Discurso no Senado Federal

NECESSIDADE URGENCIA DE BAIXA NAS TAXAS DE JUROS.

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
  • NECESSIDADE URGENCIA DE BAIXA NAS TAXAS DE JUROS.
Aparteantes
Casildo Maldaner, Edison Lobão, José Roberto Arruda, Lauro Campos, Sérgio Machado.
Publicação
Publicação no DCN2 de 03/06/1995 - Página 9410
Assunto
Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
Indexação
  • DEFESA, APROVAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, REGULAMENTAÇÃO, DECRETO LEI FEDERAL, CONTROLE, TAXAS, JUROS, PAIS, RELAÇÃO, MERCADO, BENS, MERCADORIA, AUMENTO, PREÇO, PROPORCIONALIDADE, IMPOSTO SOBRE PRODUTOS INDUSTRIALIZADOS (IPI).

O SR. PEDRO SIMON (PMDB-RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, o assunto continua atual, embora não se tenha ainda um encaminhamento de como vai ser a saída. Consegui com os Líderes pedir urgência para que, na próxima semana, possamos votar aqui no Senado o projeto de minha autoria com relação ao IPI.

Durante toda a semana, todas as manchetes dos jornais noticiam que há uma unanimidade: os juros têm que baixar. O Governador de São Paulo, o Sr. Mário Covas, diz que uma das mágoas que tem com relação à hora em que estamos vivendo é o exagero dos juros.

A imprensa publica que, em reunião com o Presidente da República, os Governadores do PSDB afirmam que há um exagero na taxa de juros.

O Governo de São Paulo observa que, se vender todas as estatais de São Paulo e que se a situação ficar igual, não tem condições de pagar os juros da dívida de São Paulo.

Dizem que uma das causas da queda do Sr. Pérsio Arida seria a de que ele estava absolutamente inflexível e que não admitia a queda dos juros e que defenderia a tese de que taxas altas seriam necessárias para garantir que o crescimento da demanda não atingisse o Plano Real.

Ora, Sr. Presidente, tenho debatido e tenho vindo a esta tribuna e tenho mandado cópias do meu projeto, mas não tenho conseguido que o debate atinja setores ligados à imprensa. Não sei! A verdade é que, com a urgência pedida, creio que poderemos votar essa matéria para que seja enviada à Câmara dos Deputados e venha à atenção do Governo Federal.

É muito singelo o que tenho a dizer. O Governo brasileiro, tendo o Sr. Fernando Henrique Cardoso como Ministro da Fazenda e o Sr. Itamar Franco como Presidente da República, conseguiu lançar um plano com resultados altamente importantes.

Há uma diferença entre o Plano Real, o Plano Cruzado, o Plano Maílson, o Plano Verão, o Plano Bresser e o Plano Collor. Os chamados planos de salvação da economia brasileira eram todos baseados em regras que determinavam alteração profunda na ordem da realidade do dia a dia da economia. Congelavam salários e congelavam preços.

Afirmam todos os técnicos de economia, principalmente os da economia liberal, que os resultados eram fictícios e eram provisórios, porque congelavam-se os preços e os salários mas as demandas se acumulavam e lá adiante explodiam e voltava tudo à estaca zero.

Na verdade isso aconteceu, aconteceu com o Plano Cruzado, aconteceu com o Plano Bresser. E a inflação aumentou, a inflação continuou, a inflação voltou e os problemas continuaram.

O que diferencia o Plano Real dos demais planos é que ele não congelou salários ou preços, não foi baixado por medida provisória, nem por decreto. Foi um projeto de lei enviado pelo Presidente Itamar Franco a esta Casa. Justiça seja feita ao Ministro da Fazenda, Fernando Henrique Cardoso: veio dezenas de vezes à esta Casa, Câmara e Senado. E o Plano Real recebeu uma série imensa de emendas do Congresso Nacional, emendas profundas. Cerca de 59 emendas foram votadas ao Plano Real. Tanto que eu, à época Líder do Governo, dizia na hora da votação aqui no Senado: "Este é um projeto nosso. A diferença desse projeto dos anteriores é que não estamos aqui com a coisa julgada, estamos alterando". O projeto enviado ao Congresso cortava verbas dos Estados e Municípios. A Câmara não aceitou, alterando-o profundamente. Essas alterações aconteceram, o Plano Real foi aprovado e deu certo.

Já não era mais Líder do Governo o candidato ao Senado por Pernambuco, Roberto Freire, e criticava duramente o PT: "Mas é uma política errada essa do Lula de ir para televisão e combater o Plano Real, de afirmar que o Plano Real está errado e que vai dar tudo errado e de lançar responsabilidade sobre o Fernando Henrique."

Dizia, ainda, Roberto Freire: "Eu acho que o Plano Real é bom. Vai dar certo. O Plano Real é do Congresso. Eu era Líder do Governo e tenho tanta responsabilidade e crédito no Plano Real como tem o Senhor Fernando Henrique Cardoso". E elegeu-se Senador. O Plano Real, repito, teve o apoio da Casa e está dando certo.

Mas o que fez o Plano Real? Sem congelar e sem achatar os salários, reduziu uma inflação de 50% para 3%. Isso aconteceu até novembro, na época do segundo turno das eleições. Estamos no mês de junho e continua acontecendo. E olhem que o Presidente Fernando Henrique teve um início de governo tumultuado, difícil, complicado; mas o seu plano de estabilização continua.

Junto com o Plano Real e com uma inflação que baixou de 50 para 3%, o Governo adotou uma medida fantástica: através de medida provisória, fez com que a nossa moeda valesse mais do que o dólar. E, hoje, o Real vale mais do que o dólar.

Eu me lembro das acusações feitas durante a campanha eleitoral, duras e dramáticas, ao Sr. Itamar Franco e ao Sr. Fernando Henrique. Diziam: "Isso é demagogia, isso é ridículo; vão gastar os US$40 bilhões das reservas cambiais para manter o dólar valendo um real. E, terminada a eleição, vão ficar sem nada"!

Confesso que também estava assustado, porque não imaginava que um dólar valesse um real; mas um dólar vale R$0,85.

O Governo não gastou até a eleição e não gastou até hoje as reservas para manter o dólar e o real no câmbio em que estão. Gastou algumas reservas num equívoco que cometeu quando abriu exageradamente para as importações. Passamos a importar US$4 bilhões; muitas mercadorias em bugigangas desnecessárias. Erro grave, quando tentou, é verdade, equacionar a inflação para que não aumentasse. Por isso, importou até desnecessariamente.

Nesse instante, o Governo gastou divisas, mas não teve que gastar para manter o valor do real.

Então, Sr. Presidente, estamos vivendo uma situação fantástica! Por medida provisória, o Governo estabeleceu normas e este País baixou a inflação; por medida provisória, por uma decisão de Governo, a nossa moeda, que não valia nada, hoje, ainda que provisoriamente, vale mais do que o dólar. E os juros continuam em 18%. Não se mexe nos juros! Quer dizer, quando a inflação era de 50%, não havia como deixar de dizer que os juros tinham que ser altos; quando a nossa moeda não valia nada, quando o Cruzeiro não valia nada, os juros tinham que ser altos. Mas, agora, a nossa moeda é forte, e a inflação é de 3%.

Qualquer um de nós que vai ao banco e deposita dinheiro na poupança ou aplica em títulos da dívida recebe de juros 4%; e, na hora de cobrar os juros, são de 18%. Isso é maluquice, Sr. Presidente! O argumento do Governo para essa situação é o seguinte: "Os juros têm que ser altos porque senão estoura o Plano Real".

Ontem, o Ministro da Fazenda disse na televisão, com todas as letras: "Coloquem o dinheiro na poupança. Aproveitem que os juros estão altos. Não comprem! Poupem!

Quer dizer, o Ministro da Fazenda vai à televisão estimular, de certa forma, que apliquemos na ciranda financeira. Essa foi a essência do pronunciamento de S. Exª: não comprem! Poupem! Os juros estão bons!

O Governo teme a procura exagerada, o aumento da demanda, porque o Brasil não pode acompanhar.

Diz o Ministro Serra - e tem razão - que o Brasil está crescendo a uma taxa de 5%, sendo que não tem condições de infra-estrutura, por enquanto, de crescer mais do que isso. O Brasil tem que adaptar o consumo às taxas de fornecimento, às taxas de crescimento. E isso só é possível via juros.

Sr. Presidente, é em relação a esse aspecto que apresento o meu projeto. Penso que o Governo pode conseguir o mesmo sem lançar mão da faixa de juros.

Em primeiro lugar, temos o Decreto-Lei nº 1.199, de 27 de dezembro de 1971:

      O Poder Executivo, em relação ao Imposto sobre Produtos Industrializados, quando se torne necessário atingir os objetivos da política econômica governamental, mantida a seletividade, em função da essencialidade do produto ou ainda para corrigir distorções, fica autorizado:

A) reduzir a alíquota até zero;

      B) majorar a alíquota acrescendo até 30 unidades no percentual de incidência fixado na lei;

      C) alterar a base de cálculo em relação a determinados produtos, podendo, para esse fim, fixar o valor tributável mínimo;

Isso já é lei, isso já existe. O Governo poderia estar aplicando essa taxa.

Meu projeto regulamenta essa matéria para a hora que estamos vivendo. O que diz o meu projeto?

      Fica criada uma alíquota adicional - que, aliás, já está criada, só que especifico sua finalidade -, o IPI, na Lei nº 4.502, de 30 de dezembro, com a função de regular o mercado de bens e mercadorias;

      Art. 2º. As alíquotas serão variáveis e incidirão sobre os bens e mercadorias escassos ou no caso em que o volume ofertado esteja aquém do volume demandado no mercado;

      Art. 3º. Fica o Poder Executivo autorizado a alterar as alíquotas adicionais de IPI sempre que necessário, para adequar a produção à comercialização e ao consumo, evitando a elevação de preços artificiais ou especulativos;

      Art. 4º. As câmaras setoriais terão a tarefa de observar o mercado e propor as alíquotas a serem adotadas ou alteradas, com o objetivo de regular o mercado de produção e consumo;

Em outras palavras, Sr. Presidente, diz o Governo que não pode baixar os juros porque, se o fizer, todos correrão para comprar televisão e a situação chegará ao mercado negro; e dá o exemplo do ano passado.

O Brasil, em 1993, produziu e vendeu 2.300.000 televisões; em 1994, produziu e vendeu 4.300.000 televisões; e, no fim de outubro e início de novembro, não tinha mais como produzir, nem importar o produto, porque, inclusive em nível internacional, não havia mais algumas peças e não tinham como chegar. O preço iria à loucura.

Muito bem! Aumenta-se o IPI. Coloca-se um preço bem alto no produto e ele não poderá ser comprado. Aumentando o IPI no preço da televisão, há duas saídas: primeiro, diminuirá o consumo, e o cidadão não poderá comprar, porque não se trata de mercado negro, o preço é que foi lá para cima; segundo, porque esse é o objetivo.

Alertem os produtores e as fábricas: vamos produzir! Não estou defendendo a tese de que, faltou mercadoria, o preço subirá e permanecerá alto.

É por isso que estou entregando o assunto à câmara setorial. É um chamamento aos produtores: produzam mais, porque falta! No momento em que os produtores voltarem para a câmara setorial e disserem: "Olha, está sobrando televisão", baixará o IPI novamente.

O Governo controla o consumo mediante juros altos para a compra de qualquer produto, para todos - para quem pode e para quem não pode -, fazendo com que o dinheiro fique no Banco. Vamos aumentar o IPI para controlar o consumo, porque, em primeiro lugar, o dinheiro ficará com o Governo. Em segundo lugar, o Governo poderá exercer um controle, aumentar esse imposto apenas sobre os produtos que sofrem maior demanda, na hora em que houver necessidade.

Sr. Presidente, essa proposta foi apresentada pelo Professor Antônio Barros de Castro, ex-Presidente do BNDES, em entrevista publicada no O Estado de S. Paulo, de 21 de maio de 1995. Foi ele que fez essa proposta; foi ele que disse que é absurdo controlar o consumo através da elevação da taxa de juros; e foi ele que propôs o aumento do IPI para resolver essa questão.

Enviei esse projeto ao Presidente da República, ao Ministro da Fazenda, ao Ministro do Planejamento e Orçamento, ao Presidente do Banco do Brasil, ao Presidente do Banco Central, ao Presidente do BNDES, e não tive resposta. Por essa razão, volto à tribuna: chamar a atenção para esse mesmo detalhe.

Acredito, Sr. Presidente, que o Brasil está atravessando um momento importante. Estamos conseguindo, apesar dos pesares, manter uma inflação em 3%; estamos conseguindo, apesar dos pesares, manter forte a nossa moeda.

Estamos enfrentando problemas sérios; o Estado do Rio Grande do Sul enfrenta problemas sérios na área da produção de vinhos, de sapatos em Novo Hamburgo. Trata-se de verdadeiros dramas, para os quais o Governo - vamos fazer justiça - está tentando criar soluções. Mas a questão dos juros altos não pode continuar, porque é ridícula.

Como bem disse o Senador Amin, muda governo, altera governo, e ninguém consegue mexer com o setor dos banqueiros. Era assim no governo do Sr. João Goulart, era assim no governo do Sr. Getúlio Vargas, era assim no governo do Sr. Juscelino, era assim nos governos militares, era assim - acompanhei - no governo do Sr. Itamar Franco. Assisti à guerra, à angústia, à ânsia de S. Exª em abaixar a taxa de juros. S. Exª demitia os Ministros quando não faziam isso, mas não adiantava. Agora, assisto ao desenrolar da mesma questão.

Repito, porém, que não há, neste momento, resposta para esta situação: se a inflação é de 3%; se meu dinheiro vale mais que o dólar; se recebo do Banco, quando aplico meu dinheiro na poupança, 4% de correção, por que me cobram 16%, 17%? A título de quê? E o Governo ainda alega que faz isso para proteger o consumo, para evitar-lhe o crescimento. Ora, que o Governo traga um argumento que tenha um pouco mais de racionalidade.

O meu projeto, modéstia à parte, toca na ferida. Temos que controlar o mercado? Temos. Não pode explodir a demanda, todo mundo saindo a comprar, havendo um consumismo. Se isso acontecer, os preços vão para a lua. E o que se deve fazer nesse caso? Aumentar o IPI: ao invés de valer 10, vai valer 20. Assim, o consumo dos produtos que sofreram aumento de IPI vai diminuir, e o dinheiro vai ficar para o Governo, não para os bancos. Não se trata - repito - de medida generalizada; só deve ocorrer onde for necessário. O produto cuja demanda não tiver a oferta correspondente sofrerá aumento de IPI.

Na verdade, os juros que se pagam se refletem na inflação, na queda do poder aquisitivo. Senadores que, como eu, tiveram que pagar pelos seus créditos especiais juros de 16% a 17% sofreram influência no seu poder aquisitivo? Sim. Houve uma verba "x" acrescida à sua despesa.

O Sr. Casildo Maldaner - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. PEDRO SIMON - Ouço V. Exª com muito prazer.

O Sr. Casildo Maldaner - Senador Pedro Simon, V. Exª cada vez mais conta com a admiração de todos nós, vez que tem o privilégio de uma sensibilidade extraordinária. V. Exª sente, mediante o contato com as bases, como estão os setores dali e de lá. Há poucos dias, abordava V. Exª a situação dramática em que vive o setor calçadista no Rio Grande do Sul e, por extensão, no Brasil inteiro. Em relação a todos os setores, V. Exª sempre aborda temas importantíssimos. A taxa de inflação era de 50%, 40% ao mês; desceu para cerca de 3%, mas não foi acompanhada pela queda dos juros, o que representa um problema para todos. Houve agora a proposta de uma solução, que não sei até onde vai.

O SR. PEDRO SIMON - Solução não houve. Tivemos um início de diálogo para buscar a solução.

O Sr. Casildo Maldaner - Quando o setor calçadista recebe um real, por exemplo, para investimento, receberá também do BNDES um real para capital de giro. Agora, não sei até onde vai essa solução, visto que os juros estão altos. Não sei se essas empresas poderão dar a volta. Não será fácil. A proposta de V. Exª é interessante. Existe um ditado que diz que há sete anos de vacas gordas e sete anos de vacas magras. Se um determinado setor produtivo vive a época das vacas gordas, por que não ocorre a participação maior desse setor no IPI, ou seja, por que esse setor não recolhe um valor maior de IPI? Nesse caso, seria criado um fundo, junto ao Governo, que reteria esse dinheiro. Quando chegasse a época das vacas magras para esse setor produtivo, haveria, via fundo, um incentivo para essa área. Esse fundo serviria, portanto, para salvar o setor, a produção, o emprego, a rentabilidade, evitando que famílias ficassem ao desalento. Creio que poderíamos fazer - até por câmaras setoriais, segundo V. Exª - essa análise muito criteriosa. A meu ver, a idéia é interessantíssima, porque temos vários setores que passam momentos difíceis e, mediante o IPI, poderemos ajudá-los. Quando esses setores viverem os momentos bons, contribuirão também com o fundo. Dessa forma, os juros não iriam propiciar o lucro dos banqueiros e de outros setores que não interessam à Nação. No momento em que a Nação entender, em que o Governo compreender a idéia que V. Exª apresenta e os seus objetivos, teremos um real estabilizado. Hoje, com esses juros, até a estabilidade do real é meio fictícia, porque quem segura o real, de certo modo, são os juros. A partir do momento em que colocarmos isso em ordem, teremos uma nação muito mais estabilizada.

O SR. PEDRO SIMON - Agradeço a V. Exª pelo oportuno aparte. Santa Catarina, a rigor, enfrenta, sente e vive os mesmos problemas que temos no Rio Grande do Sul.

No Rio Grande do Sul, os Prefeitos de 115 municípios decretaram estado de calamidade. A argumentação deles é exatamente a de que a comunidade não pode mais pagar o exagero das taxas de juros e a de que os bancos estão executando os produtores. Essa seria uma forma de protestar, na tentativa de que, decretando que as áreas rurais são de utilidade pública, se evite que os bancos terminem acionando e confiscando as máquinas e terras.

Em Brasília, nesta semana, fizeram uma paralisação generalizada do comércio, protestando contra a política do Governo, que é, via altas taxas de juros, paralisar tudo. Concordo. Não sou tão ingênuo a ponto de não entender a importância da tese do Ministro do Planejamento e Orçamento, José Serra, que diz: "Nós temos que ter cuidado".

O Brasil tem que fazer crescer sua produção de energia elétrica, tem que melhorar suas estradas, tem que melhorar sua capacidade de produzir, para que possamos crescer num percentual "x"; e o consumo deve acompanhar esse crescimento. Não adianta todos consumirem se não há produção. Seria o caos.

Só que, a meu ver, isso não precisa ser feito via aumento de taxas de juros, processo mediante o qual os banqueiros, mais uma vez, dão as regras e normas. Se a moeda é estável, é estável. A moeda está firme? Está firme. A inflação é de 2%? É de 2%. E os juros devem ser de 2%. "Ah, mas aí vai haver uma corrida de gente querendo comprar". Entra o Governo e aumenta quanto quiser a taxa de IPI sobre o produto que for necessário.

V. Exª, Senador Casildo Maldaner, levanta uma questão muito interessante: esse acréscimo do IPI ficar em um determinado fundo para, exatamente, ser sanado. Essa tese levantada pelo Senador Casildo Maldaner é da maior importância! Essas verbas do IPI, fruto do aumento de preços para evitar o exagero de consumo, vai constituir um fundo determinado para regulamentar essa matéria. Lá adiante, se for o caso, quando tiver que baixar o IPI, porque é necessário, aquele dinheiro pode servir de compensação para o aumento que for dado. Aumentou o IPI? Aumentou. Pegue esse dinheiro e o coloque no fundo. Ah, depois teve que baixar! E aí como é que fica? Pegue esse dinheiro e o entregue para a empresa para estimular a produção. Pode ser feito? Pode ser feito.

Ora, Sr. Presidente, perdoe-me a sinceridade. Já fui Governo e tenho muito respeito por ele, mas sei que essa área técnica é muito vaidosa de si, ela se valoriza muito e não leva a classe política muito a sério. Ela ouve os nossos discursos e vê as nossas propostas. Muitas vezes, no Governo do Sr. Itamar Franco, tive que reagir contra a classe dos tecnocratas, porque, quando fazemos propostas, eles nos olham com um certo deboche. O máximo que fazem é achar que somos bem-intencionados, porque o normal é acharem que não entendemos nada, que são propostas demagógicas, populistas, sem nenhum conteúdo. Por isso, dei nota 10 para o desempenho do Ministro Fernando Henrique Cardoso. Dei nota 10! Acompanhei várias vezes o Ministro Fernando Henrique Cardoso em reuniões com o Presidente Itamar - eu como seu Líder. O Sr. Fernando Henrique Cardoso, Ministro da Fazenda, surpreendeu-me, porque eu estava acostumado a vê-lo como sociólogo, como intelectual, como Senador da República. Era um homem simpático que raramente dizia "não". Geralmente, em seus pronunciamentos desta tribuna, Sua Excelência concordava em que déssemos apartes. No Ministério da Fazenda, o Ministro Fernando Henrique Cardoso foi de uma firmeza nota 1.000. Nas reuniões na Câmara, no Senado e no Congresso Nacional, Sua Excelência veio e soube dizer "não" para muita coisa: "isso não dá" ou "isso é demagogia".

Sou testemunha de que o Senhor Fernando Henrique Cardoso, como Ministro da Fazenda e como autor do Plano, jamais tomou uma medida pensando na Presidência da República. Tomou várias medidas, muitas antipáticas, amplamente antipáticas. Lembro-me de que, quando debatíamos aqui a respeito do aumento do salário mínimo para US$100,00 na época, o ex-Senador Mário Covas falava a favor do IPMF. Lembro-me de que a tribuna de honra estava lotada; a Federação das Indústrias de São Paulo e a CUT, de mãos dadas, nos esculhambando; mas o Ministro Fernando Henrique Cardoso manteve sua posição, e nós mantivemos. Eram idéias altamente antipáticas. Ali o Fernando Henrique Cardoso que conheci era o homem que tinha montado uma equipe técnica, mas era também o sociólogo. A meu ver, o Senhor Presidente Fernando Henrique Cardoso economista tem que manter um pouquinho do sociólogo. Sua Excelência está ali juntamente com tecnocratas, com técnicos, com economistas e com números; mas, com todo respeito e carinho, prefiro ver o sociólogo na Presidência da República do que o economista, porque, com a profundidade e competência do sociólogo, Sua Excelência vai ouvir, sim, os economistas, como os Ministros José Serra e Pedro Malan, mas vai dar às questões econômicas o seu devido peso.

Por isso, endereço o meu projeto de lei ao sociólogo Fernando Henrique Cardoso, porque, sinceramente, não consigo entender que uma pessoa como Sua Excelência não esteja atento a este detalhe: o Brasil tem a taxa de juros mais alta do mundo! A nossa inflação não é a mais alta do mundo; há poucas moedas no mundo que valem mais que o dólar, como o real está valendo. Portanto, se a nossa inflação está baixa, em torno de 3%, se a nossa moeda é forte, se quando poupamos eles nos dão 4% de juros, por que, quando nos emprestam, eles querem 18%?

O Sr. Lauro Campos - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. PEDRO SIMON - Ouço V. Exª, com o maior prazer.

O Sr. Lauro Campos - Quero, de início, Senador Pedro Simon, declarar que estou de acordo com a proposta de V. Exª, e esta minha posição não é de agora. A minha admiração é que cresceu agora, mas o meu acordo é antigo. Quero dizer a V. Exª que o neoclássico mais vendido no mundo, como autor de livros de introdução à economia, Paul Samuelson, já comparava e igualava a taxa de juros ao imposto, principalmente em relação ao efeito que V. Exª, com tanto brilhantismo, acaba de enfatizar. Por que não viram isso? Por que não realizaram isso? Por que, ao invés de deixar que o achatamento do consumo seja feito através do beneficiamento dos banqueiros, aumentando a taxa de juros, o Governo não canaliza para ele esse dinheiro, essa redução da renda disponível do consumidor? Isso é óbvio. A minha tese de Catedrático em Economia, chamada "Inflação, Ideologia e Realidade", foi aprovada, em primeiro lugar, entre outras pessoas, pelo eminente Ministro Oscar Dias Correa. Nela, eu mostrava as minhas preocupações em relação ao processo inflacionário e previa que, um dia, a dinâmica inflacionária se encerraria. A inflação que reduz salário, a inflação que aumenta o lucro, a inflação que permite que a bancocracia se aproprie de grande parte do produto nacional, a inflação que resulta das emissões que esse Executivo, fantasticamente despótico, realizou durante décadas, essa inflação que reduz o consumo interno e aumenta as exportações, transferindo riqueza real líquida para o exterior, essa dinâmica inflacionária contraditória iria esbarrar, um dia, nos seus limites. E o dia em que a inflação não fosse mais o elixir a que o Lord Keynes se refere, qual seria a solução no lugar da inflação? A inflação virou problema, mas não era problema. Foi através da inflação que começou o capitalismo no mundo, de acordo com Marx e com Lord Keynes. Dizem eles que foi devido ao fluxo de ouro que veio do Novo Mundo para o Velho que se verificou a inflação dos séculos XVI e XVII, iniciando-se, aí, a Nova Era, the New Age. Então, desde o princípio, a inflação tem servido de estímulo ao processo de acumulação e à dinâmica contraditória do capitalismo, que se encerra agora. O que se pretende é encontrar novas soluções que não sejam a inflação. Se o Governo não pode emitir mais, ele aumenta a carga tributária e não muda nada. Se os salários reais não podem baixar, devido à inflação que fazia esse papel, congelam-se os salários ou em URV, ou em qualquer coisa e deixam-se os preços por conta do mercado livre. E quem declarou que esse plano/processo está baseado essencialmente nisso foi o próprio Ministro Ricupero. Diz o Ministro: "Um dia, os preços subirão tanto que os empresários vão perceber que, se eles os aumentarem um pouco mais, a demanda vai cair tanto que eles vão falir." O Ministro Ricupero falou por duas vezes isso. Quer dizer, a técnica utilizada, o que há de novo nesse plano em relação aos outros é, essencialmente, do meu ponto de vista, o fato de que ele foi preparado como um processo, em que os preços chegaram ao zênite e os salários permaneceram no nadir. Naquele momento, por exemplo, os grevistas da PETROBRÁS, para não perturbarem com o aumento de salário o marasmo do plano, tiveram a promessa de fio de barba feita pelo Presidente Itamar Franco, que não precisou assinar nada, porque dava a sua palavra. Vemos que empurraram as angústias para frente e agora nos encontramos nesta situação. O projeto de V. Exª merece os maiores encômios e o maior apoio, porque realmente não há outra possibilidade, a não ser que este País seja realmente uma "bancocracia", dominada pelo Banco Central, representante de banqueiros, e pelos banqueiros organizado, que não faça algo como isso que V. Exª, em boa hora, acaba de propor.

O SR. PEDRO SIMON - Agradeço o oportuno, importante e esclarecedor aparte de V. Exª. Acho, na verdade, que V. Exª tem razão quando diz que é preciso dar uma resposta a essa questão.

A meu ver, o mínimo que o Presidente Fernando Henrique Cardoso pode fazer é pedir que sua assessoria responda a esse projeto de lei. Pedi urgência, para que ele seja votado na semana que vem. Eu faria um apelo ao Presidente da República, no sentido de que sua assessoria nos diga alguma coisa até lá; mesmo que seja que o Senador Pedro Simon está completamente equivocado. Ou então que venha e responda: "Não dá, por isso". E eu, com a maior humildade, virei à tribuna para dizer: "A assessoria do Presidente disse que o projeto está errado, que esse negócio de juros não é assim como o Simon está falando." Aquele ex-Presidente do BNDES, o Antônio Barros de Castro, que fez aquela afirmativa, também está equivocado.

O que não acho correto - perdoe-me o meu amigo Fernando Henrique Cardoso - é estarmos, pela quarta vez no Senado, falando sobre essa matéria, e não termos recebido a gentileza de uma resposta. O Líder do Governo, que é meu amigo - e mesmo que não o fosse - poderia vir dizer: "Levei esse assunto ao Governo; a resposta é esta: está estudando, está vendo, vai sair, não vai sair."

O Sr. Edison Lobão - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. PEDRO SIMON - Com toda sinceridade, Senador Edison Lobão - vou lhe dou o aparte com todo carinho - pediria a V. Exª, que tem uma cópia do projeto, que intercedesse junto ao Presidente Fernando Henrique Cardoso para que Sua Excelência peça à sua assessoria que, na próxima semana, quando o assunto em ordem e em regime de urgência será votado, nos mande um esclarecimento, até para a Bancada do Governo. Sou da Bancada do Governo, sou do PMDB, o PMDB apóia o governo. Nem que seja para me dizer: "Isso não serve ao Governo". Se não servir ao Governo, serei o primeiro a retirar o projeto. Mas que dê uma resposta.

Quando eu estava como Líder do Governo, uma das questões que considerei e que considero da maior importância é a resposta. Eu vinha à tribuna para responder quando algum Senador fazia uma proposta. Como o Senador Josaphat Marinho, mais de uma vez, e vários Senadores; quando vinham e levantavam uma questão, eu pegava o discurso, levava ao Governo e exigia uma resposta. E essa resposta podia ser dada por mim tanto da tribuna como no gabinete do Senador.

A assessoria de uma pessoa como o Fernando Henrique Cardoso, que foi Senador da República, que é não só um democrata mas um gentleman, uma pessoa de Primeiro Mundo, poderia colaborar. Não estou dizendo que o culpado é o Presidente Fernando Henrique; Sua Excelência tem um milhão de preocupações, ainda mais ele, que é o Presidente da República, o Ministro da Fazenda, o homem que faz o relacionamento político, o Ministro das Relações Exteriores. Portanto, não será Sua Excelência que resolverá essa questão, mas alguém pode alertá-lo, porque a situação está se tornando ridícula.

Estou aqui pela quarta vez, e é tão simples dar uma resposta. O Senhor Fernando Henrique Cardoso poderia dizer: "Vi o projeto. Pelo Pedro Simon, não sei, porque S. Exª não entende nada de economia, mas esse tal de ex-Presidente do BNDES está dizendo que é assim também." Quero uma resposta.

Ouço com prazer o aparte do nobre Senador Edison Lobão.

O Sr. Edison Lobão - Senador Pedro Simon, o projeto de V. Exª tem muitos méritos. Se não os tivesse, teria pelo menos um: abrir o debate de maneira mais sólida em torno dessa questão que hoje perturba a vida de todos os brasileiros. Tanto quanto V. Exª, também me impaciento com esses juros elevados, elevadíssimos. Agora, há uma coisa curiosíssima que não podemos esquecer: todos os Governos praticam juros elevados. O Presidente Fernando Henrique, em uma declaração recente, também preocupado, recomendava que se baixassem os juros. Mas Sua Excelência no Ministério da Fazenda também praticou juros elevados, assim como o Governo do Presidente Sarney, do Presidente Collor e os Governos da Revolução; todos praticaram juros elevados. Todos os economistas, mesmo aqueles que estiveram no Ministério da Fazenda e no Banco Central, quando saíram de lá, passaram a criticar os juros elevados. Isso tudo quase me leva à conclusão de que existe um mecanismo demoníaco no Banco Central, que manda mais que os Presidentes da República, os Ministros da Fazenda e até os Presidentes do Banco Central. É uma questão que não consigo entender. O Ministro Ricupero praticou também juros elevados; o seu antecessor, por igual. E assim são todos. V. Exª se referiu a atitudes mais recentes do Presidente Fernando Henrique Cardoso, quando Sua Excelência disse "não". Nós dois fomos Governadores e sabemos que, no governo, às vezes é preciso dizer "não". No governo, quando se diz um "sim" que deveria ser "não", este "sim" se transforma num verdadeiro desastre. Quando se concede, no governo, aquilo que não se tem para conceder, as conseqüências vêm em dobro. V. Exª conheceu muito o Senador Milton Campos, que foi Deputado Federal, Governador de Minas Gerais e um grande Líder da UDN.

O SR. PEDRO SIMON - Um dos homens mais dignos que conheci em minha vida.

O Sr. Edison Lobão - Dos mais dignos, dos mais capazes, dos mais corretos, um símbolo da vida pública brasileira. Certa vez, perguntaram ao Governador Milton Campos qual o seu segredo, o que adotava de especial para governar tão bem Minas Gerais. S. Exª respondeu: "Eu sei dizer "não"." Esse é também um segredo de saber governar. É claro que, quando se pode dizer "sim" no governo, não se deve dizer "não." Penso que a orientação do Presidente Fernando Henrique está correta. Sua Excelência é um homem afável, educado, sereno, inteligente, talentoso; quando pode dizer "sim", Sua Excelência o faz; e, quando não pode, tem que ter firmeza para dizer "não". Cumprimento V. Exª pela iniciativa do projeto e pelo discurso, que já não é o primeiro sobre o assunto, mas o quarto. Tenho acompanhado V. Exª.

O SR. PEDRO SIMON - Com muito carinho, agradeço a gentileza do importante aparte de V. Exª.

O Sr. Sérgio Machado - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. PEDRO SIMON - Pois não.

O Sr. Sérgio Machado - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Senador Pedro Simon traz um tema extremamente importante: a questão das taxas de juros. Senador, temos que fazer uma reflexão num sentido bem mais amplo. V. Exª está propondo o IPI como um instrumento de elevação dos preços dos produtos industrializados. A questão do excesso de demanda não acontece só com os produtos industrializados: acontece em todos os bens da economia. No início do ano, tínhamos uma economia extremamente aquecida, e todas as mudanças estruturais que o País reclamava levariam algum tempo, como a privatização, as reformas econômicas, a reforma tributária. Esse seria outro instrumento para o Governo evitar que a inflação reacendesse. Vivemos num país que, há muitos anos, está intoxicado com a inflação e com a indexação. A indexação é um excelente instrumento para se conviver com a inflação, mas depois pode-se viciar com ela e manter a doença por um período muito mais longo. Esse é um assunto que vamos ter que discutir já no Brasil. A política de taxas de juros foi usada para evitar que a economia fosse aquecida. E não foi só no setor industrial. Essa proposta de IPI de V. Exª só afetaria produtos da área industrial, e o excesso de demanda acontece na economia como um todo. Essa foi uma característica do Plano Real. Com o fim da inflação, houve um aumento muito grande de renda das camadas inferiores, que têm uma enorme propensão a consumir não só produtos industrializados, mas sobretudo produtos não-industrializados, os bens de consumo, o que afetaria o conjunto da produção. Portanto, tornou-se necessário prescrever esse remédio no curto prazo. Porém, Senador Pedro Simon, precisamos iniciar uma grande discussão. Foi feito o controle da procura, mas temos que discutir agora o crescimento da oferta, o crescimento da economia, para que possamos ter um desenvolvimento equilibrado. Temos que enfrentar essa discussão no Senado, porque aí está o grande desafio. Neste momento em que o mundo vai dar um grande salto, em que a dominação é feita pelo conhecimento, teremos que definir em quais setores estratégicos o Brasil quer ter vantagem comparativa. Concluídas as reformas econômicas, temos que avançar em busca desse desenvolvimento. Essa é uma discussão que devemos fazer, com toda a profundidade, no Senado. V. Exª, que é um idealista, também deverá dela participar, porque o Senado é um excelente fórum para debatermos com a Nação as alternativas do País.

O SR. PEDRO SIMON - É muito importante o aparte de V. Exª. Sem ele, o meu discurso poderia parecer capenga, porque falei apenas sobre os produtos industrializados. V. Exª tem razão. Poderiam perguntar por que o Senador Pedro Simon não fala, por exemplo, sobre os produtos primários? Falei sobre os produtos industrializados, porque todo o debate está sendo travado em cima deles.

Com relação aos produtos primários, o Governo já está agindo. E como está fazendo isso? Com as importações. O Governo está controlando os preços dos produtos primários via importação, de forma até exagerada. O Governo tem que pensar duas vezes. Importa o arroz da Tailândia pela metade do preço do arroz do Rio Grande do Sul. Mas ele não pode acabar com a produção de arroz do Rio Grande do Sul, porque, se o fizer, daqui a pouco não teremos mais arroz. Portanto, em relação aos produtos primários, o Governo já está usando bem de uma política, de maneira até exagerada. Importa na medida do necessário e tem ameaçado: "Ou se baixa o preço, ou vem a importação." Os produtos da cesta básica estão baixando. Não são os produtos primários. Não está havendo problema nenhum no consumo dos produtos primários. Pelo contrário, está havendo excesso de produtos! Os armazéns do Governo estão superlotados. Está na hora de comprar nova safra. Inclusive, fiz, desta tribuna, uma proposta à Primeira-Dama, no sentido de colocar esses estoques, antes que apodreçam, no seu Programa Comunidade Solidária.

O que diz o nobre Líder do PSDB, com todo o respeito, está correto: deve se olhar também para os produtos primários. Mas, em relação a estes, o Governo está agindo com competência até exagerada. Por que exagerada? Outro dia, cobraram de mim: "Senador Pedro Simon, por que V. Exª é contra a importação do trigo, do arroz, se o consumidor vai pagar a metade do preço?" Respondi: "Não sou contra a importação; quero que o consumidor pague a metade." Podem fazer um contrato de 40 anos com a Tailândia ou a China, por exemplo, para que nos venda calçados a um dólar. No entanto, não podemos importar destruindo a produção nacional, para que, daí a dois anos, o produto importado custe o dobro do nacional.

O nobre Líder do PSDB coloca bem a questão. Mas os produtos primários estão sob controle, o Governo está importando quando necessário, e não estamos tendo nenhum problema de excesso de demanda e falta de produto; ao contrário, estamos tendo excesso de produto e falta de demanda.

O Sr. José Roberto Arruda - Senador Pedro Simon, permite-me V. Exª um aparte?

O SR. PEDRO SIMON - Se o Presidente permitir, com o maior prazer.

O Sr. José Roberto Arruda - Senador Pedro Simon, gostaria de merecer a atenção de V. Exª e dos Srs. Senadores que estão no plenário, neste final de expediente de sexta-feira, para contribuir com algumas intervenções e sublinhar alguns pontos da reflexão que V. Exª traz ao Senado. A primeira delas é sobre a autoria do projeto. Com a humildade que caracteriza as pessoas experientes, como é o seu caso, V. Exª se coloca como não-economista e, portanto, faz um aposto a essa autoria do projeto. Particularmente, comungo com aqueles que entendem ser a economia um assunto importante demais para o País para ser tratado por economistas. É um assunto político, sim. Em segundo lugar, quando ouvia o pronunciamento de V. Exª - inclusive, já me dirigia ao meu gabinete e voltei ao plenário para escutá-lo com mais atenção -, senti, em alguns pontos, talvez os mais importantes do debate que V. Exª levanta, concordâncias muitos grandes com o pronunciamento que o Ministro da Fazenda fez ontem à Nação. Primeiro, parece-me que os dois concordam, o Ministro da Fazenda e o Senador Pedro Simon, em que a primeira fase do plano de estabilização econômica, aquela que consegue diminuir a inflação a índices reduzidíssimos, está concluída. Há uma segunda concordância, no sentido de que os instrumentos de políticas monetária e fiscal, usados na primeira fase do plano de estabilização econômica, são, por definição, transitórios, e que também, eventualmente, inclusive no que diz respeito à taxa de juros, podem ter cumprido a sua missão. Há uma terceira concordância, a de que um plano de estabilização econômica não é um fim em si mesmo. Todos desejamos um país com uma economia estável - e parece-me que isso está claro no pronunciamento de V. Exª -, para que ele embase um novo período de desenvolvimento econômico, com uma distribuição mais justa de riquezas. Ora, aqueles instrumentos que foram adequados, nessa primeira fase, para fazer com que o plano econômico desse bons resultados podem não ser - e muitas vezes não são - os mais adequados para alavancar um período de desenvolvimento equilibrado. No pronunciamento do Ministro da Fazenda, senti, ainda que de forma mais sutil, dois sintomas que sublinham claramente o pronunciamento de V. Exª. O primeiro é de que os juros têm de cair. O Ministro da Fazenda também disse isso, e parece-me que esse é um claro reclamo da sociedade. Ainda na semana passada, recebi, no Senado Federal, uma legião de empresários do Centro-Oeste brasileiro. Telefonei para o Ministro da Fazenda e marquei uma audiência com S. Exª para a próxima quarta-feira. Eles querem levar uma contribuição ao Sr. Ministro, que não é uma crítica ao Plano Real, ao contrário; no entanto, precisam de oxigênio para continuar as suas atividades econômicas. Esse me parece um ponto absolutamente claro. O segundo ponto claro é de que agora chegou uma fase - a mais fértil, inclusive no âmbito das discussões políticas, e este é o fórum adequado para isso - de saber-se quais são as mudanças estruturais, inclusive aquelas previstas na reforma constitucional, a serem feitas para que, continuando o plano de estabilização econômica, continuando-se com uma inflação baixa, tenhamos um projeto de país onde haja desenvolvimento auto-sustentado e equilibrado. O Senador Elcio Alvares, Líder do Governo, não está presente nesta sessão, e, como Vice-Líder, gostaria de assumir a responsabilidade de, ainda hoje, fazer um contato com o Ministério da Fazenda e comprometer-me com V. Exª em trazer, da parte do Executivo, uma opinião tecnicamente mais detalhada sobre o projeto. Na minha opinião - e repito aqui as palavras do Senador Edison Lobão - ele tem muitos atributos, mas, mesmo que não os tivesse, teria o de levantar a discussão nesta Casa, que é o fórum adequado para o debate econômico. A nossa missão - nós, que apoiamos o projeto de país do Presidente Fernando Henrique Cardoso, e eu, em particular, como Vice-Líder do Governo - não é apenas trazer as posições do Governo a este Plenário. Seria até muito simples, mas é muito mais do que isso. É recolher aqui lições como essa que V. Exª traz, com sua grande experiência política, fruto de sua longa vida pública, e questionar, de forma construtiva, os pontos que devem ser questionados, para que, juntos, afinal, sejamos parceiros na construção de um país melhor.

 

O SR. PEDRO SIMON - Recebo com emoção o aparte de V. Exª. Considero o meu discurso encerrado, porque não tenho mais nada a dizer depois do que V. Exª afirmou.

Fico muito feliz e lhe entregarei uma cópia do projeto. Tenho certeza de que V. Exª haverá de, junto ao Governo, trazer, na próxima semana, uma análise, que é exatamente o que queremos. Acho que V. Exª está absolutamente correto.

Estou apresentando esse projeto como homem de Governo, pois integro a sua Bancada. Naquela reunião em que o meu Líder atual, Senador Jader Barbalho, defendia que deveríamos ir para a oposição, fui o primeiro a me levantar e dizer: "Estamos no Governo e temos a responsabilidade, perante o País e perante a História, de apoiá-lo".

Portanto, apresento esse projeto, que é de quem está apoiando o Governo, de quem está querendo ajudá-lo. Disso não há dúvida nenhuma.

Sr. Presidente, gostaria de dizer duas palavras apenas, também ao nobre Líder.

Na minha opinião, essa greve dos petroleiros - perdoe-me a sinceridade - foi, antes de mais nada, burra, pois se deu justamente na hora em que o Congresso Nacional está discutindo privatização ou monopólio do petróleo. Essa greve foi inoportuna.

O Sr. Roberto Campos está dizendo para todo mundo ouvir: "O que, em trinta anos, não consegui explicar, os petroleiros, em trinta dias, estão fazendo com que a Nação toda entenda". Na verdade, eles conseguiram, em trinta dias, fazer com que a Nação toda dê razão ao Sr. Roberto Campos.

Disse para eles: "Vocês podem ter razão, podem estar certos; houve um acordo que deveria ter sido cumprido; vocês estão ganhando pouco; mas, num país com um salário mínimo de R$100,00, vocês ganham o quê? R$800,00, R$900,00? Vocês poderiam ter tido o ato de patriotismo de não ter entrado nessa greve enquanto não se decidisse a questão da PETROBRÁS. Vocês estão nos prestando um desserviço".

Disse ainda que, se cair o monopólio do petróleo e se atingirem a PETROBRÁS, a História, no futuro, vai-se lembrar dessa greve e eles serão dados como os grandes responsáveis por esse fato. Então, não há dúvida alguma quanto a minha posição com relação ao equívoco da greve.

Em segundo lugar, a greve foi decretada ilegal pelo Tribunal por duas vezes consecutivas. Portanto, ela já foi considerada ilegal.

Em terceiro lugar, a greve está sendo antipatizada pelo conjunto da população, que sofre com essa história da falta de gás de cozinha. Na minha opinião, não se deveria deixar faltar o gás de cozinha e nem o combustível de transporte coletivo. Poder-se-ia até mexer na gasolina do particular; todo mundo ficaria com o carro em casa. Mas, mexer em gás de cozinha e em óleo diesel é uma incompetência total!

Em quarto lugar, o Senhor Fernando Henrique Cardoso mostrou seriedade e firmeza, e tem a solidariedade do povo. Hoje, completa-se o 30º dia. A partir de amanhã, o Presidente Fernando Henrique Cardoso - e os jornais já publicam - pode demitir, por justa causa, três, quatro, cinco mil petroleiros. Seria o modelo Margareth Tatcher que alguns defendem.

Este é o primeiro ano do atual Governo. A greve foi burra, aconteceu num momento inoportuno, foi considerada ilegal, e se deu no setor mais organizado, que é o dos petroleiros. Esse é o setor que tem mais condições, pois é mais bem remunerado, mais organizado e pode mexer muito com a sociedade. Se desmoralizarem essa greve e se ela for reduzida a zero, ninguém mais levanta a cabeça.

Acredito que a Srª Margareth Tatcher, no almoço que teve com o Senhor Presidente Fernando Henrique Cardoso na Inglaterra, deve ter dito para Sua Excelência: "Houve aqui a greve dos mineiros que enfrentei durante um ano, mas, depois, fiquei ainda 14 anos - sei lá quantos - e nunca mais ninguém teve coragem de fazer isso". Pode ser.

Penso que o Presidente Fernando Henrique Cardoso já ganhou a batalha. O próprio Lula pediu para que os petroleiros parassem com a greve. Ela terminou e os grevistas estão ali humilhados, espezinhados. Acredito que esta seria a hora do gesto de grandeza do Senhor Presidente.

Sou meio diferente, por isso estou aqui e o Fernando Henrique está lá, na Presidência da República. Chamaria os grevistas e diria: "Voltem a trabalhar já. Vocês têm a minha palavra que, a partir de terça-feira, iremos sentar para conversar e acertar tudo. Não quero nenhum entendimento antes, vocês não podem exigir nada de mim, pois existe uma lei a cumprir. Voltem a trabalhar. Confiem no Presidente da República".

Seria uma saída para eles, um ato desses. O Presidente da República os chamaria e pediria para que voltassem ao trabalho. Se os petroleiros pedissem garantias, Sua Excelência diria que não as poderia dar, e mostraria o memorial assinado por Senadores e Deputados. Fui um dos que assinaram esse memorial, pois o Deputado Franco Montoro telefonou para Porto Alegre, pedindo-me que o fizesse. S. Exª leu o documento para mim e eu lhe disse que assinaria, não só porque estava certo, mas porque era um pedido de S. Exª. A primeira pessoa que assinou foi o Deputado Franco Montoro, que, parece-me, é alguém identificado com o Presidente da República. Sua Excelência o Presidente diria, então, aos petroleiros que havia recebido o memorial dos Parlamentares e que iria levá-lo em consideração. Pediria que voltassem a trabalhar e marcaria um encontro para terça-feira.

Esse é o apelo que faço ao Presidente da República.

Na próxima terça-feira, pode ser manchete dos jornais a demissão de três a quatro mil petroleiros.

Sr. Presidente, penso também que se pode ter divergência com a CUT, com o Vicentinho, ou com outros, mas prefiro essas pessoas organizadas, que conheço, do que a desorganização, do que a irresponsabilidade dos radicais, porque aí não saberemos as conseqüências.

Não me parece que desorganizar, dar um paulada no setor sindical, esmagá-lo, para que caia na desmoralização e cada radical possa seguir o seu caminho, seja uma boa saída. Deve haver alguém, ligado ao Governo do Senhor Fernando Henrique Cardoso, vibrando com o dia de hoje, e dizendo ao Presidente da República - parece que estou vendo - para não se dobrar agora, porque está no fim. "Os petroleiros já se entregaram, estão reduzidos a zero, o negócio, agora, é dar a paulada final."

E a paulada final é que, quem não voltar hoje, no 30º dia, pode ser demitido pelo Presidente amanhã, por justa causa. Sua Excelência pode fazer isso. E sairá nas manchetes dos jornais. Marcará o seu governo como o de um homem de autoridade, o homem que seguiu o modelo Magareth Tatcher.

Pelo que conheço de Fernando Henrique Cardoso - é verdade que o conhecia mais antes dessa convivência mais assídua que está tendo com o PFL -, pela sua biografia, pela sua história, pela sua personalidade, parece-me que, muito mais do que o estilo Margareth Tatcher de demitir e bancar o valente no sentido de destruir, Sua Excelência se imporá se, de repente, chamar os petroleiros para conversar e chegar a um acordo. Essa é a imagem do Presidente.

Acredito que, se fosse feita uma pesquisa com a população, a unanimidade, a imensa maioria diria que os petroleiros estão errados. E, se me perguntassem, diria: "Os petroleiros estão errados. Essa é uma greve burra, irresponsável, que se deu numa hora em que não poderia se dar". Mas, à margem de tudo isso, seria muito interessante se o Presidente buscasse, dentro da socialdemocracia, dentro do seu espírito, da sua biografia, da sua história, o gesto de estender a mão, ao invés do gesto de dar a paulada final.

Sua Excelência tem duas atitudes a tomar: pode dar o tiro de misericórdia, desmoralizando e destronando completamente a vida sindical; ou pode estender a mão, num ato de grandeza, que, na minha opinião, só pode ser praticado por quem está por cima, por quem está como o Presidente Fernando Henrique Cardoso, que ganhou absolutamente, é o vitorioso total. Pois só o herói, só o vitorioso, só o vencedor pode ter um gesto de estender a mão ao vencido.

É o apelo que faço, não ao Presidente apenas, mas ao meu amigo Fernando Henrique Cardoso.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 03/06/1995 - Página 9410