Discurso no Senado Federal

DEFESA DO REGIME JURIDICO UNICO DOS SERVIDORES PUBLICOS CIVIS DA UNIÃO. CRITICAS AO SR. BRESSER PEREIRA A FRENTE DA SECRETARIA DA ADMINISTRAÇÃO.

Autor
Cid Sabóia de Carvalho (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/CE)
Nome completo: Cid Sabóia de Carvalho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.:
  • DEFESA DO REGIME JURIDICO UNICO DOS SERVIDORES PUBLICOS CIVIS DA UNIÃO. CRITICAS AO SR. BRESSER PEREIRA A FRENTE DA SECRETARIA DA ADMINISTRAÇÃO.
Publicação
Publicação no DCN2 de 27/01/1995 - Página 1231
Assunto
Outros > ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.
Indexação
  • CRITICA, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, EDIÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), REVOGAÇÃO, REGIME JURIDICO UNICO, REDUÇÃO, DIREITOS, FUNCIONARIO PUBLICO.
  • CRITICA, DECLARAÇÃO, LUIS CARLOS BRESSER PEREIRA, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA ADMINISTRAÇÃO FEDERAL E REFORMA DO ESTADO (MARE), DEFESA, EXTINÇÃO, ESTABILIDADE, ISONOMIA SALARIAL, COMBATE, CONCURSO PUBLICO, NOMEAÇÃO, FUNCIONARIO PUBLICO.

O SR. CID SABOIA DE CARVALHO (PMDB-CE. Para uma comunicação. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, eu não poderia deixar de registrar aqui, no plenário do Senado Federal, algumas estranhezas de minha parte, que quero deixar como herança aos futuros integrantes desta Casa. 

Sabe V. Exª que muitas leis que aqui se perfizeram nasceram das mais diversas propostas da sociedade, que influenciaram a quem teve a iniciativa. Mais tarde, essas leis, enquanto projetos, enquanto não se concluíam, enquanto estavam no campo da propositura, levavam a sociedade a uma discussão, a um debate, a um consenso.

O Regime Jurídico Único dos servidores federais tem uma história a ser contada. O Senado Federal teve um projeto do Senador Mauro Benevides, que estendia a Lei nº 1.711 para todos, e o velho estatuto dos funcionários públicos seria o Regime Jurídico Único com as devidas atualizações.

Um dia, no entanto, chegou aqui um projeto de lei oriundo da Câmara dos Deputados, contendo aquilo que deveria ser o Regime Jurídico Único. E o orador, este Senador que agora fala aos senhores, mais uma vez, como relator, propôs ao Senado - e o Senado aprovou - que o Regime Jurídico Único fosse a Lei nº 1.711 devidamente autorizada. Por quê? Porque é uma lei magnificamente elaborada, uma lei de grande experiência, porque foi aplicada sobejamente e por conta dela se formou uma grande jurisprudência tanto no Judiciário quanto na Administração Pública. Portanto, a jurisprudência administrativa.

Esta Casa aprovou o meu substitutivo, e a matéria, voltando à Câmara dos Deputados, sofreu o arquivamento. A Câmara dos Deputados desarquivou um velho projeto e o enviou novamente ao Senado Federal, sob a pressão das entidades que congregavam os servidores públicos. E Senadores como eu, Mauro Benevides, Fernando Henrique Cardoso, que, inclusive, falou na ocasião da aprovação do meu substitutivo, Mário Covas e tantos outros nos curvamos ao apelo das entidades que congregam os servidores públicos para adotarmos aquela solução, que, indiscutivelmente, não era uma boa solução.

Mas essa solução impensada e imatura, que consumava a má atuação das entidades de classe, continha um consenso, um acordo do endiabrado João Santana com os líderes das categorias funcionais. Dizia-se que era um acordo do Governo com os próprios servidores.

Veja bem V. Exª que houve muitas tentativas para resolver esse problema. Houve o projeto do Senador Mauro Benevides, um projeto de lei da Câmara, o substitutivo de minha autoria. Fui também o relator do projeto de autoria do Senador Mauro Benevides. Mais tarde, houve essa operação da Câmara, de difícil conceituação regimental, e a aprovação de um Regime Jurídico Único que seria um consenso do Governo e um consenso da categoria de funcionários públicos, do estamento dos funcionários públicos.

Tudo isso foi debatido. Como Presidente da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, fiz um seminário sobre o Regime Jurídico Único, com a colaboração direta e de grande valor do Senador Odacir Soares. Esta Casa, muitas vezes, viu reuniões; meu Gabinete manteve muitas reuniões com as mais diversas entidades. Hoje, Sr. Presidente, o Governo altera isto através de uma mirabolante medida provisória. Camões dizia: "Quão fácil ao corpo a sepultura". Mais fácil que o corpo à sepultura é o Direito diante de um Secretário de Administração da qualidade do Sr. Luiz Carlos Bresser Pereira. Esse cidadão é um irresponsável, Sr. Presidente. Não sabe o que é que está dizendo. Ele quer fazer da administração pública um grande supermercado.

Posso resumi-lo: é contra a estabilidade do servidor público, é contra a isonomia - e consegue ser democrata sendo contra a isonomia -, é contra concurso público, é contra nomeação, é contra promoção; é contra a admissão que for, até as nomeações provisórias. Que homem é este? Pensei que não podia existir ninguém pior que o Sr. João Santana. Pensei que aquilo era o máximo. E agora o Sr. João Santana foi humilhado na grandiosidade da sua ignorância pela ciência, que ninguém sabe de onde vem, do Sr. Bresser Pereira. Uma coisa parece certa: esse cidadão opera com o status de Ministro como se fosse empregado de um grande proprietário de supermercado. Ele quer como nos supermercados: não há isonomia; as nomeações são do jeito que o patrão quiser; demite-se como quer; paga-se como quer. Melhor que não existisse legislação trabalhista. Não há direitos assegurados para míseras pessoas que vivem em busca de míseras funções em grandes estabelecimentos comerciais. Grandioso é o estabelecimento; pequenina é a pessoa humana, é a figura do servidor. É a criatura humana a pequenice; a grandeza é a empresa, é o capital.

Esse homem vem desse ninho de ouro, do ninho de fios de ouro, e vem criar esses grandes obstáculos ao Governo de um homem competente como o nosso ex-companheiro Fernando Henrique Cardoso. Dele conhecemos a competência, a honradez e a dignidade, mas, agora, estamos conhecendo a extravagância da nomeação de um cidadão desta qualidade para uma Pasta de tanta responsabilidade como é a Secretaria de Administração.

Revoga conquistas que vieram de um consenso entre Governo e estamentos, entre entidades de classe. Tudo isso se revoga com a maior facilidade, através de uma medida provisória! Isso é assunto para projeto de lei, para discussão em comissões técnicas, para debates, para que, aqui, sejam feitas reuniões e seminários, Sr. Presidente, como fiz, como Presidente da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania.

Eu não sei! O Sr. Bresser Pereira um dia se ofereceu para substituir, no cativeiro, a figura importantíssima de um seqüestrado. Isso é caso de analista; talvez, mais caso de análise médica seja o cidadão que combate a estabilidade, combate a isonomia, combate o concurso público, combate a nomeação e, quem sabe, combate o salário.

Já vi nos jornais que será lícito trabalhar de graça para o Governo. Já li: "O Governo aceitará trabalhos gratuitos". Mas diga que o empresário pode aceitar trabalhos gratuitos, e amanhã alguém que foi trabalhar gratuitamente vá a uma Junta de Conciliação e Julgamento dizer que trabalhou e não recebeu para que vejam qual o resultado da legislação trabalhista aplicada a uma incoerência como essa. Trabalho exige dignidade, e a dignidade se expressa por um salário digno, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores.

Estamos no reino da loucura. Tudo é fácil no universo da medida provisória. Desgraçada compreensão, acepção, solução italiana que o atual Ministro da Justiça importou, como Líder do PMDB, durante os trabalhos da Constituinte, e nos impôs, essa figura absolutamente descasada com a realidade político- institucional do Brasil. Daí por que todos se preocupam com o futuro da medida provisória. Mas enquanto não resolvemos o futuro da medida provisória, propiciamos ao Executivo uma verdadeira e ilícita ditadura, exatamente pelo abuso da utilização de um instrumento que deveria se comedir pelos princípios da relevância e da urgência. Que relevância e urgência deve existir para a castração dos direitos dos servidores públicos, Sr. Presidente? Que relevância é essa de prejudicar o patrimônio moral dos servidores públicos? Isso não é relevância, isso não cabe dentro de um princípio de urgência. O nome disso, Sr. Presidente, precisa ser dito, o nome disso é fascismo. Esse fascismo que está sendo exercitado no Brasil, inclusive com o patrulhamento de Parlamentares, o patrulhamento que agora se faz, por exemplo, do Presidente da República para que não sancione o projeto da anistia que foi votado recentemente pela Câmara dos Deputados e que beneficia o Senador Humberto Lucena. Sim, comportamentos que só podem ser vistos na História: na Itália, mas a Itália de Mussolini; na Alemanha, não na Alemanha de hoje, mas na Alemanha de Hitler, quando era preciso subtrair o Parlamento para que a Alemanha toda fosse mandada ao sacrifício, à destruição e à morte de sua população, e à destruição de suas cidades, à destruição de seu patrimônio físico; e os direitos de seu povo levados ao escárnio, os direitos do povo alemão levados ao máximo do escárnio por um louco e inconseqüente, porque não havia Parlamento.

Vejam bem, estamos caminhando numa época dificílima. Os passos que estão sendo dados pelo Poder Executivo, através de medidas provisórias, são passos duvidosos e questionáveis, inclusive quando se submete ao Congresso Nacional não questão de relevância, não questão de urgência, mas manias, neuroses, psicoses. Isso é caso de analista. Mas acredito que o futuro Congresso Nacional não há de se dobrar às inconveniências e incompetências que estão sendo propostas ao Presidente da República, desvairadamente, por um indivíduo que escreve longos artigos; quanto mais longos, menos substância; quanto mais fala, menos se entende; quanto mais argumenta, menos esclarece. E esse homem é o Secretário de Administração do Governo Federal.

Pensei que o Sr. João Santana havia batido todos os recordes. Não, não bateu! A ignorância é sempre superável. O poderio da ignorância, Sr. Presidente, é uma coisa excepcional. Os ignorantes de amanhã baterão o Sr. Bresser Pereira.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 27/01/1995 - Página 1231