Discurso no Senado Federal

ESCLARECIMENTOS, QUANTO AS NOTICIAS VEICULADAS PELA IMPRENSA, DE QUE S.EXA., COMO RELATOR DO PROJETO DE LEI DAS PATENTES, ESTARIA FAVORECENDO UM GRANDE LABORATORIO FARMACEUTICO.

Autor
Ney Suassuna (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
Nome completo: Ney Robinson Suassuna
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PROPRIEDADE INDUSTRIAL.:
  • ESCLARECIMENTOS, QUANTO AS NOTICIAS VEICULADAS PELA IMPRENSA, DE QUE S.EXA., COMO RELATOR DO PROJETO DE LEI DAS PATENTES, ESTARIA FAVORECENDO UM GRANDE LABORATORIO FARMACEUTICO.
Aparteantes
Edison Lobão, Jefferson Peres, Osmar Dias, Roberto Requião.
Publicação
Publicação no DCN2 de 03/05/1995 - Página 7148
Assunto
Outros > PROPRIEDADE INDUSTRIAL.
Indexação
  • DESMENTIDO, ACUSAÇÃO, DIVULGAÇÃO, NOTICIARIO, MEIOS DE COMUNICAÇÃO, FAVORECIMENTO, GRUPO ECONOMICO, LABORATORIO FARMACEUTICO, APRESENTAÇÃO, RELATORIO, AUTORIA, ORADOR, RELAÇÃO, LEGISLAÇÃO, PATENTE DE REGISTRO.
  • ESCLARECIMENTOS, DESMENTIDO, ARTIGO DE IMPRENSA, DIVULGAÇÃO, NOTICIARIO, MEIOS DE COMUNICAÇÃO, RELAÇÃO, RESPONSABILIDADE, ORADOR, APROVAÇÃO, LEGISLAÇÃO, PATENTE DE REGISTRO, AUTORIZAÇÃO, DESNECESSIDADE, PAGAMENTO, IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO, MERCADORIA ESTRANGEIRA, OBJETIVO, IMPEDIMENTO, ABUSO, PODER ECONOMICO, POPULAÇÃO.

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB-PB. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, como todos sabem, sou relator do PLC nº 115, de 1993, que regula direitos e obrigações relativos à propriedade industrial, conhecido nacionalmente como Lei de Patentes.

Não é a primeira vez que recebo, através da imprensa, algumas acusações, oriundas de confusão deliberada ou inadvertida da imprensa. Na verdade, o assunto é extremamente complexo, e só mesmo aqueles que se debruçam sobre ele podem compreendê-lo em profundidade. É grande a dificuldade conceitual.

Primeiro, em relação ao pipeline. Se aprovada a lei hoje, chamar-se-ão pipeline as autorizações que forem dadas, retroativas - podendo ir até 8 anos atrás -, para as patentes que foram registradas mas que ainda não foram comercializadas. Pipeline esse que só um país no mundo reconheceu - o México -, e não serve de exemplo para nós. Um outro, de modo diferenciado, tentou negociá-lo - a China -, e, como bem diz essa revista que ontem circulou na imprensa nacional, "os desenvolvidos fazem de conta que não vêem que este País não está pagando, e a China faz de conta que não deve".

O pipeline, se usarmos a quantia estipulada por esses países desenvolvidos, representaria, só para eles, uma perda de cerca de US$ 600 milhões anuais. Se deixarmos permanecer o pipeline no projeto de lei, isso significaria, num primeiro momento, que os 328 laboratórios nacionais seriam proibidos de continuar fabricando os remédios que hoje fabricam. Seria um prejuízo, porque eles nada fizeram. Do ponto de vista ético, pode não ser certo. Mas, do ponto de vista legal, não há nenhuma ilegalidade; a lei brasileira permitia.

Se deixarmos, no entanto, vigorar o pipeline, teríamos, num primeiro momento, o fechamento dessas linhas de produção, com desemprego em massa nesses 328 laboratórios. Teríamos também a abertura para cobrança passada de um conta de cerca de US$ 4,8 bilhões. Como conseqüência, com toda certeza, todos esses laboratórios iriam à bancarrota e não existiria mais qualquer laboratório nacional.

Apenas quem não entendeu, por dificuldade conceitual, essa matéria, poderia ter escrito esse editorial de jornal que diz que eu favorecia o grupo farmacêutico. O meu relatório não favorece absolutamente ninguém a não ser um país chamado Brasil, o meu País, que eu amo e não vou arredar pé de defendê-lo de todas as formas e maneiras possíveis.

O Sr. Roberto Requião - Concede-me V. Exª um aparte?

O SR. NEY SUASSUNA - Ouço V. Exª com prazer.

O Sr. Roberto Requião - Senador Ney Suassuna, vejo com muita clareza a tentativa da desqualificação do debate no Congresso Nacional. Forças organizadas estão tentando impedir o debate da Lei de Patentes. Ela veio pronta e acabada, com o original em inglês e foi mal traduzida pelo Governo Collor de Mello. Novamente, ela passa pelo Congresso Nacional, agora pelo Senado, praticamente sem discussão. Estamos tentando discutir essa lei, fazer com que o debate se estabeleça a duras penas. As pressões são internas e externas, e todos os Senadores que estão colocando em questão os interesses dos grandes grupos internacionais, em transformar em lei aquilo que até hoje somente lhes é possível defender e impor através das retaliações presidenciais da super-seção 301 da legislação americana, estão sendo sistematicamente desqualificados. Por outro lado, a falta de seriedade da imprensa com relação a esse debate é absoluta. A imprensa está-se comportando com total e absoluta irresponsabilidade. Nenhum dos seus argumentos, dos argumentos que eu encampei e que foram elaborados durante um período de dois anos pelo Senador Antonio Mariz, foram contrapostos pela imprensa ao projeto original das multinacionais. Simplesmente a ameaça de retaliações e a acusação de que somos nós, que estamos tentando dar ao Brasil uma lei decente de patentes, defensores da pirataria. É preciso que esse processo seja paralisado e que o Senado assuma, de uma vez por todas, o aprofundamento dessa discussão, seja no plenário da Comissão, seja no plenário do Senado. E que a imprensa abra suas portas. A Folha de S. Paulo, por exemplo, tenta desqualificar a minha participação, fazendo pouco caso das 121 emendas que assumi - do Senador Antonio Mariz, algumas de V. Exª e algumas que introduzi para dar um corpo coerente ao voto em separado que pretendo levar à Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. De forma gaiata, a repórter da Folha de S.Paulo disse que eu me havia recusado a debater no plenário da Comissão a Lei de Patentes; que, em companhia do Senador Esperidião Amin - que preside nossos trabalhos neste momento -, eu me dedicava a dizer frases de efeito durante as discussões. Não houve discussões. Até agora, tivemos o relato de votos: o seu voto; o voto do Senador Esperidião Amin sobre a biodiversidade, sobre a patente dos organismos vivos; o voto do Senado José Ignácio, em separado; o voto do Senador Ronaldo Cunha Lima. Mas estão brincando com o Senado e brincando com o Brasil. Precisamos aprofundar a discussão sobre a Lei de Patentes; e a imprensa brasileira precisa, de uma vez por todas, de uma lei de imprensa que responsabilize definitivamente os gaiatos, os irresponsáveis que nesse momento não sei a serviço de quem estão. Obrigado, Senador.

O SR. NEY SUASSUNA - Obrigado. Gostaria de informar a V. Exª que exaurido o debate na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania esse projeto de lei seguirá para ser debatido na Comissão de Economia, após o que virá ao plenário desta Casa para o maior debate de todos.

O Sr. Jefferson Péres - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. NEY SUASSUNA - Pois não.

O Sr. Jefferson Péres - Ilustre Senador Ney Suassuna já li e reli seu parecer e vou votar com muita consciência e responsabilidade. Mas desde já, Senador Ney Suassuna, receba meus cumprimentos pelo estudo que fez do projeto que veio da Câmara, pelo substitutivo que apresentou e, sobretudo, pela serenidade e equilíbrio com que V. Exª tem se conduzido, pela posição que tomou, distante seja da submissão a interesses externos seja da xenofobia de outros. De forma que lhe dou meus parabéns.

O SR. NEY SUASSUNA - Muito obrigado, nobre Senador Jefferson Péres. Realmente, tenho buscado fazer justiça e defender, principalmente, os interesses do povo brasileiro.

O Sr. Edison Lobão - Permita-me V. Exª um aparte?

O SR. NEY SUASSUNA - Ouço V. Exª com muito prazer.

O Sr. Edison Lobão - Senador Ney Suassuna, se eu fosse o Presidente da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania e tivesse que distribuir novamente esse processo a um dos nossos companheiros, eu o faria a V. Exª pela correção, decência e profundidade com que estudou a matéria. Prestei muita atenção no resumo do seu parecer feito por V. Exª há cerca de 10 ou 15 dias; seguramente, nenhum dos Senadores membros da Comissão de Justiça ficou em dúvida quanto ao patriotismo com que V. Exª tem se havido como Relator desta matéria que tem grande importância para o Brasil. V. Exª tem o meu apoio e os meus cumprimentos.

O SR. NEY SUASSUNA - Muito obrigado nobres Senadores Edison Lobão e Jefferson Péres.

Agora é a vez de uma grande revista de circulação nacional inverter os sinais no tocante à importação paralela. E o que vem a ser importação paralela? Vamos supor que o Governo dê autorização a um determinado cidadão para, por vinte anos, deter aqui o monopólio da fabricação de uma caneta, por exemplo, que já é registrada nos Estados Unidos ou na Alemanha; se ao chegar aqui esse fabricante, em vez de cobrar o preço vigente nos Estados Unidos ou na Alemanha, cobrar vinte vezes mais, estará praticando contra nossa população abuso do poder econômico. O que seria a importação paralela na lei? Se fosse constatado que o preço é extorsivo, o Governo brasileiro permitiria que esse produto fosse comprado diretamente do fabricante - portanto, do mesmo cidadão e no país onde é fabricado - mas vendido aqui por um preço civilizado; ou seja, se aqui fossem cobrar cem e nos Estados Unidos cobra-se dez, permitir-se-ia comprar diretamente pelos mesmos dez, porque se estaria pagando a patente do mesmo jeito; o fabricante estaria recebendo seu royalty. Se fosse comprovada a possibilidade de abuso.

No entanto, provavelmente pela dificuldade conceitual, o repórter que escreveu a matéria na revista disse que abri as portas ao contrabando oficial. Em absoluto; deixo uma salvaguarda ao povo brasileiro, ao Governo brasileiro para que não permita que nossa população seja espoliada por alguém que venha aqui deter monopólios e dar vazão a sua ganância. Em absoluto. Temos que respeitar as opiniões e a defesa dos parlamentares dos demais países, mas somos parlamentares brasileiros e vamos fazer legislação para o povo deste País.

O Sr. Osmar Dias - Permite-me V. Exª um aparte, nobre Senador Ney Suassuna?

O SR. NEY SUASSUNA - Pois não, nobre Senador Osmar Dias.

O Sr. Osmar Dias - Quero, Senador Ney Suassuna, colaborar com V. Exª de duas formas. Li seu relatório e além disso reuni em meu Estado entidades que cercam esse assunto que são ligadas à área de pesquisa e comércio, inclusive a própria Federação de Indústria do Estado do Paraná, porque queria que aquela comunidade se manifestasse a respeito de seu relatório. Tenho a manifestação das entidades organizadas de meu Estado e vou encaminhá-la a V. Exª, se assim me permitir. De outro lado, tenho também comigo um pedido de registro de patentes de um laboratório americano sobre uma variedade de soja transgênica, ou seja, com mutação. Ele registrou um pedido de patente que foi concedido, mas o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos entrou com um mandato de segurança - não sei se esse é o termo - suspendendo essa patente que se encontra sub judice. Para que V. Exª tenha uma idéia, o comércio de soja alcança hoje, no mundo, cifras da ordem de US$ 27 bilhões, e se a patente fosse concedida esse cidadão, dono desse laboratório, se tornaria dono de toda a comercialização de sementes de soja, qualquer que fosse a variedade. Esse é um risco que o Brasil não pode correr e, por isso, quero colaborar com V. Exª: vou encaminhar o estudo que fiz no Paraná, juntamente com esse pedido de patente que considero um absurdo total e que é um exemplo que pode ser acrescentado ao que V. Exª está dizendo.

O SR. NEY SUASSUNA - Obrigado a V. Exª, nobre Senador. Posso tranqüilizar V. Exª ao dizer que nosso projeto não prevê, de maneira alguma, o patenteamento de plantas, animais ou qualquer parte do ser humano - qualquer célula humana. Isso está fora de cogitação.

Voltando ao artigo da revista, nossa importação paralela, em absoluto, pode ser comparada ao contrabando. Pelo contrário, é uma salvaguarda para defender o povo brasileiro contra a sanha dos gananciosos.

Para encerrar, Sr. Presidente e Srs. Senadores, dou um exemplo: os tubos para ductos que são usados pela PETROBRÁS e que seriam vendidos no Brasil sob forma de monopólio inviabilizariam, se comprados pelos preços do fabricante, a eficiência econômica da empresa porque os preços seriam abusivos. O que aconteceu? Por meio de um processo, foi comprovado abuso do poder econômico; a PETROBRÁS, então, passou a importar do próprio detentor da patente no mercado europeu, e o preço no Brasil caiu imediatamente a níveis civilizados. Essa é a importação paralela, a importação que permite nos livrarmos dos gananciosos.

Enfim, como não estamos discutindo todo o projeto - estamos apenas fazendo uma ressalva quanto a essa notícia veiculada pela imprensa - um governo que quer lutar contra a inflação não pode abrir mão, de maneira alguma, dessa importação paralela, porque interessa ao Governo brasileiro que o preço seja digno, para que a empresa que produz sobreviva, mas que não mate a nossa economia; portanto, não permita a elevação da inflação.

Lembro a todos que haverá espaço para o debate e que não deixem de fazê-lo, porque esta é a hora e a vez de, com seriedade e prudência, sem xenofobia, mas com patriotismo, discutirmos o futuro da nossa nacionalidade. Cada vez que aprovarmos uma patente, estaremos aprovando 20 anos de monopólio para aquele setor e para aquela invenção.

Com toda a certeza, nos debates que se seguirão e em momento apropriado, teremos a grandeza de fazer uma lei que honre todo o povo brasileiro.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 03/05/1995 - Página 7148