Discurso no Senado Federal

RESPOSTA AO PRONUNCIAMENTO DE ONTEM DO SENADOR ANTONIO CARLOS MAGALHÃES, SOBRE O COMPORTAMENTO POLITICO DO EX-PRESIDENTE ITAMAR FRANCO EM RELAÇÃO AO GOVERNO DO PRESIDENTE FERNANDO HENRIQUE CARDOSO.

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • RESPOSTA AO PRONUNCIAMENTO DE ONTEM DO SENADOR ANTONIO CARLOS MAGALHÃES, SOBRE O COMPORTAMENTO POLITICO DO EX-PRESIDENTE ITAMAR FRANCO EM RELAÇÃO AO GOVERNO DO PRESIDENTE FERNANDO HENRIQUE CARDOSO.
Aparteantes
Antonio Carlos Magalhães.
Publicação
Publicação no DCN2 de 18/05/1995 - Página 8377
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • RESPOSTA, PRONUNCIAMENTO, AUTORIA, ANTONIO CARLOS MAGALHÃES, SENADOR, RELAÇÃO, COMPORTAMENTO, ITAMAR FRANCO, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, COMENTARIO, CRITICA, POLITICA, GOVERNO, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ADIAMENTO, COMPROMISSO, OCUPAÇÃO, CARGO PUBLICO, EMBAIXADOR, EMBAIXADA DO BRASIL, PAIS ESTRANGEIRO, PORTUGAL.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB-RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, venho, com muita honra, responder ao importante pronunciamento feito ontem, desta tribuna, pelo amigo, tão simpático, tão importante, Senador Antonio Carlos Magalhães.

Recebi um telefonema do ex-Presidente Itamar Franco, informando-me que iria dar uma entrevista coletiva para responder àquele pronunciamento. Disse-lhe que não achava interessante uma entrevista coletiva e me ofereci para fazer este pronunciamento, com o que Itamar Franco concordou.

Falei com o Presidente Fernando Henrique Cardoso hoje pela manhã e disse que viria a esta tribuna para fazer esta análise. Sou um admirador do Sr. Antonio Carlos Magalhães - S. Exª sabe disso -; conheço e admiro seu estilo, com restrições - ao meu, também, muita gente deve ter muitas restrições. Gosto das pessoas que falam, que dizem o que pensam, que têm o senso de oportunidade e que, na verdade, pelas mais variadas fórmulas, adquiriram a notoriedade que S. Exª tem por méritos, e eu os reconheço.

Admiro o ex-Presidente Itamar Franco ao qual não devo um copo d`água. Fui Líder de seu Governo no Senado por imposição de S. Exª. Não aceitei ser Ministro e não queria ser Líder; queria ficar na minha posição - neutra -, porque me sentia o grande responsável - foi em meu gabinete que, praticamente, se criou e se desenvolveu a CPI que culminou no impeachment do Sr. Collor. Acreditava que tinha que ter independência para ouvir que havia feito todo aquele trabalho em causa própria. Aceitei ser Líder por uma imposição do próprio Presidente e de meu Partido. Não fiz indicações, não pedi cargos, vantagens ou favores; ao contrário. Está aí o Presidente Fernando Henrique Cardoso, que é o primeiro a testemunhar sobre quantas e quantas vezes divergi dele com minha maneira áspera de falar. Sua Excelência, inclusive, dizia: "Nós temos que ouvir o Simon para ver se S. Exª concorda."

Realmente, sou do tipo de pessoa que diz o que pensa e acredito que amigo é aquele que sabe dizer o que está errado quando houver erro e não bater nas costas dizendo que está tudo muito bom, está ótimo, ainda que sua consciência diga que está errado. Eu sou assim.

Por muitas vezes, debatemos, de um modo especial, três pessoas: o Senhor Presidente Fernando Henrique, o Sr. Itamar Franco e eu. Debatemos desde que assumimos o Governo até os dias anteriores à posse de Fernando Henrique; inúmeras vezes nós três discutimos, divergimos e levamos adiante. Por isso venho aqui para colocar algumas questões.

É longa a amizade do Presidente Fernando Henrique com o Sr. Itamar Franco; aliás, Itamar Franco gosta de Fernando Henrique, que é um grande nome. E minha amizade com Sua Excelência vem de muito longe, naquela época difícil de MDB e ARENA, quando a ARENA era o consenso do "sim, senhor". O MDB também, porque era o Partido do consenso de coonestar. Mas um MDB começou a fazer diferente: foi o do Rio Grande do Sul, do qual eu era o Presidente. Começamos a divergir e a falar em teses diferentes, em democracia e em liberdade. Dentre várias pessoas que levamos ao Rio Grande do Sul para debater essas novas idéias havia uma que se chamava Fernando Henrique Cardoso, um jovem professor que tinha vindo do exílio e que tinha propostas brilhantes, mas que praticamente não era conhecido.

Dessa época para cá, fizemos uma longa amizade e chegamos ao Senhor Fernando Henrique Cardoso na Presidência. Mas antes disso Sua Excelência foi Ministro de Itamar Franco, que o convidou para o Itamaraty, onde obteve nota 10; depois disso, Itamar colocou Fernando Henrique no Ministério da Fazenda à sua revelia - Sua Excelência conta para todos que não desejava ir para o Ministério da Fazenda e que, certo dia, estava nos Estados Unidos quando lhe telefonaram a esposa e os filhos, dizendo que os jornais estavam noticiando sua indicação para o cargo de Ministro da Fazenda - então, Sua Excelência foi colocado no Ministério da Fazenda à sua revelia.

Diga-se que o Sr. Itamar Franco iniciou seu Governo de uma forma que teve, praticamente, a oposição total da grande imprensa; a imprensa não aceitou aquela chamada dupla caipira - os Ministros da Fazenda e do Planejamento, que não eram do Rio de Janeiro, nem de São Paulo; eram pessoas que vinham de Pernambuco e do interior de Minas Gerais.

Mas Fernando Henrique os indicou e debateu sobre isso; foi quando o Brasil inteiro conheceu inclusive as divergências do Sr. Itamar Franco com os seus Ministros da Fazenda. Tanto que Gustavo Krause não aceitou e se demitiu e que Paulo Haddad, amigo do Sr. Itamar Franco, também se demitiu por causa das divergências.

Eu e o Senador Roberto Freire - que está aqui - assistimos junto aos debates onde o Sr. Itamar Franco dizia que aquela não era a política econômica do seu professor de Economia. O Sr. Itamar Franco tinha aquela ânsia da guerra contra a inflação, a angústia pelo social, pela ética, pela moral, a preocupação com a questão dos juros, com os aumentos de preços, e acreditava que aquilo tinha que terminar. Eram essas as bandeiras de Itamar Franco; bandeiras que, praticamente, todo o Brasil, os companheiros e os adversários reconhecem como tais.

A partir do momento em que não aceitou essa política de Paulo Haddad - e este se demitiu -, Itamar Franco, que exigia planos reais e concretos, convidou Eliseu Resende para lançar a origem, a semente do Plano Real. Eliseu Resende veio a esta Casa, deu um show na apresentação do Plano e renunciou logo depois, porque, como disse, a revista Veja iria começar tudo de novo. Num gesto de dignidade que respeito, informou ao Presidente Itamar Franco que, embora tivesse se saído bem na discussão no Senado, sabia que uma série de debates atingiriam sua honra e ele não poderia despender todo o seu tempo dizendo que ele, Ministro da Fazenda, era uma pessoa séria que tinha direito à credibilidade ao exigir crédito ao Plano do Governo.

Naquele momento, Fernando Henrique foi escolhido; Itamar Franco o escolheu, diria eu, quase à sua revelia. Mas quando Fernando Henrique foi nomeado Ministro da Fazenda, as interrogações também se sucederam; perguntava-se, principalmente, como se sairia um sociólogo no Ministério da Fazenda. Sim, um sociólogo Ministro da Fazenda. Fernando Henrique montou uma grande equipe, e vieram os debates e as discussões. Sua Excelência tem o mérito de ter vindo incontáveis vezes a esta Casa, ao Congresso. E o Plano Real tornou-se realidade. Mérito de Fernando Henrique? Claro que sim! Mérito de sua equipe? Claro que sim! Que me diga o Senador Roberto Freire, que me diga o atual Líder do Governo, se não foram inúmeras as reuniões que fizemos para debater essa matéria. Quantas foram as reuniões em que discutimos item por item, ponto por ponto do Plano Real, sob o comando de Fernando Henrique Cardoso? Mas a responsabilidade política era do Presidente da República; quem assinou a medida provisória foi o Presidente da República; era ele o responsável!

Na época do Plano Cruzado, o Dr. Sarney foi endeusado e obteve 80% de prestígio; e quando esse Plano naufragou quem pagou o preço também foi o Presidente Sarney. Isto é evidente: ninguém elege Ministros da Fazenda; elegemos presidentes da República, e só ele é o responsável.

É certo que o Presidente Fernando Henrique Cardoso tem todas as qualidades e méritos, mas não se pode considerar que o ex-Presidente Itamar Franco não os tenha. S. Exª deu força, cobertura, solidariedade, presença; foi a voz ativa, orientou o momento de se cortarem os créditos e determinou que não se podia gastar. O Ministro da Saúde e o Ministro da Previdência eram seus amigos pessoais, mas S. Exª manteve a determinação e disse que não se gastaria porque a ordem era déficit zero. Não se fizeram obras, não se construiu, não se fizeram estradas, e foi decisão do Presidente; foi o Presidente que disse: "Não se vai gastar, não se vai construir essa estrada". Tudo isso para que o Plano desse certo.

Perguntem ao Fernando Henrique e vejam o que vai responder: "Se não fosse o Presidente, eu não faria nada"! Perguntem ao Itamar e vejam o que vai dizer: "Se não fosse o Fernando Henrique, não teria saído"! Mas isso é evidente.

Vamos acrescentar: o Fernando Henrique era o que menos pensava em candidatar-se à Presidência da República; vamos fazer justiça. O Plano Real não foi um plano aventureiro, não foi um plano eleitoreiro.

Sou testemunha de que, àquela época, ele não pensava em ser Presidente. Até porque entendia que, semelhante ao Cavallo, na Argentina, se o plano desse certo, ele seria um grande cabo eleitoral, ele teria um grande nome. Mas não candidato, porque ele teria que ficar à frente do plano para que desse certo e, aí sim, o Presidente Itamar poderia escolher o seu candidato.

Quem fez o Fernando Henrique Presidente, quem insistiu, quem se apaixonou pela sua candidatura foi o Sr. Itamar Franco. O Sr Itamar Franco foi quem cobrou: "Tem que ser tu o candidato". E eu era um dos que tinham medo e dizia: "Se o plano der certo, se as coisas se saírem bem, se o Fernando Henrique tiver e nós tivermos uma inflação respeitável, elege-se um Presidente".

Agora, aventurar, tirar o Fernando Henrique da Fazenda, criar um nome qualquer, que poderia dar certo ou dar errado, e dizer que o Fernando Henrique fez um plano demagógico para se eleger é incontrolável. Isso eu dizia na cara do Senhor Fernando Henrique Cardoso e do Sr. Itamar Franco.

O Fernando Henrique concordava, nunca exigiu que fosse ele o candidato; o Itamar não concordava. O Sr. Itamar exigia que o candidato fosse o Fernando Henrique.

Sai Fernando Henrique para ser candidato. Se dependesse dele, o hoje Ministro da Fazenda ou o hoje Presidente do BNDES seria o Ministro da Fazenda.

Participei das várias reuniões em que Fernando Henrique dizia: "No meu lugar, é o fulano ou é o sicrano". Mas o Sr. Itamar Franco tinha muitas restrições a economistas, a esses técnicos lá de dentro; dizia que tinham caixas-pretas que ele não entendia.

E, à revelia do Sr. Fernando Henrique, o Sr. Itamar Franco nomeou o Sr. Rubens Ricupero para Ministro. A partir daí, o Sr. Fernando Henrique passou a desenvolver a excepcional campanha a Presidente da República. Sou testemunha das várias e várias vezes em que o Sr. Fernando Henrique, candidato à presidência, falou com o Sr. Itamar e com o Sr. Ricupero.

Reconheço que, ainda que candidato, ainda que fora do Governo, muitas vezes, e nas questões importantes, o Sr. Fernando Henrique era consultado.

Mas, na verdade, o Plano Real continuou com o Presidente Itamar Franco e com o Ministro Ricupero.

Aí veio a desgraça da parabólica! E esta foi uma bomba, porque muita gente acreditava que o impacto seria de tal natureza que equivaleria à presença da mulher do Lula, quando expôs a filha na televisão, o que causou uma virada na última eleição presidencial. O Lula estava crescendo, mas, depois desse episódio, nunca mais conseguiu dar a volta por cima.

Todo mundo pensava isso. Lá pelas tantas, disse: "Eu não tenho escrúpulos"! Uma frase cruelmente interpretada, porque digo que o Sr. Ricupero é um homem digno, um homem de bem, um homem sério. E o que ele quis dizer foi o seguinte: ao invés de economistas da Fundação Getúlio Vargas, que só publicaram os números de mês a mês, ele não teria nenhum problema em publicá-los semana a semana, porque estava demonstrando que a inflação estava caindo.

Eu estava doente, em Porto Alegre, e o Sr. Fernando Henrique saiu do interior de São Paulo e foi até Porto Alegre. E com o Britto, candidato a governador, foi à minha residência me visitar. Quem lhe deu a notícia, quem lhe deu o fax da interpretação total das palavras do Sr. Ricupero fui eu, na minha casa - porque me pediram que assim o fizesse.

Até hoje, admiro o Fernando Henrique pela sua competência. Se fosse um outro cidadão qualquer, eu estaria assustado. Eu entendia que aquele negócio de "sem escrúpulo" iria "tremer" a eleição.

O Sr. Fernando Henrique, com a maior competência, analisou, debateu, telefonou para o Presidente, e o candidato do Sr. Fernando Henrique, para ficar no lugar do Ricupero, era, mais uma vez, o atual Ministro da Fazenda ou o atual Presidente do BNDES. O Sr. Itamar Franco, por conta própria, indicou o Sr. Ciro Gomes.

O Plano Real continuou e as coisas andaram. O Sr. Fernando Henrique ganhou as eleições. Plano de quem? Do Fernando Henrique. Quem é o craque? Fernando Henrique. Quem é o mestre? Fernando Henrique. Pelo amor de Deus, isso está claro!

Mas não se pode ridicularizar o Sr. Itamar Franco; dizer que o Sr. Itamar Franco teve a sorte de encontrar o Sr. Fernando Henrique. Não, ele foi buscá-lo. Buscou, pinçou e, contra ele, nomeou-o. Por sua vez, o Sr. Fernando Henrique buscou o Sr. Ricupero, e no impacto, tinha que ter resposta imediata. Quando aconteceu a crise do Sr. Ricupero, nomeou o Ciro Gomes.

São duas pessoas que se respeitam e que se querem bem. Essa questão, então, deve ser colocada nesses termos.

Quando o meu querido amigo Antonio Carlos disse que o ex-Presidente Itamar Franco estava vivendo uma situação difícil, peço a Deus a desgraça de viver uma situação difícil como esta. Saiu da Presidência da República com 80% de prestígio - o mais alto índice da história de um ex-Presidente da República. Até o JK, quando deixou a Presidência, estava com baixos índices de popularidade; subiu depois. O Sr. Jânio Quadros, com "a vassoura vem aí", havia tentado demolir a dignidade de JK.

De 1930, até hoje, o Senhor Fernando Henrique foi o único Presidente da República que fez o seu sucessor. Dutra queria o Brigadeiro, ganhou Getúlio; Getúlio foi levado ao suicídio, entrou Café Filho; Jânio Quadros renunciou, entrou Jango; Sarney saiu e entrou o Collor.

Essa foi a única transição pacífica, amena, tranqüila, de continuidade, sem continuísmo, que tivemos.

O Sr. Itamar Franco foi indicado para Embaixador na reunião mais linda que já vi na Comissão de Relações Exteriores. Eu esperava, como ex-Líder, ser o Relator; mas entendi o gesto de grandeza do Presidente da Comissão, que avocou para si a relatoria, e todos os integrantes e não-integrantes da Comissão encheram de elogios a figura do ex-Presidente. Um gesto realmente inédito na história do Brasil.

Penso que S. Exª não está vivendo um momento difícil, e sim de euforia.

O Sr. Antonio Carlos Magalhães - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. PEDRO SIMON - Com o maior prazer e com o maior carinho, ouço V. Exª.

O Sr. Antonio Carlos Magalhães - Em primeiro lugar, terei muito cuidado com o aparte. V. Exª está sendo muito elegante comigo, como sempre. Tenho por V. Exª muita estima, respeito e admiração. Portanto, terei que pautar o meu aparte nessa linha. Daí por que quero dar esse aparte dentro do conteúdo do discurso de V. Exª, sem entrar em pormenores; se necessário for, entrarei, mas não no discurso de V. Exª, e sim em num próprio, embora já tenha tomado essas anotações. Entretanto, V. Exª deve sentir que esse apoio ao Presidente Fernando Henrique é um pouco contraditório, porque quando Fernando Henrique deixou o Ministério da Fazenda - V. Exª mesmo confessa - S. Exª escolheu, contra a vontade de Fernando Henrique, seu sucessor. Isso não é uma boa ajuda ao candidato. V. Exª disse, por duas vezes, que ele fez questão de escolher alguém que não fosse indicação do Fernando Henrique. Depois V. Exª disse, com muita força, que o Presidente Fernando Henrique nunca pensou em ser candidato e que quem o fez foi o então Presidente Itamar Franco. Acredito sempre no que V. Exª diz, mas também tenho que acreditar em mim e no próprio Fernando Henrique. Quero apenas dizer, como subsídio para a História, que conversávamos sobre a candidatura de Fernando Henrique desde o início, quando Sua Excelência era Ministro das Relações Exteriores. Por essa razão, creio que, antes de o Presidente Itamar Franco pensar nessa possibilidade, o Fernando Henrique já conversava com vários políticos do Brasil sobre a sua candidatura a Presidente da República. Quanto ao índice de popularidade do ex-Presidente Itamar Franco, tenho bastante a contestar. Por quê? Em primeiro lugar, entre os 80% a que V. Exª se refere, a maioria manifestou-se pela opção "regular". Não atribuo a V. Exª, como Senador, o índice "regular". V. Exª é 90% ou 100% de "ótimo" e "bom". O Presidente Itamar Franco tem 49% de "regular", o que não representa um índice tão notável. Seja como for, penso que está até acima e que o destino foi muito bondoso para com ele. Daí por que eu não entender esse saudosismo do ex-Presidente, de querer sempre estar em cena, quando já deveria ter, por todas as razões que V. Exª salienta e até mesmo por essa aprovação tão boa do Senado, ido para Portugal assumir a Embaixada. Sei que V. Exª vai falar sobre isso, razão pela qual, antecipando-me, pergunto: S. Exª vai ou não assumir a Embaixada do Brasil em Portugal? Os outros assuntos não me interessam; esse interessa, porque interessa ao Presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, do Senado Federal. Muito obrigado a V. Exª

O SR. PEDRO SIMON - Responderei com muito prazer a V. Exª.

Em primeiro lugar, os índices de popularidade que auferiu S. Exª são iguais àqueles que estão auferindo todos: o Presidente Fernando Henrique Cardoso; eu e V. Exª, como Governadores dos nossos Estados. São os mesmos índices de popularidade, ou seja, os mais altos da História dos Presidentes que deixaram este País.

Em segundo lugar, V. Exª tem razão: S. Exª, o ex-Presidente Itamar Franco, não nomeou o Ministro da Fazenda que o Fernando Henrique queria. Logo, S. Exª era contra o Fernando? Não. S. Exª era a favor do Fernando, lutava por ele, arregaçava as mangas pelo Fernando, mas S. Exª tinha a sua personalidade. O Ministro da Fazenda ia executar o Plano Real do Fernando, sim, mas seria o Ministro que S. Exª queria. E o Ministro que S. Exª queria era o Ricupero, era o Ciro. Não era um técnico, porque ele não gostava de técnicos. S. Exª não tinha confiança nos técnicos. S. Exª dizia que eles falavam, falavam - não é isso, Senador Roberto Freire? -, falavam, debatiam, mas lhe parecia que eles tinham sempre uma caixa-preta, na qual não conseguia penetrar.

S. Exª dizia: "vamos ser claros. A favor do Plano? A favor do Plano. A favor da candidatura de Fernando Henrique? A favor da candidatura de Fernando Henrique Cardoso. A favor do Plano Real? A favor do Plano Real. Mas quero escolher o Ministro". S. Exª escolheu o Ricupero e não o Pedro Malan; S. Exª escolheu o Ciro e não o outro.

O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros) - Senador Pedro Simon, o tempo de V. Exª está esgotado. No entanto, a Mesa vai prorrogar a hora do Expediente por mais cinco minutos para que V. Exª possa concluir o pronunciamento.

O SR. PEDRO SIMON - Muito obrigado.

Com relação ao outro ponto a que se referiu V. Exª - a candidatura -, não estou dizendo que o Senhor Fernando Henrique, como o Sr. Antonio Carlos - ainda mais o Antonio Carlos, que é um gênio da cultura política -, não falariam em candidatura, ainda mais se o Antonio Carlos dissesse: "Olha, Fernando, acho que a sua candidatura é simpática". Não digo que não falariam. Digo é que, no Palácio, nas reuniões com o Ministro da Fazenda, com o Presidente da República, com o Líder do Governo, com o Chefe da Casa Civil, o Fernando sempre dizia que não era o candidato ideal; dizia que o candidato ideal era outro, porque ele, como Ministro da Fazenda, bancaria o Plano até o fim. É isso que estou dizendo.

Creio que o que eu disse não tem nada a ver com o que diz o Sr. Antonio Carlos. No entanto, seria normal que o Fernando Henrique dissesse, para ele ou para quem quisesse: "Meu nome está à disposição". Ou algum de nós diria o contrário?

Continuo, Sr. Presidente: não creio que o Sr. Itamar está demonstrando saudosismo, nem creio que Sª Exª está interferindo no Governo Fernando Henrique.

O meu querido amigo Ministro das Comunicações fez uma denúncia grave em relação ao Governo Itamar. O Sr. Itamar Franco exigiu: "Ex-Presidente determina a ex-Ministro que responda às acusações contra o Governo". S. Exª chamou o Ministro das Comunicações e fez o mesmo apelo. Mandou carta circular a todos os ex-Ministros - está presente um ex-Ministro, que pode testemunhar -, mediante a qual solicitava que fossem esclarecidas todas as afirmativas que se fizessem em relação ao que aconteceu no Governo.

No que tange ao episódio das tais concessões de rádio e televisão, do tal do Luiz Mário, S. Exª determinou, e elas foram anuladas. Ele voltou atrás e renunciou às concessões de rádio que havia conseguido. Inclusive a Câmara dos Deputados votou um projeto de lei anulando as concessões feitas nos últimos 30 dias no Governo do Sr. Itamar Franco. Ele tomou as medidas, fez o que tinha que fazer.

O Sr. Antonio Carlos Magalhães - E a denúncia do Ministro Ciro Gomes com relação à Saúde? O Ministro Ciro Gomes acusou o Ministro da Saúde do Governo Itamar Franco.

O SR. PEDRO SIMON - Não me lembro.

O Sr. Antonio Carlos Magalhães - O Ministro Ciro Gomes acusou o Ministro da Saúde do Governo Itamar Franco.

O SR. PEDRO SIMON - Aquela afirmativa ele mesmo respondeu.

O Sr. Antonio Carlos Magalhães - Ele quem?

O SR. PEDRO SIMON - O Ministro Ciro Gomes, em nota oficial, admitiu que falou em escândalos na Saúde, em roubalheiras dos hospitais, mas abordou um assunto que há mais de 30 anos existe. Disse ainda que não quis falar como Ministro, não quis dizer que aquilo ocorria no Governo do Sr. Itamar Franco. O problema do superfaturamento, dos gastos desnecessários, dos abusos do Ministério sempre existiu. Ainda hoje os jornais publicam que, segundo um Deputado, não é preciso criar o imposto sobre os cheques para se conseguir dois bilhões de dólares, basta que se roube a metade no Ministério da Saúde para se conseguir o dobro disso. Essa foi a nota oficial do Sr. Ministro da Fazenda.

O que eu quis dizer é que os problemas existem lá...

O Sr. Antonio Carlos Magalhães - Meu querido Senador, e a merenda escolar?

O SR. PEDRO SIMON - A outra questão é o Itamarati. Em relação a essa, acho que o Itamar não deveria ter-se intrometido. Se a esposa do Ministro parou ou não parou... ora, era um problema que não tinha nada a ver.

Falei hoje com o Chefe da Casa Civil, pois estranhei a maneira pela qual o assunto apareceu nas manchetes. Faltou ímpeto político, ou faltou decisão política, e o Sr. Itamar foi o responsável pelo fato de as privatizações não andarem. O Chefe da Casa Civil, juntamente com o Presidente Fernando Henrique Cardoso, disse-me que não foi isso que ele declarou.

O que S. Exª declarou foi que no Governo anterior não havia o ímpeto da decisão política das privatizações. Itamar? Sim, Itamar. Fernando Henrique? Sim, Fernando Henrique. Ele, Chefe da Casa Civil, segundo homem do Fernando Henrique? Sim, ele também. 

Então, S. Exª disse que fez uma análise do conjunto do Governo e não, como a manchete do jornal retrata, uma análise do Fernando Henrique ou do Itamar Franco. Concordo. No Governo Itamar Franco as privatizações não tiveram o ímpeto que estão tendo agora. É verdade. Eu era um dos favoráveis às privatizações, mas queria moderação. Eu era um dos que muitas vezes levei - sou o responsável, assumo da tribuna - à suspensão algumas privatizações por causa das denúncias graves de irregularidades que me apresentaram .

O Governo Fernando Henrique Cardoso está tendo o ímpeto do PFL. Se há um sinal de que tem cheiro de PFL no Governo, esse sinal é o processo de privatização. Nesse caso, não há dúvida nenhuma de que a política do Sr. Jorge Bornhausen e do PFL está existindo e de que está sendo altamente meritória; as privatizações estão acontecendo numa rapidez que não existia no Governo anterior.

Essa é a razão de o Senhor Itamar ter-se manifestado, o que acho que não devia, que não precisava.

Agora, Sr. Presidente, em nenhum momento o Senhor Itamar Franco atingiu o Presidente Fernando Henrique Cardoso.

Tem um aspecto, meu querido Senador Antonio Carlos Magalhães; se V. Exª, que é brilhante, às vezes se perde no jogo de palavras, eu vejo como tenho que medir as minhas quando faço um improviso.

V. Exª fez um discurso, que respeito. V. Exª veio em defesa do Presidente Fernando Henrique Cardoso. E V. Exª é um aliado que merece respeito. Mas, ao tentar defender o Presidente, V. Exª fez uma afirmativa que terminaria por agredir Sua Excelência. V. Exª disse que amigos do ex-Presidente Itamar Franco não estão sendo submetidos a inquéritos por causa da bondade do Presidente Fernando Henrique Cardoso. Aliás, coisa que considero errada, porque quando não se submete ao inquérito está-se compactuando também com alguns atos de corrupção.

Eu conheço Fernando Henrique Cardoso mais do que V. Exª. V. Exª é amigo novo, eu sou amigo velho. Claro que, hoje, V. Exª é um amigo muito mais profundo, muito mais ligado do que eu. V. Exª tem uma competência que eu respeito, em termos de aproximação com o Governo, enquanto que eu tenho uma incompetência, que eu reconheço, em termos de me afastar do Governo. Mas, mesmo assim, eu digo, aqui: conheço Fernando Henrique Cardoso. É um homem bom? É. É um homem bom! É um homem de caráter? É! É um homem extremamente bondoso? É! Mas não compactua com corrupção. Nem com amigo de Itamar Franco, nem com o Itamar Franco, nem com quem quer que seja, nem com amigo dele, Fernando Henrique Cardoso! O Senhor Fernando Henrique Cardoso não compactua com corrupção! É bom que todos saibam disto: os amigos de Itamar Franco e os amigos de Fernando Henrique Cardoso.

O Sr. Antonio Carlos Magalhães - Mas, se não apurar, estará compactuando. Tem que apurar! Existe corrupção? Tem que apurar. E é isso que quero que o Governo apure.

O SR. PEDRO SIMON - Solidarizo-me com V. Exª e repito, aqui, o que V. Exª disse no seu aparte: se o senhor Fernando Henrique Cardoso souber de fatos de corrupção e não apurar, compactua.

O Sr. Antonio Carlos Magalhães - Se não apurar, compactua. E, compactuando, está cometendo um crime. Esses casos que citei, como também os do Ministério de Ação Social e outros mais que o Tribunal de Contas está apurando.

O SR. PEDRO SIMON - Minha solidariedade total a Antonio Carlos Magalhães. S. Exª tem razão. Quantas vezes vim a esta tribuna para dizer isso. Os colegas da Legislatura passada se lembram. Eu vim aqui para dizer do Senhor Fernando Collor de Mello. Eu fui o primeiro Senador que vim aqui falar em PC Farias. Eu fui o primeiro Senador a dizer: "Olhem, estão falando coisas sérias com relação a este Governo." E quando não se falava nada do Senhor Collor, nada, eu dizia: "Eu não tenho nada contra o Collor." O que V. Exª está dizendo agora, eu disse aqui. Eu não tenho nada contra o Senhor Collor. Agora, se o Sr. Deputado Luís Roberto Ponte, que é um homem de bem, leva um dossiê, dizendo que tem corrupção, que as empreiteiras estão cobrando percentuais escandalosos e, ao invés de apurar, manda processar o Sr. Luís Roberto Ponte, Sua Excelência passa a ser co-responsável, Nisto concordo com o Sr. Antonio Carlos Magalhães. Se V. Exª - e posso lhe dizer aqui - levar ao Presidente Fernando Henrique Cardoso e dizer que este "João da Silva" é "gato", e está aqui a prova, Sua Excelência vai abrir inquérito. E se não abrir, concordo com V. Exª, será co-responsável.

O Sr. Antonio Carlos Magalhães - Tem que apurar, e aí não tem amizade!

O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros) - Senador Pedro Simon, lamentavelmente o tempo de V. Exª já excedeu em oito minutos da prorrogação que a Mesa democraticamente concedeu a V. Exª.

O Sr. Antonio Carlos Magalhães - Sr. Presidente, dê-lhe mais cinco minutos.

O SR. PEDRO SIMON - Sr. Presidente, esse assunto é tão importante, e quero encerrá-lo de uma vez por todas.

Sr. Presidente, entrego, aqui, já que não saiu a CPI das Empreiteiras no Governo Itamar Franco - eu praticamente levei para S. Exª um projeto de resolução criando a CEI - Comissão Especial de Investigação, com âmbito na Administração Pública. Está aqui o decreto ligado a S. Exª, o Presidente Itamar Franco. Essa Comissão foi composta por pessoas fora da Administração Pública: Cândido Antonio Mendes de Almeida, Daniel Quintela Brandão, Emerson Kapaz, Evandro Gueiros Leite, Francisco Batista Torres de Melo, Miguel Jeronymo Ferrante, Modesto Souza Barros Carvalhosa, Romildo Canhim. Esta Comissão de notáveis, composta de homens acima do bem e do mal, indicado pela OAB, pela CNBB e pelos empresários, foi constituída para investigar todas as denúncias ocorridas no Governo do Sr. Itamar Franco. Está aqui e peço que seja anexado o pronunciamento que fiz.

O Sr. Antonio Carlos Magalhães - Qual foi o resultado desta Comissão dos notáveis?

O SR. PEDRO SIMON - Vou dizer. Eu não ia dizer. Mas, já que V. Exª me pede, vou dizer; e V. Exª será o responsável pelo que vou dizer.

O Sr. Antonio Carlos Magalhães - Sim pode dizer, estou provocando é para isso mesmo.

O SR. PEDRO SIMON - Já vou dizer.

Sr. Presidente, peço a transcrição do discurso que proferi no Palácio do Planalto, quando se instalava essa Comissão.

O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros) - Está deferido o pedido de V. Exª.

      O SR. PEDRO SIMON - Vossa Excelência vem e diz presente a essa revolução ética. Nós não estamos aqui assistindo à constituição de uma Comissão composta de membros do Governo para fazer aquilo que se fez muitas vezes. Vossa Excelência convoca a sociedade, pede que a sociedade, através de seus membros mais que representativos, faça, com a mais ampla liberdade, a análise profunda de seu Governo, dos órgãos do Governo, para que nós possamos, realmente, dar uma resposta à sociedade.

O SR. PEDRO SIMON - Sr. Presidente, eu encerrarei dizendo a V. Exªs que esse é o estilo da mulher do Rio Grande do Sul. Com muito carinho, com muito respeito, mas, na verdade, com muita independência, principalmente uma mulher da fronteira, lá de Santana do Livramento. Uma extraordinária Senadora que tem absoluta razão e a S. Exª levo o meu carinho, o meu afeto, pedindo-lhe desculpas por um Senador bem mais velho estar lhe dando mau-exemplo. (Risos)

Sr. Presidente, quarenta e oito inquéritos foram feitos. Esses quarenta e oito inquéritos foram entregues em mãos ao Presidente Fernando Henrique. Quando encerrou o Governo, o último ato do Presidente Itamar Franco foi entregar ao Senhor Fernando Henrique os inquéritos, em um discurso feito pelo General Romildo Canhim.

Lamentavelmente, o Governo extinguiu esta Comissão! E, lamentavelmente, mandei um ofício. E, em um artigo da extinção da Comissão, diz que os inquéritos abertos pelo Governo Itamar iriam para o Ministério da Justiça. Aí mandei um ofício, que está aqui, pois estou pedindo a sua transcrição nos Anais, pedindo ao Ministro da Justiça informações sobre o que foi feito dos inquéritos. E S. Exª me respondeu: "O Trabalho já veio. Mas as 20 caixas de inúmeros papéis e papelão ainda estão no Ministério da Administração".

Já que V. Exª me pediu, a contragosto respondo, o que não gostaria de fazê-lo.

O Sr. Antonio Carlos Magalhães - A resposta de V. Exª é que só no último dia o Governo Itamar aprontou isso. Levou tanto tempo para aprontar? Por que não puniu ninguém? Por que não assumiu a responsabilidade? Nunca assumiu responsabilidade! Então, irei à tribuna, e aí sim, pedindo a V. Exª que assista o meu discurso para demonstrar a corrupção no Governo Itamar Franco.

O SR. PEDRO SIMON - Se existiu, o Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso deve apurar. Se existe corrupção, ela tem que ser apurada. O ex-Presidente Itamar Franco fez mais do que isso: fez os inquéritos e dossiês e disse: "Olhe, Fernando, no meu Governo aconteceram essas irregularidades. Estão aqui os inquéritos. Apure."

Sr. Presidente, até o dia 30, o ex-Presidente da República vai assumir a Embaixada do Brasil em Lisboa. É muito positivo para o Brasil que um ex-Presidente da República esteja assumindo a Embaixada brasileira em Portugal. É uma decisão importante, mas não se justificava esse atraso, que vem se prolongando desde a saída do ex-Embaixador José Aparecido. O ex-Presidente Itamar Franco por três vezes transferiu a sua viagem a Portugal. O Presidente Fernando Henrique Cardoso também fez isso.

Portanto, é uma boa notícia saber - espero que o assunto esteja encerrado - que, no próximo dia 30, o Sr. Itamar Franco estará assumindo a Embaixada em Portugal. Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 18/05/1995 - Página 8377