Discurso no Senado Federal

CRITICAS AO EX PRESIDENTE ITAMAR FRANCO POR PRONUNCIAMENTOS E RESPOSTAS ASPERAS A MEMBROS DA EQUIPE DO ATUAL GOVERNO.

Autor
Antonio Carlos Magalhães (PFL - Partido da Frente Liberal/BA)
Nome completo: Antonio Carlos Peixoto de Magalhães
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • CRITICAS AO EX PRESIDENTE ITAMAR FRANCO POR PRONUNCIAMENTOS E RESPOSTAS ASPERAS A MEMBROS DA EQUIPE DO ATUAL GOVERNO.
Aparteantes
Beni Veras, Elcio Alvares, Roberto Freire.
Publicação
Publicação no DCN2 de 17/05/1995 - Página 8319
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • CRITICA, ITAMAR FRANCO, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, MOTIVO, PRONUNCIAMENTO, DECLARAÇÃO, OPOSIÇÃO, GOVERNO, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ADIAMENTO, CUMPRIMENTO, COMPROMISSO, RELAÇÃO, OCUPAÇÃO, CARGO PUBLICO, EMBAIXADOR, EMBAIXADA DO BRASIL, PAIS ESTRANGEIRO, PORTUGAL.

O SR. ANTONIO CARLOS MAGALHÃES (PFL-BA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a minha fala hoje talvez seja mais rápida do que os 20 minutos que V. Exª me concede, pela bondade do Senador Lúcio Alcântara que me permitiu ocupar a tribuna.

Neste instante, desejo fazer um apelo ao bom-senso do ex-Presidente Itamar Franco, que, evidentemente, está vivendo um momento difícil da sua vida e necessita, sem dúvida, de amigos sinceros e leais que não o incentivem à insensatez e sim que lhe dêem bons conselhos, para superar esta fase de transição, vivida por tantos homens, apesar da idade que têm.

S. Exª, após deixar a Presidência da República, cercado até da estima nacional, cercado do apreço do Senado da República, traduzido por uma votação expressiva desta Casa e da Comissão de Relações Exteriores para exercer o cargo de Embaixador do Brasil, ao invés de assumir a Embaixada, vem demonstrar um saudosismo desesperado, tentando perturbar a vida da Nação com pronunciamentos totalmente descabidos e prejudiciais, sem dúvida, ao bom andamento da marcha política do País.

Falo, neste instante, com a autoridade de quem foi seu adversário, de quem o criticou bastante, e que teve a grandeza de, ao final, procurá-lo, e até sugerir o posto para o qual S. Exª foi indicado pelo Presidente da República, o de Embaixador em Portugal.

Entretanto, S. Exª, que foi tão bafejado pelo destino e que teve a sorte de ter encontrado um Ministro da Fazenda que criou o Plano Real, permitindo-lhe sair bem do Governo, e sem o qual, provavelmente, não teria a aceitação popular que teve, S. Exª, ao invés de aplaudir esse Ministro que chegou à Presidência da República, fica enciumado por qualquer pessoa que sentasse na cadeira para a qual o acaso o levou, com um ciúme do sucessor, como se a cadeira de Presidente da República fosse perpétua e lhe pertencesse.

Ora, Srªs e Srs. Senadores, o Presidente Itamar Franco - sempre quero chamá-lo de Presidente -, deveria ter tido a sensatez de, logo que aprovado seu nome para a Embaixada do Brasil em Portugal, embarcar, apresentar as suas credenciais, cumprir o protocolo da Nação portuguesa e cumprir os seus deveres para com o País em Portugal e não descumprir os seus deveres com o Brasil em nossa terra. Chegou o momento de S. Exª agradecer ao Presidente Fernando Henrique Cardoso e não de insultar a figura do Presidente da República, tentando desmerecer a autoridade de Sua Excelência.

O Presidente da República, demonstrando, mais uma vez, a sua capacidade de suportar os desafios, até para não parecer que pode suportar ataques dos adversários e não pode suportar o dos amigos enciumados, não tem respondido sequer a qualquer das acusações.

Mas é preciso parar com isso, e já! O Presidente Itamar Franco não quer reconhecer que o seu Governo só teve êxito em função do Plano Real e que Fernando Henrique aceitou o Ministério da Fazenda, depois de três ministros demitidos devido o temperamento do Sr. Itamar Franco - três! -, trouxe sua Equipe Econômica e elaborou o Plano Real, reabilitando a figura do Presidente. Ao invés de reconhecer, S. Exª, de público, quer tentar macular a figura e o Governo do seu ex-auxiliar e hoje, provavelmente, seu futuro - porque ainda não assumiu - Chefe de Governo.

Este discurso, partindo de quem parte, do Presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado Federal, que aprovou por unanimidade seu nome para a Embaixada do Brasil em Portugal -e pela quase unanimidade do Senado Federal -, é um apelo ao bom-senso do Presidente Itamar Franco, já que não posso apelar para os seus amigos, muitos dos quais - falsos amigos - não estão submetidos a inquéritos por causa da bondade do Presidente Fernando Henrique Cardoso. Aliás, coisa que considero errada, porque quando não submete ao inquérito está compactuando também com alguns atos de corrupção que, infelizmente, existiram no Governo do Sr. Itamar Franco. Alguns desses atos de corrupção denunciados por mim foram comprovados pelo Tribunal de Contas, sem que providências fossem tomadas. Alguns dos envolvidos ainda foram premiados com altos cargos nos maiores tribunais do País.

O Sr. Elcio Alvares - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. ANTONIO CARLOS MAGALHÃES - V. Exª é meu Líder, não está em jogo, mas tem o direito de apartear-me. Ouço V. Exª com muito prazer.

O Sr. Elcio Alvares - Estou ouvindo com muita atenção o seu discurso, nobre Senador Antonio Carlos Magalhães. Evidentemente, são conceitos pessoais, V. Exª é uma figura altamente abalizada na vida pública brasileira, mas tenho um dever indeclinável do qual não poderia, neste momento, deixar de prestar a minha presença. Fui Ministro da Indústria, Comércio e Turismo do Governo Itamar Franco. Tive a honra de ser Ministro; talvez não tenha tido tanto brilhantismo para exercer a função. Ao lado de outros colegas aqui da Casa, principalmente o Senador Beni Veras que está presente, posso trazer a este plenário o testemunho que julgo da minha obrigação: o Presidente Itamar Franco, em todos os momentos de nossa convivência a nível administrativo, teve uma participação da mais alta probidade. E diria mesmo que a personalidade do Presidente Itamar Franco, a questão da honestidade e da probidade administrativa eram presenças permanentes 24 horas. Quanto ao relacionamento - avalio que este é o depoimento verdadeiro sobre esse relacionamento - até o momento, não existe qualquer tipo de atitude do Presidente Itamar Franco restritiva ao comportamento do Presidente Henrique Cardoso. Mesmo porque, na condição de amigo e admirador do Presidente Itamar Franco, eu não teria condições de permanecer na Liderança do Governo, no momento em que sentisse existir um choque entre o Presidente da República atual e o Presidente Itamar Franco. Acredito sinceramente que o Presidente Itamar Franco é um homem de um temperamento muito característico, e os episódios que, por acaso, estejam acontecendo, estão presos exatamente à sua personalidade, que é ímpar, não é uma personalidade comum. Nobre Senador Antonio Carlos Magalhães, quero dizer, neste momento, em homenagem à verdade, que participei modestamente, juntamente com o Senador Beni Veras, da elaboração do Plano Real; tivemos várias reuniões no Palácio. O Presidente Fernando Henrique, então Ministro da Fazenda, foi admirável. Em uma reunião histórica, após a nossa vinda da cidade de Caxias do Sul, onde durante dois dias - um sábado e um domingo -, trabalhamos exaustivamente para a elaboração da Medida Provisória sobre a URV, tive a visão por inteiro do estadista que é Fernando Henrique Cardoso e também do grande Presidente que foi Itamar Franco. Faço esse registro, com o maior respeito a V. Exª, mas dentro do dever que está dentro de mim, não só da admiração mas, sobretudo, da minha visão dos fatos. Porque da relação entre o Presidente Fernando Henrique Cardoso e o ex-Presidente Itamar Franco, acredito, sinceramente, há uma grande dose de amizade, de admiração e de respeito recíproco, sendo que o Presidente Fernando Henrique Cardoso tem reiterado a sua mais profunda admiração pelo Presidente Itamar Franco.

O SR. ANTONIO CARLOS MAGALHÃES - Estou aqui na tribuna, meu caro Líder, não para criar um fosso entre V. Exª e o Governo, nem entre V. Exª e o ex-Presidente Itamar Franco. Ao contrário, quero diminuir esse fosso, por isso estou pedindo bom-senso ao ex-Presidente, que foi comandante de V. Exª no Governo.

Mas avalio o quanto V. Exª sofre quando lê esses impropérios do Presidente Itamar Franco, essa figura ímpar - realmente é ímpar, ninguém é capaz de uma coisa dessas em relação a um ex-auxiliar que se tornou Presidente da República, apesar do excesso de nomeações, readmissões, tudo feito para prejudicar o Plano Real.

Senador Elcio Alvares, meu Líder de hoje, Ministro de ontem, homem de bem de sempre, posso garantir a V. Exª e ao Senador Beni Veras, que vai me apartear - provavelmente vai falar muito bem do Presidente Itamar Franco -, que até hoje o ex-Presidente Itamar Franco não sabe o que é o Plano Real. Duvido que saiba o que é o Plano Real!

O Sr. Elcio Alvares - S. Exª participou do debate.

O SR. ANTONIO CARLOS MAGALHÃES - S. Exª participou do debate calado, porque, se falou, não disse nada sobre Plano Real. Duvido que S. Exª conheça qualquer coisa sobre o assunto. E V. Exª sabe disso.

O Sr. Elcio Alvares - Lamento, mas não concordo com V. Exª.

O SR. ANTONIO CARLOS MAGALHÃES - Sobre isso não vou deixar V. Exª numa situação ruim, porque quero V. Exª sempre como meu Líder nesta Casa e Líder do Governo, porque V. Exª é muito útil ao Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso.

Não quero que V. Exª tenha nenhum problema de consciência. Se soubesse que teria, jamais viria à tribuna, porque o motivo de eu estar sugerindo bom-senso ao Presidente Itamar Franco é para ajudar o Brasil, não para perder um homem da envergadura de V. Exª como Líder do Governo desta Casa.

O Sr. Beni Veras - Permite-me V. Exª um aparte, nobre Senador Antonio Carlos Magalhães?

O SR. ANTONIO CARLOS MAGALHÃES - Pois não, nobre Senador Beni Veras.

O Sr. Beni Veras - Senador Antonio Carlos Magalhães, queria apenas dar um depoimento do tempo em que estive no Governo e pude ser testemunha de atitudes corretas do Presidente, de tal forma que me solidarizei com seu Governo. Mantenho essa solidariedade de maneira altiva, porque tive razões para isso durante todo o período em que servi ao seu Governo. Muito obrigado.

O SR. ANTONIO CARLOS MAGALHÃES - Quero saber o seguinte: V. Exªs subscreveriam os telegramas dele?

O Sr. Roberto Freire - Permite-me V. Exª um aparte, nobre Senador Antonio Carlos Magalhães?

O SR. ANTONIO CARLOS MAGALHÃES - V. Exª também foi Líder. Concedo o aparte a V. Exª.

O Sr. Roberto Freire - Senador, não vou aqui falar porque fui Líder. Pode-se até solicitar do Presidente Itamar Franco - eu não diria bom-senso, até porque ele tem - que não se preocupasse tanto com o novo Governo, porque, normalmente, atritos menores podem existir. Podemos até discutir que a sua nomeação e designação para Embaixador já deveria ter sido assumida há mais tempo. São críticas que podem ser feitas e nós fazemos. Agora, V. Exª me parece muito duro aqui neste plenário, e bem distinto do que foi no plenário da Comissão de Relações Exteriores. Eu gostaria de dizer apenas isto, até porque o Presidente Itamar Franco não mudou daquela época para hoje. S. Exª sempre teve algumas dessas posições, que, inclusive, durante todo o período em que esteve na Presidência, foram motivo de comentários de todos. Quero apenas lembrar isso, pois naquela oportunidade em que se falou o que o Presidente Itamar Franco representava, em nenhum momento se colocou o Plano Real como algo que fosse do seu desconhecimento; ao contrário, falou-se como se ele tivesse sido o comandante. Era o que eu gostaria de lembrar, para que V. Exª, mesmo solicitando o bom-senso, mantivesse o seu.

O SR. ANTONIO CARLOS MAGALHÃES - A prova de que mantenho o meu bom-senso é que posso dizer a V. Exª que quando apoiei o Presidente Fernando Henrique Cardoso o fiz representando a grande maioria do povo brasileiro, contra a vontade inclusive do Presidente Itamar Franco, tais e tantas foram as dificuldades que S. Exª criou no Governo. E agora posso dizer que, na Comissão de Relações Exteriores, tomei o processo para relatar para dar uma prova ao Dr. Itamar Franco, ex-Presidente da República, de grandeza, numa demonstração de que S. Exª precisava realmente ter apoio do Senado para exercer a sua função.

Jamais poderia ter dado aquele apoio se soubesse que S. Exª iria atuar como está atuando agora, com telegramas desse tipo, o qual V. Exª tomou conhecimento ou leu na imprensa, contendo a maior agressão à maior autoridade do País. Se soubesse que S. Exª faria isso, pessoa alguma poderia aceitá-lo como diplomata.

Agora se querem o meu discurso como um motivo para que S. Exª não assuma a Embaixada, têm um discurso como motivo para que S. Exª não assuma. Mas o que tenho que dizer é a verdade, é aquilo que penso. Acredito que V. Exª conheça o teor do telegrama, da maior agressão ao Presidente da República.

Penso até que a autoridade do Presidente da República ficou diminuída com a falta de resposta, mas Sua Excelência preferiu não responder, para justamente não criar um problema ainda maior com as figuras que têm apreço - como V. Exª - pelo Presidente Itamar Franco.

Bom-senso é reagir contra quem precisa de reação; bom-senso é ter coerência nos seus princípios. Eu tenho, como V. Exª tem. E V. Exª não é mais coerente do que ninguém. V. Exª não pode dar lição de coerência a ninguém, porque quando os seus interesses estão em jogo, V. Exª sabe até mudar da sua coerência para abraçar as causas que lhe convêm.

Portanto, não estou aqui para receber lições de V. Exª.

O Sr. Roberto Freire - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. ANTONIO CARLOS MAGALHÃES - Pois não.

O Sr. Roberto Freire - Eu nunca quis ser conselheiro de ninguém, e assumo posições sem querer que ninguém as siga. Apenas estranhei, porque costumo, quando tenho uma definição sobre uma pessoa, dizer em comissão e em plenário. V. Exª conviveu com o Presidente Itamar Franco tanto quanto eu, e sabe que S. Exª é dado a alguns rompantes. Isso é do conhecimento da Casa. S. Exª não levava desaforo para casa. Muitas vezes, como Presidente, respondeu quando não era necessário fazê-lo, pelo menos no senso comum; mas ele o fazia. E nós o conhecemos assim, não é nada estranho que ele faça. Pode ser condenável hoje, como foi ontem, quando era Presidente. E a coerência é manter esse critério de análise da sua pessoa: como Presidente ontem e hoje como ex-Presidente; podendo até discordar, mas entendendo. Agora, evidentemente, não chegando ao ponto de querer desconhecer o papel que ele representou, inclusive no Plano Real. Ele não é economista, mas quem é responsável pela aplicação de um plano é o Presidente da República, e o Presidente Itamar Franco assumiu essa posição desde o primeiro momento em que ocupou a Presidência da República, quando definiu políticas, senão do ponto de vista técnico, do ponto de vista estratégico. Isso ele fez. E o Plano Real é fruto de decisão política do Presidente da República. Mesmo que, tecnicamente, o Sr. Fernando Henrique Cardoso, quando Ministro da Fazenda, tenha montado a sua equipe para detalhar e definir os parâmetros da questão econômica. Mas a decisão política foi do Presidente Itamar Franco. É isto que estou querendo dizer.

O SR. ANTONIO CARLOS MAGALHÃES - Ele fez tudo, Senador Roberto Freire, para que o Plano não desse certo. Ele nomeou quando não podia nomear; readmitiu quando não podia readmitir; enfim, fez tudo o que era possível para aumentar os gastos públicos. E a corrupção que houve no Ministério das Comunicações, a corrupção que houve no Ministério da Educação, tudo isso tem que ser e está sendo apurado pelo Tribunal de Contas.

Agora, quando a corrupção é no Governo Itamar Franco, não se trata do assunto? O Senhor Fernando Henrique Cardoso, no caso, aceitou, depois de três Ministros da Fazenda terem sido demitidos, o cargo, como uma missão, e tem que receber, de público, a repreensão do Sr. Itamar Franco de que ele é que foi o autor - ele, Itamar - do Plano Real, e que o Governo era dos dois e que Sua Excelência deve calar a boca do seu auxiliar. Essas são as admoestações que o Sr. Itamar Franco faz publicamente, porque antes sequer de o Presidente Fernando Henrique Cardoso receber a sua correspondência ele já a fazia publicar, além de outros telegramas que fez divulgar. Isso não é ético. Se ele vai ser Embaixador, se já exerceu a Presidência da República, amigos e conselheiros, como V. Exª, como o Senador Elcio Alvares, ele deveria ouvir, para não cometer esses erros.

O meu apelo é ao bom-senso é justamente para que ele encontre o seu caminho, vá cumprir a sua missão de Embaixador e sirva o País em Portugal; para que não pertube a ordem interna, proceda como estadista e não venha pertubar a vida da Nação quando ela precisa de desenvolvimento e de progresso.

Essas palavra eu tinha de dizer, em nome do meu Estado, que não recebeu qualquer benefício do Governo Itamar Franco, a não ser um Ministério onde houve corrupção.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 17/05/1995 - Página 8319