Discurso no Senado Federal

DESPEDINDO-SE DO SENADO FEDERAL. CONSIDERAÇÕES SOBRE O ESCANDALO DO ORÇAMENTO E A ATIVIDADE LOUVAVEL DO CONGRESSO NA PRESERVAÇÃO DA DIGNIDADE DA INSTITUIÇÃO.

Autor
Pedro Teixeira (PP - Partido Progressista/DF)
Nome completo: Pedro Henrique Teixeira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SENADO. LEGISLATIVO. COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), DIVIDA AGRARIA.:
  • DESPEDINDO-SE DO SENADO FEDERAL. CONSIDERAÇÕES SOBRE O ESCANDALO DO ORÇAMENTO E A ATIVIDADE LOUVAVEL DO CONGRESSO NA PRESERVAÇÃO DA DIGNIDADE DA INSTITUIÇÃO.
Aparteantes
Lourival Baptista, Mauro Benevides.
Publicação
Publicação no DCN2 de 31/01/1995 - Página 1436
Assunto
Outros > SENADO. LEGISLATIVO. COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), DIVIDA AGRARIA.
Indexação
  • DISCURSO, DESPEDIDA, SENADO, IMPLEMENTAÇÃO, MANDATO.
  • CRITICA, IMPRENSA, DEFESA, CONGRESSISTA, DESRESPEITO, CONGRESSO NACIONAL.
  • COMENTARIO, AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO, CONGRESSO NACIONAL, FATO, IMPORTANCIA, LEGISLATURA, POLITICA NACIONAL.
  • ELOGIO, AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO, LEGISLATURA, CONGRESSO NACIONAL.
  • COMENTARIO, CRESCIMENTO ECONOMICO, RELAÇÃO, ESTABILIZAÇÃO, ATIVIDADE, CONGRESSO NACIONAL.
  • CRITICA, BANQUEIRO, AUMENTO, TAXAS, JUROS.
  • REFERENCIA, TRABALHO, COMISSÃO PARLAMENTAR MISTA DE INQUERITO, DIVIDA AGRARIA, DEMONSTRAÇÃO, RESPONSABILIDADE, SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL, OBEDIENCIA, FUNDO MONETARIO INTERNACIONAL (FMI).
  • CRITICA, OMISSÃO, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, EX MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA FAZENDA (MF), PROVIDENCIA, CUMPRIMENTO, RECOMENDAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR MISTA DE INQUERITO, DIVIDA AGRARIA.
  • DENUNCIA, ABUSO, PODER ECONOMICO, POLITICO, ELEIÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, CASSAÇÃO, MANDATO.
  • COMENTARIO, PRIVATIZAÇÃO, BANCOS, CRISE, LESÃO, BRASIL.
  • CRITICA, ACUSAÇÃO, IMPRENSA, PARTICIPAÇÃO, ORADOR, PROBLEMA, CONDOMINIO, DISTRITO FEDERAL (DF).
  • DEFESA, NECESSIDADE, CONGRESSO NACIONAL, PRESERVAÇÃO, DIGNIDADE, HONRA, INSTITUIÇÃO PUBLICA.

O SR. PEDRO TEIXEIRA (PP-DF. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, sobremodo emocionado, assomo à tribuna para proferir minha breve alocução de despedida do Senado Federal, por implemento do meu mandato.

Ao fazê-lo, quero, em primeiro lugar, agradecer a Deus pela graça que me concedeu ao elevar-me, nas funções públicas e como representante do Distrito Federal, à honrosa condição de membro da Câmara Alta, onde se encontram heróicos baluartes, defensores dos interesses nacionais, orientadores dos desígnios da Pátria e guardiães do Estado de Direito democrático, com os quais pude privar de feliz e salutar convívio.

Com os meus ilustres Pares muito aprendi, ouvindo suas sábias lições, por vezes, ousando debater matérias trazidas à apreciação.

Já se me antecipa a saudade dos inesquecíveis momentos em que aqui vivi por horas, dias e meses, tendo por companheiros eminentes Parlamentares de diversas e prestigiosas agremiações partidárias, na busca incessante do melhor para o Brasil e o nosso povo.

Não obstante, o Poder Legislativo é o eterno injustiçado, eis que alvo predileto das assacadilhas irresponsáveis, acusações levianas e maniqueístas, investidas quejandas e ofensas irrogadas a Parlamentares, por parte de diminuta parcela dos meios de comunicação. Diminuta, porém estrepitosa, emprestando visão ciclópica a fatos anódinos, a serviço de iniqüidades cometidas sob o manto da liberdade de expressão, ainda que em franca libação de despautérios com o fito de denegrir a imagem do Poder, símbolo da Democracia e de atingir a honra pessoal dos seus membros.

Político, segundo essa minoria que se revela nociva à consolidação democrática, é vocábulo pejorativo, dado ao constante suspense por ela criado na opinião pública, sobretudo durante a Legislatura que ora finda.

Digo-lhes, com pureza d´alma: orgulho-me de haver integrado essa Legislatura.

Não podemos olvidar que, no curso dessa mesma Legislatura, seus membros tiveram que arrostar relevantes temas e acontecimentos político-institucionais que polarizaram as atenções da sociedade, fazendo-o sobranceiro e com elevado espírito cívico.

Assim ocorreu, cito apenas alguns exemplos, quando das alterações na estrutura administrativa do Poder Executivo, com extinção dos diversos órgãos e demissão em massa de servidores públicos civis; os sucessivos planos econômicos e implantação de novos padrões monetários exigiram do Congresso uma vigilância permanente, a bem dizer, durante os quatro anos; o processo de impeachment do Presidente da República, fato inédito na história política do País, tomou-nos um longo tempo até sua decisão final; a Revisão Constitucional, prevista no art. 3º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, pela sua alta complexidade, foi objeto de acirrados, mas elegantes debates entre personalidades de tantos saberes, máxime entre os Parlamentares; antecedendo-a, tivemos que nos ocupar com a legislação pertinente à realização do plebiscito para a escolha da forma e o sistema de governo que deveriam vigorar no País; o chamado: "Escândalo do Orçamento", envolvendo Parlamentares integrantes da Comissão Mista de Orçamento, em que pese estarrecedor, serviu para demonstrar a altivez do Congresso Nacional que, rasgando a própria carne, extirpou o cancro perverso, mediante severas punições de colegas na preservação da dignidade do Poder Legislativo, lançando dúvidas sobre se os outros dois Poderes fariam o mesmo em casos semelhantes nos seus âmbitos; as Emendas à Constituição, atendendo ponderáveis razões de ordem pública, fizeram com que o Congresso Nacional as discutisse e debatesse amplamente durante várias sessões; a morosidade na votação do Orçamento da União para o exercício de 1994 não há que se debitar ao Legislativo, eis que o Executivo não só o enviou com inusitado atraso como alterou suas propostas por múltiplas vezes; os atritos entre o Legislativo e o Judiciário, e entre este e o Executivo, só foram contornados, ao longo do tempo, mercê de hábil participação de inteligentes parlamentares da legislatura que se exaure, à qual todas as honras são devidas.

Entendo que os tempestuosos ventos da intriga e do catonismo de certas falsas vestais, felizmente não logrou erodir o Poder Legislativo, não rendendo ensejo sequer aos atrevidos e insinuantes ensaios de "fujimorização".

Não obstante tudo isso, Srªs e Srs. Senadores, o Legislativo soube, sobretudo se visto pelo ângulo da qualidade, não apenas da quantidade, exercer plenamente suas atividades típicas, produzindo normas infraconstitucionais geradoras de direitos e obrigações, bem assim a sua função fiscalizadora, consubstanciada no controle político da aplicação das leis, decorrente do princípio da representação popular, em cujo contexto se inserem os pedidos de informação a Ministros de Estado, a instauração de Comissões Parlamentares de Inquérito, e o controle externo, com auxílio ao Tribunal de Contas da União.

Quer queiram, quer não, o Brasil cresceu, respirando atmosfera_de paz social. Mas o seu crescimento econômico não ocorreu apenas em função de investimentos de riscos por parte do empresariado nacional e estrangeiro, mas pela certeza de resultados financeiros positivos, cuja garantia se deveu ao Legislativo, que soube, com maestria, zelar pelos princípios da ordem econômica e financeira preconizados na Constituição e bem cuidar do aprimoramento do nosso ordenamento jurídico de índole democrática.

O Sr. Lourival Baptista - V. Exª me permite um aparte?

O SR. PEDRO TEIXEIRA - Com muito prazer, ouço V. Exª, nobre Senador Lourival Baptista.

O Sr. Lourival Baptista - Caro amigo, Senador Pedro Teixeira, estou ouvindo V. Exª com muita atenção e gostaria de dizer que esta Casa irá perder um grande Senador, um homem que, durante a convivência que aqui mantivemos, só nos deu atenções, delicadezas. Sou muito grato a V. Exª, eminente Senador Pedro Teixeira, pois sempre que o procurei para resolver problemas ligados ao meu Estado contei com o apoio de V. Exª. Esta Casa perde um grande Senador, um homem que lutou bravamente pelo Distrito Federal. Onde estiver, eminente Senador Pedro Teixeira, disponha deste seu amigo e admirador.

O SR. PEDRO TEIXEIRA - Agradeço, nobre Senador Lourival Baptista, a generosidade com que V. Exª me brinda nesta assentada. Cresci muito todas as vezes que convivi com V. Exª nas comissões e fico honrado com o seu aparte.

Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, é este o último discurso que pronuncio no Senado, no fim de meu mandato, e podem avaliar os que ouviram meus constantes discursos e me brindaram com a leitura dos artigos que escrevi a emoção que sinto, pelas circunstâncias que envolvem a minha despedida, enquanto minh`alma se sente leve porque posso afirmar como São Paulo, de cabeça erguida, que "combati o bom combate, percorri o meu caminho e conservei a fé".

Quero agradecer àqueles que me têm manifestado a sua solidariedade e admiração, pelo desafio constante que daqui de minha pequenez, lancei às gigantescas forças do mal cartelizadas, que produziram esta Belíndia sofredora e aflita que aí está, nome por que passou a ser conhecido o Brasil: uma pequenina Bélgica, dentro de uma gigantesca Índia; a um punhadinho de bilionários, cada vez mais ricos, às custas do resto do povo; de lutadores do campo e das cidades, das pequenas, das médias e também das grandes empresas - enfim o setor inteiro da produção -, todos escravizados por esses agiotas que se dizem banqueiros, com seus juros escandalosos, que o Presidente da República, seu Ministro da Fazenda e sua equipe econômica, não querem fixar nos 12% determinados pela Constituição, desde 1988.

Mas esta é uma longa história que será contada por um pugilo de patriotas que se estão juntando para proclamar à Nação a história daquele escândalo que foi denunciado pela CPMI do Endividamento do Setor Agrícola, de que fiz parte durante seis meses, em que trabalhamos duramente para revelar à Nação o de que são capazes os componentes do Sistema Financeiro Nacional, atrevida mão longa, obediente ao Internacional, carrossel à cuja testa está o famigerado FMI, que tantas palmas bateu à vitória de Fernando Henrique, pelo cumprimento imediato de suas receitas, desde a primeira semana de seu mandato: tudo o que vem fazendo os ultraliberais montados no poder, sedizentes socialdemocratas, só interessa aos nossos credores, que não querem receber nossa dívida; querem receber só juros e mais juros, cada vez maiores. Não querem o nosso desenvolvimento: querem a nossa escravidão. Se deixarem que o gigante cresça, nos fins do primeiro quartel do próximo século, seremos a maior nação do Planeta!

Por isso dividiram o Mundo entre os países ricos e "os outros", inventaram os economistas, o neoliberalismo, a neosocialdemocracia e seus codinomes, os entreguistas - criminosos hediondos, como os chamou Hélio Fernandes, em magnífico artigo, na Tribuna da Imprensa, de 26 do corrente -, os quais estão doando nossas riquezas, por preço de banana, sob o apelido de privatização, aos banqueiros internacionais e seus testas-de-ferro: todo o Sistema Financeiro Nacional!

Na CPMI do endividamento agrícola foram ouvidas inúmeras testemunhas de escol, no último semestre de 93. Vejam o depoimento do Sr. Alcir Calliari, então Presidente do Banco do Brasil:

      Concordo totalmente; os banqueiros foram os que ganharam mais nisso. É verdade, inclusive o Banco do Brasil. Uma parte do lucro do Banco foi para a Fundação Banco do Brasil, para mil coisas, voltou para o próprio Governo, foi distribuído (sic) as ações; na verdade, o Sistema Financeiro foi quem mais se apropriou. Sobre se eu pagaria na forma que está aí, creio que nem eu nem ninguém pagaria. Se alguém se endividou num determinado valor, aplicadas aquelas taxas sobre aquele valor, a dívida torna-se incobrável...

Depois de tecer considerações, arremata:

      Nem plantando maconha irrigada seria possível pagar os empréstimos agrícolas, com os custos financeiros praticados.

      PEDRO MALAN, então Presidente do Banco Central - Não preciso ser um especialista em agricultura para saber que esta seqüência de planos a partir de 1986, com interferências em contratos, mudanças de indexadores, congelamentos, mudanças de índices teve efeitos desastrosos.

      ARISTIDES JUNQUEIRA ALVARENGA, Procurador-Geral da República - Essa é a minha vivência pessoal, e essa carga toda de vida é que trago para afirmar que esta me parece a Comissão mais importante que o Congresso Nacional já teve.

A mais importante de todas: mais que a de Fernando Collor; mais que a dos oito anões; mais que as do Império e as da República! E, depois de tanto tempo, o que as cúpulas dos Três Poderes, a quem foram dirigidas suas conclusões fizeram?

      SENADOR FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, então Ministro da Fazenda - "Todos sabem que o Sistema Financeiro tem lucros exorbitantes e, portanto, medidas devem ser tomadas para reequilibrar. Qualquer medida que eu tome nessa direção - e estou com cócegas nas mãos para tomá-la - afetará diretamente os bancos oficiais, que movem, a maior parte destes recursos".

Mas os bancos particulares movem uma grande parte, e por isto seriam também afetados pelas medidas que fizeram cócegas nas mãos do então Ministro da Fazenda, Fernando Henrique Cardoso, hoje Presidente da República. As cócegas passaram porque ele não fez nada para determinar que se devolvesse o seu a seu dono: aquilo que foi tomado dos agricultores, inclusive suas fazendas, executadas "por inadimplências", por manobras escusas, como se verificou.

Parece que, pela falta de ação do Sr. Ministro da Fazenda de então, hoje Presidente da República, um ex-Ministro da Agricultura assim depôs:

      ANTÔNIO BARROS MUNHOZ, ex-Ministro da Agricultura - Há pessoas dentro do Ministério da Fazenda, que defendem mais os bancos privados brasileiros do que a FEBRABAN.

Foi por causa disto que a CPMI fez inúmeras recomendações a todos os Poderes, especificando os órgãos que deveriam tomar urgentes providências, em face da pilhagem sofrida pelos agricultores e dos crimes cometidos nos altos escalões da República, para proteger os banqueiros.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, existe até hoje gente com cócegas nas mãos para tomar enérgicas providências sobre os eventos aqui narrados. Só cócegas.

Tudo o que falo está em uma das edições esgotadas do Relatório Final da Comissão Parlamentar de Inquérito de que estou tratando, e que precisa ser lida, estudada e ressuscitada pelo novo Congresso, para ciência de todo o povo brasileiro, que de nada sabe, porque quase nada foi feito depois das recomendações da CPMI do endividamento da dívida do setor agrícola.

Tremam de horror com a leitura dos dois primeiros períodos do Relatório:

      A criação do Conselho Monetário Nacional e do Banco Central (Lei nº 4.595/64) passando este a ser dirigido por banqueiros ou seus prepostos, com poderes de ditar normas, criou, na realidade, um novo poder na República: O PODER BANCÁRIO, o mais forte com competência de Legislativo e Executivo.

      Com o fim da conta-movimento, no Banco do Brasil, o Sistema Financeiro passou a ter lucros, e grandes lucros, enquanto os demais setores da economia passaram a amargar o descontrole. A inflação não teve mais travas, passou a viver o País na era da especulação e na estimulada correção monetária, relegando as atividades produtivas, resultando no desemprego e na fome vivida pela população brasileira.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, e, então, algumas perguntas inocentes para serem respondidas pelos Congressistas, pelo povo e por todos aqueles que dirigirão os destinos de nossa Pátria, nos próximos anos:

- A quem apoiaram, com tanta magnanimidade, os banqueiros nas eleições de outubro? E a Rede Globo, sem fazer nenhum mistério disto, a quem apoiou? As concessionárias de serviço público, todas as TVs e Rádios não podem fazer propagandas diretas ou indiretas em favor de qualquer partido ou de qualquer candidato. A que for feita será considerada doação ilícita, estimada em dinheiro, segundo o texto do art. 45 da Lei nº 8.713/93, que estabeleceu as normas para as eleições de 1994.

E esse apoio feito às claras, muito além dos limites permitidos pela lei, somado ao apoio dos banqueiros nacionais e internacionais? Esse apoio público e notório quanto vale, em milhões de reais, que extravasaram muito além daqueles limites permitidos por lei? Esse abuso do poder econômico tem, como conseqüência, a cassação do mandato do candidato dos banqueiros, hoje assentado na curul presidencial, Fernando Henrique Cardoso.

Não é à toa que a equipe econômica de Fernando Henrique Cardoso vem permitindo aos banqueiros cobrar esses juros, inadmissíveis em qualquer parte do mundo, e que pagamos a esses agiotas travestidos de banqueiros, que assaltaram o Banco Central, o Banco do Brasil, o Conselho Monetário Nacional, os Bancos estaduais e que querem tomá-los para si a preço de banana, com o nome esperto de "privatização generalizada", para salvação do Brasil. Em verdade, é crime de lesa-pátria contra o que os patriotas do Brasil precisam se unir, abrindo bem os olhos para enxergar as trapaças de que estamos sendo vítimas, enfeitadas com bonitos nomes, sob o amparo de teses liberais e "modernidades" outras, que nada mais são que o preço que está sendo pago pela maior festa eleitoral que o século teve oportunidade de ver pelas televisões e jornais, em desafio frontal à Procuradoria-Geral da República e à Justiça Eleitoral!

Essa fúria com que nos ameaçam os testas-de-ferro dos banqueiros, com reformas à Constituição, no que toca ao Sistema Financeiro, com privatizações aviltantes, mostra às claras o preço cobrado pelos banqueiros e pela mídia que apoiou o Presidente eleito, o que de resto, todos sabem, é público e notório.

Examinemos a primeira página de qualquer um dos grandes jornais do Brasil, do dia 3 de outubro, o dia das eleições! Em todos eles, duas grandes fotografias em cores! Uma sorridente e vitoriosa, a de Fernando Henrique. A outra de Lula, cara fechada e apreensiva. Sobre a de Fernando Henrique, 54%! Sobre a de Lula, 22%! E a manchete em grandes letras tomando a folha de margem a margem: "Fernando Henrique será eleito hoje, no primeiro turno!" Isto é notícia, ou propaganda capaz, só ela, de eleger qualquer candidato periclitante?

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, por causa desses vergonhosos abusos do poder econômico e do poder político, que enodoam a nossa História, a realidade é que temos assentado na cadeira presidencial um Presidente cujo esquema montou o mais afrontoso sistema para elegê-lo e colocar, nos postos de comando da nossa economia, banqueiros ou seus testas-de-ferro. Depois espera que a Justiça "respeite a vontade do povo", que foi manipulado, como todos sabem, pelo maior abuso do poder político e econômico que já se viu na História.

E então, para que existem a Constituição, a Lei e o Poder Judiciário? Para coonestar a fraude, com o nome inadmissível de "decisão política", que desacredita totalmente a seriedade das decisões de nossas mais altas Cortes de Justiça?

O candidato Enéas Ferreira Carneiro impugnou, junto à Justiça Eleitoral, a candidatura de Fernando Henrique. E o Tribunal Superior Eleitoral já nos demonstrou que não é um Tribunal de Pequenas Causas.

Confiemos em nossos juízes, que examinarão apenas, sem dúvida alguma, se houve lisura eleitoral; se emissoras de TV trataram igualmente todos os candidatos e não protegeram Fernando Henrique Cardoso; se o Ministro Ricúpero não fez do Plano Real um plano eleitoreiro, e se os que o sucederam continuam, duas ou três vezes por dia, a comparecer em cadeia, nas televisões, para defender o Plano Real, ou se pararam de freqüentá-la, logo após as eleições, o que demonstraria que houve em verdade um enorme abuso do poder político.

Todos sabemos e os Ministros do Tribunal Superior Eleitoral também sabem da verdade, e só por saberem, até de ofício, como magistralmente, na esteira de um acórdão da lavra do Relator Ministro Sepúlveda Pertence, poderá o Tribunal Superior Eleitoral vir a cassar o mandato do representante dos banqueiros, Fernando Henrique Cardoso, convocando novas eleições.

E que essas sejam legítimas, democráticas e não manipuladas pelos donos do poder, de braços dados com banqueiros, e pelas mãos impuras, gulosas e sem escrúpulos de grande parte da comunicação social. Essa falta de escrúpulos já é conhecida de todos.

Por falar como estou falando, dos defeitos dos poderosos, que são a causa das crises que assolam nossas instituições, os inimigos que criei e criarei combatendo o bom combate, de braços dados com certa imprensa marrom, que também combati e continuarei combatendo desta tribuna, grampearam meu telefone, invadiram o meu lar com sorrisos de grandes amigos, e fizeram a mais desleal montagem de que se tem notícia, conseguindo distorcer impressionantemente o sentido da verdade verdadeira, dos fatos complexos que envolvem a questão; mas lamentavelmente não tenho mais tempo de mandato para mostrar desta tribuna a verdade inteira e desnuda.

É tão convincente o crime com que certa imprensa me feriu, que um delegado de polícia, esquecido de que a prova ilícita da degravação de escutas telefônicas é imprestável para dar início a qualquer tipo de inquéritos ou de sindicâncias, oficiou-me, a mim, um Senador da República, para marcar hora para ser ouvido sobre "a questão dos condomínios de Brasília", em torno de que girava a montagem, que teve início com uma grampeagem ilícita de meu telefone, o que vem salpicando de lama a minha honra, e por que vai pagar caro, linha por linha, edição por edição, essa imprensa marrom, ávida de escândalo, querendo se confundir com a imprensa livre, responsável, esta necessária, como em toda democracia, que é sinônimo de liberdade responsável de informação. Esta, eu, jornalista que fui e que sou, defenderei sempre, até a morte.

Com um simples habeas corpus de poucas linhas, impetrado no Supremo Tribunal Federal, eu, Senador, trancaria aquele inquérito, como qualquer outra sindicância, mas preferi humilhar-me - o que é virtude e não se confunde com humilhação.

Na essência de um dos muitos acórdãos que tem a Suprema Corte, o Ministro Sepúlveda Pertence, depois de tecer sérias considerações sobre as provas gravadas, deixa bem claro que a prova gravada é uma prova imprestável. Como é tema inteiramente jurídico que faz parte do meu discurso, vou suprimi-lo, mas os Srs. Senadores vão recebê-lo depois por inteiro. Mas S. Exª conclui:

      Desse modo, não vejo, sem infidelidade aos princípios, como fugir da nulidade radical do procedimento, nele incluídos o inquérito e a prisão em flagrante...

E mandou anular tudo, porque tudo era com base em uma fita.

Nunca se viu, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, neste País, uma campanha tão baixa de ataques a esta Casa de representantes do povo. A fase que estamos atravessando deve ser considerada o Purgatório, e oxalá o Congresso Nacional possa emergir de cabeça erguida, purificado pelas seguidas provações por que vem passando, para superar este período em que serviu permanentemente de vidraça para os meios de comunicação exercitarem seu papel de apedrejadores, assim como para o Poder Executivo justificar-se de sua incompetência e ineficiência, visto que não consegue transformar o Estado no instrumento de eliminação das desigualdades entre seus cidadãos.

O Congresso Nacional, como instituição, e os elementos que o compõem, deputados e senadores, transformaram-se no alvo preferido dos formadores de opinião pública, que deveriam, antes de tudo, pautar-se pela independência e pela fidelidade aos acontecimentos e à realidade dos fatos, ao invés de se colocarem a serviço de uma elite política, que, por deter o poder no que se refere à concessão dos canais de informação, acha-se no direito de conduzir a campanha de desmoralização a que estamos assistindo e que deve resultar, a continuar nesse rumo, no descrédito total de uma instituição tão necessária ao funcionamento da democracia, qual seja um poder legislativo independente e representativo dos anseios populares.

Ocorre que, devido a notícias veiculadas pela imprensa, mas não comprovadas, e que atingem profundamente a reputação deste Parlamentar que se dirige a V. Exªs, há, agora, uma tentativa perversa de submetê-lo à execração pública, propalando-se levianamente que o Corregedor-Geral do Senado, Senador Cid Saboia de Carvalho, estaria propenso a adotar providências contra o Senador Pedro Teixeira por suposto envolvimento com a "máfia dos condomínios", que atua na invasão e grilagem de terras no Distrito Federal, principalmente em áreas pertencentes ao poder público.

É preciso que V. Exªs saibam que meu mandato popular está terminando, mas pretendo sair desta Casa de cabeça erguida. Nada foi comprovado até agora que desabone minha conduta como Senador, falecendo, portanto, competência ao Corregedor-Geral, conforme o disposto no art. 2º da Resolução do Senado Federal nº 17, de 1993, para instaurar inquérito, na forma estabelecida pelo art. 5º da mesma Resolução, ou tomar qualquer iniciativa de caráter punitivo contra este Senador.

Diz o art. 2º dessa Resolução que "compete ao Corregedor ou Corregedor substituto (...) promover a manutenção do decoro, da ordem e da disciplina no âmbito do Senado Federal". Ora, os fatos que me vêm sendo imputados, sem nenhuma prova jurídica cabal, nada têm a ver com a atividade parlamentar. Isso não quer dizer que me estou eximindo de comprovar a minha inocência.

O Sr. Mauro Benevides - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. PEDRO TEIXEIRA - Concedo o aparte a V. Exª, com muito prazer.

O Sr. Mauro Benevides - Nobre Senador Pedro Teixeira, nós, Senadores, estamos ouvindo atentamente, neste plenário, o pronunciamento de V. Exª, que certamente sinaliza sua despedida desta Casa, depois de ter desempenhado, com alguma intermitência, o mandato de Senador por Brasília, substituindo, em um primeiro momento, o Senador Maurício Corrêa e o sucedendo, agora, na vacância da cadeira senatorial, já que o Senador Maurício Corrêa passou a integrar o Supremo Tribunal Federal, pelo seu notável saber jurídico, o que ensejou, conseqüentemente, que V. Exª retornasse, em caráter definitivo, a esta Casa, embora com mandato limitado - como o de todos nós - a 31 de janeiro. Mas, na passagem do pronunciamento de V. Exª, exatamente quando se reporta às declarações do Corregedor desta Casa, Senador Cid Saboia de Carvalho, permito-me dizer a V. Exª que no próprio instante em que tomei conhecimento daquele pronunciamento, ouvi de S. Exª, imediatamente, uma contestação formal. Nem precisaria ter ouvido essa contestação, porque S. Exª jamais enveredaria pela trilha da irresponsabilidade, anunciando, antecipadamente, aquilo que seria a conclusão das perguntas ou da interpelação que faria a V. Exª, ainda mais porque V. Exª sabe que toda esta Casa acompanhou a sua trajetória desde o primeiro momento, a sua postura nos trabalhos das Comissões, a sua atuação no Plenário. Enfim, todas as atribuições que exercitou nesta Casa como representante do povo de Brasília V. Exª o fez, realmente, com a maior dignidade. E neste momento em que se despede do Senado Federal quero lhe reiterar a admiração que temos por V. Exª, na convicção de que sairá airosamente de todos esses episódios em que se viu momentaneamente envolvido, deixando pairar, acima de tudo, a sua dignidade, a sua austeridade e a sua postura correta na vida pública brasileira.

O SR. PEDRO TEIXEIRA - Agradeço ao nobre Senador Mauro Benevides esse aparte, de maior valia para o meu discurso.

Correio Braziliense aqui nos honra com a presença de toda a sua diretoria, em especial com seu Presidente, meu particular amigo, e por quem todos temos profunda admiração, Dr. Paulo Cabral.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quanto à notícia veiculada por este jornal no dia 17 de janeiro de 1995, de que o Presidente do Senado, Senador Humberto Lucena, pretendia "ouvir o Senador Pedro Teixeira antes de tomar qualquer decisão sobre a convocação de uma comissão de ética no Senado para julgá-lo", é preciso que seja esclarecido:

1 - Realmente, a Resolução do Senado Federal nº 20, de 1993, que instituiu o Código de Ética e Decoro Parlamentar, estabelece as normas de conduta a serem seguidas pelos Senadores no exercício do mandato, prevendo, inclusive, as penalidades a serem aplicadas em caso de infringência dessas normas;

2 - A mesma Resolução estabelece que o Senado elegerá o Conselho de Ética e Decoro Parlamentar, o que não ocorreu até o presente momento.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, esta Casa não pode deixar-se levar por boatos e especulações levianas dirigidas contra seus membros. Se já estivesse constituído o Conselho de Ética de Decoro Parlamentar eu me sujeitaria de bom grado a ser investigado e julgado, pois isso equivaleria a receber atestado de idoneidade moral e de conduta inatacável que, ao fim, ser-me-ia concedido, porquanto as torpes e infundadas acusações de que fui vítima não resistiriam a um exame acurado, imparcial e desapaixonado. Quem tem ouvidos para ouvir que ouça e quem tem olhos para ver que veja, e quem tem discernimento e boa vontade analise os fatos.

O que vem ocorrendo é orquestrado e executado por setores da elite que comanda este País, aproveitando-se da fragilidade do Congresso Nacional que, como está, ressente-se da falta de Líderes com a força de alguns que já tivemos e que eram ouvidos em nível nacional. Se os tivéssemos, eles atuariam como ligação entre o Poder Legislativo e a massa representada, acabando com a vulnerabilidade perante o Quarto Poder, como atualmente é reconhecida a imprensa no mundo inteiro.

Interesses escusos vêm demonstrando que não se intimidam em solapar uma instituição tão cara ao exercício da democracia, como é o Congresso Nacional, atingindo membros isolados, dessa forma manchando e conspurcando a imagem de uma instituição tão digna.

Sr. Presidente, Srs. Senadores, estou nos estertores do meu mandato, mas os meus detratores terão de comprovar suas declarações na Justiça, uma instituição que se mantém acima de suspeita.

Outrossim, desejo advertir V. Exªs para a necessidade de o Congresso Nacional manter-se alerta, isento à margem de assuntos que possam deslustrar a sua imagem e a sua honra.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, em minha atuação como Senador da República participei de vários debates e votações de matérias de interesse de diversas unidades da Federação, dedicando-me com mais afinco, por melhores conhecimentos de causa, às relacionadas com o Distrito Federal e a sua gente.

Apenas para lembrar, repito neste meu discurso de despedida o que já disse no opúsculo de minha autoria: "Fundo de Participação do Distrito Federal e Propostas Revisionais à Constituição Federal". São mais de duas centenas de emendas revisionais de nossa autoria - além de 127 Emendas às Propostas Revisionais -, que representaram um trabalho árduo em busca do aprimoramento do texto constitucional, envolvendo sugestões oriundas de diversas camadas da sociedade, assim como entidades civis, órgãos públicos e eleitores em geral, além daquelas propostas que desenvolvemos a partir das nossas próprias reflexões.

Neste último grupo destacamos, em especial, a que propõe a criação do Fundo Constitucional do Distrito Federal, visando tornar esta unidade da Federação livre da dependência financeira dos recursos voluntários repassados pela União.

Tal situação sujeita o Distrito Federal a permanente estado de vulnerabilidade, em face das suscetibilidades decorrentes de eventuais dissensões políticas entre os chefes dos Poderes Executivos da União e desta unidade da Federação, que aqui, especialmente, não convém ocorrer, a fim de não prejudicar o funcionamento da Capital do País.

Entretanto, ao apresentarmos a Proposta em questão, consideramos Brasília não apenas como sede do Governo Federal, mas, ainda, uma das principais realizações culturais do povo brasileiro.

Obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 31/01/1995 - Página 1436