Discurso no Senado Federal

DISPOSIÇÃO DA BANCADA DO PT PARA COLABORAÇÃO NO FORTALECIMENTO DO CONGRESSO NACIONAL. REFLEXÕES SOBRE O DIREITO INTERNACIONAL E AS DIFICULDADES DIPLOMATICAS COM CUBA.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
CONGRESSO NACIONAL. POLITICA EXTERNA.:
  • DISPOSIÇÃO DA BANCADA DO PT PARA COLABORAÇÃO NO FORTALECIMENTO DO CONGRESSO NACIONAL. REFLEXÕES SOBRE O DIREITO INTERNACIONAL E AS DIFICULDADES DIPLOMATICAS COM CUBA.
Publicação
Publicação no DCN2 de 17/02/1995 - Página 2048
Assunto
Outros > CONGRESSO NACIONAL. POLITICA EXTERNA.
Indexação
  • SAUDAÇÃO, SENADOR, PARTICIPAÇÃO, TRABALHO, INICIO, LEGISLATURA.
  • REGISTRO, DISPOSIÇÃO, BANCADA, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), CONTRIBUIÇÃO, TRABALHO, REFORÇO, SENADO, CONGRESSO NACIONAL.
  • CUMPRIMENTO, MESA DIRETORA, ADOÇÃO, PROVIDENCIA, DISCIPLINAMENTO, UTILIZAÇÃO, CENTRO GRAFICO DO SENADO FEDERAL (CEGRAF), CONVOCAÇÃO, SUPLENTE, PRESENÇA, REUNIÃO, CRIAÇÃO, COMISSÃO, OBJETIVO, SUGESTÃO, FORMA, APRECIAÇÃO, DEBATE, VOTAÇÃO, ORÇAMENTO, APURAÇÃO, MELHORIA, FUNCIONAMENTO, SENADO.
  • DEFESA, REALIZAÇÃO, REFORMA AGRARIA, REFORMA TRIBUTARIA, NECESSIDADE, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, GARANTIA, ESTABILIDADE, PREÇO, MELHORIA, DISTRIBUIÇÃO DE RENDA, COMBATE, MISERIA.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), AUTORIA, JOSE ARTHUR GIANNOTI, JORNALISTA, RECOMENDAÇÃO, GOVERNO BRASILEIRO, DEMONSTRAÇÃO, BILL CLINTON, PRESIDENTE DE REPUBLICA ESTRANGEIRA, NECESSIDADE, EXTINÇÃO, BLOQUEIO, COMERCIO, PAIS ESTRANGEIRO, CUBA, GARANTIA, SOLIDARIEDADE, AMERICA LATINA, AUXILIO FINANCEIRO, MEXICO.
  • DEFESA, NECESSIDADE, SENADO, DISCUSSÃO, CRITERIOS, SOLIDARIEDADE, PAIS ESTRANGEIRO.

O SR. EDUARDO SUPLICY (PT-SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, entusiasmado e cônscio da responsabilidade que temos perante o povo brasileiro, saúdo os novos Senadores - do Partido dos Trabalhadores e dos demais Partidos - no início de nossa participação nos trabalhos desta 50ª Legislatura.

Inicialmente, quero registrar a disposição da Bancada do Partido dos Trabalhadores de trabalhar com muito afinco para colaborar com todos no propósito de fortalecer o Senado Federal e o Congresso Nacional. Desejamos que esta Casa esteja à altura das esperanças de um povo generoso que confiou a nós a difícil missão de guardar e melhorar nossa Constituição, de elaborar leis e de fiscalizar os atos do Executivo. Para isso será importante iniciarmos, dando bons exemplos em nossa própria Casa.

Cumprimento a Mesa por algumas de suas primeiras medidas, quais sejam, a de disciplinar adequadamente o uso da Gráfica, a de convocar os suplentes a estar presentes em todas as reuniões - até para estarem assim bem informados - e a de constituir comissões - a primeira, para sugerir a melhor forma de a Casa apreciar, debater e votar o Orçamento da União, e a segunda, para verificar os meios de o Senado melhor funcionar.

Em segundo lugar, assinalo que o Partido dos Trabalhadores vai examinar com atenção as proposições que o Executivo está remetendo ao Congresso Nacional; com igual atenção, apreciará aquelas que os Senadores de todos os demais Partidos expuserem, bem como apresentará propostas tanto de emendas à Constituição, como de leis complementares e ordinárias.

Seremos transparentes em nossas ações, dizendo com franqueza nossas opiniões, exercendo nossa crítica, opondo-nos quando o interesse do povo estiver sendo ferido e formulando sugestões de aperfeiçoamento e de alternativas sempre que for o caso.

Algumas de nossas maiores preocupações envolvem aspectos da política econômica que possam garantir que o Brasil cresça com preços estáveis, com rápida melhoria da distribuição da renda, e ataque frontal, prioritário, à miséria.

Estaremos acompanhando aqui todos os passos direcionados à realização da reforma agrária, assinalando os que deixarem de ser dados nesse sentido. Para este ano, o compromisso do Presidente Fernando Henrique Cardoso foi o de assentar 40 mil famílias - uma meta modesta; mas até hoje, dia 16 de fevereiro, passados 47 dias de Governo, houve providências de desapropriação de áreas já preparadas por ato do ex-Presidente Itamar Franco e que permitiram o assentamento de apenas 873 famílias. É preciso que as intenções do Presidente se transformem em atos que modifiquem e melhorem a vida dos trabalhadores no campo.

Para se caminhar na direção de maior justiça, é necessário modificações no quadro tributário, no sentido de maior progressividade, e que seja compatível com maior eficiência da economia. A arrecadação dos impostos está concentrada, sobretudo, no trabalho e no consumo, muito menos do que no capital; muito mais nos impostos indiretos do que nos diretos, ao contrário da tendência dos países que alcançaram melhor distribuição de renda e maior eqüidade.

Faz-se necessária a tributação de grandes fortunas de forma consistente, inclusive com o que foi aprovado aqui como projeto do Senador Fernando Henrique Cardoso, uma forma que, infelizmente, parece estar sendo desconsiderada pelo próprio Presidente. É necessário que se efetive a arrecadação de impostos daqueles que têm mais responsabilidade de colaborar com os esforços da Nação para acabar com as suas grandes chagas sociais.

Daremos também importância à questão da solidariedade para com aqueles que tantas vezes estiveram sem voz e sem vez em nosso País; aqueles que tiveram seus direitos à cidadania negados. Seremos solidários também com os povos oprimidos de todo o mundo.

Nesses últimos dias, o Ministro da Fazenda do México anunciou ao Congresso desse país que os Governos dos Estados Unidos, Canadá, inclusive com a colaboração do Brasil, Argentina, Chile e Colômbia, vão participar de uma ajuda ao México. O Partido dos Trabalhadores enviou ontem um comunicado ao embaixador mexicano, informando da nossa disposição de ser sempre solidários com o povo do México. Nesse caso, entretanto, parece estar havendo mais uma ajuda àqueles que temem a desvalorização abrupta do valor de suas ações; uma ajuda que significa mais a tentativa de salvar aqueles que realizaram investimentos especulativos na Bolsa de Valores do México. Por essa razão, explicamos ao embaixador mexicano que não estaremos de acordo com essa proposição, sem antes discutirmos mais adequadamente os critérios de solidariedade a todos os países.

A propósito, uma das pessoas mais próximas ao Presidente da República e que pode até ser considerada um ministro sem pasta, porque durante a campanha e desde os primeiros momentos do atual Governo vem acompanhando Fernando Henrique Cardoso, publicou um artigo, de grande relevância, na Folha de S.Paulo na semana passada. Mencionarei aqui alguns dos trechos mais importantes que merecem a reflexão do Senado Federal, pois, certamente, uma de nossas principais atribuições, a curto prazo, será a discussão deste tema.

É prerrogativa do Senado Federal discutir e votar qualquer operação financeira de interesse da União, segundo o art. 52, V, VII e VIII, da Constituição. A propósito dessa questão, disse à Folha de S.Paulo, da última semana, José Arthur Giannotti:

      Não vejo como os Estados Unidos venham a pedir a solidariedade das Américas para o caso mexicano sem que suspendam o indecente bloqueio que infligem a Cuba.

      Parece que é do interesse brasileiro socorrer os especuladores internacionais, quando estes se vêem em apuros por terem especulado na bolsa de países emergentes.

      Sem acreditar na capacidade de fazer milagre desse dinheiro, pode ser que, bem aproveitado, possa servir a interesses nacionais. Este é um problema a ser estudado e decidido pelo Governo e pelo Senado brasileiros, na base de critérios econômicos e políticos. Mas, desde que critérios políticos sejam evocados, não me parece nada conveniente deixar de lado os nossos interesses internacionais. E, para nós, é politicamente muito importante deixar Cuba livre para decidir seu próprio destino. Não é só uma questão de Direito Internacional, mas ainda uma questão que toca o nosso próprio futuro.

      Não posso deixar de lamentar a degradação por que passou, nesses últimos tempos, os ideais da Revolução Cubana.

      Se uma economia ultracentralizada se mostrou incapaz de lidar com os problemas levantados pelo funcionamento de mercados setoriais, se o socialismo do tipo soviético "foi para o brejo", não se segue daí a inevitabilidade de um Estado ultraliberal. Pelo contrário, se uma economia de mercado se mostrou como a melhor forma de gerar riquezas, não é por isso que o mercado, por si só, tenha sido capaz de distribuir essa riqueza de forma justa e mais equânime.

      Se, de um lado, o novo desenvolvimento capitalista requer a presença mais ativa de mecanismos de mercado, de outro também se evidencia que, por si só, o mercado não resolve os problemas de desemprego estrutural e dos bolsões de miséria que ele cria. Desse ponto de vista, a experiência de Cuba nos é preciosa, pois ninguém pode desconhecer a Revolução por que passou no plano da distribuição de renda, da saúde, da educação e da cultura.

      Ora, essa experiência foi engessada pelo bloqueio americano, já que os Estados Unidos parecem insistir na tese de que a Revolução Cubana foi um acontecimento diabólico a ser extirpado pela raiz. Dessa perspectiva, a vitória dos Estados Unidos sobre Cuba não possui qualquer dimensão econômica, mas, isto sim, uma dimensão ideológica, como se a derrubada de Fidel Castro constituísse a prova material da verdade do liberalismo.

      Não há dúvida de que Fidel, hoje, é uma triste figura, passeando o seu caudilhismo aprumado num uniforme de campanha. Mas não sabemos até que ponto essa caricatura também resulta do isolamento a que foi submetido.

      O Brasil, como outros países periféricos, onde esta ou aquela forma de socialdemocracia foi instalada, tem interesse vital numa solução orgânica das dificuldades cubanas.

      A Ilha é um laboratório vivo das virtudes e das mazelas do socialismo real. Muito podemos aprender com as soluções que ela precisa encontrar com uma gradual incorporação da economia de mercado, combinando profunda reforma do Estado totalitário. Isso, obviamente, sem desconsiderar nossa solidariedade com o povo cubano como tal.

      Ora, parece-me inteiramente descabido que o novo Governo brasileiro se apresse a socorrer as finanças mexicanas sem fazer ver a Bill Clinton a irracionalidade e a perversidade de sua política anticubana.

      Nossa solidariedade é com todas as Américas. De sorte que um País não pode ser socorrido enquanto o outro continua sendo sufocado pelo mesmo capital que precisa de nossa ajuda.

Melhor do que a mensagem do Presidente Fernando Henrique Cardoso, proferida ontem e enviada ao Congresso, em que deixou de mencionar esses aspectos, entendo que a recomendação de José Arthur Gianotti deve ser abraçada por todos nós do Senado Federal. Avalio ser importante que um número considerável de Senadores venha a esta Casa e diga com firmeza ao Presidente Fernando Henrique Cardoso que Sua Excelência terá o nosso respaldo - representantes do povo que somos - se disser ao Presidente Bill Clinton que não faz sentido algum esse bloqueio comercial a Cuba, que, em fevereiro de 1995, fará nada menos do que 33 anos - foi em fevereiro de 1962 o seu estabelecimento.

É preciso, inclusive, que os problemas, os sucessos e os fracassos, os erros e os acertos da Revolução Cubana tenham condições de ser realizados sem esse bloqueio. Assinalo também que há, dentre os povos do mundo, a solidariedade para com este ato. O próprio ex-Presidente Mikhail Gorbachev, da União Soviética, ainda há pouco mais de um mês, escreveu artigo aberto ao Presidente Bill Clinton dizendo ser necessário eliminá-lo.

É preciso que o Senado Federal pense em formas de solidariedade internacional. É preciso que a representação do Brasil, na Conferência de Cúpula das Nações Unidas, que se realizará nos próximos dias, em Copenhague, discuta como o Brasil irá contribuir em termos de um desenvolvimento mais saudável para todos os povos do mundo. Mas para que o País possa falar da necessidade de maior solidariedade, da necessidade de melhor distribuição da riqueza e da renda entre as nações do mundo, faz-se necessário a adoção de uma política doméstica, de uma política interna consistente com esses propósitos. Como poderá o Brasil participar da Conferência de Copenhague sobre como melhorar a distribuição de renda e acabar com a pobreza se aqui não estivermos dando exemplos a esse respeito?

É perfeitamente possível pensarmos em formas de transferência de recursos dos países mais ricos para os mais pobres, mas que haja consistência, com forma de transferência de recursos dentro de cada país.

Nesse sentido se insere o Programa de Garantia de Renda Mínima que está sendo hoje objeto de estudo por parte do Executivo e objeto de debate na Câmara dos Deputados, uma vez que foi aprovado pelo Senado Federal.

Concluo, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, dizendo da disposição que existe por parte do Partido dos Trabalhadores em trabalhar e contribuir para que o Senado Federal se fortaleça, para que esteja à altura das expectativas do nosso povo, que deseja um Congresso Nacional respeitado por todos.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 17/02/1995 - Página 2048