Discurso no Senado Federal

A NECESSIDADE DE UMA POLITICA AGRICOLA ADEQUADA A REALIDADE DO PAIS. CONGRATULANDO-SE COM A DECISÃO DO CONGRESSO NACIONAL, NA DERRUBADA AO VETO PRESIDENCIAL QUE ANULAVA A VINCULAÇÃO ENTRE A CORREÇÃO DOS PREÇOS MINIMOS AGRICOLAS E OS FINANCIAMENTOS DE PRODUÇÃO.

Autor
Esperidião Amin (PPR - Partido Progressista Reformador/SC)
Nome completo: Esperidião Amin Helou Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
AGRICULTURA.:
  • A NECESSIDADE DE UMA POLITICA AGRICOLA ADEQUADA A REALIDADE DO PAIS. CONGRATULANDO-SE COM A DECISÃO DO CONGRESSO NACIONAL, NA DERRUBADA AO VETO PRESIDENCIAL QUE ANULAVA A VINCULAÇÃO ENTRE A CORREÇÃO DOS PREÇOS MINIMOS AGRICOLAS E OS FINANCIAMENTOS DE PRODUÇÃO.
Publicação
Publicação no DCN2 de 11/04/1995 - Página 5024
Assunto
Outros > AGRICULTURA.
Indexação
  • ESCLARECIMENTOS, RESPONSABILIDADE, DECISÃO, CONGRESSO NACIONAL, APROVAÇÃO, DERRUBADA, VETO (VET), PRESIDENTE DA REPUBLICA, ARTIGO, PROJETO DE LEI DE CONVERSÃO (PLV), ANULAÇÃO, VINCULAÇÃO, CORREÇÃO, PREÇO MINIMO, PRODUTO AGRICOLA, FINANCIAMENTO, DIVIDA, PRODUTOR RURAL, RELAÇÃO, NOTICIARIO, IMPRENSA.
  • DEFESA, NECESSIDADE, EFICACIA, DURAÇÃO, POLITICA AGRICOLA, EXISTENCIA, SISTEMA, FINANCIAMENTO, EMPRESTIMO, AGRICULTOR, ESTABILIDADE, AGRICULTURA.

O SR. ESPERIDIÃO AMIN (PPR-SC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, gostaria de fazer inicialmente uma pergunta. Os Requerimentos nºs 2 e 3 da Ordem do Dia de hoje foram votados ou foram apenas apresentados?

O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros) - Serão votados hoje na Ordem do Dia, caso haja quorum.

O SR. ESPERIDIÃO AMIN - Perfeito.

Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, diante do silêncio, especialmente de representantes do Senado - peço perdão se alguém, na última sexta-feita, tiver falado depois da minha saída da sessão -, aproveitando a presença do Senador Osmar Dias, quero deixar consignada a minha estranheza em relação à forma pela qual o Governo conseguiu veicular até aqui a informação acerca da derrubada do veto, que, afinal de contas, foi aposto pelo então Presidente Itamar Franco contra a iniciativa aprovada pelo Congresso, que impedia o descasamento entre a TR, ou seja, a correção monetária dos encargos financeiros, e o preço mínimo.

A sensação que temos, em função do noticiário, é que o Congresso praticou um ato de perversão, tem razões para estar envergonhado, e o Governo generosamente até nos oferece a chance de nos penitenciarmos na Semana Santa. Quem sabe se aproveitamos a Quinta-Feira Santa para nos açoitarmos, a sexta-feira para refletirmos sobre as nossas falhas, sob pena de não podermos voltar a exercer o mandato, na segunda-feira seguinte à Pascoa.

Eu, de minha parte, gostaria de deixar muito claro que não considero a decisão tomada por nós como a melhor, como a ideal, mas entre a omissão do Governo - esta, sim, está perfeitamente caracterizada - e a nossa ação, fico com a última.

Há pouco mais de dez dias, um grupo de senadores e deputados esteve com o Presidente da República, presentes o Sr. Ministro da Agricultura e autoridades do Governo Federal, e Sua Excelência disse a todos nós, no Palácio do Planalto, que, na condição de produtor rural, não se conforma com a TR, porque, descasada do preço mínimo, ela arruína o agricultor. Isso foi dito pelo Presidente da República. Contudo o Governo pratica olimpicamente a contemplação desse fato quando, democraticamente, na Câmara dos Deputados, é votada a questão, e 388 Deputados derrubam o veto contra 60 votos dados à tese do Governo, e quando, no Senado, 43 Senadores derrubam o veto contra 22 votos dados por Senadores favoráveis a sua manutenção.

Faço neste ponto uma observação muito séria. Não sou da época da DIP do Estado Novo, mas a eficiência não deve ter sido maior à praticada à época pela DIP e àquilo que tivemos oportunidade de presenciar nos últimos dias em matéria de informação sobre a natureza ilegítima, corporativista e protetora dos grandes que a decisão do Congresso significa. Quero deixar muito claro que não sou ruralista, não sou proprietário rural, não tenho nenhuma vinculação com empresa ou grupo ligado à área agrícola, mas considero não apenas agora em função da TR, já desde a época da correção monetária, inadmissível o que o sistema financeiro tem feito em matéria de apropriação de recursos do setor agrícola com a complacência e, ultimamente, com a cumplicidade do Governo.

De sorte que quero deixar muito claro que não considero a decisão do Congresso perfeita e acabada, tanto é que o Senador Osmar Dias apresentou um projeto, subscrito por mim e por outros Senadores - como os Senadores Roberto Requião, Pedro Simon e outros -, acredito, pretendendo estabelecer um limite máximo do valor do financiamento que seria alcançado pela providência salutar que o Congresso determinou de restabelecer o casamento entre encargos financeiros e a evolução do preço daquilo que o agricultor tira da terra.

Não sou agrônomo nem técnico agrícola, mas, quando governei Santa Catarina, aprendi que o agricultor precisa de um tratamento honesto, e foi em função dessa busca que adotei há doze anos a equivalência preço-produto para financiar a terra, equipamentos, sementes, modernização em matéria de apicultura, venda de máquinas em geral, e iniciei alguns projetos no campo da aquacultura.

De sorte que não é de hoje que estou convencido de que o pequeno produtor rural brasileiro não sobreviverá à ganância estabelecida pelo Sistema Financeiro, que conta com a proteção do Governo e que se materializa através de um descompasso entre os encargos financeiros e o preço do produto que o agricultor arranca da terra.

Se o Governo quiser negociar e procurar uma solução, que o faça, mas que não venha repetir cenas que já assistimos. Essa declaração de que está suspenso o crédito rural, emitida pelo Banco do Brasil na semana passada, fez-me lembrar idêntica decisão tomada no dia 3 de fevereiro do ano passado, quando a Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Decreto Legislativo nº 383, que sustava a cobrança da correção monetária.

Naquela ocasião, quando a Câmara dos Deputados tomou essa decisão, a Diretoria do Banco do Brasil proclamou que o prejuízo decorrente da aprovação do referido decreto era da ordem de 97 bilhões de dólares; quantia falaciosa, simplesmente divulgada para intimidar o Congresso e para nos indispor perante a opinião pública.

Quando esteve na Comissão de Assuntos Econômicos o então Presidente do Banco do Brasil, Alcir Calliari, meu conterrâneo - homem competente e sério -, tive oportunidade de demonstrar que essa decisão de sustar o crédito rural - ele tomou essa decisão - e anunciar que tinha havido um prejuízo de 97 bilhões de dólares, ou seja, quantia equivalente à dívida externa do País, eram consistentes e que o Banco do Brasil, que tinha tanta experiência com o crédito rural - e por isso merece tanto o nosso apreço - não tinha ainda força para mudar o calendário, alterar as estações do ano e determinar que o plantio pudesse ser transferido por um prazo de trinta dias para que a sua diretoria ou para que as autoridades econômicas conseguissem refazer as suas energias combalidas pela decisão que a Câmara dos Deputados então tomara.

Poucos dias depois, o bom senso voltou a reinar e foi estabelecido o acordo que o Governo agora desconsidera. Ao manter o veto que estabelece ou restabelece o descasamento já na vigência da TR, que é posterior à correção monetária então existente, o Governo descumpriu um acordo e deixou de oferecer à sociedade brasileira um componente elementar de uma política agrícola minimamente moral - o Brasil não tem essa política agrícola e por isso não tem um mecanismo de financiamento que permita ao agricultor saber o tamanho do encargo que tem diante de si. Ele não sabe, não sabia quando tinha o dólar diante dele e passou a saber com a equivalência preço-produto, pois ele sabe fazer a conta, sabe o que é um saco de milho, sabe o que são dez sacos de milho - essa conta ele sabe fazer. A conta que ele não sabe fazer é a que os bancos fazem.

O grande agricultor talvez saiba, e com esse não tenho nenhuma preocupação, porque se vira sozinho. A minha grande preocupação é com o modelo da pequena propriedade não apenas do meu Estado, mas do Nordeste também.

No momento em que o Presidente da República anuncia o início de um programa de reforma agrária, é de se perguntar: adianta fazer reforma agrária, ou seja, aumentar o número de proprietários, e não sustentar os proprietários que já existem numa política agrícola minimamente moral?

O que mais me assusta é o que está acontecendo na região da pequena propriedade rural do meu Estado. Na região de Xapecó, anunciam-se mais de 700 pequenas propriedades colocadas à venda.

Governo nenhum tem o direito de destruir esse modelo - que não foi construído nem por este, nem por outro -, que é o da pequena propriedade, com cultura diversificada, em que a família assume a função de pequeno empresário.

É em nome do direito de termos uma política agrícola adequada para um país com as nossas características que quero pedir que se faça justiça com a decisão do Congresso.

O Congresso não foi irresponsável; irresponsável é quem mantém uma política agrícola calcada no descasamento entre os juros, os encargos e o preço, sabe que isso está errado e nada faz.

Na pior das hipóteses, a decisão do Congresso faz com que o diálogo se agilize. Se o Governo sabia que era impossível continuar como estava, agora não apenas sabe, mas irá ajudar-nos a construir algo razoável, que estabeleça tratamento diferenciado para o pequeno, médio e grande produtor, e, acima de tudo, permita que, mais do que o discurso, haja no País uma política duradoura para que a agricultura não seja tratada aos solavancos, como ocorre pelas contínuas alterações da política financeira e pelas inconseqüentes aplicações dessa política, e que haja um sistema de financiamento de empréstimo para a nossa agricultura e para os nossos agricultores.

É da minha obrigação fazer este registro posto que, neste último fim de semana, a notícia que a sociedade brasileira recebeu foi a de que o Congresso Nacional praticou uma travessura e o Governo, com muita condescendência, ainda não irá pedir que sejamos colocados numa "camisa de força". Até agora nos dará uma magnânima oportunidade de, na Semana Santa, repito, revermos as nossas falhas, confessarmo-nos uns aos outros e com isso alcançarmos o perdão. Não tenho a pretensão de dizer que não tenha errado; já errei muitas vezes. Mas, neste caso, muitos poderão ouvir a nossa confissão. Não o Executivo, porque possui muito mais assunto para contar ao confessor do que nós outros.

Era este o registro que senti ser da minha obrigação fazer e espero que se estabeleça o indispensável diálogo, para que o Brasil perceba que a decisão do Congresso não foi fruto de um corporativismo perverso; foi uma resposta possível - e política é o exercício do possível - a uma situação insustentável que vinha sendo mantida pelo Governo.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 11/04/1995 - Página 5024