Discurso no Senado Federal

APELO NO SENTIDO DA CONCLUSÃO DE TODAS AS OBRAS DE BARRAGENS E AÇUDES PARALISADAS NO NORDESTE.

Autor
Lúcio Alcântara (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/CE)
Nome completo: Lúcio Gonçalo de Alcântara
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DESENVOLVIMENTO REGIONAL.:
  • APELO NO SENTIDO DA CONCLUSÃO DE TODAS AS OBRAS DE BARRAGENS E AÇUDES PARALISADAS NO NORDESTE.
Aparteantes
Carlos Patrocínio, Josaphat Marinho.
Publicação
Publicação no DCN2 de 21/04/1995 - Página 5933
Assunto
Outros > DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
Indexação
  • APOIO, TESE, AUTORIA, JOSE SERRA, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DO PLANEJAMENTO E ORÇAMENTO (MPO), DEFESA, NECESSIDADE, CONCLUSÃO, OBRA PUBLICA, VIABILIDADE, RETORNO, NATUREZA ECONOMICA, NATUREZA SOCIAL, INVESTIMENTO.
  • SOLICITAÇÃO, CONCLUSÃO, OBRA PUBLICA, BARRAGEM, AÇUDE, PROJETO, IRRIGAÇÃO, SOLUÇÃO, PROBLEMA, ABASTECIMENTO DE AGUA, VIABILIDADE, RETORNO, NATUREZA ECONOMICA, BENEFICIO, POPULAÇÃO, ZONA RURAL, ESPECIFICAÇÃO, ESTADO DO CEARA (CE).

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB-CE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, apoiamos a tese do Ministro do Planejamento, José Serra, quando S. Exª afirma que "o grande problema do Brasil são as obras inacabadas, os esqueletos que transformaram o nosso País em um cemitério de obras". Segundo o Sr. Ministro, estas obras têm de ser finalizadas para que possam dar retorno econômico e social aos investimentos realizados.

Poucos Estados se enquadram melhor no exemplo de José Serra quanto o Ceará, que possui, hoje, cinco barragens de médio porte que, apesar de praticamente concluídas, estão paralisadas e sofrendo destruição através da erosão e de outros fatores causados principalmente pelas chuvas dos invernos de 1994 e 1995. Vale salientar que R$17,6 milhões foram investidos nas barragens, representando 80% do valor total das obras. As obras já poderiam estar beneficiando um contingente populacional de cerca de 150 mil pessoas, ofertando quase mil toneladas de pescado e irrigando uma área de 13.600 hectares, gerando uma receita bruta de não menos de R$65 milhões.

Além das barragens, temos, em fase de conclusão, os projetos de irrigação Araras-Norte, Jaguaribe/Apodi, Curu/Paraipaba, de iniciativa do Departamento Nacional de Obras Contra a Seca - DNOCS, e da Secretaria dos Recursos Hídricos, no âmbito do Ministério do Meio Ambiente que, em conjunto, possuem uma área irrigável de cerca de 10 mil hectares, onde já foram investidos cerca de R$48 milhões, representando 75% do valor total dessas obras. Por estarem paralisadas, estão deixando de gerar uma receita bruta de R$45 milhões e de ofertar 30 mil empregos diretos e indiretos nos projetos de irrigação.

O projeto Araras-Norte, por exemplo, já tem inclusive equipamentos mecânicos adquiridos, tais como bombas, válvulas e canos que, por falta de uso, estão se deteriorando. Vale salientar ainda que os projetos foram objeto de intenso trabalho de revisão e aprovação no âmbito da legislação estadual e federal do meio ambiente, não existindo problemas nessa área. São obras com condições técnicas e operacionais para serem concluídas ainda no exercício de 1995. É bom lembrar que os novos projetos de irrigação a que nos referimos constituem avanço cultural, de vez que o modelo de gerenciamento difere fundamentalmente do tradicional. Os antigos perímetros eram explorados com paternalismo estatal, através de colonos despreparados e resultaram em desastres econômicos. Os projetos de irrigação em fase de conclusão serão organizados em Distritos de Irrigação, com exploração em moldes empresariais e com auto-gestão. Sem dúvida que eles darão início a uma nova fase para a agricultura cearense, com a criação de pólos agroindustriais disseminados pelo interior, com a prática de uma agricultura moderna, geração de empregos estáveis e de divisas para o País, conforme se observa hoje em Petrolina-Juazeiro.

Assim como as barragens, os projetos de irrigação situam-se em regiões carentes do interior, as quais, com a dizimação da cultura do algodão, tornaram-se exportadoras aceleradas de mão-de-obra desqualificada para Fortaleza, onde, segundo a CNBB, somente no ano de 1994, se formaram 80 novas favelas gerando problemas tais como a mendicância, meninos de rua, prostituição infantil, entre outros.

Os açudes e os Distritos de Irrigação irão possibilitar auto-suficiência de alimentos ao Estado e gradativamente substituirão os carros-pipa e as cestas de alimentos, que a custo extremamente elevado e não produtivo socorrem as populações atingidas durante a ocorrência das secas.

Srs. Senadores, como V. Exªs poderão avaliar, a conclusão imediata dessas obras atende às diretrizes emanadas do Ministério do Planejamento, quando o seu titular afirma que não se deve começar obras novas, enquanto as antigas não estiverem prontas.

Essa determinação vai evitar, inclusive, lobbies de empreiteiras e darão retorno econômico imediato de obras caras que estão paradas e, conforme já ressaltei, se deteriorando por falta de conclusão e conseqüente uso.

Se analisarmos individualmente os projetos executivos dessas barragens, salta à vista o brutal prejuízo à região e ao País, pelos lucros cessantes ou pela impossibilidade do retorno econômico dessas obras. Sem dúvida, é também fonte de enorme frustração para as populações locais.

O Sr. Carlos Patrocínio - V. Exª me permite um aparte?

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA - Ouço V. Exª com prazer.

O Sr. Carlos Patrocínio - Nobre Senador Lúcio Alcântara, V. Exª se antecipa em trazer a esta Casa um assunto muito importante. Eu mesmo que já estou lendo a Lei de Diretrizes Orçamentárias enviada para este Congresso, tive a oportunidade de, como V. Exª, observar a preocupação do Exmº Sr. Ministro do Planejamento, nosso colega e brilhante Parlamentar José Serra, no que diz respeito à continuidade das obras inacabadas em nosso País. Isto tem que fazer parte da LDO e tem que ser cumprido pelo Congresso Nacional e pelo Governo Federal. Não é possível, eminente Senador - como V. Exª bem frisa e está desfilando o elenco de obras inacabadas no seu Estado -, que continuemos a desperdiçar, a jogar dinheiro por todos os ralos e não concluamos as obras neste País. Agora mesmo estou procurando os meios jurídicos para desapropriar um imenso frigorífico construído na cidade de Araguaína, no Estado do Tocantins, sob os auspícios de dinheiro da SUDAM, da Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia. Como existem outras obras, elas quando chegam já no ponto de funcionamento - não sei por que cargas-d'água - simplesmente os donos, os proprietários, aqueles que fizeram os projetos os abandonam e não sei para que lado levam o restante do dinheiro que tomam da SUDAM. Estive, juntamente com o Senhor Presidente da República, em Manaus e conversei com o Dr. Frederico a respeito da desapropriação de algumas obras inacabadas que temos no nosso Estado e por todo esse Brasil afora. Sabemos, por exemplo, Senador, que a Ferrovia Norte-Sul, que começou sob os auspícios, sob a idéia do então Presidente da República e hoje nosso Presidente, José Sarney, está lá com a ponte, no rio Tocantins, prestes a ser terminada, com toda a ferragem já adquirida da USIMEC e não se tem continuidade. Essa obra é de importância vital e fundamental para o desenvolvimento da nossa região. Portanto, penso que com relação a esse particular o Ministro José Serra está absolutamente correto. O Congresso Nacional tem que referendar essa opinião do Ministro, essa determinação da Lei de Diretrizes Orçamentárias. Nós não devemos começar uma nova obra, a não ser que haja uma excepcionalidade, uma emergência e a não ser que terminemos as obras inacabadas, que são um escoadouro interminável do dinheiro público e que poderia ser revertido em favor do social do nosso País. Portanto, cumprimento V. Exª e o Ministro José Serra pela sua intenção de fazer com que terminemos as obras começadas em nosso País antes de iniciarmos outras.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA - Agradeço a V. Exª pelos outros exemplos de obras paralisadas, inclusive aquelas de caráter privado, como é o caso do frigorífico que citou, e que foram financiadas com recursos de incentivos fiscais, e também obras paralisadas na Ferrovia Norte-Sul, iniciada, como V. Exª muito bem lembrou, pelo então Presidente da República e hoje Presidente do Congresso Nacional, Senador José Sarney. Acredito até que esta Casa prestaria um grande serviço ao País se fizesse uma espécie de inventário das grandes obras públicas inconclusas, porque o número é elevado e o retorno, tanto econômico quanto social, como vou mostrar daqui a pouco, apenas com essas barragens do Ceará, seria muito grande. Ao invés disso, o que acontece? As obras se deterioram, os contratos encarecem, os equipamentos se danificam e é mais dinheiro - já escasso - do povo brasileiro que se desperdiça, que se perde, sem que possamos obter resultados daquele recurso que já foi investido nessas obras.

O Sr. Josaphat Marinho - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA - Ouço o nobre Senador Josaphat Marinho.

O Sr. Josaphat Marinho - Nobre Senador Lúcio Alcântara, a situação calamitosa que V. Exª aponta de obras paralisadas é uma rotina no País, e de longo tempo. Mas isto ocorre porque, apesar de a Constituição exigir a elaboração de planos nacionais, regionais e locais, tais planos são ignorados e substituídos por obras circunstanciais ou ao gosto dos governantes eventuais. Se V. Exª for fazer um levantamento dessas obras, aí sim. Agora, tem que elaborar um plano de levantamento das obras paralisadas, tão grande é o disparate.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA - V. Exª fere um ponto da maior importância no seu aparte, e que aliás tem me preocupado bastante. Porque já há algum tempo os nossos governos não têm se preocupado em estabelecer planos de longo prazo para o País. Os famosos PNDs, os Planos Nacionais de Desenvolvimento, os planos regionais, têm vivido ao sabor das contingências, do provisório, das emergências. Temos descurado de maneira muito grave da elaboração dos nossos planos de metas, dos nossos planos qüinqüenais, do nosso programa realmente de interesse para o País e para as nossas regiões. De forma que esse descumprimento, essa desatenção aos dispositivos constitucionais é de fato uma lacuna muito grave que se tem observado nos últimos governos. Talvez porque, premidos pelas dificuldades momentâneas, se descuidem da elaboração desses planos de médio e de longo prazos.

O açude Truçu, em Iguatu, poderá beneficiar cerca de 43 mil pessoas, com um potencial de irrigação de 4 mil hectares e produção de pescado de 309 toneladas/ano.

Há pouco, o Senador Eduardo Suplicy clamava por políticas assistenciais, inclusive na área da alimentação. Essa é uma resposta efetiva, barata, com proteínas de alta qualidade, para melhorar o padrão alimentar das nossas populações.

Já foram investidos nesse açude cerca de R$9,3 milhões, representando 61% do valor total da obra, ao redor de R$15,3 milhões. Trata-se de uma obra de vital importância para a região de Iguatu, uma vez que permitirá a criação de um pólo agroindustrial, com perspectiva de gerar uma receita bruta anual de cerca de R$30 milhões com frutícolas tropicais.

Por sua vez, o açude Fogareiro, em Quixeramobim, localizado no centro do semi-árido cearense, tem possibilidade de beneficiar quase 50 mil pessoas. Possui um potencial de irrigação de cerca de 3.900 hectares e uma produção pesqueira ao redor de 413 toneladas/ano. Na obra, estimada em R$10,3 milhões, o DNOCS já investiu R$4,2 milhões, ou seja, 41% do seu valor total, mas a população carente continua sendo abastecida através dos carros-pipa.

O terceiro projeto, o da barragem São Miguel, no município de Açaré, beneficiará 8.800 pessoas, com uma área irrigável prevista de 700 hectares e oferta de pescado em torno de 112 toneladas/ano. O valor total da obra é de R$7 milhões e já foram investidos pelo DNOCS cerca de R$2,1 milhões, representando aproximadamente 30% do valor total da obra.

O quarto açude, o Serafim Dias, em Mombaça, considerada área crítica quanto ao abastecimento de água, poderá beneficiar cerca de 35 mil pessoas, produzir 46 toneladas/ano de pescado e permitir a irrigação de mais de 2 mil hectares. Ali já foram investidos R$1,4 milhões, representando cerca de 70% do valor total da obra.

Por último, o açude Olho d´Água, em Várzea Alegre, vai beneficiar cerca de 10,2 mil pessoas, numa área privilegiada para irrigação. Tem possibilidade de aproveitamento de 500 hectares em solos aluvionais e baixo custo de produção, devido à fertilidade natural desses solos. A estimativa do custo total é de cerca de R$5 milhões, tendo sido aplicados pelo DNOCS cerca de 11% do valor total da obra. 

Com relação aos projetos de irrigação, o problema é tão sério quanto o das barragens e, em certa medida, talvez causem mais frustração às comunidades prejudicadas. Esses projetos já têm suas fontes de água garantidas e, em alguns casos, foram construídos os grandes canais e o sistema de distribuição de água, faltando pequenas obras para possibilitar a instalação das empresas que farão a exploração agroindustrial desses complexos, gerando emprego e renda.

O projeto de irrigação Araras-Norte prevê uma área irrigada total de 3.225 hectares (primeira e segunda etapas), e foram investidos cerca de R$24,8 milhões, representando 77,2% do valor total da obra. Para a conclusão final da primeira etapa (1.600 hectares), resta aplicar apenas R$1,2 milhão. Os benefícios com o início da operação do projeto seriam quase que imediatos. Poderiam ser ofertadas, no curto prazo, cerca de 4.800 ocupações, gerando uma receita bruta em torno de R$7,2 milhões.

Para a segunda etapa do Araras-Norte, com área prevista para 1.618 hectares irrigados, faltam recursos de cerca de R$6 milhões. Isto representa em torno de 15% do valor total da segunda etapa do projeto.

Pelo tempo decorrido do início das obras, o projeto deveria estar concluído desde 1991. Na realidade, esse investimento foi praticamente relegado ao abandono, causando revolta aos antigos proprietários desapropriados. A maioria não teve sequer condições de comprar um terreno na cidade para construir sua moradia. O destino foi a favela. Assim sendo, o Araras-Norte, até agora, produziu apenas miséria.

O projeto de irrigação Jaguaribe-Apodi, com área total prevista de 5.000 hectares, considerado uma área modelo de exploração, tem apenas 1.750 hectares utilizados. Para 1995, faltam recursos da ordem de R$2 milhões, com dotação orçamentária em indisponibilidade. Esse valor viabilizará a metade da área prevista do projeto (2.500 hectares). Com suas obras concluídas, o projeto já poderia estar gerando um faturamento anual de cerca de R$4,6 milhões. Atualmente, com muito esforço, tem alcançado R$1,2 milhões.

O projeto Curu-Paraipaba, por sua vez, tem previsão de irrigar 4.220 hectares. Para 1995, faltam R$2,8 milhões, com dotações orçamentárias adicionais não-liberadas. Por situar-se a apenas 70 quilômetros de Fortaleza, oferece fortes possibilidades de abastecer a capital e todo o interior com produtos hortifrutigranjeiros. Esse projeto recebeu uma oferta do Governo do Estado do Ceará, como outros, por iniciativa do Governador Tasso Jereissati, para uma parceria de conclusão até 1998. Para seu término serão necessários R$17 milhões, dos quais 63% seriam da União e 37% do Estado.

Somos inteiramente favoráveis à busca do equilíbrio orçamentário. Todavia, como V. Exªs puderam avaliar, no Ceará existem obras praticamente paradas, com possibilidades concretas de elevado retorno econômico. Concluídas, elas contribuirão para solucionar os problemas do abastecimento de água e possibilitariam a geração de renda em expressivas camadas da população do meio rural.

Obra cara é obra parada! É investimento sem perspectiva de retorno. É "jogar pela janela" o dinheiro do contribuinte.

Vamos concluir as barragens e os projetos de irrigação! Os resultados são imediatos. A população interiorana depressa poderá sentir as grandes transformações que a modernização do meio rural possibilitará.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 21/04/1995 - Página 5933