Discurso no Senado Federal

CRITICAS A INERCIA DO CONGRESSO NACIONAL QUANTO A FREQUENTES REEDIÇÕES DE MEDIDAS PROVISORIAS PELO EXECUTIVO.

Autor
Epitácio Cafeteira (PPR - Partido Progressista Reformador/MA)
Nome completo: Epitácio Cafeteira Afonso Pereira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
MEDIDA PROVISORIA (MPV).:
  • CRITICAS A INERCIA DO CONGRESSO NACIONAL QUANTO A FREQUENTES REEDIÇÕES DE MEDIDAS PROVISORIAS PELO EXECUTIVO.
Aparteantes
Esperidião Amin, Mauro Benevides, Pedro Simon.
Publicação
Publicação no DCN2 de 26/01/1995 - Página 1182
Assunto
Outros > MEDIDA PROVISORIA (MPV).
Indexação
  • CRITICA, OMISSÃO, CONGRESSO NACIONAL, AUTORIZAÇÃO, EXECUTIVO, REEDIÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV).
  • QUESTIONAMENTO, CONSTITUCIONALIDADE, REEDIÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), FUNDAMENTAÇÃO, ARTIGO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
  • NECESSIDADE, LEGISLATIVO, DEFESA, PRERROGATIVA, RELAÇÃO, LEGISLAÇÃO, PARTICIPAÇÃO, CONGRESSISTA, REJEIÇÃO, ACORDO, VOTAÇÃO, LIDERANÇA, PARTIDO POLITICO.

O SR. EPITACIO CAFETEIRA (PPR-MA. Como Líder. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, citado pelo nobre Líder do PDT, Senador Magno Bacelar, pelo que falei ontem sobre medidas provisórias, quero esclarecer alguns pontos.

Em primeiro lugar, o Presidente do meu Partido, nobre Senador Esperidião Amin, enviou-me correspondência, referindo-se à emenda constitucional que apresentará para disciplinar medidas provisórias.

O primeiro discurso que fiz nesta Casa, há quatro anos, tem o título: Reedição de Medida Provisória é inconstitucional. Esse discurso está à disposição de qualquer um dos meus colegas.

Quero deixar claro meu entendimento: a medida provisória é, na realidade, um projeto de lei. Tanto assim que está claro na Constituição: "se não for aprovada e transformada em lei dentro de 30 dias, é considerada rejeitada". Então, é um projeto de lei com eficácia imediata. Ninguém contestou esse discurso e todos os apartes que recebi foram nesse sentido. A medida provisória é semelhante ao decreto-lei, que tinha, todavia, uma redação inversa. Se não fosse rejeitado dentro de 30 dias, era considerado aprovado.

E o que vem fazendo o Governo? Reedita a medida ao se aproximar o 30º dia. Ora, se em 30 dias não é aprovada, considera - rejeitada, e não pode, na forma da Constituição, ser reapresentada na mesma sessão legislativa, exceto se houver assinatura da maioria absoluta dos membros de uma das Casas do Congresso.

Sr. Presidente, o Congresso vem apenas reclamando. O Poder Executivo, desde os tempos de "Dom" Fernando Collor de Mello, pisa o pé do Congresso, que geme diz: "tira o pé de cima do meu", mas não reage. E a inércia do Congresso está levando a essa situação, porque há sempre o receio de desagradar a um Presidente.

O Presidente, na realidade, diante desse simples gemido do Legislativo, vai governando com medidas provisórias e já entrou em todos os campos.

O Sr. Pedro Simon - Permite V. Exª um aparte?

O SR. EPITACIO CAFETEIRA - Pois não. Ouço o aparte de V. Exª, nobre Senador Pedro Simon, ainda Líder porque não passou a faixa para o seu sucessor..

O Sr. Pedro Simon - Que o nobre Senador Elcio Alvares não fique magoado com essa provocação - S. Exª sabe que todos nós o vemos com muito respeito. Nobre Senador, V. Exª levantou uma questão da maior importância. Volto a repetir: estamos vivendo um momento novo da vida do Senado e do Congresso. Recebi, hoje pela manhã, a emenda do Senador Esperidião Amim. S. Exª disse que iria apresentá-la e o fez. Baseados nela, então, teremos que debater. Creio que o nobre Senador Esperidião Amin tem toda razão, talvez esse seja um dos assuntos mais importantes sobre o qual o novo Congresso deva discutir. Não cabe, aqui, mencionar o Presidente Itamar Franco, ou o Presidente Fernando Henrique Cardoso, ou o Presidente Fernando Collor de Mello, ou seja quem for. Na verdade, temos que decidir essa matéria. O mundo mudou. Ao Congresso cabe legislar e fiscalizar. O legislar, como era antigamente, não vai voltar. Em primeiro lugar, temos que discutir o legislar, o Legislativo com o Executivo. O Executivo também vai legislar, vai mandar projetos e nós vamos ter que votá-los. Terminou aquela época do Congresso no Palácio Tiradentes, em que um projeto entrava e ficava na gaveta, porque os Deputados progressistas não tinham maioria, porque os Deputados mais conservadores não queriam votar contra, porque votar contra era antipático. A época em que o Dr. João Goulart ia para as ruas, havia as reformas de base, os " vota, não vota, deixa de votar, não deixa de votar", isso também terminou. A Revolução acabou com o decreto-lei. O decreto-lei foi o grande responsável pelo esvaziamento do Congresso Nacional. Volto a repetir que a orientação - fui Senador à época do decreto-lei e posso dizê-lo - para o Parlamentar da ARENA era: "Vai para casa. Quer cumprir a sua obrigação? Vai para casa, não fica aqui para votar." Porque o decreto-lei, se não fosse rejeitado em 30 dias, era considerado aprovado. Durante os 20 anos do regime militar, colocou-se na cabeça dos Senadores e Deputados que cumprir a obrigação era ir para casa, era não estar presente para votar. E para nós, do MDB, era uma guerra. Vivíamos pedindo, pelo amor de Deus, para o Parlamentar ficar para votar. E ele respondia que não ia ficar porque não ia haver quorum. Ia ficar aqui bancando o besta, se não havia quorum? Retiro a palavra que disse há pouco, pois estou recebendo uma simpática admoestação do Senador Josaphat Marinho. Ia ficar aqui bancando o bobo? Nem bobo posso dizer! Ia perder tempo, então. Se não ia haver quorum, por que iria perder o seu tempo? Veio a Constituinte. A Comissão de Sistematização votou uma Constituição parlamentarista. Vamos deixar claro: não houve erro dos Constituintes. Não fui Constituinte, mas posso dizer que não houve erro dos Constituintes quando votaram a medida provisória, porque a medida provisória é da essência do regime parlamentarista. O Ministério coloca a medida provisória, que vai para o Congresso. Cai a medida provisória, cai o gabinete. Na Itália, a medida provisória tem causado a queda de vários gabinetes, porque é o confronto entre o Congresso e o gabinete. Aprovada a medida provisória, vitória do gabinete. Rejeitada a medida provisória, cai o gabinete. Já houve casos em que o Presidente da República dissolveu o Congresso para fazer nova eleição. No Brasil, entrou a medida provisória e caiu o parlamentarismo. Foi uma piada. Vamos falar, com toda sinceridade: quem de nós, na Presidência da República, podendo baixar uma medida provisória, hoje, às nove horas da noite, não o faz? Em seguida, é só mandar publicar no Diário Oficial, que sai no dia seguinte. Já é lei. É lei do menor esforço, porque o Executivo já não pensa, já não analisa. Saiu errado, publica novamente. É um círculo vicioso. Não dá para acusar ninguém, porque também somos responsáveis. Desde que foi promulgada a nova Constituição, as medidas provisórias são editadas, passam-se trinta dias, nós não aprovamos nem rejeitamos. Trinta dias não são suficientes para fazer a leitura, nomear comissão, escolher relator, presidente, apresentar a proposta, rejeitar ou aprovar. Parece-me que a emenda do Senador Esperidião Amin aumenta esse prazo. Não há dúvida de que esse prazo tem que ser aumentado. O que tem acontecido? O Governo edita a medida provisória, e a Câmara e o Senado não aprovam nem rejeitam. Às vezes, por comodismo, não decidimos, porque são projetos complicados. A anuidade escolar é um caso típico. Vamos ter que decidir quem tem razão: os alunos ou os donos de escolas? Mas, para que decidir, se isso é coisa de medida provisória? O Presidente que se rale! Felicito o Senador Esperidião Amin por colocar a matéria à discussão, porque é uma matéria decisiva. Quando falo em novo Congresso, estou falando dessas matérias de fundamental importância. Vamos decidir como vai ser a nova medida provisória: o prazo, a reedição. Vamos decidir se serão 60 dias, se poderá haver uma reedição ou se não poderá haver nenhuma. Mas vamos decidir. Depois da decisão, vamos votar. O Congresso vai aprovar ou rejeitar, dentro do prazo que estipulamos. O tema levantado por V. Exª, nobre Senador Epitacio Cafeteira, é da maior importância. Entretanto, se me perguntassem qual a matéria mais importante a ser discutida pelo novo Congresso, eu diria: a medida provisória. E as decisões devem ser tomadas pelos 81 Senadores. Os Líderes podem coordenar, mas a decisão será dos 81, com pauta predeterminada. Na minha opinião, vamos nos reunir de segunda a segunda, todos os dias da semana, um dia atrás do outro, dez dias... Precisamos resolver! Comentei com o Senador Esperidião Amin que talvez fosse o caso de debatermos a questão do quorum, para que cada um seja chamado à responsabilidade, com publicação permanente das decisões e das presenças nesta Casa. No momento em que a decisão da pauta for dos 81 Senadores, e no momento em que todos souberem o que vão votar, tenho certeza que todos os 81 estarão aqui presentes. Não será como atualmente, quando os Líderes decidem, os outros Senadores comparecem à Casa, mas 90% das vezes vêm, vão embora e ninguém toma conhecimento das suas presenças. Por quê? Porque só votam quando é pedida a verificação de quorum. Mas se eles vêm e sabem o que vão votar, que os seus votos são importantes e decisivos, eles votarão. É o que penso. V. Exª está levantando um assunto da maior importância, que merece ser debatido exaustivamente, e não apenas um discurso. A proposta do Senador Amin é importante. Precisamos debater, analisar e chegar a uma conclusão.

O SR. EPITACIO CAFETEIRA - Senador Pedro Simon, não quero fazer deste discurso um pot-pourri. V. Exª traz um assunto que também é importante.

Esta Casa faz sessões extraordinárias sem aviso prévio a seus membros. Toca a campainha, quem estiver aqui comparece, quem não estiver não comparece. Outro dia, saí daqui às 23h30min. e não havia mais nada programado. No dia seguinte, fomos informados de que houve uma sessão depois da meia-noite; uma sessão de 7 minutos, mas houve. Se não houver uma pauta predeterminada, estaremos colaborando para o fechamento do Congresso Nacional.

Não tenho dúvida, nobre Senador Pedro Simon, que um pedido de urgência, antes de tudo, assim que for aprovado, tem que ser comunicado a cada Senador. Se cada um de nós tem um fax, por que a Mesa não nos transmite a informação de que tal matéria teve a sua votação determinada em regime de urgência urgentíssima, para que cada um tome conhecimento?

Ficamos nós sem saber o que vamos votar. A pauta, muitas vezes, é feita na última hora. Das sessões ordinárias, pelo menos, sabe-se com 24 horas de antecedência, mas das extraordinárias ninguém sabe, sendo que nestas são aprovadas muitas das matérias mais importantes.

Nobre Senador Pedro Simon, se regulamentássemos a medida provisória, dizendo que pode ser reeditada uma ou duas vezes, estaríamos entendendo que ela é passível de reedição.

A minha colocação é a de que não se deve reeditar. O prazo de 30 dias é pequeno, mas o Governo não deixa sequer o Congresso Nacional rejeitar, porque, antes dos 30 dias, ele a reedita com outro número, às vezes até com alguma alteração na redação. Foi o que ocorreu com as medidas provisórias das mensalidades escolares. Foram oito reedições. Quantas objeto de ação judicial? Quanto o Governo gastou com isso?

Esta é uma realidade, e nós nos limitamos a reclamar. A reclamação é o quanto basta: reclamou, fez um discurso? Tudo bem! Não, não está bem. É preciso que o Congresso Nacional, como Poder Legislativo, procure saber qual é a competência do Poder Executivo de legislar.

Que força tem a reedição; ela deve, pode, ou não existir? Por que não fizemos uma consulta ao Supremo Tribunal Federal? Por que não perguntamos se a reedição é ou não inconstitucional? Isso é importante, pois é o nosso direito que está sendo usurpado. Não falo isso em função do Presidente Fernando Henrique Cardoso; falei isso quando era Presidente o Sr. Fernando Collor, em discurso, em abril de 1991.

Peço a V. Exªs que reflitam sobre esta situação. Estamos hoje com 70 e poucas medidas provisórias; no dia 1º de fevereiro teremos que substituir titulares e suplentes, de setenta e poucas comissões, tendo em vista a mudança dos membros do Senado Federal. Estou na minha função de Líder, tenho que informar aos meus liderados.

Vejo que estamos posando de legisladores e assistindo ao Poder Executivo legislar e ainda dizer: o Congresso não vota... o Congresso não faz...

Estava junto com V. Exª quando lutávamos para ter quorum e quando íamos ganhar, o que se via era os parlamentares dizerem: vamos sair do plenário para não dar número, sejamos omissos. É a obstrução da maioria. Nobre Senador, algo inédito no mundo: a maioria fazer obstrução em função do decreto-lei. Agora, quanto à aprovação da medida provisória, o Governo tem que colocar o seu Parlamentar no plenário.

V. Exª fala que a Constituição Federal foi feita para o parlamentarismo. Não concordo com V. Exª, até fiz uma digressão, há muito tempo. A Constituição Federal foi feita como quem manda fazer uma estátua; faça-me uma estátua nua que quero colocar na praça. A pessoa, que esculpia a estátua, modelou um corpo feminino muito bonito. Na hora da conclusão, aquele que mandou fazer a estátua disse: É do sexo masculino, pode colocar os órgãos; e ficou esta aberração: uma estátua com corpo de mulher e com sexo masculino.

É a Constituição que permite que uma medida provisória caminhe por cima do Congresso. O regime de governo foi a última coisa a ser definida, por isso esta Constituição está deturpada, nobre Senador Pedro Simon. Temos que encontrar uma maneira de solucionar este problema. O desejo do nobre Senador Esperidião Amin é corretíssimo. S. Exª quer, pelo menos, colocar freio em coisas que estão extrapolando. Mas o próprio projeto que o nobre Senador Mauro Benevides pede que seja posto em pauta, é um projeto do ex-Deputado, hoje Ministro da Justiça, Nelson Jobim, disciplina esta matéria. Não votarei contra esse projeto. Não vou defendê-lo, porque continuo considerando inconstitucional a reedição de medidas provisórias, mas não criarei obstáculo algum, e o PPR não obstacularizará, pois é preciso que haja alguma disciplina, para sermos respeitados como legisladores.

O Sr. Esperidião Amin - V. Exª me permite um aparte?

O SR. EPITACIO CAFETEIRA - Ouço V. Exª com prazer.

O Sr. Esperidião Amin - Estando inscrito, se não estou enganado, para falar em seguida, quero oferecer um aparte muito breve e exatamente neste ponto que V. Exª, Senador Epitacio Cafeteira, está abordando. Deixo muito claro que, no meu modesto ponto de vista, só uma emenda à Constituição poderá pôr cobro, pôr fim à reedição de medidas provisórias que está institucionalizada. A essa altura, dizer que a Constituição não queria que houvesse a reedição é negar os fatos que estão ocorrendo desde 1988: medidas provisórias estão sendo reeditadas. Ora, o então Deputado Nelson Jobim entendeu que poderia pôr cobro a isso através de um projeto de lei complementar que foi aqui defendido brilhantemente, depois de passar pela Câmara, pelo Senador Pedro Simon. Ofereci um aparte no dia 22 de maio de 1991, apoiando-o - tenho aqui as notas taquigráficas. Votaria a favor, e voto de novo, mas fui alertado pelo Senador Bisol, que ponderou, à época, também no dia 22 de maio - está no Diário do Congresso do dia 24/05/91 -, que somente uma alteração da Constituição proibiria a reedição de medidas provisórias. Por esta razão, primeiro, se quiserem colocar em votação peço ao Líder do Partido que assine o requerimento. Peço, porque o PPR não obstaculizou e não quer obstaculizar uma deliberação sobre o assunto. Mas entendo que só uma emenda constitucional poderá pôr cobro a isto que o Senador Pedro Simon muito bem disse: é o abusivo apetite do Poder Executivo e a inapetência, a omissão, o comodismo nosso - meu também. Como disse o Senador Pedro Simon, é muito fácil: bola dividida, deixa para o Poder Executivo. Para que vamos nos meter em mensalidade escolar, se o Poder Executivo vai reeditar? Isso é uma perversão. A palavra certa para isso é "perversão". O Executivo se perverte ou é pervertido, como o Senador Pedro Simon disse: "manda preparar, segura o Diário Oficial". As medidas provisórias passam a ser uma rotina e o que é pior: decidida pelo quinto escalão, senão não sairia uma medida provisória, determinando, por exemplo, legislar sobre o sal iodetado, através de medida provisória. Medida provisória é um instituto extremo e até por acordo de cavalheiros já se chegou a isso - faço questão de referir neste aparte. Em 1991, não foi porque o Presidente Collor mudou, foi porque o Congresso reagiu que baixou para 11 medidas provisórias num ano. Em 1992, com dois Presidentes da República foram 10 medidas provisórias apenas. E, no ano passado, foram 405. Então, excesso de apetite do Poder Executivo e acomodação do Poder Legislativo. Mas voltarei ao assunto quando tiver a palavra. O que desejo dizer ao nobre Senador Epitacio Cafeteira é que, independente dessa questão jurídica, no seu discurso, já falava em ser contra uma reedição. Acontece que elas estão sendo feitas. O que está acontecendo é uso e costume. Para pôr cobro a isso, se for a lei complementar o caminho, creio que ela tenha um grande padrinho: o autor. Vai ser um pouco difícil o Poder Executivo questionar... Já imaginou o Ministro da Justiça, Nelson Jobim, mandar o Advogado-Geral da União ou uma autoridade do Poder Executivo questionar a constitucionalidade de um projeto de lei do Deputado Nelson Jobim? O que torna esse projeto de lei forte é o seu autor. Por isso, creio que devamos votar a favor, caso venha à votação. Entendo que é um assunto muito sério ou o mais importante. Não sou o dono da verdade, mas quero participar de uma solução. De acordo com que aprendi no meu Estado - cada um de nós aprende onde já trabalhou -, a Constituição catarinense proíbe a reedição de medida provisória no mesmo ano. Existe a medida provisória - lá ela vigora por 30 dias, pois a Assembléia é um ambiente menor do que o Congresso Nacional -, mas não tem uma reedição no mesmo ano. No ano seguinte pode. Edita algo, ou então, no lusco-fusco, ou seja, na passagem do ano até consegue. É isto que estou propondo: 60 dias de vigência, e, no lusco-fusco, ou seja, somente na transição de um ano para o outro poderá reeditá-la. Desejava fazer um breve aparte, mas acabei me alongando. Congratulo-me com a colocação de V. Exª. Penso que o nosso Partido está sendo absolutamente coerente. Posição que V. Exª defendeu em 1991 e que defendi em 1992, aparteando o Senador Pedro Simon. O manifesto do nosso Partido, de 27 de outubro de 1993, a propósito da Revisão Constitucional, ao trazer hoje este assunto a lume, não como dono da verdade, mas reconhecendo um erro e a necessidade de corrigi-lo.

O SR. EPITACIO CAFETEIRA - Agradeço-lhe o aparte, nobre Senador Esperidião Amin.

Felizmente não estamos na Inglaterra, não temos direito consuetudinário, senão a medida provisória já estaria consagrada e, a partir daí, não teríamos nem condição de reclamar.

Chamo a atenção desta Casa para a maneira como foi redigido o parágrafo único do art. 62:

Art. 62...........

Parágrafo único - As medidas provisórias perderão a eficácia, desde a edição, se não forem convertidas em lei, no prazo de trinta dias, a partir de sua publicação, devendo o Congresso Nacional disciplinar as relações jurídicas delas decorrentes.

Ora, não é o fato de ser rejeitada, porque aqui não o foi nenhuma. Mas é pelo fato de não ter sido convertida em lei. E o Governo vem driblando; antes do prazo de conversão em lei, edita outra medida provisória.

O Sr. Pedro Simon - Antes do prazo?

O SR. EPITACIO CAFETEIRA - O Governo está reeditando com vinte e sete dias. Antes de esgotarem-se os trinta dias, ele a reedita, sob novo número, às vezes até com algumas pequenas modificações.

Sobre o assunto, assim se expressa o eminente Prof. Manoel Gonçalves Ferreira Filho em seu festejado Curso de Direito Constitucional, Editora Saraiva, ed. de 1989, pág. 183:

O Poder Legislativo dispõe de um prazo de trinta dias, contados da publicação, para deliberação, sem a qual as medidas provisórias perderão a eficácia, com efeito retroativo. Neste caso, o Congresso Nacional disciplinará as relações jurídicas decorrentes da medida provisória.

Estamos aí com a moeda nacional, que se chama real, mas que é provisória.

O Sr. Pedro Simon - Mais forte do que o dólar, mas é provisória.

O SR. EPITACIO CAFETEIRA - Então, suponhamos que, ad argumentandum, o Congresso Nacional resolvesse rejeitar o real, como ficaria a situação? É aí que entra a colocação do nobre Senador Esperidião Amin: virou costume e a moeda está funcionando, já está sendo até falsificada! Dizem que a falsificação é muito boa. Parece-me que em Minas Gerais encontraram 57 notas de 50 reais falsificadas.

O Sr. Esperidião Amin - Mas, de boa qualidade!

O SR. EPITACIO CAFETEIRA - Falsificada, mas de boa qualidade! Não sei se essas estão cotadas acima do dólar!

O que precisamos, nobre Senador Pedro Simon - e V. Exª é candidato à Presidência do Senado -, é que esta Casa resolva cobrar o direito que tem o legislador de legislar, não apenas os líderes, mas todos. Os líderes devem se reunir para discutir a pauta, esta tem que ser do conhecimento de todos. A votação há que ser exercida por todos. Portanto, coloco-me ao lado de V. Exª. E, se for o caso, bateremos à porta do Poder mediador, que é o Judiciário, para sabermos até onde vai o direito do Executivo e onde começa o do Legislativo. Porque, nesta hora em que estamos vivendo, não sabemos dos nossos direitos. Se sabemos, fazemos de conta que não e deixamos correr, deixamos o tempo passar para ver se a coisa muda.

O Sr. Mauro Benevides - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. EPITACIO CAFETEIRA - Ouço o aparte do nobre Senador Mauro Benevides.

O Sr. Mauro Benevides - Nobre Senador Epitacio Cafeteira, esse tema V. Exª já o abordou, pelo menos nos últimos trinta dias, umas três vezes, desta tribuna. E, em todas as oportunidades em que V. Exª se reportou a esse tema, eu, em intervenções, que certamente deslustrei o discurso de V. Exª...

O SR. EPITACIO CAFETEIRA - Não apoiado!

O Sr. Mauro Benevides... manifestei-me solidário à sua iniciativa, sobretudo a forma de profligar a excessiva utilização de um instrumento que, no processo legislativo, deveria ser apenas utilizado pelo Executivo em condições excepcionais. Veja V. Exª que a iniciativa do Deputado Nelson Jobim, hoje Ministro da Justiça - V. Exª atente bem para esse dado de natureza cronológica, de natureza temporal -, e esse projeto está conosco desde 1991, recebeu parecer favorável do nobre Líder de então, Senador Pedro Simon; parecer judicioso, brilhante. Foram apreciadas também as emendas de vários Senadores. Há, inclusive, um voto em separado do nobre Senador Josaphat Marinho e emenda do Senador, hoje Governador da Paraíba, Antonio Mariz; todos com o objetivo de aprimorar o texto originário da Câmara dos Deputados. Veja V. Exª, nobre Senador, que já fluiu o prazo de quatro anos para se apreciar essa proposição. Se ela tem conotação polêmica, podemos realmente considerar polêmica essa matéria. Mas ela foi instruída pela comissão competente, que é a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. Os pareceres, muito bem lavrados, já foram publicados nos avulsos talvez umas seiscentas vezes, número superior ao das medidas provisórias que foram editadas até hoje, tanto pelo Presidente Fernando Collor como pelo Presidente Itamar Franco, e agora pelo Presidente Fernando Henrique Cardoso. Veja V. Exª que temos insistido na tese da abusividade de utilização desse instituto. Muitas vezes chegamos até a suscitar dúvidas quanto à legitimidade dos pressupostos da relevância e urgência. Mas, praticamente isso fica em discussão e debate no plenário, sem que, no momento supremo da decisão, o Plenário se mobilize e se movimente para possibilitar exatamente uma deliberação. Nem V. Exª, como Líder do PPR, nem eu, como Líder do PMDB, temos sido capazes de mobilizar as nossas Bancadas e fazê-las aqui decidir, afinal, em torno dessa proposição. Não é possível que cheguemos ao final desta legislatura, tendo a tramitação dessa matéria iniciado em abril de 1991, e já estamos no término desta legislatura sem que, pelo menos, ofereçamos à opinião pública brasileira um exemplo de coragem de nos definirmos em torno de um instituto, que é importante para o Poder Executivo, e, de certa forma, subestima a nossa capacidade para legislar. Então, estamos abrindo mão de uma competência nossa e transferindo-a para o Poder Executivo. Daí por que quando o Senador Magno Bacelar me conclamou, na tarde de hoje, para que firmássemos um documento solicitando uma inversão de pauta para que, dessa forma, compelíssemos o Plenário a decidir em torno dessa proposição - fizemos até o acréscimo no requerimento do projeto de autoria da Deputada Rita Camata - tivemos a intenção de não permitir que uma matéria que chegou aqui no início desta legislatura ficasse sem apreciação, porque não tivemos a coragem de decidir a respeito das medidas provisórias. Porque nos falta a coragem, já que o Ministro da Justiça é o próprio autor do projeto, se o Relator da proposição na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania era o Líder do Governo, Senador Pedro Simon? Se o jurista do porte e da respeitabilidade do Senador Josaphat Marinho se manifesta favorável com um voto em separado, o que nos falta para decidir em torno dessa questão? Falta o quê? Falta a nós, Líderes, o poder de mobilização, para garantir no plenário a presença do número indispensável ao exame dessa proposição. Sabe V. Exª que, muitas vezes, o Plenário acorre pressuroso, independentemente da nossa convocação, para votar determinadas proposições nesta Casa. Mas uma como essa, instruída pela Comissão competente, vai ser transferida a outra Legislatura! Espero que V. Exª, que aqui permanecerá, continue a insistir nessa tecla, para que - quem sabe - daqui a quatro anos, quando eu voltar, não encontre mais essa proposição na Ordem do Dia do Senado Federal.

O SR. EPITACIO CAFETEIRA - Sr. Presidente, vou encerrar. Antes, quero fazer uma colocação que considero muito importante, nobre Senador Mauro Benevides.

Na verdade, jamais busquei colocar esta matéria em votação ou lotar este plenário para votar este Projeto, porque o mesmo, se é um Projeto de Lei Complementar, precisará da sanção do Presidente, e sabemos que nenhum Presidente vai se autolimitar. Amanhã, o Presidente veta, consagra que ele pode reeditar, tanto que vetou a Proposta do Congresso. Não acredito que nenhum Presidente usuário do comodismo da Medida Provisória sancione este Projeto de Lei.

Estou me batendo para que o Congresso inicie a reconquista do seu direito. Não num Projeto de Lei Complementar que o Presidente pode sancionar ou vetar, porque aí admitiríamos que somente se o Presidente da República quiser é que se vai limitar a medida provisória. Na hora em que fizermos um projeto de lei que dê ao Chefe do Executivo o direito de veto, estaremos concordando que Sua Excelência a vem utilizando de forma correta.

O Sr. Mauro Benevides - Permite-me V. Exª uma nova brevíssima intervenção?

O SR. EPITACIO CAFETEIRA - Ouço o aparte de V. Exª.

O Sr. Mauro Benevides - Nobre Senador, V. Exª quer que se valorize a iniciativa parlamentar e que ela sobreleve quanto à iniciativa do Presidente da República de editar medidas provisórias? Foi isto que entendi?

O SR. EPITACIO CAFETEIRA - Não, nobre Senador. Se V. Exª quer bem entender, concluirá o seguinte: a medida provisória - está escrito na Constituição - que não for transformada em lei em 30 dias, está rejeitada. E se ela está rejeitada, a matéria somente poderá voltar na mesma Sessão Legislativa se contar com a maioria absoluta de uma das Casas do Congresso, conforme estabelecido na Constituição.

Essa é a realidade. E nós estamos fazendo de conta que não é. Estamos deixando correrem soltas a edição e reedição. Em determinado momento o Presidente pertence a um grupo; a seguir, já é outro Presidente, não do mesmo grupo. Agora já estamos num terceiro, de um terceiro grupo.

É apenas o direito de gemer, de dizer: Presidente, Vossa Excelência está pisando no meu calo, nunca o de protestar! Devemos dizer: pise onde Vossa Excelência pisar; mas pise no chão, não pise no meu pé!

Ocorreu com todos os Presidentes, não apenas com o Presidente Fernando Henrique Cardoso, não. Foi com o Presidente Fernando Collor, foi com o Presidente José Sarney, foi com o Presidente Itamar Franco. Nunca o Congresso procurou saber naquele outro Poder, que está aqui na Praça dos Três Poderes, bem ali ao lado, dirimir as dúvidas. Por que não perguntamos se se pode ou não reeditar medida provisória? Por que nós nunca discutimos este isto? Porque a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado não se reúne para discutir este assunto? Afinal de contas é o nosso - não diria nem direito - mas dever de legislar.

Assisti, na televisão, há poucos dias, algo semelhante ao Congresso Nacional: uma máquina de passar roupa. Ela era tão rápida, que conseguia passar mais rápido do que uma pessoa vestir um paletó. O Congresso, às vezes, é essa máquina. Consegue aprovar tão rápido como nunca se viu. Quando se pensa, já está aprovado. E o projeto de lei leva esse tempo todo.

Nunca me interessei em colocar número em plenário, porque penso que quem pode mais pode menos. Se o Presidente pode sancionar, pode vetar. Se Sua Excelência pode apenas concordar em reeditar uma vez, pode também não concordar.

Penso que não devemos pedir ao Presidente que concorde em nos devolver o direito de legislar, devemos exigir, por ser um direito inalienável, recebido do povo.

O Sr. Mauro Benevides - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. EPITACIO CAFETEIRA - Com prazer.

O Sr. Mauro Benevides - Nobre Senador Epitacio Cafeteira, o que V. Exª exige, estamos atendendo. Primeiro, a discussão ampla e profunda dessa matéria na Comissão própria da Casa, que tem competência regimental para isso, que é a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. Houve, realmente, um estudo aprofundado, com apresentação de emendas, com voto em separado. Portanto, aprimorando o texto originário da Câmara dos Deputados. E mais do que isso, quisemos, o Senador Magno Bacelar e eu, ao propor a inversão da Ordem do Dia de hoje, valorizar duas iniciativas de parlamentares, no caso o Senador Nelson Jobim e a Deputada Rita Camata. Permitimos que essas duas matérias pudessem ser apreciadas hoje, evidentemente por serem lei complementar, com o Plenário na sua composição, não sei se íntegra, mas pelo menos garantindo os 41 votos favoráveis. Foi essa a intenção do colega de V. Exª da representação do Maranhão, que apoiei imediatamente, na expectativa de que esta Casa, pelo menos, decida sobre essas duas proposições que são de autoria de dois parlamentares e que merecem, portanto, o exame do Senado Federal.

O SR. EPITACIO CAFETEIRA - Pela colocação de V. Exª, acredito que não fui ainda bem entendido. Penso que nós, parlamentares, só devemos propor matéria da competência dos dois poderes: o Legislativo legisla, o Executivo sanciona e executa. É assim que se faz o jogo democrático. Propomos uma matéria que o Presidente da República pode vetar e continuar abusando da edição de medida provisória. Não me parece um projeto que deva ser apreciado por um parlamento que quer se valorizar. Diria até que é uma forma de consultar o Presidente da República: Vossa Excelência quer continuar reeditando medida provisória ou quer parar, editando só uma vez? Porque é isso que vamos fazer, vamos perguntar se Sua Excelência quer parar de reeditar. A aprovação não resolve em última instância. O entendimento que tenho, Senador Mauro Benevides, é que estamos nos descuidando de defender aquilo que não é só um direito, mas é uma obrigação do legislador.

Este Senado, como todo o Poder Legislativo, tem a obrigação de assumir o direito e o dever de legislar e proibir abusos cometidos pelo Executivo - não pelo Presidente atual, mas por todos -, como o de reeditar medidas provisórias e governar com as mesmas. Abuso que está se acentuando: primeiro, são 8, depois, 15, depois, 130, depois, são 500; daqui a pouco, não há necessidade de virmos aqui, bastará que o Governo Federal reedite medidas e tome as decisões que queira tomar, como ocorreu no final do ano, quando foi aprovada a medida provisória aumentando o imposto. Porém, se for lida com clareza a Constituição, verificaremos que aquela transformou-se em lei em 1995, para ser executada em 1996, porque uma medida provisória somente se transforma em lei após aprovação desta Casa.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 26/01/1995 - Página 1182