Discurso no Senado Federal

JUSTIFICANDO PROJETO DE LEI QUE ENCAMINHA A MESA, INSTITUINDO O 'VALE-CULTURA'.

Autor
Júlio Campos (PFL - Partido da Frente Liberal/MT)
Nome completo: Júlio José de Campos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA CULTURAL.:
  • JUSTIFICANDO PROJETO DE LEI QUE ENCAMINHA A MESA, INSTITUINDO O 'VALE-CULTURA'.
Publicação
Publicação no DCN2 de 09/05/1995 - Página 7820
Assunto
Outros > POLITICA CULTURAL.
Indexação
  • HISTORIA, ANALISE, INSUCESSO, INCENTIVO, GOVERNO, CULTURA, BRASIL.
  • DEFESA, NECESSIDADE, AJUSTAMENTO, OBJETIVO, INCENTIVO, CULTURA, SOLICITAÇÃO, APROVAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, CRIAÇÃO, NATUREZA CULTURAL, ANALOGIA, AUXILIO ALIMENTAÇÃO, VIABILIDADE, ABERTURA, TRABALHADOR, ACESSO, ATIVIDADE CULTURAL, ESPORTE.

O SR. JÚLIO CAMPOS (PFL-MT. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a história dos incentivos à cultura, no Brasil, tem sido o relato de uma sucessão de enganos e frustrações, a maioria dos quais afogados em um imenso mar de boas intenções.

Os estudos realizados sobre o assunto mostram o pouco que se conseguiu fazer nesse campo e reduz a quase nada as iniciativas bem sucedidas.

Não se tem ainda um diagnóstico muito claro das causas que impediram o pleno sucesso das bem intencionadas iniciativas de sucessivos Governos. Não sabemos com certeza o que levou esses programas, se não ao fracasso total, pelo menos ao esquecimento.

Todos partiram sempre da mesma e feliz constatação de que é necessário investir no apoio à Cultura Nacional, pois sabem o quanto isso é importante para o desenvolvimento harmônico e integrado de um povo.

Na análise dos fracassos até aqui registrados, é possível que a própria ambigüidade do termo cultura tenha sido uma das causas principais de tanto desperdício. Essa ambiguidade dilui os objetivos dos programas. Diluídos os objetivos e metas, dada a imprecisão do objeto da ação governamental, diluem-se conseqüentemente os meios, confundem-se os esforços e, finalmente, perdem-se todas as boas intenções do legislador.

Na realidade, existe uma enorme ambivalência no que se quer dizer com a palavra cultura.

Para a maioria ela é sinônimo de erudição, mas para outros ela pode nomear todas as manifestações da expressão popular, aí incluídas todas as manifestações de arte, da mais popular à mais erudita, até às crenças, valores, atitudes, idioma e linguagens de um povo.

É evidente que os mecanismos e as estratégias montadas para promover a cultura indígena no Brasil muito dificilmente serão eficazes na defesa, por exemplo, da ópera ou de toda a riqueza do nosso folclore.

Dificilmente os mecanismos que servirem ao incentivo e estímulo à divulgação da nossa magnífica música barroca do século XVI atenderão às necessidades de apoio à poesia oral nordestina ou à nossa literatura de cordel. São objetos diferentes a merecer um tratamento diferente.

A falta de uma melhor definição de objetivos confunde e inviabiliza a ação. Essa ambivalência tem sido, provavelmente, o grande obstáculo que impediu até hoje que se desse o apoio necessário ao cinema nacional ou ao teatro.

Foi essa ambigüidade básica, com certeza, que não permitiu que se implantasse entre nós um verdadeiro mecanismo de apoio e estímulo à música erudita nacional, ao surgimento de novos autores na nossa literatura, ou às manifestações folclóricas de danças e de cantos, ao balé clássico, ou mesmo à literatura oral dos improvisadores e repentistas do Nordeste e do Sul.

É preciso, portanto, que se estabeleçam limites claros e objetivos precisos para que se tenha uma ação eficaz. E, nesse sentido, é preferível até que se reduza o campo de atuação de um Programa de Apoio à Cultura a deixar dispersar-se a pouca verba disponível.

Outra questão não resolvida, presente às propostas de apoio à Cultura até agora em curso, não consegue esconder uma certa dose de despotismo por parte dos debatedores, ao permitir que o Estado assuma sozinho o direito de estabelecer quais as manifestações culturais a merecerem o apoio e o incentivo do Poder Público.

É imenso o campo de atuação de uma norma com tais indefinições, e é imenso também o privilégio de escolha de que se investe o Governo ao definir as manifestações da cultura que deverão merecer o amparo dos recursos públicos.

Esse é o segundo grande equívoco, equívoco que tem levado à ação em defesa dos bens de cultura, seja que sentido que se dê ao termo, a um tipo de mecenato oficial, sempre passível de suspeição, pois os critérios de seleção para a escolha das áreas beneficiadas são sempre de dificílima aferição.

Para contornar a ambigüidade que aqui apontamos e permitir que o próprio povo defina as manifestações culturais a serem apoiadas, é que peço a atenção das Srªs e dos Srs. Senadores para o Projeto de Lei que estou submetendo hoje à deliberação desta Casa, instituindo o "Vale-cultura".

Uma proposta que faculta ao trabalhador brasileiro, a baixo custo, o acesso aos bens de cultura que hoje estão restritos quase que apenas a algumas parcelas privilegiadas da população.

Uma proposta que abre, literalmente, aos trabalhadores brasileiros as portas das manifestações esportivas ou culturais das quais ele tem sido quase sempre afastado.

A cultura, ou o lazer cultural, é uma necessidade tão importante quanto as demais. E se é verdade que estamos às vésperas de um momento privilegiado no que diz respeito à oferta de produtos culturais devido à estabilidade financeira que acabamos de alcançar, é preciso então que nos antecipemos a isso e criemos as condições para que o trabalhador nacional se beneficie também desse momento privilegiado que se avizinha.

Este será, com certeza, o marco definitivo no processo de apoio ao teatro brasileiro.

O cinema nacional, se souber aproveitar a oportunidade, poderá colecionar outras grandes vitórias como as que conheceu nos tempos da chanchada popular ou mesmo nos heróicos tempos da Vera Cruz.

A música popular terá seu público grandemente aumentado e isso, com certeza, deverá abalar a correlação que hoje impera e que reduz o gosto nacional ao gosto de uma parcela da população que consome música estrangeira no Brasil.

O mesmo poderá acontecer com a música erudita, a dança clássica ou popular, além de todas as variadas manifestações esportivas às quais o trabalhador brasileiro raramente tem acesso.

Estou consciente de que a aprovação de um mecanismo dessa natureza significará a criação do maior estímulo que se poderia oferecer para aumentar o consumo de bens culturais no Brasil.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 09/05/1995 - Página 7820