nunca supérfluo insistir que, graças à Telebrás, o Brasil tem, hoje, nove vezes mais telefones do que há vinte anos e, a cada minuto, dois novos telefones são instalados. A tarifa para chamada local é uma das menores do mundo. Além disso, o Brasil tem hoje mais de 13 milhões de terminais instalados, mais de 300 mil celulares operando e quase 300 mil telefones públicos, dos quais 25 mil operando com cartão indutivo, uma tecnologia de ponta desenvolvida totalmente aqui.

      Por tudo isso, Sr. Presidente, é que permaneço inabalável no meu apoio à preservação do monopólio das telecomunicações brasileiras, em boa hora confiado à Telebrás.

      É o que penso e sustentarei até prova em contrário.

 Obrigado, Sr. Presidente. (Muito bem!)


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 10/05/1994 - Página 2123