Discurso no Senado Federal

ATUAÇÃO DA DELEGAÇÃO BRASILEIRA NA CONFERENCIA MINISTERIAL DE MARRAQUESH, PARA ASSINATURA DE ACORDOS DA RODADA URUGUAI DE NEGOCIAÇÕES COMERCIAIS MULTILATERAIS DO GATT. CRITICAS AO GOVERNO ITAMAR FRANCO.

Autor
Gilberto Miranda (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AM)
Nome completo: Gilberto Miranda Batista
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA EXTERNA. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • ATUAÇÃO DA DELEGAÇÃO BRASILEIRA NA CONFERENCIA MINISTERIAL DE MARRAQUESH, PARA ASSINATURA DE ACORDOS DA RODADA URUGUAI DE NEGOCIAÇÕES COMERCIAIS MULTILATERAIS DO GATT. CRITICAS AO GOVERNO ITAMAR FRANCO.
Aparteantes
Gerson Camata, Lourival Baptista.
Publicação
Publicação no DCN2 de 19/05/1994 - Página 2427
Assunto
Outros > POLITICA EXTERNA. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, PARTICIPAÇÃO, ORADOR, JOÃO ROCHA, SENADOR, QUALIDADE, REPRESENTANTE, SENADO, ENCONTRO, CONFERENCIA INTERNACIONAL, ACORDO GERAL SOBRE TARIFAS E COMERCIO (GATT), REALIZAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, MARROCOS, OBJETIVO, ASSINATURA, ACORDO, COMERCIO, AVALIAÇÃO, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL).
  • ELOGIO, ATUAÇÃO, DELEGAÇÃO BRASILEIRA, DIREÇÃO, CELSO AMORIM, MINISTRO DE ESTADO, ITAMARATI (MRE), ANTONIO CANTUARIA GUIMARÃES, EMBAIXADOR, BRASIL, PAIS ESTRANGEIRO, MARROCOS, DEFESA, TESE, INTERESSE NACIONAL, CONTESTAÇÃO, ACUSAÇÃO, REALIZAÇÃO, ATIVIDADE COMERCIAL, DUMPING, PAIS.
  • CRITICA, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, INEXISTENCIA, PROVIDENCIA, IMPEDIMENTO, CORRUPÇÃO, SISTEMA, SAUDE, HOSPITAL, ESTADO DE RONDONIA (RO), EDUCAÇÃO, PAIS.

    O SR. GILBERTO MIRANDA (PMDB - AM. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, honrado pela indicação de meu nome para compor a delegação brasileira que participou da reunião ministerial em Marraquesh como representante desta Casa, juntamente com o ilustre Senador João Rocha, aproveito a oportunidade para ressaltar, perante este Plenário, a importância daquele Encontro realizado entre os dias 12 e 15 de abril, no longínquo Reino do Marrocos.

    O Encontro Internacional em questão teve por finalidade complementar e ratificar a solução de questões que foram objeto da pauta de trabalho da Rodada Uruguai de Negociações Comerciais Multilaterais relacionadas com o GATT, concluída em 15 de dezembro do ano próximo passado.

    Na reunião de Marraquesh, além da discussão de um grande número de assuntos vinculados ao comércio internacional, firmou-se a Ata Final da Rodada Uruguai, mediante assinatura de mais de cento e vinte países, sem contar a importantíssima medida adotada no sentido da criação da Organização Mundial de Comércio - OMC, que deverá, paulatinamente, substituir o GATT, criado nos idos de 1947.

    Inicialmente, devo testemunhar desta tribuna a atuação da Delegação brasileira a esse evento, chefiada pelo notável Ministro Celso Amorim.

    Na realidade, o desempenho da delegação de nosso País caracterizou-se pelo fiel compromisso às teses de interesse do Brasil perante os demais parceiros comerciais no plano mundial e, bem assim, pelo denodo com que defendeu as posições criteriosamente destacadas.

    De igual forma, cabe registrar a atuação do ilustre Embaixador de nosso País no Marrocos, Dr. Antônio Cantuária Guimarães, que há cinco anos desenvolve um profícuo e incessante trabalho de aprimoramento das relações diplomáticas e comerciais entre o Brasil e o Reino do Marrocos.

    A figura expressiva do eminente Embaixador Antônio Cantuária Guimarães merece o reconhecimento do País em razão dos relevantes serviços que vem prestando ao desempenho das altas funções que exerce no exterior, registrando-se a elevação do volume de exportações brasileiras para o Marrocos, ano a ano, de 30 milhões para 200 milhões nos últimos tempos.

    A experiência e o trabalho eficiente apresentados por esse incansável embaixador já o recomenda para o exercício em países integrantes do chamado Primeiro Mundo.

    Sr. Presidente, Srs. Senadores, voltando ao tema central deste pronunciamento, pretendo deixar consignada a minha satisfação pela performance da diplomacia brasileira no trato das complexas e relevantes questões discutidas na cidade de Marraquesh.

    O discurso do Ministro Celso Amorim foi muito bem recebido pelos participantes dos países em desenvolvimento, em face da corajosa oposição àqueles que nos acusam de promover o chamado dumping social.

    Uma vez caracterizada a ocorrência dessa espécie de dumping, que consistiria na manutenção de parcos e aviltantes salários aos trabalhadores envolvidos nos processos de produção dos bens destinados à exportação por parte dos países periféricos, com a finalidade de redução dos preços perante o comércio internacional, estariam os países do Primeiro Mundo autorizados a impor sobretaxas sobre os produtos importados do mundo subdesenvolvido, para compensar aquilo que denominam concorrência desleal.

    Trata-se na realidade de insustentável sofisma idealizado pelas nações que detêm a supremacia comercial, em detrimento das frágeis economias que caracterizam os Estados subdesenvolvidos ou em fase de desenvolvimento.

    Como bem salientou o Ministro brasileiro, nada justifica a inclusão na agenda da nova Organização Mundial de Comércio desse controvertido tema que, se acolhido e posto em prática, propiciaria a "exportação do desemprego dos países ricos para os pobres, impondo a estes um encargo social insustentável".

    Aliás, sobre essa intrincada questão, manifestou-se o ex-Ministro Celso Lafer, em substancial artigo publicado no jornal Folha de S.Paulo, edição do dia do corrente mês. Com extrema lucidez e objetividade, assim concluiu o eminente professor e cientista política:

      Em síntese, não existe dumping social quando em um regime democrático as relações de trabalho atendem a um standard internacional consagrado no plano interno pela positivação dos direitos econômicos e sociais.

      Esse standard vem sendo elaborado pela Organização Internacional do Trabalho - OIT, criada depois da 1º Guerra Mundial precisamente com esse objetivo. Se existe em um país, como é o caso do Brasil, a tutela da liberdade de associação sindical, do direito de greve, da jornada de trabalho delimitada, do descanso semanal remunerado, das férias, da distinção entre horas extras e horas normais, do mecanismo de seguridade social, da limitação ao trabalho de menores etc., ou seja, basicamente aquilo que vem previsto na convenção da OIT, as relações e a organização de trabalho estão pautadas no mercado interno pela prevalência da democracia dos direitos humanos.

      Os Estados Unidos e a União Européia, que têm feito da afirmação da democracia dos direitos humanos no campo dos valores e dos méritos do mercado no campo econômico, vetores de sua ação diplomática, em função mesmo das disparidades salariais existentes no seu próprio âmbito interno, não têm como, em boa-fé, contestar esse argumento que desqualifica, como base no mérito e na realidade, a tese do dumping social.

    O Sr. Gerson Camata - Permite V. Exª um aparte, Senador?

    O SR. GILBERTO MIRANDA - Ouço V. Exª, Senador Gerson Camata.

    O Sr. Gerson Camata - Nobre Senador Gilberto Miranda, ouvindo o depoimento e o relatório de V. Exª, que esteve no encerramento da Rodada Uruguai do GATT, fico a pensar como o Brasil é um País diverso, diferente nas suas várias áreas e nos seus vários compartimentos. Se olharmos o setor público, veremos a degradação - e há pouco comentava-se aqui - do ensino público; assistimos diariamente à televisão e observamos, percebemos que todas as vezes que um brasileiro procura um hospital, o atendimento por ele recebido é pior; se andarmos pelas estradas brasileiras, perceberemos que elas estão se acabando, não estão sendo conservadas como um enorme patrimônio acumulado pelo País. Mas há alguns setores da administração brasileira que são ilhas de excelência, apesar desse processo doloroso que sentimos quanto à perda de qualidade do serviço público, da prestação desses serviços aos cidadãos. Na área da saúde, se observamos a queda do padrão, o não-atendimento, a queda da qualidade, às vezes até a queda do padrão ético dos profissionais de Medicina, vemos a rede Sara Kubitschek, dirigida pelo Dr. Campos da Paz, que nem a iniciativa privada consegue superar. E, no contexto do panorama geral do serviço público brasileiro, devemos aplaudir, permanentemente, o pessoal do Itamaraty. Atravessaram o período populista de Jango, o período militar, voltamos para o regime democrático, e o Itamaraty continua sendo uma ilha de excelência pelos serviços prestados ao País. É até um modelo para o mundo; vários diplomatas e estudantes pretendentes à carreira diplomática de países africanos, da América Latina, estão vindo fazer seus cursos no Instituto Rio Branco. E quem, como V. Exª, acompanhou e teve o privilégio de assistir ao encerramento dessa Rodada Uruguai, percebeu, ao longo desses seis ou sete anos, a pressão que os países do Primeiro Mundo começaram a fazer sobre os países subdesenvolvidos; queriam criar uma espécie de privilégio para eles, que já são privilegiados no sistema mundial de desenvolvimento. E se percebeu sempre a posição coerente do Brasil, de alinhamento com os países em desenvolvimento, mas praticamente uma posição de liderança dos países subdesenvolvidos. Perdendo em alguns momentos, vencendo em outros, o Itamaraty prosseguiu, liderando os diplomatas brasileiros que nunca perderam o rumo e a orientação que era aquela que interessava ao Brasil, mas que interessava também aos outros países do Terceiro Mundo que foram alinhando-se com nosso País nas posições brasileiras ali defendidas, como uma espécie de doutrina nesse setor. Chega-se agora ao final das negociações na reunião da qual V. Exª participou, e nossa posição foi ampla e nitidamente a posição do mundo. O que era no começo apenas uma posição da diplomacia brasileira, foi praticamente o resultado final da rodada de negociações que foi penosa, dura e estendeu-se durante muito tempo. É hora de dizermos que os demais setores do serviço público deveriam se mirar no pessoal do Ministério das Relações Exteriores, apesar de toda a crise e dificuldades pelas quais passa o nosso País. Sabemos que há até pouco tempo não havia sequer recursos para os aluguéis dos consulados e embaixadas. No entanto, a qualidade humana, a vontade de prestar serviço não se desfez diante da crise atravessada pelo Itamaraty. Os resultados, positivos, estão aí, sendo colhidos permanentemente. Dois deles V. Exª enumera aqui: o coletivo, que é a participação desses profissionais da diplomacia ao longo de todo o processo da Rodada Uruguai no GATT e, o outro, um diplomata brasileiro -isolado no Marrocos -, que multiplica de 36 milhões para 200 milhões de dólares o comércio entre os dois países. O discurso de V. Exª, tenho certeza, é uma conclamação daquilo que o Brasil pode fazer; de que setores do serviço público que se perdem e se degradam podem se recuperar se se mirarem na imagem, no profissionalismo e na dedicação do pessoal do Ministério das Relações Exteriores. Invejo V. Exª, que teve o privilégio de estar nessa conferência final, que foi um evento histórico, e certamente, V. Exª dirá aos seus netos que dele participou.

    Ao mesmo tempo, cumprimento V. Exª pela apreciação que faz, destacando, perante o Plenário do Senado, essa atuação tão firme, tão profissional e tão bonita, da qual nós, brasileiros, muito nos orgulhamos, que é o desempenho profissional dos membros do Ministério das Relações Exteriores. Eles nunca perderam a orientação e o rumo a seguir quando ditam os interesse do povo brasileiro, que são, coincidentemente, os da maioria dos países em desenvolvimento. Cumprimento V. Exª pela exposição que faz, pelo relatório que apresenta e pela visão que tem, quando aponta esse caminho, que é o do profissionalismo, o do amor à Pátria, o da dedicação e o do estudo, que faz com que o Brasil seja, talvez, diplomaticamente, um dos Países que têm competência para definir os seus objetivos e uma competência maior ainda para alcançá-los. Muito obrigado a V. Exª

    O SR. GILBERTO MIRANDA - Agradeço a V. Exª pelo aparte, nobre Senador Gerson Camata.

    Creio que tivemos oportunidade de observar o exemplo sobre o que V. Exª acaba de dizer, há poucos dias, na convenção do nosso partido, no Estado do Espírito Santo.

    Entendo que é V. Exª o exemplo de vida pública!

    Antes de me manifestar sobre os assuntos a que V. Exª se referiu, quero dizer que, quando toda a população diz que a classe política não é séria, não é direita e está envolvida em falcatruas; vemos um candidato do nosso partido, do PMDB, em primeiro lugar nas pesquisas para Governador do Estado - candidato sem concorrente -, não aceitar a indicação para disputar o cargo. É corajosa a sua posição.

    Porém, acredito que V. Exª não pode deixar de disputar as próximas eleições para o Senado; deve voltar a esta Casa e continuar abrilhantando o Brasil e o seu Estado.

    É realmente lamentável que o PMDB, que o povo do Estado do Espírito Santo, enfim, que a Nação brasileira não possa contar com o seu auxílio como administrador. V. Exª, que foi Vereador, Deputado Estadual, Deputado Federal e Governador - e que tem todas as chances novamente de ser aclamado como Governador de Estado - dá o exemplo quando não quer disputar as eleições, enquanto tantos outros estão brigando pelo cargo diuturnamente.

    Com relação ao ensino, às estradas, à Educação e ao sistema de saúde brasileiros, V. Exª tem toda razão. O Governo, mesmo no final da sua gestão, tenta redesenhar o Estado porque tem meios para isso. Nesses sete meses que ainda restam, ele teria condições de fazer algo, mas estamos com o Estado literalmente abandonado. Parece que há um desencanto por parte da Presidência da República.

    Vivemos em um regime presidencialista. Porém, abrimos os jornais e deparamo-nos com toda a sorte de assuntos, mas não vemos o Presidente orientando os seus subordinados e os seus Ministros.

    Ficamos assustados quando, hoje, ainda lemos nos jornais, depois de um ano, sobre o superfaturamento da usina de Xingó. Em relação ao Governo, as matérias relatam apenas os piores momentos.

    O Hospital Sarah Kubitschek, citado por V. Exª, é um exemplo fantástico, visto que tive a oportunidade, lamentavelmente - quando fiquei praticamente um ano de muleta -, de contar com o trabalho dos profissionais daquele hospital.

    Por outro lado, vemos a rede hospitalar envolvida em falcatruas. Sem dúvida nenhuma, os funcionários ganham mal e o Governo atrasa o pagamento, mas isso não justifica a falsificação dos nomes dos clientes e todas as atitudes irresponsáveis das quais fazem parte os hospitais.

    Com relação à classe diplomática brasileira, nobre Senador Gerson Camata, fiquei impressionado ao constatar o trabalho dos nossos profissionais no Marrocos, nessa convenção. Havia aproximadamente 10 embaixadores trabalhando num quarto de hotel, daqueles mais baratos, porque o dinheiro era pouco. Na oportunidade, tivemos até a necessidade de visto extra para o Senador João Rocha e vimos como o Embaixador Antônio Cantuária e outros se manifestaram em nosso auxílio.

    Presenciamos também o tratamento dispensado, nas últimas horas, para a avaliação do MERCOSUL com relação à rodada completa do Acordo de Marraquesh.

    Sr. Presidente, Srs. Senadores, até nos últimos minutos, os embaixadores brasileiros participavam de reuniões com os Países vizinhos na América do Sul.

    O trabalho do Embaixador Antônio Cantuária, no Marrocos, é um exemplo que deveria ser seguido por todos os embaixadores do mundo.

    Há cinco anos o Brasil vendia aproximadamente 30 milhões de dólares por ano ao Marrocos; hoje, vende 200 milhões e só não vende mais por falta de financiamento. A meu ver, apenas esse fato já credencia um embaixador como aquele para ser promovido, para ser levado a um outro País de maior dimensão e, conseqüentemente, parar mostrar a todos os membros da carreira diplomática que, quando se trabalha, pode-se ascender, e não apena ser promovido via Presidência da República.

    O Sr. Lourival Baptista - Permite-me V. Exª um aparte, nobre Senador Gilberto Miranda?

    O SR. GILBERTO MIRANDA - Com prazer, nobre Senador Lourival Baptista.

    O Sr. Lourival Baptista - Estou ouvindo V. Exª com a maior atenção e solicito interferir-me no seu discurso referente ao Embaixador Antônio Cantuária Guimarães. Quero dizer que V. Exª, na verdade, faz justiça a um diplomata que é, acima de tudo, um homem que presta e tem prestado relevantes serviços ao Brasil na sua carreira de embaixador. Tudo o que V. Exª disse, subscrevo. O Embaixador Antônio Cantuária Guimarães honra o ltamaraty e o Brasil.

    O SR. GILBERTO MIRANDA - Nobre Senador Lourival Baptista, agradeço o aparte e a forma com que V. Exª se refere ao Embaixador Antônio Cantuária, especialmente quando vemos os salários que os embaixadores brasileiros ganham no exterior.

    Imagine V. Exª que um embaixador, no exterior, como, por exemplo, no Marrocos, ganha um salário em torno de 5 mil dólares! E tem de receber e convidar autoridades. Se quiser promover o comércio, tem de, efetivamente, oferecer coquetéis e fazer visitas. A embaixada brasileira, entretanto, tem pouquíssimos recursos não apenas no Marrocos, mas no mundo inteiro.

    Penso que está na hora de verificarmos com olhos diferentes o que acontece nas embaixadas brasileiras e os salários dos nossos diplomatas. É impossível vender sem ter condições de promover o comércio internacional.

    Vimos, recentemente, o próprio Presidente Bill Clinton interferir numa concorrência na Arábia Saudita com relação à telefonia, porque concedia àquele País um contrato de 4,5 bilhões de dólares. Em outra oportunidade, o mesmo presidente fez algo semelhante com relação aos armamentos.

    Creio que a Presidência da República deveria seguir esses exemplos.

    Fico assustado quando Sua Excelência, por medo de avião ou, talvez, por falta de vontade, cancela uma viagem à China. A China tem um comércio promissor, tem tudo para que o Brasil possa exportar. É um país de um 1 bilhão e 200 milhões de habitantes. E não vemos, em nenhum momento, o Presidente demonstrar interesse de alargar os laços comerciais com aquele país.

    Sr. Presidente, Srs. Senadores, voltando à reunião do GATT.

    A defesa desse entendimento, de resto promovido pelo Brasil em Marraquesh, é vital para a própria sobrevivência das nações, às quais se imputa a ocorrência de fatores tendentes a reduzir o custo da mão-de-obra, com o objetivo de diminuir, artificioso e desumanamente, o preço do produto exportado.

    A partir da reunião de Marraquesh, o mundo passou a conhecer oficialmente a posição brasileira acerca dessa questão.

    Mas, Sr. Presidente, Srs. Senadores, pretendo, nesta oportunidade, registrar alguns dos mais importantes reflexos advindos da celebração de diversos acordos na mencionada reunião de Maraquesh.

    Em primeiro lugar, cabe observar que diligentemente as autoridades brasileiras mantiveram contatos prévios com os nossos parceiros no MERCOSUL, no sentido de que fosse assegurada uma atuação harmônica e coordenada com o objetivo de preservar as normas comuns adotadas por esse grupo de nações no extremo sul do Continente.

    Com base na Exposição de Motivos e na Ata Final, onde o Ministério das Relações Exteriores desenvolve resumida apreciação sobre o acordo de declarações relacionadas com a Rodada Uruguai do GATT, destaco alguns pontos que me parecem de grande relevância para o nosso País.

    Prevê-se, mediante adoção das medidas de liberação comercial assumidas pelos contratantes, redução tarifária média global de 40% nos próximos 6 anos, cabendo observar que o aprimoramento das regras disciplinadoras das soluções de controvérsias do chamado antidumping e das salvaguardas proporcionará a diminuição da capacidade unilateral das relações de comércio, que acabam de beneficiar, sistematicamente, as grandes potências.

    O Brasil, concretamente, haverá de se beneficiar, a partir da vigência de diversas medidas aprovadas, as quais propiciarão, por exemplo, a queda de aproximadamente 36% das tarifas aplicadas sobre produtos brasileiros por parte da União Européia, de 24% por parte dos Estados Unidos da América e de 57% por parte do Japão.

    Ora, tal redução tarifária provocará certamente o aumento de nossas exportações, especialmente quando se constata que inúmeros produtos de nossa pauta já tiveram suas alíquotas reduzidas a zero, tais como a polpa, o papel, a madeira, a cerveja, o aço, os não-ferrosos, consignando-se que, após dificílimas negociações, obtivemos ganhos reais nos setores de calçados e de sucos de laranja.

    Sensível mudança foi introduzida no setor agrícola, cujo acordo, agora sob a égide do GATT, prevê regras específicas tendentes a reverter as políticas protecionistas, o que, aliado a outras providências, diminuirá a concorrência desleal de nossos produtos em terceiros mercados.

    Outro aspecto que merece registro é o acordo sobre têxteis e vestuário, que prevê o gradual "descontingenciamento" às exportações, mediante a "desconstituição" do Acordo Multifibras. No período de 10 anos, o comércio têxtil deverá estar integrado às disciplinas reforçadas do GATT, representando uma ambiciosa conquista do Brasil de acesso aos mercados mais desenvolvidos.

    Também o setor de serviços passará a ter maiores oportunidades de penetração no mercado internacional, através do "acordo-quadro" que, mediante normas e princípios flexíveis, possibilitará a maior liberalização do comércio e, por via de conseqüência, a maior participação do nosso País neste importante setor da economia.

    A propriedade intelectual não deixou de ser alvo das negociações entabuladas e afinal ratificadas em Marraquesh, destacando-se o fato de que o texto oriundo da Rodada Uruguai serve de base para a elaboração das emendas oferecidas pelo Poder Executivo aos projetos sobre a matérias que tramitam no Congresso Nacional.

    Em suma, cabe ressaltar a enorme relevância desse evento internacional que, em boa hora, vem introduzir sensíveis alterações nas principais normas de regência das relações comerciais de cunho internacional, especialmente no sentido de estabelecer um sistema integrado visando à solução de controvérsias de forma mais rápida, eficiente e transparente, propiciando, assim, a redução de arbitrariedade e unilateralismo das grandes potências comerciais, em detrimento das nações em desenvolvimento.

    Esses, Srs. Senadores, são alguns dos temas mais candentes abordados pela representação do nosso País que, volto a afirmar, portou-se de forma incensurável, fazendo com que todos os brasileiros presentes àquele evento se sentissem orgulhosos do seu país.

    Além das autoridades já mencionadas, cabe registrar a eficiente atuação dos demais participantes da prestimosa equipe enviada pelo Itamaraty, ressalta-se os Srs. Embaixadores Luiz Felipe Lampreia, Paulo Nogueira Batista, Affonso Celso de Ouro-Preto, José Artur Denot Medeiros, além de Ministros e Secretários daquele Ministério.

    Mas, Sr. Presidente e Srs. Senadores, um aspecto que chamou a atenção deste Senador, na visita ao Marrocos, país que proclamou a sua independência em 1956, foi a política de privatização adotada pelo governo daquele país.

    Com uma economia voltada predominantemente para a agricultura, mas com uma significativa produção de fosfato e, em

menor escala, de ferro, carvão, manganês, chumbo, petróleo, zinco e cobalto, o Reino de Marrocos procura atingir melhores índices de desenvolvimento mediante a privatização de seu parque industrial e de suas rodovias, dentre outros setores.

    Eis aí mais um exemplo de abertura econômica a ser seguido pelo Brasil, que teima em manter a idolatria da xenofobia, que tanto tem contribuído para emperrar a máquina estatal e, por conseqüência, o próprio desenvolvimento do País.

    Muito obrigado. Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 19/05/1994 - Página 2427