Pronunciamento de Humberto Lucena em 18/05/1995
Discurso no Senado Federal
CRISE ALGODOEIRA DO NORDESTE.
- Autor
- Humberto Lucena (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
- Nome completo: Humberto Coutinho de Lucena
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
POLITICA AGRICOLA.:
- CRISE ALGODOEIRA DO NORDESTE.
- Aparteantes
- Ronaldo Cunha Lima.
- Publicação
- Publicação no DCN2 de 19/05/1995 - Página 8512
- Assunto
- Outros > POLITICA AGRICOLA.
- Indexação
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- LEITURA, CARTA, AUTORIA, ORADOR, ENCAMINHAMENTO, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, RELAÇÃO, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, ALGODÃO, REGIÃO NORDESTE, NECESSIDADE, ADOÇÃO, PROVIDENCIA, GOVERNO FEDERAL, EXECUÇÃO, PROGRAMA, RECUPERAÇÃO, LAVOURA, REGIÃO.
O SR. HUMBERTO LUCENA (PMDB-PB. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Sras. e Srs. Senadores, há alguns dias, juntamente com outros representantes da bancada do PMDB do Estado da Paraíba, no Senado e na Câmara dos Deputados, estive em contato informal com Sua Excelência, o Senhor Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, oportunidade em que foram apresentadas e discutidas várias reivindicações da Região Nordeste, a propósito da viagem que o Chefe da Nação fará à região, amanhã, dia 19.
Dentre os pleitos colocados, ressaltou-se, por oportuna e urgente, a questão da cotonicultura nordestina, hoje praticamente dizimada, e que está evidentemente a exigir uma ação decidida e decisiva do Governo Federal, no sentido de viabilizar sua recuperação, considerando que esta diz respeito não apenas ao Nordeste, mas envolve o interesse do próprio País.
Pois bem, Sr. Presidente, Sras. e Srs. Senadores, desse encontro resultou uma carta minha, firmada pelo restante da bancada paraibana do PMDB, que enviei ao Presidente da República, nos seguintes termos:
"Senhor Presidente Fernando Henrique Cardoso,
Em recente reunião informal com Vossa Excelência, a bancada do PMDB da Paraíba no Senado e na Câmara, por meu intermédio, colocou alguns pleitos relacionados com ações governamentais no Nordeste, sobretudo tendo em vista a sua próxima visita àquela região.
Entre esses pleitos, sugerimos a Vossa Excelência a implantação no Nordeste, a partir da Paraíba, de um programa de recuperação da cultura do algodão, seriamente afetada, ao longo dos últimos anos, por duas secas sucessivas e pela incidência da praga do "bicudo", apesar de já existir uma tecnologia desenvolvida pela Embrapa, que tem permitido a convivência do "bicudo" com a lavoura algodoeira.
A crise na cultura do algodão desocupou milhões de nordestinos, sobretudo no chamado semi-árido, que sempre teve na produção do algodão, particularmente o arbóreo, de fibra longa, o principal esteio de sua economia. Lembro que essa situação vem-se refletindo sensivelmente na economia e nas finanças dos Estados nordestinos, principalmente em alguns como a Paraíba, onde o algodão sempre participou como uma das principais fontes de produção no setor primário da economia.
No período 1977/1978, o plantio, resultando em uma safra de cerca de 690.000 toneladas, o beneficiamento e a industrialização do algodão empregavam em torno de vinte e cinco milhões de pessoas na região. Com a incidência da crise climática, enfrentando-se secas como a que durou cinco anos (1979 a 1983), e a ocorrência da praga acima referida, a produção, sobretudo a do algodão arbóreo, começou a declinar fortemente, ano a ano, chegando na penúltima safra de 1992/1993 a apenas 123.880 toneladas, com um desemprego crescente, que agravou ainda mais a tensão social no Nordeste.
Enquanto isso, o preço do algodão veio aumentando no mercado internacional, tendo alcançado atualmente o seu melhor nível, de US$1,15 dólares por libra-peso, com tendência, segundo os analistas, de manter-se em torno desse patamar ainda por um período relativamente longo, ou seja, uma perspectiva mercadológica bastante otimista para o algodão do Nordeste, especialmente o de fibra longa, que sempre ocupou um lugar de destaque nas exportações brasileiras, o que vale dizer que a recuperação da lavoura algodoeira é de fundamental importância não só para a região, como para o País.
Caso semelhante, mas de menor porte, vinha ocorrendo com a cultura do cacau na Bahia, "ameaçada por moléstia denominada "vassoura de bruxa", a qual, em muitos casos é de alta infestação, pode dizimar a cultura", conforme Exposição de Motivos Interministerial nº 144, de 12 de abril deste ano, aprovada pelo Senhor Presidente da República (DOU de 12 de maio de 1995). Pois bem, para atender aos apelos das classes produtoras e dos representantes da Bahia no Congresso Nacional, Vossa Excelência decidiu acolher o programa de recuperação da lavoura cacaueira, devidamente justificada pela referida Exposição de Motivos, o que vai assegurar a aplicação de R$330 milhões, em quatro anos.
Portanto, o que reivindicamos de V. Exª é a mesma solução para o problema - a nosso ver mais grave e extenso - da cultura do algodão no Nordeste, quase dizimado pela praga do "bicudo".
Na expectativa de que, na sua próxima visita ao Nordeste e, sobretudo, à Paraíba, Vossa Excelência possa lançar um Programa de Recuperação da Lavoura Algodoeira, também em quatro anos, através da Embrapa, com sede em Campina Grande, subscrevemo-nos,
Atenciosamente"
Senadores Humberto Lucena, Ronaldo Cunha Lima e Ney Suassuna; Deputados Ivandro Cunha Lima, Cássio Cunha Lima, José Luiz Clerot, Ricardo Rique, Gilvan Freire, José Aldemir e Armando Abílio.
Na verdade, Sr. Presidente, Sras. e Srs.. Senadores, essa iniciativa tem todas as justificativas plausíveis. A crise da cultura algodoeira do Nordeste, como vimos, constitui-se em uma difícil situação macroeconômica, social e política para a região e não está vinculada apenas às questões citadas, como as secas e a praga do "bicudo".
Além disso, é necessário que se anote o problema da redução do crédito agrícola e os períodos de alta inflação, com juros elevados, bem como a extinção da tarifa de importação, que era de 40% e a proteção do produto na maioria dos países produtores, através de subsídios. E, mais, esse algodão importado foi beneficiado com longos prazos para pagamento, chegando a até 300 dias. O que, com a superinflação crônica em que vivíamos, tornou praticamente impossível se vender o produto internamente. E isso se deu justamente no momento em que o consumo industrial de algodão no Nordeste se elevava significativamente, tornando-o o segundo pólo de consumo do Brasil, de cerca de 300.000 toneladas de pluma/ano perdendo somente para o Estado de São Paulo.
Só por esses fatores já seriam mais que justas as eventuais ações do Governo Federal e dos governos estaduais e municipais voltadas para a recuperação dessa lavoura. Entretanto, como nos referimos na carta referida, as condições são hoje ainda mais positivas, vez que o preço atual do algodão está a justificar todas as iniciativas para essa retomada. E, por sua tradicional qualidade, o algodão nordestino tranqüilamente poderá voltar a contribuir fortemente para o aumento de nossas exportações. E, assim, Sr. Presidente, Sras. e Srs.. Senadores, não há qualquer razão para que as áreas plantadas com essa lavoura não sejam largamente ampliadas, dentro de uma programação cientificamente conduzida, no próximo quadriênio.
Tanto assim que a nossa proposta teve o amparo do Centro Nacional de Pesquisa do Algodão (CNPA), da EMBRAPA, sediado em Campina Grande, na Paraíba, que sugeriu um programa para a recuperação da cultura algodoeira do Nordeste.
Com efeito, de acordo com aquele Centro de Pesquisa, apesar dos problemas, a safra de 1993/94 já registrou um aumento considerável na produção, em relação à dos anos imediatamente anteriores. No caso do algodão herbáceo, passou-se de cerca de 187.000 hectares plantados para 416.000 hectares. E a área reservada para o algodão arbóreo se manteve, demonstrando também um quadro positivo, uma vez que a redução de área plantada, nesse caso, vinha se acentuando aceleradamente até 1992.
Ademais, o CNPA aponta para o fato auspicioso de que uma parte razoável da área plantada decorre da renovação de cultivares precoces, tecnologicamente desenvolvidos, e que são muito mais produtivos do que os genótipos tradicionais. A produtividade, desse modo, vem aumentando nos últimos anos, particularmente por causa da adaptação desses cultivares sintetizados na própria região e perfeitamente adaptados às condições de clima e solos do semi-árido e das áreas irrigadas.
Logicamente, todas essas condições propiciadoras da recuperação terão de se enquadrar em um rol de fatores fundamentais, como sejam, o controle integrado de pragas, inclusive o bicudo; a produção de sementes básicas, fiscalizadas e certificadas; um diagnóstico e uma análise geral dos processos de comercialização; leis estaduais para o devido disciplinamento desses processos; compromisso de cada Estado de fazer cumprir a Lei Federal sobre o arrancamento e queima dos restos culturais de cada safra, no caso do algodão herbáceo; e a poda drástica e limpeza do campo, a cada ano, no caso do arbóreo.
Ademais, terá que haver um treinamento teórico-prático para os agentes de extensão nos Estados e Municípios, bem como a verticalização da cultura, por meio de cooperativas e associações de produtores, para que se concentre o produto em um mercado central, onde o produto negociado é a fibra, cujo valor é, no mínimo, três vezes maior do que o do produto bruto. Sem esquecer de mencionar a criação de mecanismos de difusão de massa, capaz de divulgar os passos tecnológicos necessários ao cultivo do algodão, em bases rentáveis, além de outras informações pertinentes.
Ou seja, Sr. Presidente, Sras. e Srs.. Senadores, todo um esforço que se traduzirá, em suma, a partir de 1996, até o final do século, no estabelecimento de uma área plantada de 400.000 hectares, sendo 100.000, a cada ano, com um custo anual de financiamento de pouco mais de R$45 milhões, totalizando um custo de R$180 milhões, no período de 1995/94, além de alocação de recursos da ordem de R$100 mil, por ano, para treinamento. Um esforço a ser louvado e creditado ao descortino do Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, que, desse modo, vai-se credenciando, na História do País, como um dos artífices de seu desenvolvimento.
No dia de amanhã, portanto, os nordestinos terão, com o lançamento oficial, pelo Presidente da República, na Cidade de Campina Grande, do Programa de Recuperação da Cotonicultura do Nordeste, a possibilidade de vislumbrar uma nova fase, através das condições reais de aumento do número de empregos e de sua renda. Sendo do meu dever agradecer a Sua Excelência em meu nome e no de meus companheiros de bancada do PMDB no Congresso Nacional, a adoção da iniciativa que tomamos em favor do Nordeste e da Paraíba.
Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ao encerrar este pronunciamento, desejo formular votos de uma boa viagem ao Presidente da República ao Nordeste, particularmente à Paraíba. Enfatizo ainda que, em Campina Grande, além de Sua Excelência lançar o programa de recuperação da cultura algodoeira, também, ao que se sabe, vai anunciar o compromisso da construção, ao longo do seu Governo, do canal que levará as águas da Barragem de Coremas, no alto sertão da Paraíba, para o sistema de São Gonçalo, possibilitando a ampliação de milhares de hectares irrigados na Várzea de Souza. Será mais uma obra de grande importância para o desenvolvimento, sobretudo do semi-árido da Paraíba - e por que não dizer do Nordeste? - antes que lá cheguem as águas do São Francisco, de acordo com o projeto de transposição há tanto tempo esperado pelos nordestinos.
O Sr. Ronaldo Cunha Lima - Permite-me V. Exª um parte?
O SR. HUMBERTO LUCENA - Ouço V. Exª.
O Sr. Ronaldo Cunha Lima - Senador Humberto Lucena, ontem e antes de ontem também manifestei, a exemplo de V. Exª, o clima de confiança e otimismo que o Nordeste, mais especialmente os paraibanos, vive com a presença do Presidente da República naquela região, mais especificamente na nossa Cidade de Campina Grande. Quero, na oportunidade, felicitar V. Exª. Eu estava presente ao encontro com o Senhor Presidente da República, quando V. Exª, na residência do Senador Ney Suassuna, como Presidente do nosso Partido em nosso Estado, traduzindo o pensamento de toda a Bancada da Paraíba e elencando algumas providências ali colocadas, levantava o problema do algodão. O Presidente assimilou a questão, aceitou-a, tanto assim que estará amanhã em Campina Grande anunciando um programa de recuperação da cultura algodoeira no Estado e no Nordeste. O documento que V. Exª encaminhou à Bancada para ser enviado ao Presidente da República, lido neste instante, traduz com absoluta propriedade o problema, no enfoque correto dado por quem realmente conhece a situação. O aspecto técnico está superado, como salientou V. Exª, no instante em que a própria EMBRAPA, por meio de experiências científicas, encontrou a forma de eliminar o bicudo pela semente precoce, que eliminou aquela praga. O que é importante agora é a adoção de medidas de caráter econômico, o apoio, o incentivo, o estímulo, a fixação de preços, como V. Exª observa muito bem em seu pronunciamento. Quero, portanto, em meu nome - e acredito que em nome do Senador Ney Suassuna e, por extensão, da Bancada da Câmara Federal, já que aqui se encontra o Deputado Cássio Cunha Lima, creio que em nome de todos os Deputados Federais do Estado da Paraíba - saudar V. Exª pela iniciativa e manifestar nossa confiança em que o Presidente da República, aproveitando os dados que V. Exª traduziu na sua carta e neste discurso, possa efetivamente implantar um programa de recuperação da cultura algodoeira na Paraíba e no Nordeste. Parabéns a V. Exª.
O SR. HUMBERTO LUCENA - Agradeço as palavras de V. Exª, nobre Senador Ronaldo Cunha Lima, que, juntamente comigo e com o Senador Ney Suassuna e os Deputados Federais do PMDB da Paraíba, teve oportunidade de colocar perante o Presidente da República essa proposta, afinal vitoriosa, a exemplo do que ocorreu com o cacau da Bahia.
Nesse particular, desejo agradecer ao Senador Josaphat Marinho pelos elementos que me deu, para que eu pudesse consubstanciar melhor a sugestão ao Senhor Presidente da República.
Quero acentuar, ao concluir, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que o programa de recuperação da cultura algodoeira é muito mais importante do que o da recuperação da cultura do cacau, por ser de dimensão muito maior. Afinal, diz respeito a todo o Nordeste - do Piauí até a Bahia -, enquanto que o cacau quase que se limita apenas à Bahia, embora seja uma cultura da maior relevância para a economia não somente daquele Estado, mas de todo o Nordeste e de todo o Brasil.
Eu não poderia deixar de me congratular com o Sr. Ministro-Secretário do Desenvolvimento Regional, Dr. Cícero Lucena, pela atenção que deu ao assunto. S. Exª não só prestigiou a nossa iniciativa fazendo com que junto ao Presidente da República ela fosse incluída na programação de sua visita ao Nordeste, como também fez um grande trabalho, no sentido de assegurar a construção da adutora Coremas de São Gonçalo, a que me referi há pouco.
Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.