Discurso no Senado Federal

DECLINIO DA POPULARIDADE DO PRESIDENTE FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, CONFORME DADOS E PESQUISA DE OPINIÃO PUBLICA. CRITICAS A DECISÃO PRESIDENCIAL DE VETAR O VALOR ATUALIZADO DO SALARIO-MINIMO. A QUESTÃO DE IRREGULARIDADES NAS DESAPROPRIAÇÕES NA RODOVIA CARVALHO PINTO, OBRA DO GOVERNO FLEURY FILHO.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. POLITICA SALARIAL. POLITICA DE TRANSPORTES.:
  • DECLINIO DA POPULARIDADE DO PRESIDENTE FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, CONFORME DADOS E PESQUISA DE OPINIÃO PUBLICA. CRITICAS A DECISÃO PRESIDENCIAL DE VETAR O VALOR ATUALIZADO DO SALARIO-MINIMO. A QUESTÃO DE IRREGULARIDADES NAS DESAPROPRIAÇÕES NA RODOVIA CARVALHO PINTO, OBRA DO GOVERNO FLEURY FILHO.
Aparteantes
Aureo Mello.
Publicação
Publicação no DCN2 de 27/01/1995 - Página 1233
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. POLITICA SALARIAL. POLITICA DE TRANSPORTES.
Indexação
  • COMENTARIO, DADOS, PESQUISA, OPINIÃO PUBLICA, DEMONSTRAÇÃO, REDUÇÃO, POPULARIDADE, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, RESULTADO, ANUNCIO, VETO (VET), AUMENTO, SALARIO MINIMO, SIMULTANEIDADE, MELHORIA, REMUNERAÇÃO, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, VICE-PRESIDENTE, MINISTRO DE ESTADO, DEPUTADOS, SENADOR.
  • CRITICA, DECISÃO, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, VETO (VET), AUMENTO, SALARIO MINIMO, INCOERENCIA, DISCURSO, POSSE, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, DEFESA, PRIORIDADE, COMBATE, FOME, MISERIA, MELHORIA, DISTRIBUIÇÃO DE RENDA, RIQUEZAS, REALIZAÇÃO, JUSTIÇA SOCIAL, PAIS.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O ESTADO DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), DENUNCIA, IRREGULARIDADE, PROPRIETARIO, CESSÃO, TERRENO, AMEAÇA, DESAPROPRIAÇÃO, CONSTRUÇÃO, RODOVIA, GOVERNO, LUIS ANTONIO FLEURY FILHO, EX GOVERNADOR.

O SR. EDUARDO SUPLICY (PT-SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, pesquisas de opinião pública mostram um declínio da popularidade do Presidente Fernando Henrique Cardoso. Dentre os fatores desse declínio neste primeiro mês de mandato está o anúncio do veto do aumento do salário mínimo de 70 para 100 reais, ao mesmo tempo em que a Nação toma conhecimento de que o Congresso Nacional, em entendimento com o Executivo, aumentou a remuneração do Presidente, dos Ministros, de Deputados e de Senadores em proporção muito mais acentuada do que se poderia prever em termos de critério de recuperação de perdas da remuneração das pessoas que exercem essas funções respectivamente.

Ao mesmo tempo, o Ministro do Planejamento, José Serra, um dos principais responsáveis pela política econômica, faz uma declaração, segundo a qual o salário mínimo deveria ser estadualizado na sua opinião. No outro dia, reitera que essa opinião é apenas de natureza pessoal, e não do Governo.

É de se esperar, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que os responsáveis pela política econômica e, em especial, o Presidente da República, que é o maior responsável, Fernando Henrique Cardoso; o Ministro da Fazenda, Pedro Malan; o Ministro do Planejamento, José Serra; o Ministro do Trabalho, Paulo Paiva; o Ministro da Previdência, Reinhold Stephanes, sobre os quais pesa a enorme questão da remuneração das pessoas que estão na faixa de rendimento próximas de um, de dois salários mínimos, é de se esperar que tenham S. Exªs maior responsabilidade sobre o que dizer a respeito dessa questão.

Seria de se esperar que o governo de um presidente que ressaltou, ao longo de sua campanha, que iria realizar a justiça social neste País, que iria promover melhoria da distribuição da renda e da riqueza e que, como disse no seu pronunciamento de posse perante o Congresso Nacional, no seu último discurso como Senador, daria prioridade ao combate à fome e à miséria, que examinasse com responsabilidade os dados sobre o salário mínimo no Brasil. Examinasse, por exemplo, que o salário mínimo, em termos reais de poder aquisitivo, em dezembro de 1994, quando terminou o Governo Itamar Franco, e em decorrência da própria administração do então Ministro da Fazenda, Fernando Henrique Cardoso, estava em torno de 17 reais e 32 centavos, se tomarmos o índice de julho de 1940 como valor 100, o menor índice de salário mínimo desde que foi instituído, em julho de 1940. O salário mínimo chegou a níveis como de 142 reais, tomando como base julho de 1940 e o valor 100; em agosto de 1956, chegou a 142 reais e 50 centavos; em janeiro de 1959, 144 reais; depois sofreu um decréscimo significativo, chegando a 51 reais e 87 centavos em março de 1987; em maio de 1987, a 33 reais e 34 centavos; em junho de 1987, a 27 reais - um dos menores valores da história.

Agora, entretanto, estamos falando de um salário mínimo real que está no mais baixo nível da sua história desde que foi instituído no Brasil. É bem verdade que o custo de vida varia nas diferentes capitais brasileiras dos diferentes Estados. Mas isso não constitui um argumento suficientemente forte para termos como solução para o problema do aumento do salário mínimo, a esta altura, a sua estadualização ou regionalização, inclusive porque seria um retrocesso ao que já aconteceu no Brasil.

Se examinarmos os preços da cesta básica nas 12 capitais onde o DIEESE levanta o seu custo, veremos que, em que pese ter havido uma queda no custo da cesta básica em dezembro último,"o salário mínimo ainda é insuficiente para adquirir os treze produtos alimentícios da ração essencial (doze no Norte e Nordeste). Em dezembro, das catorze capitais pesquisadas, somente em Fortaleza, cidade onde o preço do conjunto de gêneros alimentícios foi mais baixo, o valor do salário líquido (64 reais e 56 centavos, depois de descontados 7,77% da Previdência Social) era menor que o custo total da cesta, de 63 reais e 91 centavos. Em São Paulo, ocorreu o contrário, sendo apurado o maior: 87 reais e 42 centavos."

"Com base no custo da cesta básica verificado em São Paulo, o DIEESE calculou em 728 reais e 90 centavos o valor do salário mínimo necessário para cobrir os gastos essenciais de uma família de quatro pessoas (dois adultos e duas crianças). Comparado ao salário mínimo vigente em dezembro - 70 reais -, aquele valor é 10,41 vezes maior", ou seja, o salário mínimo hoje no Brasil está dez vezes menor do que o necessário para obtermos o suficiente para que uma família de quatro pessoas - dois adultos e duas crianças - possa sobreviver com dignidade.

O Sr. Aureo Mello - Senador Eduardo Suplicy, V. Exª concede-me um aparte?

O SR. EDUARDO SUPLICY - Pois não, Senador Aureo Mello, com muita honra.

O Sr. Aureo Mello - Nobre Senador Suplicy, outro dia eu ouvi uma declaração, atribuída, se não me engano, ao futuro Senador de São Paulo, hoje Ministro, José Serra, que me deixou impressionado e, ao mesmo tempo, serviu de diretriz para o que deveria ser o salário mínimo nos seus termos reais. S. Exª disse que o Estado de São Paulo tem capacidade de pagar dois salários mínimos ou mais - esse salário mínimo que foi votado e que o nosso Presidente Fernando Henrique Cardoso está querendo vetar - e que o Estado do Piauí não teria condições de pagar nem meio salário mínimo ao seu trabalhador. O ideal mesmo seria os legisladores se debruçarem atentamente sobre a questão do salário mínimo regional. Essa história de uniformizar as coisas no Brasil é realmente um pecado, porque existem vários Brasis: existe o Brasil da fome, o Brasil estorricado, o Brasil da solidão e do abandono, o Brasil das savanas e dos chapadões abandonados, o Brasil do progresso, o Brasil da evolução, das grandes fábricas e existe o Brasil da grande indústria. Por isso, entendo que esses Brasis teriam que ter uma legislação particular. Pessoalmente, entendo que o Brasil, ao invés de ser uma federação, deveria ser uma confederação, unida apenas para efeito de defesa nacional. Era este o aparte que gostaria de dar ao discurso de V. Exª. Muito obrigado.

O SR. EDUARDO SUPLICY - Agradeço, Senador Aureo Mello, o aparte de V. Exª.

De fato, há diferenças consideráveis em nosso Brasil, país continental, inclusive no que diz respeito ao custo da ração essencial mínima. É preciso salientar que, enquanto na Região Centro-Sul a ração essencial mínima calculada pelo DIEESE é composta de treze alimentos básicos - carne bovina, leite tipo C, feijão em cores ou preto, arroz agulhinha, farinha de trigo, batata, tomate, pão francês, café em pó, banana, açúcar refinado ou cristal, óleo de soja e manteiga -, no Norte e Nordeste, são pesquisados os mesmos produtos, exceto a batata e a farinha de trigo, esta substituída pela farinha de mandioca. Então, ao invés de treze alimentos básicos, pesquisa-se o custo de doze alimentos básicos, o que contribui para que, nas Regiões Norte e Nordeste, o custo da ração essencial mínima seja um pouco menor do que na Região Centro-Sul: 20%, 30% ou até 35% menor do que em São Paulo.

Em dezembro de 1994, o valor da ração essencial mínima em São Paulo era de 87 reais e 42 centavos; em Brasília, 85 reais e 17 centavos; em Belo Horizonte, 81 reais e 51 centavos; em Florianópolis, 80 reais e 88 centavos; em Curitiba, RS$80,20; em Porto Alegre, 78 reais e 80 centavos; em Belém, 77 reais e 88 centavos; no Rio de Janeiro, 77 reais e 28 centavos; em Vitória, 76 reais e 27 centavos; em Salvador, 70 reais e 48 centavos; em Natal, 65 reais e 64 centavos; em Recife, 65 reais e 21 centavos; em João Pessoa, 64 reais e 99 centavos; e em Fortaleza, 63 reais e 91 centavos. Portanto, o valor da ração essencial mínima de São Paulo é 35% maior do que o de Fortaleza, que é o mais baixo.

Será que essa diferença representa um argumento para haver um salário mínimo não unificado no Brasil inteiro? Avalio, Sr. Presidente, que a melhor maneira de se resolver esse problema é não evitar, neste momento, o aumento do salário mínimo de 70 reais para 90 reais. Penso que devemos adotar esse aumento do salário mínimo, complementando-o com a adoção do Programa de Garantia de Renda Mínima, de um Imposto de Renda Negativo no Brasil.

A discussão sobre os efeitos do salário mínimo nos diversos países do mundo tem mostrado que é preciso que haja um salário mínimo como uma forma de proteger aqueles trabalhadores que têm um menor poder de barganha na economia, para se evitar que o piso da remuneração chegue a valores muito baixos. Mas é preciso que haja um complemento, porque se se eleva extraordinariamente o salário mínimo - vamos supor que, hoje, chegássemos a aumentá-lo de 100 para 800 reais -, isso acaba ocasionando um impacto significativo sobre os preços e o emprego. Então, um pulo dessa natureza não poderia ser considerado adequado.

Mas, qual o tipo de instrumento que hoje, mais e mais, é utilizado nos diversos países? Para aquelas faixas de rendimento relativamente baixas, que envolvem ganho não suficiente para a subsistência das pessoas, garante-se um complemento de renda na forma de um crédito fiscal, como existe nos Estados Unidos, na Inglaterra e em muitos outros países.

Nos Estados Unidos, desde 1975, instituiu-se o crédito fiscal por remuneração recebida, o earned income tax credit; na Inglaterra, há muitos anos, existe o income suport ou diversas formas de crédito familiar, que garante a todo chefe de família que trabalhe o recebimento de um complemento de renda, se esta não for suficiente.

O Secretário de Trabalho dos Estados Unidos, Robert Reich, ainda recentemente, relatou que o aumento do salário mínimo nos Estados Unidos, combinado com o crédito fiscal por remuneração recebida, tem permitido que muitos norte-americanos sejam elevados para cima da linha de pobreza, tornando, inclusive, mais estimulante o trabalho.

O aumento do salário mínimo, quando administrado de forma moderada, com responsabilidade e combinado com o imposto de renda negativo, tem contribuído para o aumento no nível de empregos e também para que um maior número de pessoas saltem para cima da linha de pobreza. Este é que seria o procedimento adequado e que merece consideração por parte do Governo.

Vou continuar tratando desse assunto na próxima semana, Sr. Presidente.

Um outro assunto traz-me à tribuna na tarde de hoje. Gostaria de comentar uma notícia do jornal O Estado de S. Paulo de ontem, segundo a qual proprietários cederam terrenos sob ameaça de as terras estarem sendo desapropriadas para a construção da Rodovia Carvalho Pinto.

Noticia o referido jornal o seguinte:

      O ex-Governador Luiz Antonio Fleury Filho conseguiu inaugurar a Rodovia Carvalho Pinto, principal obra rodoviária de sua administração, somente após ter determinado a construção de uma estrada de aproximadamente dois quilômetros que passa por três propriedades privadas. O desvio, feito em apenas um mês, uniu dois trechos da Carvalho Pinto separados por túneis inacabados entre os quilômetros 73 e 75 da estrada, e as terras foram cedidas ao Estado. "Esta é, sem dúvida, uma operação inédita em todo o mundo", analisou o atual Presidente da Empresa de Desenvolvimento Rodoviário S.A. (DERSA), Stanislav Seriancic.

      Os proprietários das terras por onde passa o desvio, no Município de Jacareí, cederam parte das propriedades ao Estado, por um ano, sob ameaça: ou permitiam o desvio ou seriam desapropriados pela DERSA. Um deles, Renato de Oliveira Ferreira Coelho, afirmou, ontem, ao Estado que o uso de dois alqueires dos 60 de suas terras, por um ano, foi gratuito: "Foram mostradas as vantagens que a cessão gratuita das terras traria, pois não correríamos o risco da desapropriação". E mais: "Eles prometeram asfaltar a entrada das fazendas e devolver a terra tirada do local; o asfalto foi feito, mas a terra não foi devolvida".

Sr. Presidente, no ano retrasado, considerei importante verificarmos indícios de irregularidades na BR 101, no Estado de Santa Catarina. Agora, vejo indícios sérios de irregularidades em obras de estradas de rodagem no Estado de São Paulo. O Senador Esperidião Amin, com razão, avalia que devo tomar as providências.

Comunico que, há pouco, conversei com o Líder da Bancada do Partido dos Trabalhadores na Assembléia Legislativa de São Paulo, Luiz Carlos Silva, o Professor Luizinho, que está tomando as devidas providências no sentido de solicitar todas as informações do Secretário de Transportes, o Sr. Plínio Assma e do Presidente da DERSA, Stanislav Seriancic, sobre as irregularidades detectadas na administração anterior, para que a Assembléia Legislativa possa tomar as devidas providências sobre o assunto.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 27/01/1995 - Página 1233