Discurso no Senado Federal

RELATO DOS SEUS 65 ANOS DE VIDA POLITICA EM COMPLEMENTAÇÃO A SEU DISCURSO DE DESPEDIDA, PROFERIDO NO DIA 18 DE DEZEMBRO ULTIMO.

Autor
Nelson Carneiro (PP - Partido Progressista/RJ)
Nome completo: Nelson de Souza Carneiro
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ATUAÇÃO PARLAMENTAR.:
  • RELATO DOS SEUS 65 ANOS DE VIDA POLITICA EM COMPLEMENTAÇÃO A SEU DISCURSO DE DESPEDIDA, PROFERIDO NO DIA 18 DE DEZEMBRO ULTIMO.
Publicação
Publicação no DCN2 de 01/02/1995 - Página 1839
Assunto
Outros > ATUAÇÃO PARLAMENTAR.
Indexação
  • COMPLEMENTAÇÃO, DISCURSO, RELAÇÃO, ATIVIDADE POLITICA, ATUAÇÃO PARLAMENTAR, ORADOR, MOTIVO, DESPEDIDA, SENADO.

O SR. NELSON CARNEIRO (PP-RJ. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, há vinte e quatro anos, na primeira sessão da Legislatura, ocupei esta tribuna, para dizer a que vinham, no auge do poder autoritário, aqueles sete bravos do PMDB, que me deferiram a honra de liderá-los. E, a partir de então, fui deixando nos Anais ciência de tudo que realizamos, para julgamento dos pósteros. Chegou a hora do adeus. Sinto que, animado do mesmo propósito, deponha para os que vierem de nós o que fizemos e o que deixamos de fazer, nos traços rápidos de um depoimento veraz e insuspeito. Nunca transigimos com o arbítrio. Fomos uma voz a serviço da liberdade, ainda quando a ordem constitucional perecia definitivamente sepultada sob o império do poder absoluto. Enchemos os Anais com o protesto contra as restrições á imprensa. Quando mais se adensavam as nuvens negas da onipotência governamental, cassando mandatos e sepultando esperanças com a campanha do anticandidato, heróica e gratuita, abrimos uma réstia de claridade, por onde afinal a Nação, alargando-a, começou a acreditar em dias melhores. Se não fomos, porque minoria, capazes de fazer sozinhos as leis, coube-nos colaborar para aperfeiçoá-las. Aquele pugilo de combatentes cumpriu seu dever, honrou o compromisso inicial.

Sinto de meu dever deixar nos Anais um pouco de minha vida política, que tanto interessa aos maldizentes. Durante 65 anos, dos 19 aos 84, houve duas fases. a primeira desenrolou-se na província, em partidos locais. Na campanha da Aliança Liberal e na Ação Autonomista. A UDN, fundada em 1945, foi o primeiro partido nacional a que pertenci sob a liderança de Otávio Mangabeira, e em companhia de Luiz Viana, Aloísio de Carvalho, Nestor Duarte, Gilberto Valente, Lomanto Júnior, Josaphat Marinho, Jaime Aires, Jaime Baleeiro e outros consagrados baianos. Em 1951, a sucessão regional dividiu as alas da UDN e os mangabeiristas, todos eles, com a perda da legenda, emigraram para o Partido Libertador. Em 1958, Mangabeira, entre os três candidatos ao Governo do Estado, escolhera aquele com quem eu estava pessoalmente incompatibilizado. Para não dar à Bahia o espetáculo de subir em tribuna diferente da ocupada pelo chefe e companheiro de tantos anos, resolvi não participar do pleito eleitoral, dedicando-me à advocacia em São Paulo. Eis quando Augusto do Amaral Peixoto me escreveu, convidando-me para integrar a chapa da Aliança Democrática Nacionalista, união de sete pequenos partidos cariocas, inclusive do PSD, que ele presidia, e o Partido Libertador. E somente aceitei fazê-lo depois que Luiz Viana, então Presidente do PL baiano, publicou em A Tarde, de Salvador, a necessária resposta, dizendo que não me dava, me emprestava à política do Rio de Janeiro. Acompanhei, uma a uma, as convenções dos partidos coligados, para conhecer e conviver com os líderes políticos da capital da República. A sexta Convenção era do PSD. Ao chegar, um pouco atrasado, fui recebido com palmas. Diante de minha estranheza, Augusto do Amaral Peixoto passou-me um bilhete, informando que meu nome já fora homologado pelo Partido. Finda a reunião, explicou-me que, naquela tarde, fora procurado pelo presidente da seção regional do Partido Libertador, Xavier de Araújo, antecipando que, igualmente candidato, não poderia indicar meu nome, sob pena de por em risco sua própria eleição. Foi então que Amaral Peixoto, para que eu não perdesse todo o trabalho realizado, me incluíra entre os indicados pelo PSD, ressalvando, com a nobreza que o caracterizou, que eu continuava livre para escolher a legenda que desejasse. A Aliança elegeu dois Deputados, Breno da Silveira, do Partido Socialista, e eu. Na primeira sessão da legislatura 1959/1963, inquirido, declarei que integraria a bancada do PSD. E assim agia com prévio conhecimento dos colegas baianos. Em 1965 um ato institucional extinguiu todos os partidos, inclusive o PSD, e possibilitou o surgimento de dois novos. Escolhi o MDB, e nele militei até 1982, quando a sucessão fluminense fez que o abandonassem os três Senadores. Cada um escolheu seu destino, e filiei-me ao PTB. Divergências de orientação determinaram que retornasse posteriormente ao MDB, então PMDB. Notórias eram as dificuldades de entendimento das duas correntes da secção regional da tradicional agremiação, de que me afastei em dezembro do ano passado, depois de frustradas todas as tentativas de aglutinação, como depôs em plenário o Líder Mauro Benevides.

Enquanto isso há quem se gabe de haver militado num só partido. A diferença é que acompanhei até à hora derradeira J.J. Seabra, Otávio Mangabeira e Amaral Peixoto, meus chefes e amigos. E poderia voltar a qualquer partido, sem público ato de contrição. Por mais lágrimas que vertesse, o maldizente não tornaria à agremiação que tão generosamente o acolhera, ainda que se dispusesse a cumprir qualquer penitência imposta pelo líder traído. Contra sua reintegração nos quadros partidários, todos antigos e novos companheiros protestariam, dos garotinhos ao militantes da terceira idade.

No curso de minha carreira política, nunca recebi um ceitil de qualquer Partido. Cozi-me com as linhas de minha pobreza. Ainda em 1994, as despesas da Coligação foram pagas com os recursos arrecadados pelos quatro partidos que a integravam, e sem qualquer interferência minha. Isso mesmo deve constar das contas prestadas à Justiça Eleitoral.

As razões que me levaram a deixar o PMDB, que fundara, estão no discurso pronunciado no Senado Federal em 29 de dezembro de 1994, e corroboradas pelo depoimento, na mesma sessão, pelo líder Mauro Benevides. Errei em integrar o que deveria ser a chapa da Coligação Rio Unido, atendendo ao apelo de seu candidato a Governador, arrependido de haver escolhido para compô-la um ilustre Deputado pelo PTB, que descartou assim obteve meu apoio. A história é de ontem. O candidato presidencial foi um prisioneiro de alguns correligionários nas rápidas visitas ao Rio, e encerradas, a poucos dias do pleito, com uma desastrada declaração que a imprensa acreditou de crítica à minha candidatura. Coube ao Rio de Janeiro converter as eleições numa apoteose de fraudes. O Tribunal anulou umas, validou outras, embora a urna fosse uma só e os fraudadores fossem os mesmos.

Os out-doors, que a Coligação espalhara pelo Estado, sob a responsabilidade do candidato a governador, não tinham nem meu nome, nem minha fotografia. E, no ato de votar, teve ele o cuidado de mostrar, pela televisão, que não votava em mim. 3 de outubro no Rio de Janeiro, foi Sábado de Aleluia.

Encerro 65 anos de vida pública e pouco mais de quarenta e dois de atividade parlamentar. Nos 24 anos como Senador, nunca invoquei a idade para licenciar-me, e não o faria quando confio que somente Deus sabe os anos que me restam. A infâmia não me alcança. Como todo candidato a cargo majoritário, designei dois suplentes, antigos parlamentares, sem qualquer impugnação. O candidato a governador quebrou lanças para indicar o Vice-governador, contrariando quantos sustentavam outros nomes, igualmente capazes. Os macacos continuam sem olhar para trás.

Integra esse depoimento o discurso com que encerrei minha carreira política no último dia 18. Apenas o completo, que a generosidade dos apartes não me permitiu concluir.

Obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 01/02/1995 - Página 1839