Pronunciamento de José Pedro em 26/01/1995
Discurso no Senado Federal
REFLEXÃO CRITICA SOBRE A RESPONSABILIDADE DA CLASSE POLITICA E DO SENADO FEDERAL PELO SEU DESCREDITO JUNTO A OPINIÃO PUBLICA.
- Autor
- José Pedro
- Nome completo: José Pedro Rodrigues Gonçalves
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
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SENADO.:
- REFLEXÃO CRITICA SOBRE A RESPONSABILIDADE DA CLASSE POLITICA E DO SENADO FEDERAL PELO SEU DESCREDITO JUNTO A OPINIÃO PUBLICA.
- Publicação
- Publicação no DCN2 de 27/01/1995 - Página 1224
- Assunto
- Outros > SENADO.
- Indexação
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- ANALISE, CRITICA, ATUAÇÃO, CLASSE POLITICA, SENADO, RESPONSAVEL, AUSENCIA, CONFIANÇA, OPINIÃO PUBLICA.
- DEFESA, NECESSIDADE, ETICA, ATUAÇÃO, SENADO, VIABILIDADE, TRANSFORMAÇÃO, SOCIEDADE, MELHORIA, QUALIDADE DE VIDA, DISTRIBUIÇÃO DE RENDA, ALCANCE, JUSTIÇA SOCIAL.
O SR. JOSÉ PEDRO ( -MT. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, inicialmente uma primeira questão: o que pode fazer aqui no Senado um homem que assumiu um mandato por 30 dias? Propor uma revolução nacional de pouco adiantaria, por ser apenas mais um gesto entre tantos outros e que ficaria sepultado no primeiro escaninho da burocracia. Só resta tentar contribuir para que o Senado perceba o seu valor na História e acorde da letargia que sempre o dominou, assumindo o seu papel como vanguarda do projeto de desenvolvimento nacional.
Não vim aqui fazer da crítica uma censura, muito menos ensinar caminhos aos caminhantes. Vim, isto sim, trazer a palavra daqueles que nunca falaram, os excluídos sociais com os quais tenho convivido no meu cotidiano de médico dos miseráveis, daqueles para quem o remédio, muitas vezes, traz mais problemas que soluções, por exemplo, quando melhora o apetite dos que não têm o que comer.
É um paradoxo freqüente no meu dia-a-dia, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, como paradoxo é também o apodrecimento de milhares de toneladas de alimentos que o Governo atira no lixo, porque as leis, criadas neste Parlamento, proíbem, impedem, atrapalham, obstaculizam, não importa o verbo, nem a verba, o certo é que à boca dos famintos não chegam nunca, apesar da campanha contra a fome, apesar das juras do Presidente de varrer a miséria e a fome do nosso meio. A continuar como é de costume, Srªs e Srs. Senadores, o modo mais fácil de acabar com a miséria e a fome parece ser acabando com os famintos e miseráveis.
A leitura que faço do Parlamento em geral e do Senado em particular é fruto de minha alfabetização com o povo que me ensinou a decodificar o seu modo de olhar e, especialmente, de sentir os resultados das ações do Governo, aqui incluindo os três Poderes.
Ensina o povo que cada medida adotada aqui é um pouco mais de sofrimento lá. A única medida que o beneficiou, e com isto concorda, menos do que desconfia, é o Plano Real. Entretanto, sempre com um pé atrás, aguarda, temeroso, uma reviravolta, porque de políticos, historicamente, só recebeu traições, dissabores, frustrações.
O povo vota não por um dever cívico, como querem alguns piegas, mas por temor das ameaças da lei diante da obrigatoriedade do voto. Vota nas mesmas pessoas, eternamente, porque este País é um grande curral eleitoral graças à centralização do poder discricionário dos partidos políticos que impede a oxigenação dos seus quadros e praticamente proíbe o acesso à candidatura dos independentes, dos que têm voz própria, dos que voam sozinhos. Ainda querem que o suplente seja de absoluta confiança do titular. Onde está escrito "absoluta confiança", a leitura a ser feita é "do absoluto controle" do titular, como se suplente fosse um cidadão de segunda classe, um fiel escudeiro do outro, que veio, como eu, aproveitar a xepa do Senado, na visão da imprensa. A imprensa tem razão, Sr. Presidente e Srs. Senadores. A imagem desta Casa que chega até lá fora, onde vivem os mortais, é a de uma grande feira livre, onde se negocia de tudo, embora aqui dentro seja a imagem do Olimpo, onde os semideuses, proprietários exclusivos de todos os poderes, saberes e razões, exercem, acima do povo e da Nação, os seus mandatos.
O Senado não encontra em si próprio a sua justificação. Ele existe porque existe o povo e sem povo não há porque existirem as instituições.
O objeto do Senado é a pátria. Ele é o guardião das instituições, fiscalizador e controlador do Estado, decorrências naturais da democracia. A missão do Senado transcende ao comum entendimento de muitos. Daí a nossa responsabilidade enquanto cidadãos representantes ou enquanto corporação organizada.
Ao se abrirem as sessões desta Casa, invoca-se o nome de Deus, portanto, torna-se sagrado este espaço democrático, locus concentrador das representações da sociedade; logo fala aqui a sociedade, o povo, não o cidadão eleito. Da boca do Senador deve sair a palavra do povo, não exclusivamente a palavra do partido, nem aqui se discutirem os interesses desses partidos representados. O partido é a ferramenta com a qual o povo deve operar para fazer chegar até aqui os seus pleitos, a sua voz e suas ansiedades, mas o que se vê é o oposto. Os interesses do partido têm sempre prevalecido, o povo é apenas um detalhe, a escada onde se pisa para se ascender a este Olimpo. Diz-se que se precisa de partidos fortes para o fortalecimento da democracia. O que fortalece o partido não são as leis, nem os regulamentos, nem os mecanismos autoritários até hoje existentes que favorecem o mandonismo dos mesmos de sempre.
O que fortalece o partido é a virtude de seus membros, a qualidade e o caráter de seus representantes.
O Brasil tem muito mais personagens do que estes poucos que freqüentam a sua História nas últimas décadas.
O Congresso e o Senado são símbolos, e como símbolos são revestidos de uma sacralidade ética, como paradigmas que devem ser para a sociedade.
A sociedade necessita de símbolos, de um paradigma, de um modelo aglutinador que possa consubstanciar uma prática social compatível com essa ética.
Na ordem das coisas, cada coisa tem o seu valor imanente para se inserir na ordem, no início ou no final, conforme o valor implícito.
Na taxonomia da sociedade, aquela excluída do banquete social e que não freqüenta festas no Itamaraty, o Senado está colocado quase no final, embora concorde que deveria estar em primeiro lugar. A culpa não é da sociedade nem da imprensa, mas do próprio Senado, que não conseguiu acompanhar as mudanças da sociedade, porque não as percebeu. Permaneceu atendendo ao primado da legislação aqui fabricada para atender aos seus próprios costumes, sem se ater ao fato essencial de que tão importante quanto a lei, que embora legal e eventualmente pode ser imoral, é a dimensão ética, que contempla mais que a visão de mundo de todos e atende a essência dos direitos de cada um.
Estou falando da ética, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não de uma palavra apenas, ou apenas de uma palavra. Falo de um modo de conviver em sociedade, de nortear o rumo da vida e do modo de andar a vida.
Já se falou que estamos iniciando a fase da ética. Espero que seja realmente da ética, não da etiqueta. Dizem alguns políticos que a única coisa errada em política é perder eleição. Será isso a ética de que tanto se fala?
Mais que a fase da ética devemos iniciar a fase da transformação da sociedade, e ninguém melhor do que o Senado, que tem a obrigação de ser o seu paradigma, para sair na frente, abrindo caminhos, rompendo fronteiras, abandonando a mesmice e se tornando um exemplo para as demais instituições.
É hora de agir, não apenas de falar, de operar os mecanismos com agilidade dando respostas imediatas à sociedade.
Reclamar do excesso de medidas provisórias é confessar a incapacidade de votá-las em tempo, permitindo a sua reedição e oferecendo ao Executivo o motivo para o seu uso exagerado.
Modernizar não significa apenas trabalhar com equipamento de ponta, mas saber diagnosticar e tratar com presteza as mazelas da sociedade. Significa viver o que o povo vive, compreender e se comprometer com a sociedade em primeiro lugar.
Modernizar significa lutar pela retomada, não do crescimento, mas do desenvolvimento. Enquanto o primeiro conceito se exaure no quantitativo, o desenvolvimento implica mudança de nível de qualidade do viver da sociedade, não apenas da minoria que detém a absoluta maioria da riqueza e da renda nacional.
Nenhum país do mundo concentrou tanta riqueza nas mãos de poucos, em tão pouco tempo, quanto o Brasil nas últimas décadas. Agora o povo e o mundo esperam que, com a mesma velocidade, haja, não uma desconcentração, mas uma distribuição real de renda entre todos os brasileiros. Esta mudança deve ser o foco principal do trabalho do novo Congresso.
Insisto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que é dever do Senado assumir a vanguarda desta luta, acima de quaisquer interesses pessoais, partidários ou regionais.
Muito obrigado, Sr. Presidente.