Discurso no Senado Federal

NECESSIDADE DE MUDANÇAS URGENTES NA POLITICA ECONOMICA DO GOVERNO.

Autor
Carlos Bezerra (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/MT)
Nome completo: Carlos Gomes Bezerra
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SISTEMA DE VIGILANCIA DA AMAZONIA (SIVAM). POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA. ATUAÇÃO PARLAMENTAR.:
  • NECESSIDADE DE MUDANÇAS URGENTES NA POLITICA ECONOMICA DO GOVERNO.
Aparteantes
Casildo Maldaner, Humberto Lucena, Iris Rezende, Pedro Simon.
Publicação
Publicação no DCN2 de 19/05/1995 - Página 8508
Assunto
Outros > SISTEMA DE VIGILANCIA DA AMAZONIA (SIVAM). POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA. ATUAÇÃO PARLAMENTAR.
Indexação
  • COMENTARIO, NECESSIDADE, ALTERAÇÃO, REGIMENTO INTERNO, SENADO, EXTINÇÃO, PRIVILEGIO, LIDERANÇA, OBTENÇÃO, TEMPO, PRONUNCIAMENTO, USO DA PALAVRA, PLENARIO.
  • DEFESA, CANCELAMENTO, PROJETO, SISTEMA DE VIGILANCIA DA AMAZONIA (SIVAM), DESNECESSIDADE, IMPLANTAÇÃO, PROGRAMA DE OBRAS, SEGURANÇA NACIONAL, NECESSIDADE, ESTABELECIMENTO, PRIORIDADE, DESTINAÇÃO, RECURSOS, REGIÃO NORDESTE, SAUDE PUBLICA, PAIS.
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, SENADO, ALTERAÇÃO, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, AUMENTO, TAXAS, JUROS, DEFESA, DESCENTRALIZAÇÃO ADMINISTRATIVA, ATENÇÃO, DESENVOLVIMENTO ECONOMICO, REGIÃO CENTRO OESTE, NECESSIDADE, INVESTIMENTO, AGRICULTURA, REDUÇÃO, DESIGUALDADE SOCIAL, MELHORIA, SISTEMA, TRANSPORTE, SITUAÇÃO, RODOVIA, HIDROVIA, TRANSFERENCIA, COMPETENCIA, MUNICIPIOS, RESPONSABILIDADE, EXECUÇÃO, POLITICA, SETOR, SAUDE, ASSISTENCIA SOCIAL, SANEAMENTO, HABITAÇÃO, REFORMULAÇÃO, SISTEMA UNICO DE SAUDE (SUS).
  • COMENTARIO, HISTORIA, PARTICIPAÇÃO, ORADOR, LUTA, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRATICO BRASILEIRO (PMDB), IMPLANTAÇÃO, DEMOCRACIA, PAIS, CONSOLIDAÇÃO, PLANO, ESTABILIZAÇÃO, ECONOMIA, REAL.

O SR. CARLOS BEZERRA (PMDB-MT. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, entendo que esta Casa deve, com urgência, fazer algumas modificações no seu Regimento, para não mais permitir certas anomalias que acontecem aqui, como, por exemplo, inscrever-se com antecedência o Senador e depois, por várias manobras, ficar esperando infundadamente e até não poder usar da palavra em função de facilidades que aqui ocorrem. Esta deve ser a Casa do bom exemplo e não se pode permitir que essas facilidades continuem ocorrendo, porque isso enseja o descontentamento da maioria dos Srs. Senadores.

Sou contra qualquer espécie de privilégio, muito mais em uma Casa da natureza desta, do quilate desta. Isso tem que ser abolido. Eu conversava há pouco com o Senador Iris Rezende, que está pretendo estudar, e quero participar com S. Exª medidas para terminar, definitivamente, com todos esses privilégios. Jamais farei, por exemplo, uma comunicação de liderança que não seja uma comunicação de liderança, apenas para uso pessoal. Esse tipo de manobra é feita a todo momento nesta Casa, como outras também que são praticadas e que não fazem bem para a saúde do Senado Federal.

O SR. PRESIDENTE (Ney Suassuna) - Senador Carlos Bezerra, permita-me dizer que todos que usaram da palavra o fizeram de acordo com o Regimento.

O SR. CARLOS BEZERRA - Sei disso. E por essa razão temos que mudar o Regimento. Alguns que usaram da palavra de acordo com o Regimento o fizeram erroneamente, não cumpriram a finalidade para a qual a palavra foi outorgada. É isso o que está errado, e a Mesa deve ser rígida nesse sentido.

Posso aqui pedir a palavra pela Liderança do PMDB e fazer um discurso pessoal para tratar de problema do Mato Grosso, da enchente do Pantanal; essa não é uma questão de liderança. Temos que abolir essa prática interna, para que os trabalhos da Casa ocorram de forma correta.

Em segundo lugar, antes de começar o meu discurso, gostaria de falar sobre a questão do SIVAM. Ouvi aqui o pronunciamento irado do nosso Líder Jader Barbalho, e com razão. Mas discordo um pouco de S. Exª. Esse Projeto SIVAM parece um projeto da época dos militares. Há uma semelhança muito grande com a fase do "Brasil, ame-o ou deixe-o", do Brasil grande, do Brasil do Delfim Netto, Brasil dos militares. Tem a cara dessa fase e dessa era.

Estamos vivendo uma situação catastrófica no País: a saúde pública falida, a educação sem recursos.

Ora, meu Deus, tem que prevalecer o bom-senso! Entendo que o Presidente Fernando Henrique Cardoso receberia os aplausos de todo o Brasil se cancelasse esse Projeto.

O Brasil não tem grandes problemas de segurança nacional, neste instante, para estar correndo atrás de um projeto dessa natureza. O Brasil, graças a Deus, vive em paz e integradamente com seus vizinhos. A integração marcha de forma tranqüila. Uma das coisas mais auspiciosas que tem acontecido nos últimos tempos é a integração do Brasil com a América Latina. Vivemos de costas para a América Latina durante séculos, mas agora há uma política de integração - e o Presidente José Sarney deu um grande passo nesse sentido. Então, não há por que gastar um bilhão e quatrocentos milhões de dólares num projeto desse.

Quantos problemas poderiam ser resolvidos na Região Norte com esses recursos? Recursos dessa natureza poderiam ser utilizados para socorrer a saúde pública brasileira, que vive uma situação calamitosa.

O Presidente Fernando Henrique Cardoso, com a formação democrática e a consciência social que possui, deixaria o País muito feliz se revogasse definitivamente esse projeto.

Neste momento, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, vou tratar do assunto para o qual me inscrevi.

É com um misto de alegria e orgulho que venho hoje, pela primeira vez, à tribuna do Senado Federal.

Se a chegada ao cargo de Governador do meu Estado, em 1986, foi o ponto mais alto de minha vida de administrador público, alcançar uma cadeira no Senado da República é, seguramente, o ponto culminante de uma vida dedicada às tarefas da política.

Se fôssemos traçar um paralelo entre as atividades políticas e a carreira acadêmica, poderíamos dizer que esta Casa representa o doutoramento para os políticos. Ocorre que aqui, neste plenário, têm assento muitos dos homens públicos mais capazes e respeitados do Brasil. Quase todos os que cumprem um mandato popular nesta Casa exerceram, antes, altos cargos em seus Estados, nas Assembléias, na Câmara dos Deputados, no Executivo.

Ex-governadores, ex-ministros, ex-deputados, ex-prefeitos. Se somássemos apenas o tempo de serviços prestados à Nação pelas pessoas que aqui têm um lugar, chegaríamos a milênios de experiência, de sabedoria, de bom-senso. Tradicionalmente, o Senado da República é a Casa do equilíbrio, da ponderação, da lucidez. E isso se dá porque para cá vêm os mais provados, os mais tarimbados. Esta, definitivamente, não é uma Casa de amadores em política. É uma Casa de pessoas que amam a política.

Aqui estão brasileiros dos mais diferentes estratos sociais, das mais diversas facções ideológicas e dos mais distantes rincões. Mas a uni-los, inequivocamente, está a larga experiência política. Ou, dito de outra forma, aqui estão os que adquiriram a mais rara das sabedorias, aquela que só se obtém com longos anos de experiência.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, se faço esta breve introdução é para realçar o papel que cabe ao Senado - ou, mais especificamente, ao conjunto de experientes homens públicos aqui abrigados -, um papel de fundamental importância neste difícil momento da vida brasileira.

Na verdade, em incontáveis ocasiões, nos momentos mais graves da vida nacional, o Senado da República foi chamado a intervir. Atuou sempre com equilíbrio e justiça. Mas, hoje, o desafio com que nos deparamos é o de não deixarmos passar mais esta chance que estamos tendo de colocar o Brasil na esteira do desenvolvimento econômico e social.

Durante quase um ano de funcionamento do Plano Real, pela primeira vez, em mais de uma década, estamos tendo uma oportunidade verdadeira de colocar o País nos trilhos. Durante 15 anos, estivemos engolfados numa inflação que varreu da memória dos brasileiros toda e qualquer referência de preços. Toda a poupança do País foi jogada na fornalha da ciranda financeira, numa tola tentativa de evitar sua rápida corrosão. Por 15 anos, toda e qualquer atividade produtiva foi abandonada em favor do lucro fácil e enganoso de um dinheiro que se multiplicava nos bancos, mas que perdia valor todo dia.

É necessário que o atual Governo examine, imediatamente, a política financeira vigente, que poderá levar o País ao caos se não houver uma mudança imediata nessa política de juros.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, uma vida inteira dedicada ao meu Partido, o PMDB, antes MDB, do qual fui fundador em meu Estado, confere-me um atestado de fidelidade. Estou nesse Partido há quase trinta anos. Na minha juventude, fui petebista, empolgado pelas idéias do grande estadista Getúlio Vargas e de Alberto Pasqualini, na sua grande obra, Sugestões e Base para uma Política Socialista, que considero atual e pronta para ser aplicada no Brasil nos dias de hoje. Há quarenta anos, comecei minhas atividades políticas, como líder estudantil. Fui fundador e primeiro presidente da União dos Estudantes Secundaristas de Mato Grosso. Tive a honra de engrossar as fileiras do contingente de brasileiros que lutou pelas reformas de base na década de 60.

Mais tarde, em 1966, quando leis de exceção nos forçaram ao bipartidarismo, ingressei no então Movimento Democrático Brasileiro. Militava nessa agremiação quando fui preso. Estava preso quando recebi a notícia do falecimento da minha primeira filha. Fui perseguido, mas não abandonei minhas convicções.

A verdade é que, ao longo dos últimos trinta anos, exerci os mais diversos cargos públicos, sempre como um homem do PMDB. Fui deputado estadual, de 1975 a 1979; deputado federal, de 1979 a 1983; duas vezes prefeito de Rondonópolis, de 1983 a 1986 e de 1993 a 1994; e governador de Mato Grosso, de 1987 a 1990. Sempre pelo PMDB.

Não ocupo um lugar nesta Casa como representante do novo poder econômico nem das velhas oligarquias. Alinho-me junto àqueles que lutam contra a concentração do poder nas mãos de poucos, contra o progresso somente para privilegiados.

Minha luta é para que nossa democracia seja cada vez organizada para promover o desenvolvimento, criar empregos, adotar salários dignos, multiplicar oportunidades e empresas. Pela decência e respeito aos direitos à saúde, educação, habitação, à vida digna.

Nosso País dispõe de recursos naturais abundantes, de agricultura moderna, de base industrial sólida, de estrutura de serviços diversificada. Nosso povo é criativo, trabalhador, dinâmico. Porém, falta-nos a direção política forte, capaz de promover esse invejável potencial e colocá-lo a serviço do crescimento econômico e do progresso social.

Se com a redemocratização ganhamos a legitimidade que o regime autoritário não tinha, embora fosse eficazmente coordenado até em decorrência da brutal concentração de poder, hoje, o que está prevalecendo é a falta de rumos e uma paralisia generalizada em decorrência da fraqueza e colapso da União, Estados e Municípios.

Um dos principais objetivos de minha vida pública tem sido a descentralização administrativa, seguida de uma maior integração entre as suas várias esferas.

Com a recuperação da cooperação entre os poderes - União, Estados e Municípios - poderemos exigir da União o controle macroeconômico, as políticas de fomento agrícola, industrial, de infra-estrutura e do desenvolvimento social.

A corajosa municipalização de setores como a educação básica, saúde pública, assistência social, meio ambiente, habitação, é uma imposição social e econômica. Todo serviço público será mais eficazmente realizado sob o controle direto da sociedade civil, característica acentuada das ações municipalizadas e da participação direta e organizada da comunidade.

O Sr. Casildo Maldaner - Permite V. Exª um aparte?

O SR. CARLOS BEZERRA - Com prazer ouço o aparte de V. Exª, Senador Casildo Maldaner.

O Sr. Casildo Maldaner - Gostaria, com a sua permissão, nobre Senador, de aproveitar este momento em que V. Exª nos dá, nesta tarde, uma verdadeira aula de luta cívica, daquilo que foi na vida. Ainda há pouco, V. Exª discorria daquilo que já foi como Deputado Estadual, como Prefeito daquela grande cidade de Rondonópolis, no Mato Grosso, por duas vezes; V. Exª que foi Deputado Federal e Governador do grande Estado do Mato Grosso, e traz-nos uma preocupação enorme com o Centro-Oeste, em conseqüência, com o Brasil. Nós, catarinenses - e não é só dentro do partido, mas já o conheço de longa data -, admiramos imensamente as suas lutas no Estado do Mato Grosso, em prol do Brasil. Quero aproveitar este momento para cumprimentar-lhe. Fico embevecido quando vejo V. Exª na tribuna fazendo essas colocações de maneira simples, mas convincente; V. Exª é preocupado com todos os temas, até na reformulação de algumas coisas do Regimento, para que esta Casa, na verdade, tenha a sua saúde no verdadeiro sentido da palavra. Preocupa-se com o Projeto SIVAM, conforme há pouco levantou, aconselhando o Governo pela experiência que tem, no bom sentido, é claro. Nós, colegas de Partido, há tantos anos comungamos das mesmas idéias. Por isso, quando vem, agora, traçar os caminhos de sua atuação parlamentar aqui no Senado - a coroação do político quando vem a esta Casa, como disse há pouco - quero me congratular, de todo o coração, com V. Exª, e continuar a ouvir esse belo pronunciamento de V. Exª. Muito obrigado.

O SR. CARLOS BEZERRA - Agradeço o aparte de V. Exª que incorporo ao meu pronunciamento. Quando falo de minha vida partidária, Senador Casildo Maldaner, penso em quanto gostaria que todos os políticos brasileiros tivessem essa firmeza e coerência partidária. Um dos grandes problemas deste País é o descrédito na política e nos políticos; e uma das razões do desgaste do político é a mudança de partidos; na primeira crise, oportunistamente, ele muda de partido. V. Exª é exemplo contrário disso, como o Senador Iris Rezende, a seu lado, também fundador do MDB, como eu, que também sofreu perseguição da ditadura e atravessou inúmeras crises em nosso Partido. Muitas vezes, disseram-me que o MDB havia acabado; não acabou, continuamos aqui; e o PMDB ainda será motivo de muitas glórias para nós todos e para o Brasil, se Deus quiser.

O Sr. Iris Rezende - Permite V. Exª um aparte, nobre Senador?

O SR. CARLOS BEZERRA - É com prazer que ouço V. Exª, Senador Iris Rezende.

O Sr. Iris Rezende - Quero também congratular-me com o ilustre Senador e companheiro que, nesta tarde, faz um pronunciamento que representa uma verdadeira profissão de fé, quanto à sua posição nesse novo mandato que desempenha no Senado e quanto à confiança nos destinos deste País. Sinto imensa felicidade em vê-lo tomado de tanta preocupação e, com objetividade, situar-se nesta Casa como um instrumento de grandes lutas, porque sempre vi e vejo em V. Exª um grande valor da política nacional. Tornamo-nos amigos, talvez pela proximidade de nossos Estados, pela convivência na discussão dos problemas comuns do Centro-Oeste; talvez por pertencermos, há tanto tempo, ao mesmo Partido político. Mas não o falo agora como amigo nem como companheiro, quero falar como homem público, para deixar registrado nesta Casa o conceito que tenho de V. Exª, para que, realmente, fique nos Anais do Senado Federal. Tenho em V. Exª um dos grandes valores da política nacional, vindo do interior, lá de longe, trazendo, na verdade, um exemplo de luta, um exemplo de comportamento na vida pública de nosso País. V. Exª tem sido um espelho para os políticos do seu Estado e tenho certeza de que ao longo dos anos, ao final do nosso mandato nesta Casa, V. Exª será também o espelho para os políticos deste País, de homem coerente, responsável, lutador e, sobretudo, moderado nas suas atitudes. Tenho certeza de que não apenas o Estado do Mato Grosso, mas o Centro-Oeste brasileiro, tem nesta Casa mais um defensor das grandes causas e mais um homem de luta, no sentido de que este País possa realmente encontrar o caminho que tanto persegue e até hoje, lamentavelmente, ainda vive inseguro pelos problemas, principalmente sociais e econômicos. Congratulo-me, mais uma vez, com o pronunciamento de V. Exª e fico feliz, porque vejo, através da sua fala, aquele homem público sempre dotado de muito entusiasmo, de muita garra e de muito espírito público.

O SR. CARLOS BEZERRA - Agradeço o aparte de V. Exª.

Considero que fizemos, ontem, a reunião mais brilhante sobre uma região brasileira, que já ocorreu nesta Casa - a da Região Centro-Oeste - com os governadores e senadores. Essa reunião de ontem, Senador Iris Rezende, ao meu ver, só alcançou o sucesso - e terá muito sucesso mais à frente - graças ao nosso entrosamento, à nossa vinda para o Senado: a sua vinda, a minha vinda. Penso que vamos começar a traçar um novo rumo para a Região Centro-Oeste. Vi, claramente, o nosso caminho, o nosso futuro. Ontem, abrimos uma grande perspectiva.

O Sr. Humberto Lucena - Permite V. Exª um aparte?

O SR. CARLOS BEZERRA - Pois não, Senador. Aliás, ontem, eu usei o discurso de V. Exª na reunião do Centro-Oeste. Disse que estamos fazendo a união do Centro-Oeste. O discurso de V. Exª, conclamando a união do Norte, do Nordeste e do Centro-Oeste, repercutiu bastante. Por isso, na reunião de ontem, colocamos que, quando o Centro-Oeste estiver integrado e unido, vamos sentar para conversar com o Nordeste.

Concedo o aparte a V. Exª, nobre Senador Humberto Lucena, com muito prazer.

O Sr. Humberto Lucena - Apenas para cumprimentar V. Exª pelo seu pronunciamento e dar o meu testemunho, em meu nome e dos Senadores Ronaldo Cunha Lima e Ney Suassuna, que está presidindo a sessão, pela atuação de V. Exª na vida pública, não apenas como Deputado Federal, mas como Governador e agora, como Senador, sobretudo para destacar a sua excepcional dedicação ao Partido que ajudou a fundar juntamente comigo e com outros companheiros, com a finalidade de dar combate ao regime militar nos idos de 1965, e, acima de tudo, também a competência com que V. Exª se houve à frente do governo do Mato Grosso.

O SR. CARLOS BEZERRA - Agradeço o aparte de V. Ex e o incorporo ao meu pronunciamento.

Sr. Presidente, não li nem um terço do meu pronunciamento.

O Sr. Pedro Simon - V. Exª me concede um aparte, nobre Senador Carlos Bezerra?

O SR. CARLOS BEZERRA - Senador Pedro Simon, é impossível terminar esse pronunciamento sem ouvi-lo, V. Exª que é um velho companheiro, um dos fundadores do MDB.

O Sr. Pedro Simon - Nobre Senador, quero trazer o meu carinho a V. Exª e lembrar a longa fase que tivemos no nosso velho partido lá no Mato Grosso. Recordo-me de quando V. Exª nos convidou - o Senador José Richa e eu - em 1979, na época da extinção do MDB, para darmos uma mão para o amigo, para um grupo de companheiros que até a imprensa local chamava-os de malucos, pois queriam levar adiante um partido que não tinha nenhuma condição. V. Exª nos levou de avião para um local onde havia agrupamentos de gaúchos e paranaenses que estavam desenvolvendo a região, se não me engano, o norte do Mato Grosso. E, naquela região, vocês do Mato Grosso lançaram a idéia de que estava nascendo um grande partido. Não posso me esquecer daquela reunião. O avião em que viajávamos aterrissou na avenida principal de uma cidade, a qual, na época, era uma estrada com algumas casas de um lado e do outro. Quando descemos, as pessoas correram em nossa direção, pensamos que fossem companheiros que vinham-nos abraçar. Entretanto, havia ocorrido um acidente muito grave, e a chegada do avião salvou a pessoa acidentada. Dizíamos: daqui a algum tempo, este Partido que está nascendo será um grande Partido. Daqui a 20 anos, quando esta avenida estiver asfaltada e cheia de construções, dirão que "uns malucos aterrissaram aqui". O Partido cresceu, a cidade cresceu, a região cresceu. Havia um medo de que o Estado do Mato Grosso desapareceria se fosse dividido. Hoje, o Mato Grosso é um grande Estado e, graças a Deus, o nosso Partido está muito bem, devido ao trabalho e à competência de pessoas como V. Exª. Muito obrigado.

O SR. CARLOS BEZERRA - Senador Pedro Simon, agradeço a V. Exª pelo seu aparte.

No último final de semana, percorri doze municípios daquela região e pude verificar que ali o Partido é majoritário e está mais forte do que nunca.

Os mecanismos de integração administrativa neste país continental e heterogêneo precisam explorar todas as virtualidades produtivas. Cada região-problema oferece também soluções, mesmo parciais, para nossas dificuldades.

Temos que, finalmente, depois de quase 500 anos, tomar posse deste País. Temos que avançar até o Oeste brasileiro e em seguida fazermos estradas que nos liguem ao Oceano Pacífico, para que fiquemos de frente para o pujante e crescente mercado asiático. Dizem os estudiosos de economia que se o Mediterrâneo foi a principal rota de comércio até o século XVIII e que, a partir daí, a supremacia passou para o Oceano Atlântico, o Segundo Milênio será a Era do Pacífico.

Precisamos deslocar o eixo do desenvolvimento econômico para as regiões sempre encaradas como periféricas por vários Governos. Entre essas regiões desprezadas encontra-se o nosso Centro-Oeste, já reconhecido hoje como o celeiro da Nação, mas que ainda produz uma ínfima parcela do que poderá produzir quando tiver boas estradas, armazéns em número suficiente, agroindústrias, energia, etc.

Precisamos assegurar lugar de destaque para a questão da agricultura porque ela é fundamental para promover a justiça social. Só os agricultores podem produzir o alimento de que tanto precisamos para acabar com a fome nas cidades. Só um eficiente incentivo às atividades agrícolas favorece de modo decidido a interiorização do desenvolvimento, meta das mais caras do nosso partido. Só uma agricultura desenvolvida pode fixar os homens no campo, evitando que muitos deles fujam para as cidades, onde engrossam o cordão dos excluídos. É importante destacar também, no que se refere ao campo, um crescimento simultâneo das exportações com o aumento da oferta no mercado interno. Somente para atender nosso mercado interno, são precisos 100 milhões de toneladas de alimentos; só estamos produzindo 78,5 milhões de toneladas, exportamos 40% deste total, por isso há fome, há subnutrição, conforme estudos da FAO, organismo da Organização das Nações Unidas (ONU).

Mesmo sob as condições adversas que prevalecem há mais de uma década, a agricultura e a agroindústria não deixaram de crescer. Dobrando a safra atual, promoveremos o mercado interno e as exportações, interiorizando o desenvolvimento e promovendo o combate à fome e à miséria com o aumento da oferta de alimentos e maior geração de empregos.

Precisamos diminuir o fundo abismo das desigualdades sociais neste País que tem uma distribuição de renda que é das mais iníquas do mundo. A solidariedade tem sido um dos caminhos para combater a fome, mesmo que em programas eventuais, enquanto não se constrói uma Legislação que force a verdadeira redistribuição da renda.

O desenvolvimento econômico é a principal mola propulsora da justiça social. O Brasil tem que crescer, distribuindo a riqueza de uma forma equânime, não da forma como se deu durante o regime militar, que só aprofundou o fosso entre os mais ricos e os mais pobres.

Sr. Presidente, Srs. Senadores, a educação pública gratuita para todos , especialmente para os mais pobres, sempre precisa ser outro objetivo prioritário. Acabar com o analfabetismo é outra meta importante para nós, porque sabemos que no mundo de hoje não há mais espaço para trabalhadores sem um elevado grau de escolaridade. A educação deve ser integral, de tal forma que se forme o cidadão e o trabalhador ao mesmo tempo. A cada dia as exigências do mercado de trabalho são maiores em relação ao nível de preparação dos operários. E todos sabemos o sucesso que vem sendo obtido pelos países asiáticos que investiram maciçamente em escolas. Essa é outra urgente necessidade.

Outro ponto também importante é o nosso sistema de transportes. Predominantemente rodoviário, subutiliza os modais pesados (hidroviário e ferroviário), impondo a estes setores profundas desatualizações tecnológicas e de gestão.

O Brasil dispõe de importante e desenvolvida malha rodoviária, embora, atualmente, ela se ache em boa parte degradada pela deficiência de manutenção, o que, em vários trechos, vem comprometendo a segurança do tráfego.

Embora detentor de importantes bacias hidrográficas, o Brasil apresenta incipiente e precária utilização de seu sistema de transporte hidroviário, salvo raras exceções nos extremos Norte e Sul. Em todo o território nacional, praticamente inexistem instalações portuárias e de infra-estrutura hidroviária adequadas. A falta de investimentos em material de transporte limita a utilização das rotas atualmente viáveis para o transporte fluvial.

Também nesse campo, é preciso ocorrer a municipalização, pois somente a partir de um amplo programa de recuperação das rodovias municipais chegaremos a total correção dos pontos críticos da malha viária total. Com recursos repassados aos municípios, e sob controle e fiscalização direta da sociedade isso será possível. 

Sr. Presidente, Srs. Senadores, o Brasil gasta pouco e muito mal com políticas sociais. Gastamos mal em razão da nossa desordem institucional e ausência de prioridades. É uma crise de planejamento que favorece o clientelismo e a corrupção.

Novamente a municipalização é o caminho para eliminar desperdícios e distorções que estão classificando o País entre os de mais baixo índice de Desenvolvimento Humano, segundo estudos de organismos internacionais como o PNUD.

Municipalizar a execução das políticas de educação, saúde, assistência social, habitação ou saneamento, possibilita a eficiência dos serviços, maior controle social e melhor utilização de recursos.

A política de saúde, por exemplo, tem sido marcada por grandes transformações. O Sistema Único de Saúde (SUS) foi um passo decisivo e provocou aumento expressivo dos gastos com saúde nas três esferas do governo. Porém, mais recentemente, sofreu distorções que estão comprometendo o sistema. Isto exige de nós todo esforço para assegurar à população os direitos garantidos na Constituição. Precisamos resgatar os princípios fundamentais do SUS, corrigir as distorções, duplicar os gastos com saúde.

Sr. Presidente, Srs. Senadores, só mesmo um desenvolvimento econômico ordenado, persistente e socialmente justo pode acabar com as profundas iniquidades com que somos obrigados a conviver hoje.

Como disse antes, o PMDB foi, durante o regime militar, o guarda-chuva sob o qual se abrigaram brasileiros das mais diversas facções ideológicas. Tínhamos todos um objetivo em comum: combater um regime arbitrário que, entre outros grandes crimes, tentou esmagar todas as lideranças políticas emergentes, cassando-lhes os mandatos, forçando-as ao exílio ou ao ostracismo.

Primeiro no MDB, depois no PMDB, lutamos sem trégua contra um regime que se alicerçava na repressão no seu sentido mais amplo. Repressão política que buscava eliminar lideranças, sufocar partidos, intimidar os mais audazes. Repressão às idéias, como a censura de peças de teatro, livros, filmes, jornais e revistas. Lutamos durante as trevas do AI-5. Lutamos num tempo em que as prisões arbitrárias eram freqüentes, num tempo em que muitos eram torturados. Alguns de nossos companheiros perderam a vida. O legado do nosso partido, portanto, é de luta contra o atraso e em favor da democracia.

Com o fim do bipartidarismo compulsório, o PMDB dividiu-se. Dele nasceu o Partido da Social Democracia Brasileira, o PSDB do Presidente Fernando Henrique Cardoso. Do PMDB saíram vários que ajudaram a criar o Partido dos Trabalhadores. Sob bandeira do PMDB abrigavam-se os comunistas, como o nobre Senador Roberto Freire.

Hoje estamos em campos opostos, mas temos todos, em comum, o respeito às regras da democracia.

Este é um momento de definição, ou pegamos o bonde da história, ou ficamos para trás, com o atraso. Ninguém desconhece que temos de fazer uma reforma constitucional. Alguns não a querem, é claro, forçados pelas corporações que os elegem. Não devemos ter compromissos com corporações. Compromisso, sim, com o que é melhor para o País.

Sr. Presidente, Srs. Senadores, como antigo militante do PMDB, tive a honra de participar de todas as grandes lutas políticas desses últimos trinta anos. Nos primeiros anos da ditadura, em especial depois do AI-5, o então MDB significava a resistência ao regime militar durante os anos mais negros, quando as cassações de mandato se sucediam pelos motivos mais mesquinhos. O PMDB esteve à frente de todas as iniciativas que, naqueles tempos, uniam as forças democráticas do País, agrupadas na ABI, na OAB, em setores da Igreja, nos sindicatos, nas universidades.

Em 1978, lançamos a anticandidatura do General Euler Bentes Monteiro contra a farsa do Colégio Eleitoral. Em 1979, conseguimos a anistia, marco inicial do regresso do Brasil à democracia. Em 1984, desencadeamos, junto com as demais forças democráticas do Brasil, a monumental campanha das Diretas Já em apoio à famosa emenda de nosso companheiro Dante de Oliveira, hoje governador de Mato Grosso. Milhões de pessoas saíram às ruas das principais cidades do País para dar um basta ao famigerado Colégio Eleitoral.

Esse passado glorioso é o patrimônio inalienável do PMDB, hoje o Partido brasileiro com maior representação no Parlamento.

Sr. Presidente, Srs. Senadores, o Brasil, nos últimos trinta anos, fez a transição da ditadura para a democracia. Foi um período de grandes turbulências na área econômica. Velhos problemas conjunturais deste País, mesclados com graves questões internacionais, formaram o pano de fundo dessa penosa travessia.

Durante anos, aqui no Congresso Nacional, desperdiçamos muito tempo e muita energia para conquistar, uma a uma, as condições mais elementares para a democracia. Nos últimos anos, reentronizada a democracia, estivemos envolvidos na questão econômica. Vários planos de estabilização foram tentados sem sucesso. O Brasil registrou as piores taxas de crescimento de sua história. Em função do imediatismo dos problemas econômicos, deixamos de lado os grandes temas nacionais, abandonamos totalmente a idéia de planejamento de médio e longo prazo. Mas, de todo modo, pouco a pouco, ao longo desse tempo, foram sendo estabelecidas as bases para o ajuste, que veio com o Plano Real.

Ainda estamos longe de uma situação ideal, mas o que temos hoje de concreto é o Plano Real. Depois de anos com inflação passando da casa do milhar, estamos com um índice de menos de dois por cento ao mês. É ainda um indicador elevado, se comparado com os países desenvolvidos, mas é razoável para o descalabro em que vivemos por tanto tempo.

O Plano Real resulta de antigo anseio do povo brasileiro. Conquista que tem de ser mantida e aperfeiçoada. Muito foi feito mas muito mais ainda está por se fazer. Nossa luta é para ajudar o País a alcançar sua estabilidade econômica permanente. Esse é também um compromisso do nosso Partido, cujo objetivo maior sempre foi o desenvolvimento com justiça social.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 19/05/1995 - Página 8508