Discurso no Senado Federal

POSIÇÃO DO PT NAS MUDANÇAS CONSTITUCIONAIS, PRIORIZANDO OS DEBATES PELAS REFORMAS FISCAL E TRIBUTARIA. DEFESA DO IMPOSTO SOBRE GRANDES FORTUNAS.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA TRIBUTARIA. REFORMA CONSTITUCIONAL.:
  • POSIÇÃO DO PT NAS MUDANÇAS CONSTITUCIONAIS, PRIORIZANDO OS DEBATES PELAS REFORMAS FISCAL E TRIBUTARIA. DEFESA DO IMPOSTO SOBRE GRANDES FORTUNAS.
Publicação
Publicação no DCN2 de 08/04/1995 - Página 4963
Assunto
Outros > REFORMA TRIBUTARIA. REFORMA CONSTITUCIONAL.
Indexação
  • COMENTARIO, ANALISE, DOCUMENTO, RESULTADO, REUNIÃO, DIRETORIO NACIONAL, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), PARTICIPAÇÃO, ECONOMISTA, BANCADA, DEPUTADOS, SENADOR, PROPOSTA, REFORMA TRIBUTARIA, PAIS.
  • ANALISE, IMPORTANCIA, FINANCIAMENTO, DEFICIT, NATUREZA FISCAL, OBJETIVO, OBTENÇÃO, ESTABILIDADE, PREÇO, AUMENTO, OFERTA, EMPREGO, MELHORIA, DISTRIBUIÇÃO DE RENDA, PAIS.
  • DEFESA, NECESSIDADE, ALTERAÇÃO, FORMA, OBTENÇÃO, RECEITA TRIBUTARIA, ARRECADAÇÃO, IMPOSTOS, SIMULTANEIDADE, REDUÇÃO, DESPESA PUBLICA, GASTOS PUBLICOS.
  • CRITICA, PLANO, REAL, MOTIVO, VINCULAÇÃO, TAXA DE CAMBIO, SIMULTANEIDADE, POLITICA, MANUTENÇÃO, AUMENTO, JUROS.
  • DEFESA, IMPORTANCIA, REDUÇÃO, TAXAS, JUROS, RELAÇÃO, DIVIDA EXTERNA, DIVIDA INTERNA, OBJETIVO, MANUTENÇÃO, POLITICA FISCAL, PAIS.
  • DEFESA, NECESSIDADE, RECUPERAÇÃO, POUPANÇA, FINANÇAS PUBLICAS, OBJETIVO, REALIZAÇÃO, PROGRAMA DE INVESTIMENTO, PROGRAMA, GARANTIA, RENDA MINIMA, POPULAÇÃO CARENTE, MELHORIA, DISTRIBUIÇÃO DE RENDA, PAIS.
  • ANALISE, CARGA, TRIBUTOS, BRASIL, COMPARAÇÃO, PRIMEIRO MUNDO, RESULTADO, NECESSIDADE, PRIORIDADE, COMBATE, EVASÃO FISCAL, PAIS.
  • DEFESA, NECESSIDADE, FUNDAMENTAÇÃO, REFORMA TRIBUTARIA, BRASIL, AMPLIAÇÃO, NUMERO, CONTRIBUINTE, REDUÇÃO, COBRANÇA, IMPOSTOS, INCLUSÃO, PREÇO, PRODUTO, AUMENTO, IMPOSTO PROGRESSIVO, DESCENTRALIZAÇÃO, EXECUÇÃO, ARRECADAÇÃO, NATUREZA FISCAL.
  • DEFESA, INCLUSÃO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, PRINCIPIO CONSTITUCIONAL, PROGRESSIVIDADE, COBRANÇA, IMPOSTO MUNICIPAL, IMPOSTO PREDIAL E TERRITORIAL URBANO (IPTU).
  • SOLICITAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, PROVIDENCIA, AGILIZAÇÃO, TRAMITAÇÃO, PROJETO DE LEI, CAMARA DOS DEPUTADOS, OBJETIVO, IMPLANTAÇÃO, IMPOSTO SOBRE GRANDES FORTUNAS, PAIS.

O SR. EDUARDO SUPLICY (PT-SP. Como líder, pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador) - Sr. Presidente, Senador José Sarney, Srªs e Srs. Senadores, o Partido dos Trabalhadores está amadurecendo e avançando no que diz respeito às reformas econômicas que considera importantes para o País e que estas se iniciem pela reforma fiscal e tributária.

No último final de semana, o Diretório Nacional do Partido dos Trabalhadores reuniu-se e, após um debate - quando ouvimos, inclusive, o ex-Secretário da Receita Federal, Sr. Osires Lopes Filho, que teve a gentileza de, não sendo do Partido dos Trabalhadores, realizar um debate conosco, com duração de três horas, onde pode dar o testemunho de sua experiência e de seu grande conhecimento do sistema tributária brasileiro. Após inúmeras reuniões entre os economistas do PT, dentro do diálogo com toda a Bancada de Deputados e Senadores, em reunião, chegou-se a um documento que expõe as diretrizes principais das linhas de reforma fiscal e tributária que consideramos importantes propor para o Brasil e para o Congresso Nacional.

Em primeiro lugar, consideramos importante reduzir o déficit fiscal de forma a ser financiado sem pressão inflacionária neste País, para que se obtenha estabilidade de preços, desenvolvimento com geração de emprego e distribuição da renda. Para que isto ocorra, faz-se necessário modificações de profundidade no lado da receita e no lado da despesa. Para nós, reforma fiscal compreende não apenas saber o que se passa com o lado da arrecadação de impostos, mas, sobretudo, pensar também no conteúdo dos gastos públicos.

Consideramos isto importante porque faz-se necessária a reorientação da base de sustentação do Plano de Estabilização do Plano Real.

Os fundamentos do Plano Real são, sobretudo, a âncora cambial e os juros altos, que têm levado o País a dificuldades. A âncora cambial e a política de juros altos têm demonstrado possuir fôlego curto para manter um programa de estabilização que possa de fato ter sucesso duradouro.

Acreditamos ser importante a diminuição da carga de juros, relativamente às dívidas interna e externa. É preciso que haja a diminuição das taxas de juros para não se comprometer qualquer esforço de política fiscal. Daí a importância de obtermos uma reforma fiscal de maior profundidade.

Faz-se necessária uma verdadeira reforma do Estado, baseada em princípios de democracia, de eficiência, para que o Estado preste serviços públicos de boa qualidade, realize os investimentos nas áreas da educação, da saúde, infra-estrutura, e que possa realizar justiça social neste País.

A recuperação de poupanças públicas é necessária. De outra maneira, o Estado não estará conseguindo realizar esses investimentos que vão possibilitar o crescimento com melhor distribuição da renda. E, sobretudo, a realização de programas que o Partido dos Trabalhadores tem defendido, como a instituição do Programa de Garantia de Renda Mínima, que vai instituir o mecanismo de Imposto de Renda negativo no Brasil.

Queremos ressaltar a contradição existente entre a carga tributária real, da ordem de 25%, e a carga potencial estimada, conforme a Receita Federal, em torno de 40%, segundo as próprias palavras de Osires Lopes Filho. Pois, se, efetivamente, não houvesse a evasão e a sonegação fiscal que conhecemos, resultado do sistema tributário presente, arrecadar-se-ia algo como 40% do Produto Interno Bruto.

Faz-se necessário dar maior prioridade ao combate à evasão e cabe assinalar que os países civilizados têm uma carga tributária da ordem de 30 a 45% em relação ao Produto Interno Bruto. O Brasil, com 25%, portanto, está bem aquém da carga tributária alcançada nos principais países desenvolvidos, nos países considerados mais civilizados.

Se conseguirmos aumentar significativamente o leque de contribuintes, combatendo a evasão fiscal, poderemos então reduzir a alíquota dos tributos. Sem dúvida, as alíquotas nominais de impostos no Brasil são bastante altas, sobretudo as de impostos indiretos. Hoje pagam mais os que têm menos, e menos - e às vezes não pagam - aqueles que têm mais. Eis por que a reforma tributária precisa se basear na ampliação do número de contribuintes, nos princípios de justiça social, de maior progressividade, de redução dos impostos indiretos com a elevação dos diretos - portanto, com maior progressividade dos indiretos - e na maior descentralização, sobretudo provendo-se os municípios de mais recursos e maior autonomia.

Algumas das mudanças que o Partido dos Trabalhadores propõe são na área da Constituição, mas outras são infraconstitucionais, e para nós constitui também algo muito importante uma ação decisiva na administração fazendária, na administração da cobrança dos tributos. Não somos favoráveis à desconstitucionalização do sistema tributário.

Os pontos principais da proposta do Partido dos Trabalhadores colocados para o Congresso Nacional, para o Executivo, para os brasileiros, são os seguintes: primeiro, que haja, de fato, respeito ao princípio de maior progressividade nos impostos, inclusive que isto esteja muito claro na Constituição. Podemos lembrar que, após 1988, diversas prefeituras tentaram adotar o princípio de maior progressividade na cobrança do IPTU, o Imposto sobre Propriedade Territorial Urbana, e em alguns municípios, como São Paulo, houve ações para impedir que se adotasse esse princípio. É preciso que ele esteja na Constituição, com maior clareza ainda, para que depois não se tenha obstáculos na cobrança do IPTU, do ITR e de outros impostos dessa natureza.

Nós somos favoráveis ao imposto sobre grandes fortunas. E aqui queremos inclusive lançar um desafio ao Presidente Fernando Henrique Cardoso, que foi justamente o autor do projeto do imposto sobre grandes fortunas, aprovado já pelo Senado Federal, com a contribuição, que consideramos importante, do então Senador Roberto de Oliveira Campos, hoje Deputado, e lembrar que esse projeto está tramitando na Câmara dos Deputados.

Em que consiste o projeto que dispõe sobre a tributação de grandes fortunas? Elaborado nos termos do art. 153, VII, da Constituição Federal, e regulamentando, portanto, aquilo que já está previsto na Constituição, esse projeto taxa as fortunas consideradas como o conjunto de todos os bens situados no País e no exterior que integrem o patrimônio do contribuinte. São isentos os patrimônios inferiores, nos termos da lei, a dois milhões de cruzeiros novos, em 1º de fevereiro de 1989, que correspondem, hoje, a um milhão e oitocentos 800 mil reais. Pois bem, o projeto sobre grandes fortunas atinge, realmente, aquelas pessoas físicas, aqueles contribuintes que têm um patrimônio considerável. Não é, portanto, um imposto para atingir a classe média, muito menos os trabalhadores deste País. E é um projeto que pode ser considerado moderado, de bom senso.

Basicamente, aqueles contribuintes com patrimônio de um milhão e oitocentos mil até três milhões e seiscentos mil reais deverão pagar 0,3% de alíquota, subindo ela progressivamente até a alíquota de 1% sobre patrimônios líquidos superiores a sete milhões e duzentos mil reais. Cabe ressaltar que, do valor do imposto devido, poderão os contribuintes deduzir o Imposto de Renda pago sobre os ganhos de aplicações financeiras, de atividades agropastoris, aluguéis, royalties, lucros distribuídos, ganhos de capital.

Assim, Sr. Presidente, nós, aqui, queremos estimular o Governo Federal a catalisar esforços no âmbito da Câmara dos Deputados para que o projeto sobre grandes fortunas seja apreciado o mais rapidamente possível.

Também somos favoráveis a que haja um Imposto de Renda mais progressivo. Hoje, as alíquotas são as seguintes: aqueles que ganham consideravelmente, que estejam na faixa de renda de quinze, vinte ou trinta mil reais, estes recolhem 35% de quanto ganham; aqueles que estão na faixa dos oito, dez mil reais, recolhem 26,6%; aqueles que estão na faixa de renda de um a dois mil reais, recolhem 15%, e aqueles que estão abaixo de setecentos reais, estão isentos.

Avaliamos que seria interessante que as alíquotas de Imposto de Renda se iniciassem não apenas com a isenção, mas, primeiro, com a alíquota negativa, ou seja, se hoje quem ganha abaixo de setecentos reais está isento, aqueles cuja renda não atingisse pelo menos duzentos reais passariam a ter o direito de receber um complemento de renda, o que seria justamente o Imposto de Renda negativo previsto no Programa de Garantia de Renda Mínima, que poderia ser uma alíquota entre 30% e 50% da diferença entre duzentos reais e a própria renda da pessoa. Quem estivesse na faixa de setecentos até por volta de um mil reais recolheria 5%; uma faixa um pouco acima, 10%; outra acima, 15%, e assim por diante, podendo-se ter desse modo uma combinação do Imposto de Renda e do imposto sobre grandes fortunas ou sobre o patrimônio líquido, de tal maneira que aqueles com mais recursos, maiores rendimentos e maior capital, no Brasil, realmente pudessem dar uma contribuição que efetivasse, na nossa legislação, o princípio do imposto de renda e da tributação progressiva. Avaliamos que se poderia instituir um Imposto de Renda mínimo para as pessoas jurídicas, baseado no cálculo do patrimônio líquido, na medida em que hoje muitas empresas, pessoas jurídicas, conseguem, através dos artifícios contábeis legais, mostrar que não obtiveram lucros. Entretanto, conseguem fazer um aumento significativo de seu patrimônio líquido. Instituiríamos então um princípio para o pagamento de um Imposto de Renda mínimo.

Gostaríamos de poder combinar esse mesmo princípio previsto para as pessoas físicas e para as pessoas jurídicas, combinando o imposto de renda das pessoas jurídicas com o imposto de grandes fortunas.

Somos favoráveis a que o Imposto Territorial Rural passe a ser administrado e pago no Município. Portanto, somos favoráveis à municipalização do Imposto Territorial Rural, porque acreditamos, primeiro, que esse imposto está longe de efetivamente realizar o objetivo para o qual foi criado. Explicou-nos o Sr. Osiris Lopes que o Imposto Territorial Rural, no ano passado, arrecadou apenas trinta, quarenta milhões de reais. Ora, o Imposto sobre Serviços de uma cidade, por exemplo, como Porto Alegre, é algo dessa natureza. Quer dizer, trinta ou quarenta milhões de reais de arrecadação é tão ínfimo que não serve, seja como fundos para a implantação da reforma agrária, muito menos para a realização de justiça social.

Por que colocar para o Município a cobrança desse imposto?

Houve até um debate muito interessante em nível de Diretório Nacional. Alguns disseram: "Digamos que no Município, em qualquer Estado, no Paraná, no Mato Grosso, esteja havendo o controle pelos grandes proprietários. Eles não vão querer cobrar o imposto". Mas suponhamos que nos Municípios vizinhos haja uma prefeitura com a disposição de realização de justiça e querendo cobrar o ITR. É importante que a União mantenha os serviços de cadastramento de imóveis rurais, provendo o município da base de coleta de dados suficientes para ter o valor do imóvel naquela região. Portanto, seria em parceria, em colaboração com a União. Mas caberia ao Município cobrar o ITR, podendo ficar com a sua arrecadação. Na medida que um prefeito conseguir realizar a cobrança do ITR, naquele Município, - esta é a nossa avaliação - isso vai representar um exemplo para os Municípios vizinhos e aí haverá a possibilidade de, com o exemplo frutificando, poder arrecadar-se os recursos e realizar-se o que se faz necessário.

Queremos que haja o reaparelhamento da administração tributária com a ampliação dos quadros profissionais, qualificação e motivação para investimentos em informática. É muito importante que haja motivação no servidor da Receita Federal.

O SR. PRESIDENTE (José Sarney. Faz soar a campainha.)

O SR. EDUARDO SUPLICY - Vou concluir, Sr. Presidente, com os pontos finais.

É preciso que haja quebra do sigilo bancário, quando houver indícios claros de evasão fiscal, como ocorre nos Estados Unidos e em outros países, a unificação dos cadastros, a simplificação do sistema tributário com medidas de desburocratização, sobretudo para pequenas e médias empresas, concluindo com o fortalecimento da consciência tributária.

Diz um antigo princípio, consignado no Bill of Rights, que não há contribuição sem representação.

Queremos a defesa desse princípio com um acréscimo: não há contribuição sem representação e sem efetiva participação da população para definir como arrecadar e como gastar os recursos. Muito obrigado, Sr. Presidente. (Muito bem!)


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 08/04/1995 - Página 4963