Discurso no Senado Federal

PROTESTO POR TEREM SIDO DESATIVADOS OS DOIS UNICOS ARMAZENS MANTIDOS PELA CAMPANHA NACIONAL DE ABASTECIMENTO-CONAB NO ESTADO DO TOCANTINS. APELO AO MINISTRO DA AGRICULTURA, SENADOR JOSE EDUARDO DE ANDRADE VIEIRA, EM FAVOR DA DEFINIÇÃO DE UMA POLITICA FIRME DE DEFESA DO PRODUTOR AGRICOLA NACIONAL.

Autor
Jacques Silva (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/GO)
Nome completo: Jacques Silva de Sousa
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA AGRICOLA.:
  • PROTESTO POR TEREM SIDO DESATIVADOS OS DOIS UNICOS ARMAZENS MANTIDOS PELA CAMPANHA NACIONAL DE ABASTECIMENTO-CONAB NO ESTADO DO TOCANTINS. APELO AO MINISTRO DA AGRICULTURA, SENADOR JOSE EDUARDO DE ANDRADE VIEIRA, EM FAVOR DA DEFINIÇÃO DE UMA POLITICA FIRME DE DEFESA DO PRODUTOR AGRICOLA NACIONAL.
Publicação
Publicação no DCN2 de 01/02/1995 - Página 1840
Assunto
Outros > POLITICA AGRICOLA.
Indexação
  • PROTESTO, DESATIVAÇÃO, ARMAZEM, Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB), PAIS, ESPECIFICAÇÃO, ESTADO DO TOCANTINS (TO).
  • SOLICITAÇÃO, JOSE EDUARDO DE ANDRADE VIEIRA, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA AGRICULTURA (MAGR), MINISTERIO DA AGRICULTURA, DO ABASTECIMENTO E DA REFORMA AGRARIA (MAARA), DEFINIÇÃO, POLITICA AGRICOLA, DEFESA, INTERESSE, PRODUTOR, PAIS.

O SR. JACQUES SILVA (PMDB-GO. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, com quantos armazéns se combate a Fome no Brasil? 

De quantos armazéns precisa o Brasil para estocar os alimentos que lhe permitam vencer o desafio da fome?

Um país que mantém parte de sua população em estado de fome endêmica pode ser dar ao luxo e ao requinte de fechar armazéns de estocagem de alimentos?

Um país que possui uma população de mais de trinta milhões de famintos, um contingente vergonhoso de pessoas subalimentadas, mal alimentadas ou simplesmente não-alimentadas, pode se permitir o luxo de deixar fechar armazéns que guardam comida?

Pode um país, que consegue se alinhar entre os mais atrasados do mundo no que diz respeito à mortalidade infantil, deixar ruírem armazéns de comida, abandonar instalações existentes e deixar que mais e mais crianças morram de fome?

Se somos capazes de nos manter entre as dez maiores e mais importantes economias do mundo, por que não somos capazes de nos incluir entre os países de melhor qualidade de vida no mundo? O que nos falta, se somos capazes de produzir alimentos em larga escala, se somos até um dos maiores produtores mundiais de alimentos, se podemos nos superar, a cada ano, e conseguir uma supersafra agrícola, como esta que se vem anunciando desde já? 

O que nos falta?

Qualquer analista, com um mínimo de bom senso, perceberá que as contradições de um Brasil capaz de produzir alimentos em larga escala e, ao mesmo tempo, capaz de deixar que mais de trinta milhões dos seus concidadãos sejam excluídos e expulsos de sua mesa, mostram que o País deve estar cometendo um grande equívoco de natureza gerencial.

Não nos falta competência técnica para produzir comida; falta-nos é competência administrativa para colocar o resultado de todo esse esforço técnico a serviço de todo o povo, e não apenas a serviço de uma parte dele.

Qualquer um poderá ver que nos faltam políticas claras, definidas e firmes que assegurem a cada contribuinte que o dinheiro com que ele colaborou para financiar, por exemplo, os subsídios à agricultura, retornará em benefício de todo o povo e não de apenas alguns privilegiados.

Se peço políticas firmes é porque a imagem que me ocorre, ao ver a facilidade com que, a cada governo, a cada safra quase, são mudadas as regras e os rumos da Agricultura Nacional, é a imagem de alguma coisa fluida, líquida e cambiante, em tudo oposta ao ideal de solidez, de clareza e de estabilidade que se deveria esperar de normas que regem uma atividade, como a atividade agrícola, onde quase nada se improvisa.

Mas a cada ano o que vemos, como acontece com as normas do Imposto de Renda, é que mudam as regras do jogo para o financiamento da agricultura, a cada governo mudam as metas, a cada safra quase, mudam as intenções de quem financia a produção de comida, como se as intenções de quem planta pudessem ser mudadas ao bel prazer da burocracia nacional.

Feliz ou infelizmente, a natureza não se submete aos ditames da burocracia. Infelizmente, para a nomenklatura tupiniquim, a agricultura impõe seu próprio ritmo e exige respeito absoluto a seus próprios limites.

Falta-nos sem, dúvida, competência administrativa para que a riqueza que somos capazes de produzir seja colocada ao alcance de todos. Justiça Social, Desenvolvimento e Crescimento Econômico não são categorias antagônicas e inconciliáveis, por mais que a nossa experiência histórica insista em nos dizer o contrário, ao longo de todos esses séculos de convivência dos Dois Brasis de que nos falava Jacques Lambert nos idos dos anos cinqüenta. Um Brasil escravo e outro livre, um Brasil branco e outro mulato ou negro, um Brasil rico e outro pobre, um Brasil que sustenta e apóia as oligarquias e outro que sofre, obedece e cala.

Um Brasil que se alinha entre os grandes produtores mundiais de comida e um outro Brasil que deixa mais de trinta milhões de seus cidadãos com fome.

É este o desafio que temos que enfrentar e que a nossa consciência nos impõe como o dever de uma geração que abriu os olhos para essa realidade e não aceita mais conviver com ela.

É por esta razão que o fechamento de armazéns da Companhia Nacional de Abastecimento - CONAB, em todo o Brasil, como vem sendo feito nos últimos tempos, longe de significar apenas uma decisão burocrática, tomada por razões de ordem interna da administração desse ou daquele órgão, é um verdadeiro acinte à nossa consciência e ao sentimento de eqüidade e racionalidade que deve nortear a gestão de recursos públicos.

Um desmando que não se consegue justificar em um país que tem fome.

Um descalabro que não posso admitir é que, no Estado de Tocantins, até pouco tempo território goiano, entre os dois únicos armazéns que a CONAB mantinha, um está em ruínas e o outro foi desativado.

Como se isso pudesse ser feito em um Estado que se mostrou capaz de colher safras a cada ano maiores, em um Brasil que precisa de alimentar também aqueles seus mais de trinta milhões de famintos.

O armazém da CONAB em Araguaína, no Tocantins, está totalmente danificado. Por incúria, por descaso ou por mera incompetência de seus administradores, os recursos que ali foram investidos correm o risco de nunca mais retornarem aos nossos cofres. 

O outro armazém da CONAB em Tocantins, construído em Formoso do Araguaia, ainda tem como ser recuperado mas corre o risco de permanecer vazio e inútil, como mais um monumento ao desperdício e ao descaso com que são tratados os parcos recursos de que a nação dispõe.

Neste momento em que o Brasil parece respirar um clima geral de otimismo, nos momentos iniciais de uma nova gestão, fazemos daqui o nosso apelo para que, em nome da racionalidade e do respeito ao dinheiro do povo, se impeça que mais armazéns da CONAB sejam fechados em todo o País, e se providencie a recuperação imediata de todos os que ainda estão em condições de uso.

É um apelo que fazemos ao Sr. Ministro da Agricultura, Senador José Eduardo de Andrade Vieira, de quem podemos esperar uma gestão firme, clara e decidida em defesa do interesse do produtor agrícola nacional. Estou seguro de que a mentalidade de um homem formado ao calor da luta diária, que caracteriza vida de qualquer empresário, nos permite alimentar a esperança de uma gestão racional dos imensos recursos de um país que já se dispôs a ser até mesmo o celeiro do mundo, a serviço da produção de comida, contra o desperdício.

O titular do Ministério da Agricultura dos dias de hoje é, mais apropriadamente, o titular do Ministério da Alimentação e é o maior responsável institucional pelo combate à fome no Brasil.

Por esse motivo é que estou confiante de que não será preciso deixar ruírem mais e mais armazéns que deveriam estar cheios de comida, até que nos convençamos finalmente da necessidade de soluções duradouras, claras, definidas e permanentes para que Brasil se descubra, enfim, capaz de alimentar o seu povo.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente. 


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 01/02/1995 - Página 1840