Discurso no Senado Federal

FELICITANDO A CNBB PELA QUALIDADE E PROFUNDIDADE DA CAMPANHA DA FRATERNIDADE. ANALISE DA POBREZA NO PAIS.

Autor
Benedita da Silva (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
Nome completo: Benedita Souza da Silva Sampaio
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
IGREJA CATOLICA. POLITICA SOCIAL.:
  • FELICITANDO A CNBB PELA QUALIDADE E PROFUNDIDADE DA CAMPANHA DA FRATERNIDADE. ANALISE DA POBREZA NO PAIS.
Aparteantes
Eduardo Suplicy.
Publicação
Publicação no DCN2 de 07/04/1995 - Página 4752
Assunto
Outros > IGREJA CATOLICA. POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • ELOGIO, QUALIDADE, IMPORTANCIA, TEXTO, FUNDAMENTAÇÃO, CAMPANHA DA FRATERNIDADE, CONFERENCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL (CNBB).
  • ANALISE, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, FOME, MISERIA, POBREZA, PAIS, NECESSIDADE, GOVERNO FEDERAL, ADOÇÃO, PROVIDENCIA, VIABILIDADE, JUSTIÇA SOCIAL, MELHORIA, QUALIDADE DE VIDA, POPULAÇÃO CARENTE.

A SRª BENEDITA DA SILVA (PT-RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, tive a oportunidade de ir à CNBB para uma visita. Tendo em vista a chegada da Páscoa, eu gostaria muito de poder contribuir com aquela entidade, já que tenho acompanhado constantemente o trabalho que desenvolve no País, em que pese ter uma outra prática, segundo a minha fé religiosa.

A Campanha da Fraternidade para 1995, da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), procura seguir "o Evangelho no qual Jesus mostrou, com sua prática, que a vontade do Pai é que não se perca nenhum desses mais pequeninos, desejando encontrar o rosto do Senhor oculto no rosto dos excluídos". A ação da Campanha centraliza-se em prol dos que estão à margem das atenções da sociedade e tem como tema "A Fraternidade e os Excluídos", cujo lema é a expressão do espanto de quem é surpreendido com a suprema e definitiva revelação da história: "Eras Tu, Senhor?"

O texto-base da Campanha da Fraternidade 95 enfatiza a existência de uma multidão de injustiçados, desamparados, carentes, que justifica a busca de fraternidade. Pretende contemplar aqueles que seriam os mais abandonados, os que se sentem esquecidos, negados na sua humanidade. No Brasil, País do Terceiro Mundo cujo sistema acentua a exclusão, o "rosto dos excluídos" são rostos desfigurados pela fome, desiludidos por promessas políticas não cumpridas, rostos humilhados dos que têm sua cultura desprezada, aterrorizados pela violência diária, rostos dos que não têm o mínimo para viver dignamente. Em termos concretos, essas diversas faces, rostos, são os dos moradores de rua, dos idosos, dos encarcerados, dos prostituídos, dos doentes, dos portadores do vírus HIV, dos deficientes, dos alcoolizados, dos drogados e dos desempregados.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a Campanha da Fraternidade teve o cuidado de, a cada referência ao tema de sua campanha, moldar o quadro da realidade brasileira. Por exemplo, quando fala dos idosos, traça um perfil da situação dos aposentados (um contingente de quinze milhões de brasileiros) e da Previdência Social, enfatizando que "numa sociedade que valoriza apenas o produtivo, o idoso sobra". Perdem sua auto-estima, adoecem por falta de carinho, de motivação para viver. Mas a doença que mais os destrói é a convicção de que não servem para mais nada. Por esses e outros motivos, muitos idosos morrem antes do tempo.

Quando se refere aos presidiários, traça um perfil do sistema penitenciário brasileiro, ressaltando que o atual sistema penitenciário do Brasil é totalmente ineficaz, desumano e desumanizante. Não recupera nem ressocializa ninguém. As prisões são violentas, superlotadas e desassistidas. São aproximadamente 130 mil presos, em 297 estabelecimentos penais, correspondendo a 2,5 presos a mais por vaga. Revela um País cuja saúde enfrenta desafios que precisam ser enfrentados, como a existência de 5 milhões de crianças mal nutridas, o equivalente a 25% da população infantil com menos de cinco anos; ou ainda, em relação à assistência médica: 59% da população brasileira depende da assistência pública, 25% depende da assistência médica privada e 16% da população está desassistida.

O Mapa do Mercado de Trabalho traçado pela CNBB, com base nos dados do IBGE, revela que o desemprego é uma praga da qual o capitalismo, com todos os seus sucessos, não consegue se livrar. Segundo a Organização Internacional do Trabalho, só 30% da população está integrada no mercado formal de trabalho. Dos 70% dele excluídos, 30% não trabalham, 22% são subempregados e 18% são desempregados. Constata-se que, dos 64 milhões de brasileiros economicamente ativos, 31 milhões não têm cobertura previdenciária. Ou seja, vivem na economia informal.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, diariamente, 32 milhões de brasileiros defrontam-se com o problema da fome, uma população equivalente à da Argentina. Essa pobreza e miséria manifestam-se de forma mais trágica na exploração de meninas e meninos prostituídos, na mortalidade e desnutrição infantil, entre outros. São esses os números da exclusão que a Campanha da Fraternidade expõe para a sociedade. Aguardemos que os esclarecimentos e as informações contidas nessa Campanha toquem o coração do nosso povo, da nossa sociedade, para o despertar da consciência da responsabilidade de cada um de nós, individualmente, e, principalmente, para despertar, profundamente, os corações e mentes dos nossos governantes para que sensibilizem-se com a situação dos excluídos de nosso País, especialmente no momento em que se discute a revisão constitucional, principalmente no que diz respeito à Previdência Social e às conseqüências que trará a milhões de brasileiros, muitos dos quais fazem parte dos "excluídos" da Campanha da Fraternidade de 1995.

Ainda nesse contexto, e considerando os 300 anos da morte de Zumbi dos Palmares, ao estar na CNBB e ver ali a face dos excluídos, dos despossuídos e dos marginalizados, eu não pude deixar de pensar também nesse povo que tem dado sua contribuição, o povo negro brasileiro, em cuja face está estampada a condição de aposentado, desempregado, marginalizado, caído, analfabeto, prostituído.

Fiquei, então, pensando como seria bom se pudéssemos entender essa face real que o Brasil tem e fazer valer os direitos conquistados com medidas que, até agora, não pudemos ver colocadas nas propostas de reforma constitucional.

Participei hoje, na Câmara dos Deputados, da reunião da Comissão que trata das questões ligadas ao meio ambiente e a minorias, presidida pelo Deputado José Sarney Filho. Ali, pude olhar para a face daqueles índios, homens e mulheres, povo que reconhecemos serem os verdadeiros donos desta terra, e constatar que estavam praticamente mendigando assistência.

O povo indígena precisa do seu estatuto, precisa que se demarquem as suas terras, precisa de uma política voltada para as suas necessidades, inclusive culturais, na relação com a terra, na relação com o nosso universo.

Todas essas faces do Brasil que estão sendo ressaltadas pela CNBB provavelmente estarão nos nossos corações e nas nossas decisões quando da votação de projetos e emendas que estão tramitando na Casa.

O Sr. Eduardo Suplicy - Permite-me V. Exª um aparte?

A SRª BENEDITA DA SILVA - Concedo o aparte ao Senador Eduardo Suplicy.

O Sr. Eduardo Suplicy - Senadora Benedita da Silva, gostaria de cumprimentar V. Exª e a CNBB por chamar a atenção de toda a população brasileira para o tema dos excluídos neste ano de 1995. No momento em que V. Exª traça um quadro da situação, sobretudo dos negros, dos índios, dos meninos e meninas de rua deste País, obviamente está chamando a atenção do Senado Federal no sentido de que devemos dedicar mais atenção e energia para invertermos esse quadro, do qual também fazem parte aqueles que no Brasil estão em busca do seu direito de cultivar a terra. Hoje, há dezessete mil famílias esperando serem assentadas de acordo com um projeto de reforma agrária. Faz-se necessário, o quanto antes, que o Governo Fernando Henrique Cardoso efetive a sua meta de assentar, ainda que modestamente, quarenta mil famílias este ano, e, se possível, até ultrapassar esse número. Há cerca de dez dias, no Ceará, o Presidente anunciou a desapropriação da ordem de um milhão de hectares de terras para fins de realização de reforma agrária. Isso viabiliza o assentamento de quarenta mil famílias. Mais ainda, de janeiro a março, o número de famílias assentadas correspondeu a 2.431 famílias, ainda decorrentes de ações na área da reforma agrária do Governo Itamar Franco. Faz-se necessário também acelerar esse processo para se garantir que mais e mais pessoas, neste País, passem da condição de excluídos para a condição da cidadãos.

A SRª BENEDITA DA SILVA - Agradeço o aparte de V. Exª e sei que ele se ajusta, perfeitamente, ao nosso desejo de contribuir com o Presidente da República, para que, no decorrer do seu Governo, ele adote medidas positivas para que a política social que defendemos chegue, verdadeiramente, à casa desses excluídos que a CNBB ressalta.

Todos sabemos que há necessidade de uma reformulação política neste País, necessidade de maiores investimentos, de crescimento econômico para fazer com que o Brasil tenha uma grande economia e seja o primeiro em justiça social. Enquanto faltarem a liberdade, a igualdade e a fraternidade, estaremos sempre diante da violência, da morte, da miséria.

É importante estarmos atentos a esse chamado da CNBB, que traz uma contribuição para o debate.

Que todas essas campanhas mostrando a face do Brasil - a Comunidade Solidária, a Campanha do Betinho - sejam todas uma só, e que possamos ser um só na defesa do nosso País e do povo brasileiro.

Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 07/04/1995 - Página 4752