Discurso no Senado Federal

ELOGIOS A CNBB PELO TEMA 'ERAS TU, SENHOR?' DA CAMPANHA DA FRATERNIDADE DE 1995.

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
IGREJA CATOLICA.:
  • ELOGIOS A CNBB PELO TEMA 'ERAS TU, SENHOR?' DA CAMPANHA DA FRATERNIDADE DE 1995.
Aparteantes
Benedita da Silva.
Publicação
Publicação no DCN2 de 08/04/1995 - Página 4953
Assunto
Outros > IGREJA CATOLICA.
Indexação
  • COMENTARIO, ANALISE, IMPORTANCIA, CAMPANHA DA FRATERNIDADE, CONFERENCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL (CNBB), COMBATE, FOME, MISERIA, PAIS.
  • SOLICITAÇÃO, JOSE SARNEY, SENADOR, PRESIDENTE, SENADO, PROMOÇÃO, REUNIÃO, PARTICIPAÇÃO, CONFERENCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL (CNBB), REPRESENTANTE, GOVERNO, PROGRAMA COMUNIDADE SOLIDARIA, COMBATE, FOME, MISERIA, PAIS.

 

O SR. PEDRO SIMON (PMDB-RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - É uma honra tê-lo na Presidência da Casa, nobre Senador José Sarney.

Sr. Presidente, ontem, o Senador Eduardo Suplicy fez referência a essa matéria e, na ocasião, lhe sugeri que fôssemos, juntamente com outros Senadores, à presença de V. Exª.

Farei, aqui, publicamente essa exposição, e muito me honraria se V. Exª aqui permanecesse.

Sr. Presidente, todos conhecemos a tradicional Campanha da Fraternidade que a CNBB faz. É uma campanha importante e significativa que tenta, todos os anos, chamar a atenção da sociedade para os problemas e dificuldades do nosso mundo e da nossa sociedade.

Tenho aqui alguns dos textos básicos dessas campanhas. Em 1993, todo o debate da Campanha da Fraternidade girava em torno do tema "Onde moras?" O objetivo era mostrar a situação de miserabilidade de milhões de brasileiros que praticamente não moram em lugar nenhum, embaixo das pontes, nas favelas, na miséria absoluta.

No ano passado, o texto base de toda a Campanha da Fraternidade foi "A família, como vai?" Oportunidade em que se debateu, se discutiu e se aprofundou sobre os temas da família brasileira e da família no seu conjunto.

Tenho para mim, Sr. Presidente, que o texto base mais profundo e mais significativo desde que a CNBB realiza esta Campanha da Fraternidade é o deste ano: "Eras tu, Senhor?", referindo-se àquela Parábola do Evangelho de Mateus, Sr. Presidente - que V. Exª e eu conhecemos -, onde Jesus nos diz que quando Ele voltar, no final dos tempos, haverá de selecionar os que ficarão à sua direita e os que ficarão à sua esquerda. Ele haverá de selecionar aqueles que quando Ele esteve aqui, teve fome e lhe foi dado o que comer, teve frio e lhe deram o que vestir, não tinha onde pousar e lhe deram morada; a esses, diz Jesus no Evangelho, Ele chamará para o seu convívio. E aqueles outros que quando Ele tinha frio, não lhe deram o que vestir, quando Ele tinha fome, não lhe deram o que comer, quando Ele não tinha onde morar, não lhe deixaram onde viver, esses, Ele decretará a perseguição. Quando lhe perguntaram: -Mas, Senhor, quando tivestes frio e não lhe demos agasalho? Quando o Senhor teve fome e não lhe demos alimento? Quando o Senhor não tinha onde morar e eu não lhe demos assistência? A resposta de Cristo V. Exª conhece: Todas as vezes em que foi negado o alimento, o agasalho a assistência a uma criancinha, a uma pessoa que não tinha o que comer, o que vestir, onde se abrigar, foi a Mim que negaram.

Esse é o texto "Eras Tu, Senhor". É o tema dos excluídos. Será que há um tema mais oportuno para debatermos nesta Casa e neste País do que o dos excluídos? Nós somos os incluídos, e nós, do Senado Federal, somos os mais incluídos que se possa imaginar.

A Bíblia fala na história dos talentos, em que, um dia, cada um de nós será cobrado de acordo com aquilo que recebeu, cada um de nós haverá de prestar conta daquilo que fez, com a competência, com a capacidade que a vida lhe proporcionou. 

Nesse dia, talvez ocorram enormes surpresas.

Sr. Presidente, V. Exª foi Governador do Maranhão, Presidente da República, Presidente do Congresso Nacional; eu fui Governador de Estado, Senador da República; estamos aqui, eleitos por uma imensa maioria, estudamos em faculdades, temos a tranqüilidade de ver a nossa família serena, nossos filhos em nossos lares, e fomos eleitos pelo voto popular para sermos a Casa revisora, para, durante oito anos, estarmos aqui olhando para o nosso País, preocupados com seu destino e seu futuro.

O próprio Presidente da República, no seu cotidiano, providencia o que deve ser feito: pagar os funcionários, observar o déficit, procurar manter tudo em dia.

Nós, Senadores da República, com oito anos de mandato, somos aqueles que, em tese, já passaram pelos rumos da vida - muitos já foram, como V. Exª, Presidente da República; outros, governadores; outros, ministros; outros, secretários de Estado; outros, parlamentares de outros Parlamentos. Tendo acumulado experiência e com a responsabilidade de estarmos aqui a trabalhar pela nossa Pátria, devemos fazer a pergunta: trabalhar como? De que forma?

Longe de mim imaginar que nós, parlamentares, desde a madrugada, quando acordamos, ou quando deitamos, já bem tarde, não estamos preocupados, trabalhando por aquilo que a nossa consciência manda, que é cumprir o nosso mandato.

Cumprimos o nosso mandato nesta tribuna; cumprimos o nosso mandato no plenário, assistindo e aparteando; cumprimos o nosso mandato apresentando projetos de lei, apresentando emendas, indo às reuniões das comissões, convocando ministros e autoridades; cumprimos o nosso mandato aprofundando o conhecimento das matérias por meio da imprensa, jornais e televisão, para que possamos debatê-las; cumprimos o nosso mandato indo as nossas bases, conhecendo os nossos eleitores e com eles discutindo; cumprimos o nosso mandato tentando aprimorar a legislação do nosso País.

Sr. Presidente, será que em nosso íntimo, quando voltamos para casa, no final de um dia, nós, em tese, achamos que essa caminhada, esse esforço, esse trabalho e essa dedicação valeram a pena? O que significa para mim valer a pena?

Para mim, Sr. Presidente, valer a pena é dar prioridade ao que é prioritário.

Será que este Senado da República, na hora de legislar, dá prioridade ao que é absolutamente prioritário? O que é prioritário num país como o Brasil?

É claro que sabemos que existem dois Brasis. Em primeiro lugar, essa resposta é dada de duas maneiras. Há o "Brasil Bélgica", que tem padrão de Primeiro Mundo, que vai muito bem, obrigado; que tem casa, casa de praia, casa de sítio, carro de primeira linha e os seus filhos estudando nas melhores faculdades, consumindo produtos nacionais e importados. Trabalhando, é verdade; são bons médicos, advogados, engenheiros, professores, empresários, intelectuais, técnicos, são pessoas responsáveis, que têm mérito, crédito e respeito. Longe de mim imaginar que a Bélgica brasileira é constituída por pessoas irresponsáveis, maléficas, desonestas e incompetentes - claro que não! Muitas delas cumprem o seu dever. São bons médicos, advogados, engenheiros, professores, sociólogos, empresários, homens que têm terra, produzem e cultivam a terra.

Mas as pessoas em relação às quais debatemos aqui, esse projeto que se aprovou, rejeitando o veto e praticamente tomando todo o dinheiro do Brasil para dá-lo aos produtores, o debate a que se assiste diariamente no noticiário da televisão e dos jornais, toda essa discussão do dia-a-dia é para o nosso "Brasil Bélgica".

Se olharmos para o meu Partido e para a maioria deles, quem é o Presidente? Quem é o Vice-Presidente? Em tese, em regra, quem é o vereador? Quem é o prefeito? Quem é o deputado? Quem é o dono da rádio? Quem é o presidente da entidade comunitária? Quem é o reitor da universidade? É o "Brasil Bélgica", é o Brasil daqueles para os quais a campanha "Eras Tu, Senhor?" praticamente não tem um significado maior, porque eles não entendem!

Dizem: mas eu faço a minha parte! Pago o meu imposto, trabalho, produzo, rendo, educo meus filhos, dou bom salário para a minha empregada, até dou vantagens a ela, pago a escola do seu filho. Estou fazendo a minha parte!

Em relação a nós, Congresso Nacional, como é que não estamos fazendo a nossa parte?! Estamos legislando, votando todos os dias. É a Zona Franca de Manaus, a agricultura no Rio Grande do Sul, são os temas mais variados que se pode imaginar. Nós estamos trabalhando!

Será que é por aí? Será que não está faltando, neste País, neste Congresso Nacional e neste Senado Federal, nós entendermos que, desgraçadamente, praticamente nada se faz pelo "Brasil Índia", pelos milhões que passam fome, que estão na miséria, que não participam, que não são gente, que não têm presença, que não produzem e que não consomem e que, conseqüentemente, são como se não existissem. Será que algum de nós, com tranqüilidade, volta para casa ao final de um dia trabalhado aqui e diz: eu fiz a minha parte. Hoje o "Brasil Índia" diminuiu, graças ao meu trabalho, ao que eu fiz - que hoje já não é. Pode não estar no "Brasil Bélgica", mas também não está no "Brasil Índia". Está no Brasil transição.

A campanha da CNBB tem esse significado. Não sei se todos se apercebem disso, mas tem esse significado.

A campanha da CNBB está dizendo que aquele jovem drogado - drogado porque não teve apoio, estímulo, presença - é um filho de Deus, está alertando para a situação do velho desamparado que, praticamente, neste País, não tem qualquer expectativa de vida, lembrando a ele que o Senhor está presente.

Aponto isso para mostrar a dolorosa chaga de uma Recife, capital mundial do turismo-sexo, ganhando da Tailândia, para onde vai hoje o Presidente Fernando Henrique Cardoso e queira Deus que ele não apenas veja, mas faça algo de concreto. Ali é Cristo que está presente. Há 32 milhões de brasileiros que passam fome, que estão no ritmo do Brasil miséria, enquanto milhões de toneladas de grãos apodrecem nas mãos do Governos, nos silos espalhados por este País. É Cristo que está presente.

Sr. Presidente, custa-me acreditar que a frieza seja tão grande e tão intensa e nos absorva a todos. Sim, vamos ser sinceros. Se nós, que tivemos a experiência da vida, desde os de origem mais humilde - um exemplo é a Senadora Benedita da Silva, que viveu e conhece o drama do dia-a-dia da carência e pela sua competência veio galgando degrau a degrau e aqui chegou. Há, também, aqueles que, de certa forma, não tiveram origem semelhante, mas que passaram por duros caminhos da vida e os conhecem. Quem de nós, em nossas caminhadas, não sabe - e pergunto a querida Senadora do Rio Grande do Sul -, não conhece a zona das regiões da fome e da miséria, onde isso não poderia existir, porque a terra é pródiga e feliz para todos.

Se não nos preocupamos, não atentamos, não fazemos algo no sentido de entender este significado, não cobramos o sentido de buscar essa solução, esperar isso de quem? Essa campanha é emocionante.

Sr. Presidente, por exemplo, em todas as cantigas da Igreja, nas missas, desde a abertura, Ofertório, Comunhão, Pós-Comunhão, em todas as orações, em todas as missa, referem-se a textos do "Eras Tu, Senhor?", em que se chama a atenção da sociedade, permanentemente, constantemente, para a responsabilidade nossa com os excluídos.

(Manifestação das galerias)

Responsabilidade nossa, Sr. Presidente, com os excluídos!. Penso que a Igreja está fazendo fantasticamente o seu papel. Em nenhuma outra campanha, a CNBB abordou com tanta profundidade, com tanto conteúdo, com tanta seriedade essa questão como o faz agora.

Daí o meu apelo a V. Exª, Sr. Presidente. Em conversa com o Senador Eduardo Suplicy, eu dizia: vamos falar com o Presidente José Sarney, vamos pedir que ele convide o Presidente da CNBB, e sua equipe, para realizarmos uma reunião, sob a presidência de S. Exª e, talvez, de alguém do Executivo, para debatermos uma maneira, fora do tradicional, através de um ofício, divulgando na "Voz do Brasil", imprimindo cartazes dizendo que o Senado é solidário, que apóia. Além disso, Sr. Presidente, que chamássemos a CNBB e, talvez, autoridades ligadas ao plano apresentado pelo Governo - o Programa Comunidade Solidária - para tentarmos estabelecer uma mesa redonda, um debate, uma discussão sobre o conteúdo e a profundidade da matéria. Creio que poderíamos realizar uma reunião da maior importância, para que não aconteça com esse o que ocorreu com os outros temas. Quando acontece uma campanha ...

A Srª Benedita da Silva - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. PRESIDENTE (José Sarney) - Senadora Benedita da Silva, o tempo do orador estará esgotado daqui a 2 minutos. Há uma longa fila de oradores que estão esperando para falar nesta sessão. Por isso, pediria a V. Exª que deixasse o orador concluir o seu discurso. Muito obrigado.

O SR. PEDRO SIMON - Sr. Presidente, faço um apelo muito profundo. Gostaria que V. Exª convidasse, que falasse com o Presidente da CNBB e a equipe que está montando este programa - talvez seja o caso, não sei, nem quero entrar no mérito, mas, se for -, com a equipe do Governo que trata do Programa Comunidade Solidária para juntos discutirmos. O pior que pode acontecer é não dar em nada. Mas mesmo que não dê em nada, já vale, pela reunião, pela tentativa de nos sentarmos para debater.

Creio, Sr. Presidente, e lhe digo, do fundo do coração, que se existisse esse ritmo que V. Exª está dando, justiça seja feita, de tanta rapidez no andamento dos projetos, das discussões e das votações nesta Casa, um discurso como este, uma proposta como esta, há três anos, não seria uma proposta fadada a cair no vazio. No máximo, eu poderia apresentar um projeto. Aliás, tenho um projeto - que foi aprovado - pedindo que o Presidente da CNBB seja ouvido. Creio que V. Exª poderia convidar o Presidente da CNBB para na semana que vem, ou quando o nobre Presidente achar mais conveniente, realizarmos uma reunião com a finalidade de debatermos. V. Exª vai me perguntar: mas concluir o quê? Não sei, Sr. Presidente, sinceramente. Seria ridículo imaginar que eu soubesse. Agora, sei que V. Exª, os parlamentares, o Presidente da CNBB, o grupo que está à frente desta campanha e, se for o caso, a representação do Governo no Programa Comunidade Solidária poderíamos encontrar um bom caminho.

Trago as minhas felicitações à CNBB. Meu abraço querido e fraternal ao seu Presidente, mas gostaria que não ficasse só nisso, porque é muito pouco. Poderíamos talvez marcar um elo novo e totalmente diferente, para mostrarmos o que podemos fazer para os excluídos.

Entre os incluídos, Sr. Presidente, somos os mais incluídos. No Brasil dos incluídos, há os mais e os menos. Entre os primeiros há os trabalhadores que estão bem, os empresários, a classe média alta e os intelectuais, mas os mais incluídos e com mais responsabilidade somos nós, Senadores da República, com 8 anos de mandato. Superamos, em responsabilidade com relação a esta questão, os Deputados e até mesmo o Presidente da República, que passa o dia e a noite - e V. Exª sabe disso melhor do que eu - "correndo atrás dos fatos". Muitas vezes me pergunto - dizia V. Exª quando fui seu Ministro -, entre aquilo que assino destinado ao social e o que chega ao seu destino, quanto se perde no meio do caminho dos erros e dos equívocos da burocracia da sociedade!. Nem o Presidente, então, tem maior responsabilidade do que a nossa.

Faço um apelo a V. Exª para que marque essa reunião, que será histórica no sentido de chamarmos o Presidente da CNBB e sua equipe. V. Exª tem uma equipe tendo a frente o Sr. José César, mostrando um belo trabalho na Presidência do Senado. Superamos o Executivo no momento em que estamos fazendo algo de novo, ou seja, a campanha dos excluídos deve ter em nós, os incluídos, a verdadeira colaboração.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 08/04/1995 - Página 4953