Discurso no Senado Federal

DEGRADAÇÃO DO SISTEMA PREVIDENCIARIO BRASILEIRO.

Autor
Epitácio Cafeteira (PPR - Partido Progressista Reformador/MA)
Nome completo: Epitácio Cafeteira Afonso Pereira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PREVIDENCIA SOCIAL.:
  • DEGRADAÇÃO DO SISTEMA PREVIDENCIARIO BRASILEIRO.
Publicação
Publicação no DCN2 de 25/05/1995 - Página 8675
Assunto
Outros > PREVIDENCIA SOCIAL.
Indexação
  • COMENTARIO, ANTERIORIDADE, ORADOR, ADVERTENCIA, ALTERAÇÃO, SISTEMA, CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIARIA, RESPONSABILIDADE, EMPRESA, OBJETIVO, TRANSFERENCIA, INCIDENCIA, FOLHA DE PAGAMENTO, FATURAMENTO, REDUÇÃO, PERCENTAGEM, CONTRIBUIÇÃO, TRABALHADOR, CONSOLIDAÇÃO, SEGURIDADE SOCIAL.
  • ANALISE, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, PREVIDENCIA SOCIAL, RESULTADO, IRREGULARIDADE, RETIRADA, GOVERNO, RECURSOS, RESERVA TECNICA, TRABALHADOR, FINANCIAMENTO, OBRA PUBLICA, CORRUPÇÃO, ADMINISTRAÇÃO.
  • APRESENTAÇÃO, TABELA, DEMONSTRAÇÃO, VIABILIDADE, EFICIENCIA, SISTEMA, PREVIDENCIA SOCIAL, NECESSIDADE, CORREÇÃO, APLICAÇÃO, RECURSOS.

O SR. EPITACIO CAFETEIRA (PPR-MA. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, desde 1979, quando ocupava uma cadeira na Câmara dos Deputados, venho alertando para que se implante no País um sólido sistema de Seguridade Social, e não apenas uma estrutura frágil de benefícios previdenciários hesitantes e esporádicos.

Em novembro daquele ano, fixava-me no problema da abrangência - à época muito restrita - e no da incidência, que pesava exclusivamente sobre a folha de pagamento das empresas, isto é, empregados e empregadores. Sugeria, então, o abarcamento dos trabalhadores em geral - aí incluídos os trabalhadores rurais e até os desempregados - como beneficiários, e a transferência dos encargos da incidência de receita para o faturamento, pois já entendia que caminhávamos para a automação em detrimento da mão-de-obra humana.

Dizia eu, à época: "A Previdência Social, abrangendo apenas os contribuintes, funciona como uma companhia de Seguro Social evidentemente restrita. É necessário, portanto, a alteração do sistema de contribuição previdenciária a cargo das empresas, objetivando transferir a sua incidência da folha de salários para o faturamento, reduzindo ainda em 50% a contribuição direta do trabalhador".

Tudo o que vinha preconizando sobre a necessidade da criação de uma Seguridade Social com receitas abrangentes de toda a sociedade foi inscrito em 1988 em nossa Carta Magna. O que peço hoje é que seja cumprida a diretriz constitucional que estabelece a diferenciação entre Saúde e Previdência Social, diferenciando, também, os recursos para cada área e associando esta última, e somente ela, às contribuições para os planos previdenciários.

O problema da Previdência Social brasileira não data de hoje. Podemos fixar o ponto de partida para a sua gradativa deterioração na unificação dos grandes institutos. Até então, cada categoria profissional tinha sua própria estrutura previdenciária voltada e gerida exclusivamente para seu benefício, o que possibilitava, além de tudo, uma proximidade entre administração e beneficiários, permitindo, assim, um controle e fiscalização permanentes.

Houve, realmente, um alargamento da abrangência quando o Governo Federal resolveu quitar a sua dívida para com o trabalhador rural, pagando-lhe uma aposentadoria. Mas o fez utilizando a reserva técnica do trabalhador urbano, que era quem havia contribuído. Não se teve, até hoje, a menor preocupação - à exceção do FINSOCIAL - em redimensionar a incidência. O sistema previdenciário, até então funcional, mais ou menos ágil e confiável, foi modificado para respaldar o Poder Público em suas obrigações sociais.

Há muito tempo o Governo Federal, de forma indevida e sem qualquer respaldo jurídico, recorre às reservas técnicas da Previdência Social, retirando recursos talvez a título de empréstimo, o que seria até saudável se houvesse pelo menos correção do dinheiro utilizado para financiar obras. Se formos exemplificar, citaremos apenas as de maior vulto, como a Transamazônica, a construção de Brasília, a Ponte Rio-Niterói, Itaipu, etc. Essas obras significaram um investimento sem qualquer retorno do dinheiro que representava, na Previdência Social, as reservas técnicas dos trabalhadores brasileiros.

Apesar de tudo isso, ainda havia muito dinheiro na Previdência e, na falta de uma administração eficiente e honesta, surgiram as quadrilhas que assaltaram e ainda assaltam os seus cofres.

Se resumirmos o que aconteceu, podemos dizer, com toda segurança, que a abrangência da Seguridade Social foi estendida, atingindo, no que tange à saúde, praticamente a totalidade da população, mas a incidência continuou e continua a mesma, contribuindo para ela apenas uma pequena parcela de trabalhadores e empregadores.

Não há como falarmos em reforma da Previdência quando no INSS não existe nenhuma reserva técnica para encarar o futuro.

O quadro hoje apresenta-se da seguinte forma: paga-se de acordo com o que se recebe, sem qualquer reserva, sem caixa. É, portanto, uma situação insustentável a da Previdência, que, certamente, estrangular-se-á em muito pouco tempo. Tudo isso porque as contribuições de todos esses anos, que seriam as reservas técnicas, como já demonstrado, saíram pelo ralo. A Previdência Social no Brasil está na UTI, descerebrada, em fase terminal, levando uma vida apenas vegetativa.

Remédio para curar o enfermo, todos sabemos, não existe, e a solução para a manutenção dessa vida aparente ou sobrevida é colocar mais um tubo de oxigênio ou aumentar o número de transfusões de sangue e alimentos. No caso da Previdência, isso significa aumentar o percentual de contribuição, cobrar dívidas de Estados e prefeituras, acionar empresas, etc., sempre com a intenção de protelar o atestado de óbito.

Não será diminuindo a despesa com a aposentadoria por tempo de serviço que se resolverá o problema. Isto representaria um recuo nas conquistas sociais. A solução é mudar a incidência, de tal forma que toda a sociedade contribua, para ser, toda ela, também, beneficiada.

Previdência Social que atenda apenas os seus contribuintes é perfeitamente executável. Prova disso são os fundos de pensão, que pelo seu vigor econômico e financeiro estão hoje participando ativamente dos leilões de privatização.

Cálculos atuariais atestam que é possível uma aposentadoria por tempo de serviço com contribuições mensais em percentuais muito inferiores aos que hoje são cobrados e com benefícios superiores aos que são pagos atualmente pelo INSS.

Apresento, anexadas a este pronunciamento, para exame de V. Exªs, duas tabelas calculadas atuarialmente, que permitem demonstrar a viabilidade e a simplicidade de um sistema tecnicamente elaborado, capaz de sobreviver sem qualquer necessidade de peripécias ou artifícios.

Os Srs. Senadores poderão verificar na Tabela I que o custo total de uma aposentadoria para um trabalhador que pretenda aposentar-se aos 60 anos de idade e tenha ingressado no mercado de trabalho aos 25 anos, contribuindo, portanto, durante 35 anos, é de aproximadamente 7,74% (sete vírgula setenta e quatro por cento) sobre o seu salário mensal, já incluso o custo administrativo de 10% (dez por cento). Se repartido igualmente entre empregador e trabalhador, o custo redundaria em 3,87 (três vírgula oitenta e sete por cento) para cada um - muito inferior a qualquer percentual até hoje cobrado pela Previdência Social.

Atentem para o fato de que em nenhum momento considerou-se a participação do Governo neste cálculo.

Outro exemplo seria aquele de um indivíduo que começasse a contribuir aos 40 anos de idade e desejasse aposentar-se aos 65, trabalhando tão somente 25 anos. Os cálculos atuariais indicariam a necessidade de uma contribuição total de 12,84% (doze vírgula oitenta e quatro por cento) do seu salário mensal, também já incluso o percentual de 10% a título de taxa de administração. Se houvesse contribuição solidária entre trabalhador e empregador teríamos, para cada um, a necessidade do aporte de 6,42% (seis vírgula quarenta e dois por cento). Sem a participação do Governo!

Verificando a Tabela II, constata-se que um indivíduo que começasse a contribuir para a Previdência aos 25 anos de idade, dispondo da taxa atualmente em vigor, que perfaz entre empregado e empregador o custo total de 20% sobre o seu salário, deveria receber, ao final de 30 anos de serviço, uma aposentadoria no valor de R$151,18 (cento e cinqüenta e um reais e dezoito centavos.)

O que se deduz, Srªs e Srs. Senadores, do exame destas tabelas é a exeqüibilidade de um sistema previdenciário eficiente, desde que os recursos recolhidos sejam corretamente aplicados.

É claro que os cálculos apresentados configuram uma situação hipotética ideal, que se enquadraria perfeitamente em nosso sistema previdenciário se, e somente se, Sr. Presidente, o tivéssemos concreto e saneado. Infelizmente, não é isso o que ocorre.

É importante ressaltar que todos os contribuintes têm que ser tratados de forma igualitária, sejam eles trabalhadores ou funcionários públicos civis ou militares, o que também hoje não ocorre.

O Governo precisa entender que militar não se aposenta. Militar vai para a reserva. Militar não é apenas funcionário público, mas está permanentemente a serviço da Pátria. Mesmo na reserva, o militar continua subordinado ao Regulamento Disciplinar, podendo ser preso por suas palavras e atos. Com essa subordinação, o militar da reserva teria que necessariamente continuar na folha de pagamento do seu Ministério.

Como se imagina ser possível um sistema previdenciário que aposenta: a) trabalhadores calculando-se uma média de suas 36 últimas contribuições; b) funcionários públicos civis com salários integrais, ou até mesmo vantagens anteriores; c) militares que, acidentados em serviço, vão imediatamente para a reserva com salários integrais?

Ora, são três tipos de aposentadorias diferentes. Enquanto o funcionário público é aposentado com todo o seu salário, o trabalhador comum tem que se aposentar com a média das 36 últimas contribuições. O militar, como disse, continua a serviço da Pátria, subordinado ao regime disciplinar. Há, no interior, um ditado popular que diz: "Quem come do meu pirão experimenta do meu cinturão". O militar continua a experimentar do cinturão, sem comer do pirão do Governo. Ele tem as obrigações de um militar da ativa, mas recebe como aposentado.

Nosso desejo, Sr. Presidente, não é criticar o Governo que aí está, até porque ele apenas herdou essa situação. Queremos é que os que assessoram o Presidente conscientizem-no dessas verdades e apresentem projetos lúcidos, que resolvam tão angustiante problema sem ferir o direito e a expectativa de direito do trabalhador brasileiro.

Já disse pessoalmente ao Presidente da República que não votarei favoravelmente às propostas de reforma da Previdência, porque não se pode reformar o que simplesmente não existe.

Modificar agora o sistema de aposentadorias é uma agressão aos direitos adquiridos dos que já vêm contribuindo para a Previdência Social. O Governo gastou os recursos de tantos anos de contribuição dos trabalhadores e quer agora, por derradeiro, tirar deles a esperança?

Isso seria desumano. Não podemos destruir um sonho acalentado por toda uma existência. O trabalhador deve continuar a ter o direito a aposentar-se por tempo de serviço e a viver dignamente, cedendo seu lugar aos jovens no mercado de trabalho.

Respeitemos os que, com dignidade, têm encanecido trabalhando pelo Brasil.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é de se meditar. Hoje, os aposentados não dependem da Previdência, porque ela não mais existe. Hoje, para receberem a sua aposentadoria, os trabalhadores dependem é de uma providência. Não estou falando de providência divina, mas da providência que o Governo - Executivo e Legislativo - toma para que haja arrecadação suficiente para cobrir a folha de pagamento dos aposentados.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 25/05/1995 - Página 8675