Discurso no Senado Federal

SITUAÇÃO DE ABANDONO EM QUE SE ENCONTRAM OS PRODUTORES RURAIS DE CANA-DE-AÇUCAR, EM MEDICILANDIA-PA.

Autor
Ademir Andrade (PSB - Partido Socialista Brasileiro/PA)
Nome completo: Ademir Galvão Andrade
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA AGRICOLA.:
  • SITUAÇÃO DE ABANDONO EM QUE SE ENCONTRAM OS PRODUTORES RURAIS DE CANA-DE-AÇUCAR, EM MEDICILANDIA-PA.
Aparteantes
Jader Barbalho, Sebastião Bala Rocha.
Publicação
Publicação no DCN2 de 17/03/1995 - Página 3208
Assunto
Outros > POLITICA AGRICOLA.
Indexação
  • COMENTARIO, CRITICA, SITUAÇÃO, ABANDONO, TRABALHADOR RURAL, SETOR, CANA DE AÇUCAR, REGIÃO NORTE, ESPECIFICAÇÃO, ESTADO DO PARA (PA), MOTIVO, DESATIVAÇÃO, USINA, RESPONSABILIDADE, INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRARIA (INCRA).
  • SOLICITAÇÃO, ANEXAÇÃO, ANAIS DO SENADO, PROTOCOLO, CONTRATO, AQUISIÇÃO, VENDA, USINA, RESPONSABILIDADE, BANCO DO BRASIL, INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRARIA (INCRA), DESTINAÇÃO, JOSE HENRIQUE CARNEIRO DA CUNHA NETO, EMPRESARIO, ESTADO DO PARA (PA).

O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB-PA. Pronuncia o seguinte discurso. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é com tristeza que subo à tribuna desta Casa hoje, pois venho relatar o sofrimento de pessoas que estão vivendo dias difíceis pela irresponsabilidade, pela não palavra cumprida de setores do Governo Federal.

Há 15 dias chegaram a Brasília, na busca pelos seus direitos, em torno de 150 trabalhadores rurais, 150 produtores de cana, representando, evidentemente, uma série de outros que não puderam comparecer à Capital Federal. Vieram com enorme sacrifício, em caminhões pau-de-arara, enfrentando a rodovia Transamazônica e toda sorte de dificuldades, para brigar por um direito líquido e certo.

Cerca de 10 dias atrás essas pessoas compareceram ao plenário do Senado Federal. Naquela ocasião, fiz uma exposição dos motivos pelos quais elas estavam em Brasília. Essas pessoas foram levadas para o interior do Estado do Pará, hoje situados em um município chamado Medicilândia, na época do Governo Médici, militar, que não só fez a Transamazônica, mas também apresentou projetos que viabilizaram a permanência dessas pessoas.

O Governo Federal construiu uma usina de beneficiamento de cana, para transformá-la em álcool e açúcar, prometendo mundos e fundos aos trabalhadores que, de várias partes do Brasil, aceitaram o convite e para lá foram. Instalaram-se, limparam a terra, plantaram a cana e começaram a produzir. Entretanto, a má administração fez com que o próprio Governo, posteriormente, decidisse vender a usina à iniciativa privada, com o que os próprios canavieiros concordaram, por entenderem ser uma idéia salutar.

Em 1982, era Presidente do INCRA o Dr. Paulo Iokota, que, pelo contrato lido hoje nesta tribuna - inadmissível contra o patrimônio público -, deveria estar na cadeia. O INCRA vendeu a usina a um cidadão conhecido, que sabe ganhar dinheiro com esse tipo de transação, chamado José Henrique Carneiro da Cunha Neto, dono da empresa CONAN - Construtora e Incorporadora Carneiro da Cunha.

Imaginem os senhores a fórmula de venda dessa usina! Está aqui o contrato, que considero uma vergonha para este País! Não entendo como uma coisa desta espécie pôde concretizar-se! A venda foi feita com o pagamento de Cr$500 mil (quinhentos mil cruzeiros) à época - que não sei quanto valem hoje - e oito prestações de Cr$1.501.440 bilhão (um bilhão, quinhentos e um milhões, quatrocentos e quarenta mil cruzeiros).

Observem o que diz a venda: "Dividida em sete prestações anuais, não incidindo sobre elas nem juros nem correção monetária." Imaginem sete prestações, vencidas cada uma ao dia 20 de dezembro, sem juros e sem correção monetária!

O Governo entrega a esse bandido um patrimônio público, permitindo também que ele, por meio desse contrato, pudesse tomar empréstimos em vários bancos deste País, penhorando os bens da referida usina. E assim foi feito. Ele tomou posse da usina, tomou dinheiro no BNDES e em vários bancos oficiais, sumiu com o dinheiro e abandonou o projeto. O INCRA, percebendo a maracutaia, buscou tomar a usina de volta, e o inacreditável é que esse cidadão entrou na Justiça exigindo uma indenização de US$100 milhões, sem que ele tivesse pago uma sequer das promissórias que havia assinado no ato da compra da usina.

Hoje, o processo encontra-se na Justiça, que não faz nada, conforme colocou muito bem aqui ontem o Senador Antônio Carlos Magalhães. Esse processo está parado na Justiça. O INCRA penhorou de volta esses bens. Quem está sendo prejudicado e sofrendo as conseqüências de toda essa falcatrua, de toda essa irresponsabilidade, são os trabalhadores rurais do meu estado, o Pará, especialmente aqueles do Município de Medicilândia.

Sua luta trouxe-os aqui no ano passado, quando o INCRA assinou um protocolo, juntamente com o Banco do Brasil e com as entidades responsáveis pela condução da exploração do beneficiamento da cana nessa referida usina. O INCRA assumiu uma série de compromissos, entre os quais lhe cabia viabilizar os recursos financeiros suficientes e oportunos, em especial quanto ao apontamento da indústria e sua manutenção para a safra 94/95. Além disso, avalizar junto ao Banco do Brasil, analisando caso a caso os débitos vencidos provenientes de custeio e formação do canavial dos produtores, que, por sua condição de responsabilidade, merecem esse tratamento.

Existe uma legislação canavieira clara. Esses trabalhadores rurais têm direitos legítimos que a lei lhes garante. Eles perderam as suas safras por três anos consecutivos, por culpa única e exclusiva do INCRA, e, no ano passado, quando eles esperavam ter resolvidos os seus problemas, está estabelecido no Orçamento da União 1,1 milhão de reais para fazer funcionar a usina.

Em 1994, gastou-se 2,5 milhões de reais, agora conta com 1,2 milhão. Inicia-se a época da safra em maio, e esses trabalhadores estão sem a menor condição, mais uma vez, de vender as suas produções. Por causa disso, vieram aqui à Brasília, cansados de serem enganados, cansados de não terem quem lhes desse guarida nas suas reivindicações e nos seus direitos, e, há quinze dias, eles estão aqui negociando.

Tiveram uma audiência com o Ministro da Agricultura, que os recebeu rapidamente em pé e disse não saber do que se tratava o assunto. Foram três ou quatro audiências com o Presidente do INCRA, que disse que era muito pequeno para resolver um problema dessa grandeza. Ontem tiveram a última reunião e, conseqüentemente, a última desilusão. Hoje, eles foram expulsos, despejados da CONTAG onde estavam hospedados há quase 15 dias. A CONTAG pediu a eles que se retirassem. Hoje de manhã, entraram na sede do INCRA e lá estão ocupando a ante-sala do gabinete do Presidente daquele órgão.

Aqui está presente o Senador Jader Barbalho, que, por duas vezes, foi Governador do Pará e, portanto, conhece muito mais do que eu os problemas enfrentados por esses cidadãos, neste plenário representados por uma comissão.

Sr. Presidente, numa última tentativa de verem garantidos os seus direitos e para que as pessoas enxerguem os sofrimentos e as dificuldades por que passam, seis cidadãos entraram em greve de fome desde a meia-noite de ontem. Faço questão de ler o nome deles: João Batista Barbieri, Prefeito de Medicilândia pelo PMDB - não é do meu Partido e nunca tive qualquer ligação com S. Exª, conheci-o agora, neste momento de dificuldade; Genildo Gomes de Araújo, Vice-Prefeito, também do PMDB de Medicilândia; Luís Belo dos Santos, Vice-Presidente da Associação dos Fornecedores de Cana da Transamazônica; Artur Schineider Neto, canavieiro; Lourival Lambert, canavieiro; Raimundo Rodrigues de Sousa, canavieiro, e João Teixeira, canavieiro. Sete deles decidiram apelar para essa medida extrema e, desde a meia-noite de ontem, encontram-se em greve de fome na área externa desta Casa.

O Sr. Jader Barbalho - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. ADEMIR ANDRADE - Ouço V.Exª com prazer.

O Sr. Jader Barbalho - Senador Ademir Andrade, V. Exª traz à discussão da Casa um tema que deve ser da maior preocupação por parte das autoridades federais, em relação aos trabalhadores da Transamazônica. V. Exª me citou, inclusive minha atuação como Governador desde meu primeiro mandato, e posso dar o testemunho dos desencontros dessa questão, que já demanda muitos anos, desde os idos de 1983. Quero colaborar com V. Exª. Recebi os trabalhadores no meu gabinete, relataram-me o caso e ouvi atentamente todo o drama deles; drama que venho acompanhando e lamentando que o INCRA, até o momento, não tenha conseguido equacionar o problema. Já deveria ter sido, de certa forma, equacionada juridicamente essa pendência e a usina já deveria ter sido transferida a uma cooperativa de trabalhadores e financiada como cooperativa e não ter sido mantida pelo INCRA até hoje. No meu entendimento, essa é uma postura inadequada, mas o Governo Federal é devedor de uma solução. Quero colaborar com V. Exª e com eles, que estão aqui a nos assistir. Há pouco recebi um telefonema do Ministro da Agricultura, José Eduardo Vieira, e fiquei muito feliz, porque S. Exª me informou haver recebido os trabalhadores na semana passada. O Ministro está chegando de uma viagem ao exterior e disse a mim que ia inteirar-se, junto ao INCRA, desse assunto. Em princípio, tinha notícia de que no acordo feito com o INCRA e o Banco do Brasil, o INCRA teria recebido a orientação de que, juridicamente, não poderia ser o avalista da operação, mas S. Exª estava buscando informação e, desde logo, pedia que o informassem - o que faço, nesta oportunidade, durante o discurso de V. Exª - de que amanhã às 9h30min estará à disposição, no Ministério da Agricultura, para receber esses trabalhadores, pois àquela altura já terá informações do INCRA, visto que foram desenvolvidas conversas na sua ausência. Manifestei ao Ministro a mesma preocupação de V. Exª, qual seja, que esse assunto demanda uma solução, pois as pessoas pobres, trabalhadoras e sofridas da Transamazônica, que plantam cana na expectativa de não serem atrapalhados pelas autoridades, esperam, como eu, que seja encontrada uma solução. As palavras do Ministro muito me sensibilizaram, porque S. Exª manifestou interesse em recebê-los de imediato, isto é, recebê-los-á amanhã pela manhã, garantindo-me que terá sensibilidade no tratamento dessa questão. Fico, então, na expectativa, como deve ficar V. Exª, já que o Ministro, que é a autoridade maior responsável pela área, falou na quantia de 3 milhões, que seria a quantia necessária, dizendo que iria buscar uma solução para conseguir essa quantia e amanhã daria uma resposta a esses trabalhadores. Portanto, o discurso de V. Exª é apropriado, merece toda a minha solidariedade, como merecem os trabalhadores; e, da minha parte, vou ficar na expectativa de que o Ministro da Agricultura possa dar uma solução, mas não uma solução paliativa. Creio que, neste caso da Usina Abraham Lincoln, há que ser dada uma solução definitiva. Como bem disse V. Exª, este é um problema que já demanda muitos anos, já vem desde 1982, portanto, já há tempo suficiente para que uma avaliação e decisão sejam tomadas de forma concreta e definitiva a respeito do assunto. Espero que essa audiência, amanhã, com o Ministro, possa dar solução ao problema. Muito obrigado pelo aparte que me concedeu.

O SR. ADEMIR ANDRADE - Agradeço, Senador Jader Barbalho, o aparte de V. Exª. Ainda hoje, pela manhã, eu o procurei, como procurei todos os Deputados Federais do Pará, para ajudarem nessa questão. O Deputado Giovanni, também, eu e a Deputada Socorro Gomes, solicitamos audiência, e o próprio Presidente José Sarney também fez uma interferência, no sentido de que o Ministro resolvesse essa questão. Também tenho esperança de que não seja necessário que as pessoas tenham que morrer de fome neste País, tenham que fazer greve de fome, como estão fazendo. Imagino o sofrimento deles, desde ontem, a meia-noite, até agora sem comer, para obterem um direito que é líquido e certo, garantido pela legislação canavieira e pelos compromissos assumidos pelo Poder Executivo neste País, através do INCRA.

O SR. SEBASTIÃO ROCHA - Senador Ademir Andrade, V. Exª me concede um aparte?

O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB-PA) - Ouço com satisfação o Senador Sebastião Rocha.

O SR. PRESIDENTE (José Eduardo Dutra) - Senador Ademir Andrade, informo que V. Exª dispõe de dois minutos para encerrar seu pronunciamento, em vista da longa lista de oradores inscritos. Pediria que o aparte fosse o mais breve possível.

O Sr Sebastião Rocha - Sr. Presidente, vou ser o mais breve possível. Senador Ademir Andrade, quero me associar à luta de V. Exª e também ao Senador Jader Barbalho, duas lideranças fortes do Pará que estão ao lado dos trabalhadores, com quem me congratulo nesta oportunidade. O apoio de V. Exªs a essa reivindicação dos trabalhadores é muito importante, pois demonstra a grandeza do ato de colocar acima de possíveis divergências partidárias e políticas os interesses maiores da população da nossa Região, a Região Amazônica. Portanto, somo-me a V. Exªs nesse esforço e coloco-me inteiramente à disposição para ajudar no que for possível na solução desse problema. Espero que a grande sensibilidade demonstrada pelo Ministro em relação ao assunto, juntamente com o Presidente do INCRA, possa ajudar rapidamente no caminho de uma solução definitiva para o problema. Muito obrigado.

O SR. ADEMIR ANDRADE - Eu é que agradeço. Seria importante a presença de V. Exª e, se possível, do Líder do PMDB, na audiência com o Ministro amanhã, para garantir a solução para essa situação de sofrimento por que passam os trabalhadores rurais.

Solicito ainda, Sr. Presidente, que seja anexado ao meu pronunciamento, para que fique registrado nos Anais do Senado, o protocolo assinado pelo Banco do Brasil, pelo INCRA e por esses trabalhadores, esse protocolo não-cumprido, não-honrado, bem como essa vergonha, que é o contrato de venda da Usina Pacal a um empresário trambiqueiro, conhecido como tal, chamado José Henrique Carneiro da Cunha Neto.

Fico torcendo para que a luta desses trabalhadores seja vitoriosa e que eles não tenham que morrer de fome para verem atendidos seus direitos em nosso País.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente. Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 17/03/1995 - Página 3208