Discurso no Senado Federal

COMPROMETIMENTO DA ECONOMIA DO ESTADO DE SERGIPE, EM DECORRENCIA DA LONGA SECA NA REGIÃO. REFLEXÕES SOBRE A REFORMA AGRARIA. APOIO A AGRICULTURA FAMILIAR.

Autor
José Alves (PFL - Partido da Frente Liberal/SE)
Nome completo: José Alves do Nascimento
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DESENVOLVIMENTO REGIONAL. AGRICULTURA.:
  • COMPROMETIMENTO DA ECONOMIA DO ESTADO DE SERGIPE, EM DECORRENCIA DA LONGA SECA NA REGIÃO. REFLEXÕES SOBRE A REFORMA AGRARIA. APOIO A AGRICULTURA FAMILIAR.
Aparteantes
Casildo Maldaner.
Publicação
Publicação no DCN2 de 08/04/1995 - Página 4967
Assunto
Outros > DESENVOLVIMENTO REGIONAL. AGRICULTURA.
Indexação
  • DEFESA, NECESSIDADE, COMBATE, SECA, REGIÃO NORDESTE, ESPECIFICAÇÃO, ESTADO DE SERGIPE (SE), MOTIVO, AUMENTO, VELOCIDADE, PROCESSO, EXODO RURAL, PEQUENO PROPRIETARIO.
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, REALIZAÇÃO, PROGRAMA, IMPLANTAÇÃO, ADUTORA, APROVEITAMENTO, RECURSOS HIDRICOS, PERIODO, GOVERNO, JOÃO ALVES FILHO, EX GOVERNADOR, OBJETIVO, PREVENÇÃO, SECA, REGIÃO NORDESTE, ESPECIFICAÇÃO, ESTADO DE SERGIPE (SE), ATENDIMENTO, POPULAÇÃO, POVOADO, ZONA RURAL, PROPRIEDADE RURAL.
  • COMENTARIO, ANALISE, POSSIBILIDADE, COMPROMETIMENTO, ABASTECIMENTO, AGUA, CAPITAL DE ESTADO, ESTADO DE SERGIPE (SE), MOTIVO, FALTA, CONCLUSÃO, SISTEMA DE ABASTECIMENTO, RECURSOS HIDRICOS.
  • SOLICITAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, ADOÇÃO, PROVIDENCIA, MELHORIA, FUNCIONAMENTO, SUPERINTENDENCIA DO DESENVOLVIMENTO DO NORDESTE (SUDENE), ORGÃO PUBLICO, OBJETIVO, INCENTIVO, DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
  • NECESSIDADE, FACILITAÇÃO, ACESSO, FORMAÇÃO PROFISSIONAL, ASSISTENCIA TECNICA, CREDITOS, CUSTEIO, FORMA, EQUIVALENCIA, PRODUTO, OBJETIVO, INCENTIVO, PEQUENO PROPRIETARIO, PROPRIEDADE RURAL, PAIS.

O SR. JOSÉ ALVES (PFL-SE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, nessa última segunda-feira, estive em Sergipe, onde pude comprovar a gravidade da evolução da seca que vem castigando o semi-árido do Estado e agora chega ao litoral, nunca antes tão atingido, colocando 35 Municípios em situação de calamidade e já ameaçando comprometer seriamente a nossa economia, especialmente a pecuária e as culturas de cana e laranja, em que se concentra parte substancial da produção agrícola sergipana.

Este período de estiagem vem sendo considerado como a maior seca dos últimos 50 anos, atingindo muitas regiões do Estado, onde a população já havia aprendido, ao longo dos anos, a conviver com esse fenômeno.

Muita gente, agora, está abandonando suas terras e vindo, pouco a pouco, em direção ao litoral, em cujas cidades, pela crescente presença de retirantes, e pelos depoimentos que trazem desde os pontos mais longínquos do Estado, já se pode avaliar o espectro das privações e dificuldades por que passam os moradores e proprietários do meio rural.

O SR. PRESIDENTE (José Sarney) - Senador Eduardo Suplicy, faço um apelo a V. Exª para que permaneça no plenário por mais 15 minutos, a fim de assegurarmos número para a continuidade da sessão.

Peço ao Senador Osmar Dias que também permaneça no plenário.

Com a palavra o Senador José Alves.

O SR. JOSÉ ALVES (PFL-SE) - A realidade urbana nacional não comporta, sem grandes transtornos e problemas, a aceleração do êxodo rural, com sérias conseqüências que todos sabemos - desemprego, insegurança e o aumento dos gastos governamentais com saúde, educação, moradia e saneamento básico.

Em Sergipe, a seca não está apenas forçando a retirada de moradores e empregados do campo, mas também pequenos e médios proprietários que, simplesmente, estão abandonando suas terras, propriedades que já vinham explorando com grandes dificuldades, devido aos próprios problemas que enfrenta a nossa agricultura, como insuficiência de assistência técnica, encolhimento do crédito agrícola, juros elevados e uma situação insustentável de inadimplência.

É preciso que se combata a seca, uma luta secular em nossa região, o fenômeno do clima e um capricho eventual e cíclico da natureza, mas é urgente que se acabe com o abandono imposto ao homem do campo.

Muito se tem feito no País e nas suas diversas regiões para combater suas causas e conseqüências, e tenho a certeza de que ainda muito se fará neste período de governo, tanto no plano federal quanto estadual, mas é preciso que se faça algo com lógica, prioridade e urgência, porque a agricultura é a base vital da nossa economia, ela é quem produz o sustento diário da população, ocupa 35 milhões de pessoas e participa substancialmente de nossas exportações, gerando preciosas divisas, incrementos no PIB e na renda nacional.

Para a prevenção das secas em Sergipe, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, uma experiência triste e muito antiga no Nordeste, vários governos desenvolveram importantes trabalhos, e entre eles quero ressaltar as obras específicas visando a captação e preservação de recursos hídricos realizadas pelo Projeto Chapéu de Couro, no Governo João Alves Filho. O programa promoveu a construção de poços, cisternas, cavou e protegeu cacimbas e fontes, instalou reservatórios para captação de águas das chuvas e ajudou a população a desenvolver a sua própria experiência de obter este tão bem dispensável à vida.

Em todo o Estado foram construídos 1.760Km de adutoras, que canalizam água do rio São Francisco e outros rios. Hoje todas as sedes municipais têm água encanada, que chega também a 1.500 propriedades rurais e a 90% do povoado da zona rural com mais de 50 casas.

A longa estiagem, devido ao rebaixamento do nível dos rios que compõem o complexo de adutoras do sistema de abastecimento hídrico do Estado, vem comprometendo seriamente até o fornecimento da água em Aracaju, cujas obras de infra-estruturas, concluídas em 97%, foram planejadas para garantir tranqüilidade no abastecimento da Capital, em condições normais, até o ano 2.020, mas esta estiagem vem sendo uma situação atípica, que certamente será superada com a conclusão total do referido sistema .

Em matéria de recursos hídricos, Sergipe, atualmente, é o Estado do Nordeste melhor servido de água tratada, tanto a servida para o consumo doméstico quanto aquela destinada à agricultura. 

Entretanto, falta-lhe ainda substancial apoio técnico e financeiro para a atividade agrícola e para fixar o homem no campo, onde apenas um pedaço de terra não lhe é suficiente para viver e sustentar a sua família.

Seca e abandono são um fardo muito pesado para o homem do campo, que longe ouve e avista a perspectiva ilusória de conforto nas grandes cidades.

E quero, nesta oportunidade, lamentar o processo de esvaziamento por que vem passando a SUDENE, um órgão de desenvolvimento regional que durante sua existência vinha prestando inestimáveis serviços ao progresso da Região Nordeste e hoje, bastante enfraquecida, até mesmo pela falta de motivação de seus dirigentes, vem se tornando até insensível aos mais elementares problemas de nossa região.

Desta tribuna faço um apelo ao Governo Federal para que cuide com atenção não apenas da SUDENE mas também de outros órgãos cuja finalidade é apoiar e estimular o desenvolvimento de reduzir as disparidades regionais.

No início da semana passada, a imprensa deu ampla repercussão a medidas do Governo Federal, que, em decreto assinado pelo Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, autorizou o INCRA a fazer a desapropriação de cerca de 130 fazendas, num total de 900 mil hectares, destinados ao assentamento de 16 mil famílias.

A reforma agrária é um projeto de extrema urgência e importância para a recuperação de nossa agricultura e a melhoria das condições de vida no campo e também nas cidades, pois as dificuldades no meio rural, além de encarecerem o custo de vida pelo ângulo da alimentação, são um estímulo ao êxodo para o meio urbano, com as sérias conseqüências que todos sabemos: desemprego, insegurança e aumento dos gastos governamentais com saúde, educação, moradia e saneamento básico.

Portanto, quero ressaltar a importante iniciativa do Presidente Fernando Henrique Cardoso em retomar, no início de seu Governo, o programa de reforma agrária, o objetivo de assentar 40 mil famílias até o final deste ano como parte das metas plurianuais que estabeleceu.

Há estudos concluindo que a comida que chega à mesa dos brasileiros é produzida em cerca de 400 milhões de hectares.

Essa área está repartida em sete milhões de propriedade rurais, sendo que apenas 500 mil estabelecimentos ocupam 75% do total dessa área agrícola, isto é, constituem 300 milhões de hectares, que são ocupados por estabelecimentos patronais, em torno dos quais vivem 5 milhões de pessoas, ou seja, 20% da mão-de-obra ocupada no campo.

Os outros 6,5 milhões de propriedades rurais são basicamente familiares. Ocupam apenas 25% das terras, uma área em torno de 100 milhões de hectares, mas geram 80% do emprego no campo, correspondendo a 20 milhões de pessoas.

É preciso ressaltar que a agricultura familiar em nosso País, desenvolvida em estabelecimentos agrícolas de 20 a 100 hectares, é a que produz a maior parcela dos nossos produtos agropecuários; exceto soja, arroz, cana-de-açúcar e bovinos que são provenientes, em sua maior parte, da agricultura patronal, desenvolvida em áreas de 500 a 10 mil hectares e favorecidos pela pelas políticas agrícolas a partir do final dos anos 60, devido à concentração fundiária, mecanização e crédito fartos aos grandes produtores.

Portanto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quero apoiar com prioridade a agricultura familiar, os pequenos produtores e a parcela de nossa população que vive e produz no campo é uma questão de coerência em nossa política agrícola, porque a atividade rural, além de contribuir economicamente com a produção nacional, também contribui socialmente porque emprega, abriga e alimenta a todos os que a ela se dedicam.

A realidade socioeconômica do campo revela que 6,5 milhões de brasileiros sobrevivem marginalizados em 2,5 milhões de minifúndios, com área em torno de 2 hectares; e outros 7,5 milhões, ou seja, 30% do pessoal que trabalha no campo e vivem em área de 8 hectares, situam-se na fronteira entre a marginalidade e a luta e para se incorporar no mercado, muitos deles vítimas do endividamento agrícola e da redução do crédito.

Para a recuperação da nossa agricultura, é indispensável um apoio especial e diferenciado para os pequenos produtores que desenvolvem a agricultura familiar.

É preciso que se facilite o acesso à formação profissional, à assistência técnica e crédito de custeio com equivalência-produto e juros compatíveis com a atividade agrícola a estes produtores, pois o crédito rural, amparado por lei, deve ser financiado com recursos provenientes dos 25% dos depósitos à vista, captados pela rede bancária a custo zero, razão por que os juros cobrados não deveriam ser tão elevados. 

O Sr. Casildo Maldaner - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. JOSÉ ALVES - Ouço com muito prazer o nobre Senador Casildo Maldaner.

O Sr. Casildo Maldaner - Estou ouvindo atentamente V. Exª já adentrando a tarde de sexta-feira. E V. Exª faz seu pronunciamento com tanta proficiência que nos deixa, na verdade, até regozijados pelos conhecimentos que traz, úteis não só para o seu Estado mas também para o Brasil, ao fazer essa análise da agricultura brasileira principalmente a familiar. E eu gostaria de me engajar no seu pronunciamento, porque em Santa Catarina temos exemplos típicos de pequenas propriedades agricultáveis, às quais as famílias se dedicam. Hoje, através do requerimento do Senador Osmar Dias e Vilson Kleinübing, penso que se está indo ao encontro dessa grande solução. O veto derrubado pelo Congresso Nacional vai fazer com que o Governo sente para conversar, para encontrar o verdadeiro caminho e, com isso, encontrar a solução para as pequenas famílias, quer dizer, as pequenas propriedades com a sua produção diversificada, onde pratica-se um verdadeiro artesanato na agricultura. Assim, estaremos indo ao encontro de uma grande solução, qual seja, a interiorização do desenvolvimento. Hoje eu entendo que nas grandes cidades do Brasil já existem três problemas: o da habitação, do saneamento básico e de segurança. Estaremos ajudando até os prefeitos e as administrações destas grandes cidades, ao fazer com que a interiorização do desenvolvimento aconteça. Através da sua proposta e da sua análise, Senador José Alves, nós estamos indo a este grande encontro. Por isso gostaria de congratular-me com V. Exª, em nome de Santa Catarina, por esta belíssima exposição que está fazendo já neste início de tarde de sexta-feira.

O SR. JOSÉ ALVES - Agradeço a gentileza do seu aparte.

Convido à reflexão os que dirigem o programa de reforma agrária, pois não será apenas distribuindo terras que se resolverá o problema do campo. Além da distribuição de áreas, é fundamental uma assistência permanente às famílias assentadas.

Nos Municípios de Carira e Poço-Redondo, região do semi-árido sergipano, onde o Governo autorizou a desapropriação de duas fazendas, que somam mais de 2.500 hectares, médios e pequenos proprietários também estão abandonando suas terras devido à seca que assola o sertão, numa estiagem já considerada, como disse antes, a mais grave dos últimos 50 anos.

Será muito difícil que famílias possam ser fixadas ali, onde até os antigos proprietários, já ambientados com a realidade da região, estão abandonando suas terras.

Sergipe desenvolveu uma experiência vitoriosa de colonização e reforma agrária no Município de Canindé do São Francisco, no semi-árido, próximo de Poço-Redondo - o Projeto Califórnia, onde foram assentadas muitas famílias, em áreas desapropriadas, que têm apoio de um amplo programa de assistência técnica, infra-estrutura e água canalizada do rio São Francisco, que serve à agricultura irrigada em mais de mil hectares.

Com a implantação de Xingó, Sergipe já tem um outro projeto detalhado, o Califórnia II, que objetiva a irrigação de 5.000 hectares, a um custo muito mais baixo com relação ao projeto anterior, devido à simplificação da tomada de água, proveniente da construção do reservatório da hidrelétrica.

O apoio do Governo Federal a esse projeto de assentamento e reforma agrária do Governo Estadual teria um retorno muito mais seguro e econômico do que a tentativa de se fixar famílias no sertão de Carira e Poço-Redondo, onde é extrema a dificuldade de água, portanto, muito difícil o trabalho, a produção e a sobrevivência.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, os alimentos estão caros, principalmente no Nordeste, porque, entre a terra e a produção, situa-se, além do clima e da desassistência, a usura dos juros altos cobrados pelo sistema financeiro, e entre a produção - onde o produtor rural mal cobre os seus custos - e o consumidor, está enraizada a ganância dos atravessadores.

É urgente, prioritário e indispensável que o Governo implante um programa realista e duradouro de assistência técnica, creditícia e social à população do campo, pois é ela quem alimenta as cidades.

O Brasil urbano, para sua própria sobrevivência, deve cuidar com carinho, respeito e admiração do Brasil rural, porque é de lá que chega à mesa o pão que alimenta os brasileiros.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 08/04/1995 - Página 4967