Discurso no Senado Federal

RENEGOCIAÇÃO DAS DIVIDAS DOS ESTADOS E MUNICIPIOS.

Autor
Ney Suassuna (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
Nome completo: Ney Robinson Suassuna
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DIVIDA PUBLICA.:
  • RENEGOCIAÇÃO DAS DIVIDAS DOS ESTADOS E MUNICIPIOS.
Aparteantes
Antonio Carlos Magalhães.
Publicação
Publicação no DCN2 de 27/05/1995 - Página 8885
Assunto
Outros > DIVIDA PUBLICA.
Indexação
  • DEFESA, NECESSIDADE, URGENCIA, RENEGOCIAÇÃO, DIVIDA, ESTADOS, MUNICIPIOS, RESPONSABILIDADE, GOVERNO FEDERAL, MOTIVO, REDUÇÃO, PARTICIPAÇÃO, ARRECADAÇÃO, FUNDO DE PARTICIPAÇÃO DOS MUNICIPIOS (FPM), PREJUIZO, FUNDO SOCIAL DE EMERGENCIA, AMEAÇA, INADIMPLENCIA, PREFEITURA MUNICIPAL, PAIS, AUMENTO, GRAVIDADE, PROBLEMAS BRASILEIROS, NATUREZA SOCIAL.

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB-PB. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, costumo dizer que este País é talvez o último paraíso da Terra. Trata-se de um país de gigantesco potencial, cujo povo tem calor humano, mas que conjunturalmente passa por uma fase ruim.

Há poucos dias, ouvi do próprio Presidente da República que o Brasil arrecada mensalmente cerca de R$6 bilhões e gasta, com despesas gerais - excluindo-se os Ministérios -, R$5 bilhões. Sobram, portanto, R$1 bilhão para operar os Ministérios. Com a Saúde, são gastos R$550 milhões, e sobram R$450 milhões para os demais Ministérios. Quando ouvi de Sua Excelência essas colocações, fiquei a imaginar como é grande a dificuldade de se governar um país desse tamanho com tão poucos recursos.

Ontem, o Senador Esperidião Amin falou que Santa Catarina - Estado que todos temos como modelo de desenvolvimento e de acerto, uma área do País que deu certo - não obstante o fato de arrecadar mensalmente cerca de R$170 milhões, passa por uma série de dificuldades: quebradeira de empresas, problemas com a agricultura.

O nobre Senador Pedro Simon acaba de trazer ao conhecimento desta Casa que o Rio Grande do Sul também está atravessando uma fase muito ruim. E vejam: para nós, nordestinos, para nós, brasileiros, o Rio Grande do Sul também é um Estado que deu certo, de grande agricultura, de grande pecuária, de grande industrialização, enfim, um Estado onde se verifica progresso.

Comparativamente, vou ao meu Estado, a Paraíba. Enquanto Santa Catarina arrecada mensalmente R$170 milhões e tem 5 milhões de habitantes, a Paraíba recolhe cerca de R$55 milhões ao mês e tem 3,2 milhões de habitantes.

O grande problema do meu Estado e dos demais Estados nordestinos é a dívida acumulada, dívida oriunda da época do milagre brasileiro, quando se podia tomar emprestada qualquer quantia a um custo mínimo de 6% anuais. Os árabes dispunham de muito dinheiro, o mercado internacional era farto e os empréstimos podiam ocorrer com muita facilidade.

Esses juros saltaram para 22% e exponenciaram essas dívidas. Hoje, o meu Estado deve cerca de US$1,8 bilhão. Foi feito um acordo para que pudéssemos renegociar a dívida. No primeiro momento, a renegociação da dívida ocupava 9% da nossa arrecadação. A arrecadação caiu, e a dívida passou a ocupar-lhe 11%. Veio a "crise do bicudo" e acabou com uma riqueza excepcional do Estado, o algodão. Depois, uma seca terrível reduziu o nosso rebanho a um décimo. Hoje, o pagamento da rolagem da dívida ocupa exatos 25% da nossa arrecadação. Isso é insuportável.

Como a Paraíba, a maioria dos Estados do Nordeste vive o mesmo drama: cai a arrecadação, e proporcionalmente a dívida eleva-se a níveis insuportáveis. Não sobra um centavo para investimento, razão pela qual o Estado, em vida vegetativa, mal arrecada para pagar a folha de pagamento e cumprir os compromissos como, por exemplo, o da rolagem da dívida.

Mais preocupante ainda é a situação nos municípios do meu Estado e dos demais Estados do Nordeste. Enquanto o Fundo de Participação dos Municípios, num Estado como São Paulo, ocupa 1,5% da receita, na Paraíba esse percentual sobe a 92%. Não bastasse a complexidade dessa situação, há fatores que preocupam ainda mais.

O último recenseamento do IBGE comprovou que as populações diminuíram. Segundo opinião da maioria dos prefeitos, houve interesse em diminuir, ou seja, houve arrumações prévias para que se chegasse a esse número, diminuído, de habitantes. Muitos desses prefeitos inclusive mandaram fazer pesquisas para mostrar que a população não era aquela declarada pelo IBGE, que houve até crescimento em relação ao penúltimo recenseamento.

Com o número menor de habitantes, o que aconteceu, Sr. Presidente e Srs. Senadores? Diminuiu-se o percentual de participação dos Municípios no Fundo. E o que é pior: o próprio Fundo de Participação também caiu na sua arrecadação. Hoje os municípios atravessam situação calamitosa. A arrecadação não é suficiente para pagar nem sequer os funcionários que trabalham na Educação, Saúde e demais atividades.

Alerto o Senado Federal e a Presidência da República para as conseqüências desse fenômeno: mais pessoas migrarão, mais famílias serão fragmentadas no Nordeste e, com toda a certeza, problemas sociais virão em avalanche sobre as grandes cidades do Centro-Oeste, do Sul e do Sudeste. É uma situação insustentável! Faço um alerta às autoridades, pois essa situação não pode continuar. É preciso que se encontrem soluções.

O município, Sr. Presidente, é a cellula mater de um país. O município, o burgo, a cidade precedeu até mesmo à criação do estado. Não há país que vá bem quando as partes do seu todo - os municípios - estão deteriorando e passando momentos de calamidade.

Não sei se nos outros Estados, como Pernambuco por exemplo, o fenômeno se repete, se a gritaria e a quebradeira também estão ocorrendo. Outro dia estive em Maceió e lá ouvi de Parlamentares que a situação do Estado é até pior do que a da Paraíba; sei que o Rio Grande do Norte também está vivendo dias difíceis. Sergipe, um pouco menos. Mas sei que todos os municípios estão extremamente preocupados com a queda da participação do Fundo dos Municípios. Não sei que solução vamos encontrar, mas sei que os problemas se avolumarão, principalmente daqui a alguns anos, quando esses municípios tiverem que arcar integralmente com a aposentadoria de seus funcionários.

O Sr. Antonio Carlos Valadares - Concede-me V. Exª um aparte, Senador Ney Suassuna?

O SR. NEY SUASSUNA - Com muita honra, Senador Antonio Carlos Valadares.

O Sr. Antonio Carlos Valadares - Senador Ney Suassuna, em seu discurso, V. Exª discorre, em profundidade, sobre os problemas brasileiros, enfatizando principalmente o da arrecadação da União, dos Estados e dos Municípios nessa crise avassaladora que abarca a todos e atinge diretamente os Estados mais pobres da Federação. Posso testemunhar que no Estado de Sergipe, Unidade da Federação que represento nesta Casa, a situação não é diferente da dos demais Estados que sofrem o impacto da crise, com a falta de arrecadação, com a queda do Fundo de Participação dos Estados e Municípios e com essa transferência constitucional que o Governo Federal é obrigado a fazer todos os meses. Tudo isso implica também a queda bruta de investimentos e, conseqüentemente, no desemprego e na falta de pagamento dos funcionários. Há municípios - posso dizer que, na sua grande maioria, do Nordeste - que pagam salários irrisórios, vergonhosos mesmos, na base de 50% ou até 30% do salário mínimo. Na verdade, isso é um crime cometido contra o trabalhador, que decorre justamente da inadequação entre a contratação de servidores e a receita pública municipal. De sorte que quero afiançar a V. Exª: o Brasil, efetivamente, vive um momento de dificuldades, acrescido da falta de investimentos, do aumento da taxa de juros, que impõem às indústrias muitas limitações nos seus investimentos, na contratação de pessoal, gerando desemprego, principalmente nos centros urbanos mais adiantados do nosso País. É preciso que a equipe econômica do Governo avalie essa situação, reflita, pense no Brasil, deixe de planejar e execute todas aquelas promessas que foram feitas no ano passado. Acreditamos ainda que o Presidente Fernando Henrique Cardoso está com o propósito de executar tudo aquilo que prometeu durante a campanha eleitoral. Mas as dificuldades precisam ser superadas, e são muitas. Muito obrigado a V. Exª.

O SR. NEY SUASSUNA - Obrigado a V. Exª pelo seu aparte, nobre Senador Antonio Carlos Valadares. Ouvi-o com atenção e o incorporo ao meu discurso.

Lembro a V. Exª que outro fator prejudicou ainda mais o Nordeste: o Fundo Social de Emergência. Esse Fundo tirou receita de todos os municípios e de todos os Estados. No caso dos Estados do Sul e do Sudeste, essa retirada foi de pouca monta. Mas foi grande no caso específico dos Estados nordestinos. Isso posso avaliar pelo meu Estado, onde perdemos US$17 milhões. Isso é retirar de quem não tem. Em uma arrecadação de US$55 milhões mensais, retirar-se US$17 milhões para participar de um Fundo, que, com certeza, será aplicado muito mais no Sul e no Sudeste do que no Nordeste, criará uma situação extremamente difícil.

Não bastasse isso, vem agora uma medida provisória que, se aplicada in totum, nos retirará mais US$7 milhões de uma arrecadação já magra, parca e dificultosa. Como disse, vamos ter problemas se continuarmos pagando 25% da nossa arrecadação para saldar o serviço da dívida.

Não sei como será o futuro, mas sei que, quando se aplicar essa medida provisória, o Fundo Social de Emergência, a aplicação da aposentadoria no caixa único, com toda certeza, vamos ter a quebradeira geral dos municípios do interior. E são essas instituições dos municípios que ainda retêm uma grande quantidade de pessoas. Isso significará uma avalanche de migrantes sobre as grandes cidades, aumentando os problemas de infra-estrutura, de violência e tantos outros mais.

Por isso, deixo, desta Tribuna, um alerta aos Srs. Parlamentares, ao Presidente Fernando Henrique Cardoso, ao Ministro Pedro Malan, ao Ministro José Serra. S. Exªs, que têm as rédeas de toda a política econômica, não devem descuidar dos municípios, principalmente nordestinos, porque, com a queda precipitada da arrecadação do Fundo de Participação dos Municípios, eles estão vivendo dias de calamidade. Está se tornando inviável manter as prefeituras do interior. E, ainda mais, se não fizermos a renegociação da dívida, dando um prazo maior, daqui a pouco também estarão em situação falimentar muitos Estados da Federação.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente, deixando aqui o alerta que salvem as nossas prefeituras, cellula mater deste País, e a economia de Estados, que hoje estão marchando para o caos, se não for reformulada a política econômica do País! Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 27/05/1995 - Página 8885