Discurso no Senado Federal

CRITICA AO ESTABELECIMENTO DE MEDIDAS DE DESESTIMULO A ZONA FRANCA DE MANAUS.

Autor
Jefferson Peres (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AM)
Nome completo: José Jefferson Carpinteiro Peres
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DESENVOLVIMENTO REGIONAL.:
  • CRITICA AO ESTABELECIMENTO DE MEDIDAS DE DESESTIMULO A ZONA FRANCA DE MANAUS.
Aparteantes
Gerson Camata.
Publicação
Publicação no DCN2 de 04/05/1995 - Página 7260
Assunto
Outros > DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
Indexação
  • CRITICA, DECRETO FEDERAL, GOVERNO, ESTABELECIMENTO, LIMITAÇÃO, IMPORTAÇÃO, ZONA FRANCA, DESRESPEITO, ESTADO DO AMAZONAS (AM).

O SR. JEFFERSON PÉRES (PSDB-AM. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, falando também em nome do Senador Bernardo Cabral, ontem, mais uma vez, de surpresa, como costuma acontecer em relação a nós, do Norte, o Governo baixou decreto estabelecendo um teto para as importações da Zona Franca de Manaus. Um retrocesso que nos leva de volta ao ano de 1991, quando tínhamos esse contingenciamento, ficando em desvantagem em relação ao resto do Brasil.

Agora, se a Zona Franca é excepcional, por um lado, graças aos incentivos fiscais, como vantagem, tem como desvantagem, excepcionalmente, o limite para suas importações. Isso desestimula enormemente os investimentos na área, porque essa instabilidade de regras, esse ziguezague, esse vai-vem dá muita insegurança aos investidores nacionais e estrangeiros.

Por outro lado, levará ao contingenciamento de importações com regras, com cotas para cada empresa, mediante critérios estabelecidos pelo Governo, e trará de volta a corrupção, o tráfico de influência e a advocacia administrativa que existiam até há 3 anos, gerando escândalos que depois foram explorados em desfavor da Zona Franca.

Sr. Presidente, não discuto que o País enfrenta problemas na área externa e que, em conseqüência, o Governo adota medidas para tentar reequilibrar a balança comercial e de pagamento. Mas, em primeiro lugar, quem criou esses problemas foram os Ministros da área econômica, com os seus erros de política cambial. Não fora a teimosia desses Ministros, de manter praticamente congelado o câmbio a partir da introdução do real, em julho do ano passado, seguramente o Brasil não voltaria a viver, como está vivendo, depois de 20 anos, déficits enormes na balança comercial; situação que os Ministros tentaram remediar de forma trapalhona, quando instituíram a banda cambial há um mês. E agora tentam remediar isso, fazendo a economia de palitos e acertando um golpe muito duro na Zona Franca de Manaus.

Que economia podem conseguir com isso? Cem, duzentos milhões de dólares por ano? Quanto contribuirá isso para o equilíbrio da balança comercial?

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, poderíamos até admitir que toda a economia é válida para se retornar ao almejado equilíbrio. Mas, ainda que seja assim, a maneira como esse decreto foi baixado, de surpresa, sem entendimento prévio com as lideranças estaduais, sem sequer comunicação ao Governador do Estado, aos Senadores e aos Deputados Federais, de uma forma amolecada, é um enorme desrespeito à sociedade do meu Estado. Isso é inaceitável, Sr. Presidente.

Eu sou Senador pelo PSDB, Partido do Governo. Nenhum mandato tem mais legitimidade do que o meu, pois eu fui eleito contra o Governo do Estado, contra todos os prefeitos do Amazonas, contra todo o poder econômico, sem ajuda do distrito industrial e de nenhuma empresa do Amazonas, numa eleição quase que milagrosa. Por isso eu me sinto com uma enorme responsabilidade sobre os ombros. Eu não posso estar neste Senado, hoje, em silêncio, e não vou ficar nem hoje, nem amanhã, nem nunca.

Sou vacinado contra o fisiologismo. Nunca entrei nem vou entrar em gabinete de ministro para pedir cargos federais para o Amazonas. Renuncio a isso. Nunca quis fazer isso porque considero essa uma prática condenável, o que me dá ainda mais autoridade para reclamar da maneira desrespeitosa com que estão tratando o Estado do Amazonas.

O Sr. Gerson Camata - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. JEFFERSON PÉRES - Concedo o aparte a V. Exª.

O Sr Gerson Camata - Ilustre Senador Jefferson Péres, participo das preocupações e até da revolta com que V. Exª aborda o problema do estabelecimento das cotas de importação pela Zona Franca de Manaus. Vejo que V. Exª mesmo compreende que a situação atual do País, em determinados momentos, exige muita prudência, por parte do Governo, para que não percamos tantas reservas que possamos chegar à situação a que chegou o México e a que outros países estão próximos de chegar. Mas V. Exª ressalta, na sua fala, realmente, um ponto que aumenta as preocupações que todos temos, isto é, a maneira quase ditatorial com que não o Presidente da República, mas a equipe econômica toma decisões, sem discuti-las previamente com ninguém, sem um exame detalhado que estabeleça que setores serão os mais atingidos. Se olhamos um pouco para trás, vemos, por exemplo, que, no final do Governo passado, a equipe econômica - que, na verdade, é a mesma que está aí - estabeleceu um projeto pelo qual se poderia combater a inflação substituindo a nossa eficiência pela eficiência dos outros. Passamos, então, a importar desde bolachas até batatas dos norte-americanos, vinhos dos alemães, todos produtos que competem com os nacionais e empurram para baixo os preços dos produzidos aqui. Não foram analisados, ao serem tomadas aquelas atitudes, os prazos curto e médio. Os integrantes da equipe econômica não viram que sessenta dias depois as coisas teriam que mudar e o País teria que novamente se reciclar todo e começar a combater a inflação com a nossa eficiência. Como a indústria brasileira não tem condição de produzir no nível da demanda do mercado, então começa essa situação que estamos vivendo com o crédito, com os juros, de sufoco, fazendo com que o País fique em sobressalto, com uma grande expansão, uma grande compressão. Na iniciativa privada, as empresas que atuam nas área de importação e de exportação trabalham quase sempre com previsão de um ano, dois anos. E observamos que os técnicos do Governo trabalham com uma previsão de 15 dias, sem medir a profundidade dos problemas que serão enfrentados mais na frente. Veja V. Exª o que ocorreu com o Porto de Vitória há poucos dias. Subitamente, o Governo, até em uma medida legítima de defesa das reservas, elevou a tarifa dos automóveis importados de 20% para 32%, e depois para 70%. A maior parte desses automóveis entra no País pelo Porto de Vitória, no Espírito Santo, pela eficiência, pelas baixas tarifas e pela rapidez com que o porto os desembarca. Os dólares dos carros que estão chegando agora saíram em dezembro, quando da encomenda. As divisas já foram gastas e a elevação da alíquota não fará com que os contratos sejam cancelados. Os carros continuam chegando. E estamos enfrentando um problema incrível: como os importadores diminuíram as vendas e eles têm que pagar o tributo para retirar o carro da área alfandegada, eles não os estão retirando. Chegarão, este mês, 50.000 automóveis e não há área alfandegada, no Espírito Santo, onde colocá-los. Algumas coisas previsíveis, que poderiam ser discutidas para se encontrar fórmulas intermediárias, são objeto de decisões tomadas bruscamente e não encontramos, por parte das mesmas autoridades, não digo soluções como a redução das alíquotas, mas sugestões como o aumento das áreas alfandegadas para que um maior número de veículos possa ser armazenado. Pelo contrário, elas criam dificuldades e continuam fazendo isso. Então, V. Exª, que é do PSDB, poderia levar mais próximo do Presidente da República um apelo de prática democrática por parte do pessoal do Governo que trabalha na área econômica, porque um ato, uma portaria dessas mexe com a vida de milhões de brasileiros. Esses membros do Poder Executivo têm mais poder do que todo o Congresso Nacional. V. Exª não consegue, com nenhum projeto de lei, fazer algo com o alcance rápido e imediato de uma portaria, ou até de uma declaração. Mas eles não conseguem ter uma prática democrática no exercício desse poder enorme que têm. Faria bem ao Brasil e aos brasileiros se essas medidas pudessem ser melhor discutidas com quem, estando efetivamente na área, pode saber a extensão do sacrifício que tem que dar ao País nesta hora, que pode também ser dada de várias maneiras. E as alternativas nunca são discutidas. Por isso, creio que a fala de V. Exª é um grito de protesto, de revolta, um apelo que o seu Estado faz em favor das práticas democráticas que V. Exª defende, e eu o cumprimento por isso.

O SR. JEFFERSON PÉRES - Muito obrigado, nobre Senador Gerson Camata, V. Exª apontou bem a arrogância de alguns Ministros, principalmente da área econômica, talvez a auto-suficiência narcísica do Ministro José Serra. Eu nem falaria no Ministro Pedro Malan, que, parece, vai aceitando uma posição subalterna, nem na Ministra Dorothéa Werneck, coitada, que sabe de aumentos de tarifas pelos jornais e não pede demissão.

O Ministro do Planejamento, parece, esse sim, na sua auto-suficiência narcísica, repito, o grande responsável por isso. É um homem, parece-me, impermeável a sugestões e a discussões, é um caráter autoritário, o que é surpreendente em quem conheceu o exílio e lutou contra os regimes autoritários.

Não estou exagerando, Srs. Senadores, porque nada mais autoritário, nada mais revoltante do que a adoção, pelo Governo, via decreto, de uma medida que atinge fundamente a economia de um Estado, e um Estado pequeno, sem discussão e sem sequer comunicação prévia às suas autoridades e aos seus representantes.

Ainda dou ao Presidente da República o benefício da dúvida. Acredito que Sua Excelência tenha sido envolvido pelo Ministro e não saiba nem o alcance do que assinou.

Vou esperar que essa medida seja temporária. Não sou um chantagista para vir aqui ameaçar votar contra o Governo, porque votarei sempre contra aquilo que a minha consciência disser que não é bom para o País, seja qual for a atitude do Governo em relação a mim ou ao meu Estado, mas, Sr. Presidente, minha atitude será de crítica permanente ao Governo se continuarem a nos dar esse tratamento.

Esse complexo de dominação, essa relação colonizador-colonizado, eu, pelo menos, não vou aceitar, Sr. Presidente.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 04/05/1995 - Página 7260