Discurso no Senado Federal

MANIFESTOS FAVORAVEIS E CONTRARIOS AO SUBSTITUTIVO DO EX-SENADOR CID SABOIA DE CARVALHO AO PROJETO DE LEI DE DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO NACIONAL.

Autor
Emília Fernandes (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/RS)
Nome completo: Emília Therezinha Xavier Fernandes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
EDUCAÇÃO.:
  • MANIFESTOS FAVORAVEIS E CONTRARIOS AO SUBSTITUTIVO DO EX-SENADOR CID SABOIA DE CARVALHO AO PROJETO DE LEI DE DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO NACIONAL.
Publicação
Publicação no DCN2 de 08/06/1995 - Página 9930
Assunto
Outros > EDUCAÇÃO.
Indexação
  • DEFESA, NECESSIDADE, OPORTUNIDADE, OFERECIMENTO, PAIS, LEGISLAÇÃO, DIRETRIZES E BASES, EDUCAÇÃO.
  • COMENTARIO, EXISTENCIA, MANIFESTO, PROFESSOR, ALUNO, PREFEITURA, UNIVERSIDADE, SECRETARIA DE EDUCAÇÃO, ESTADOS, DEFESA, SUBSTITUTIVO, AUTORIA, CID SABOIA DE CARVALHO, EX SENADOR, PROJETO DE LEI, DIRETRIZES E BASES, EDUCAÇÃO, APROVAÇÃO, COMISSÃO DE EDUCAÇÃO, SOLICITAÇÃO, SENADO, ATENÇÃO, ESTUDO, PROPOSTA, ALTERAÇÃO, LEGISLAÇÃO.
  • QUESTIONAMENTO, EXISTENCIA, MOTIVO, AUSENCIA, RELAÇÃO, INTERESSE, EDUCAÇÃO, PRIORIDADE, TRATAMENTO, APROVAÇÃO, LEGISLAÇÃO, DIRETRIZES E BASES.
  • DEFESA, SUBSTITUTIVO, AUTORIA, CID SABOIA DE CARVALHO, EX SENADOR, PROPOSTA, ALTERAÇÃO, LEGISLAÇÃO, DIRETRIZES E BASES, EDUCAÇÃO, NECESSIDADE, DISCUSSÃO, ASSUNTO.

A SRª EMILIA FERNANDES (PTB-RS. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o que me traz à tribuna, nesta tarde, é a tentativa de sensibilizar os Srs. Senadores para uma questão que está sendo debatida no Senado Federal, que diz respeito não apenas aos professores e estudantes deste País, mas também a toda a sociedade, principalmente a nós, parlamentares, que temos o dever e a oportunidade de oferecer ao País uma nova Lei de Diretrizes e Bases.

Sr. Presidente, Srs. Senadores, assumi meu mandato com o compromisso de contribuir de forma criativa, participativa e responsável para tornar realidade uma das necessidades mais urgentes da Nação brasileira, também um dos sonhos acalentados pela comunidade educacional do país: a Lei de Diretrizes e Bases - LDB.

Nesse sentido, gostaria de reafirmar, mais uma vez, minha preocupação com a forma com que vem sendo conduzido por esta Casa o debate sobre este tema vital para a vida e o futuro do Brasil.

A persistir os procedimentos até aqui adotados, a Lei de Diretrizes e Bases, aprovada pelo Senado Federal, não resultará de um racional, democrático e objetivo debate de mérito e conteúdo com a comunidade educacional, a sociedade e os próprios parlamentares.

Apesar de limitada a apenas uma audiência pública, os setores interessados têm-se manifestado, em sua absoluta maioria, contrários tanto à forma de tramitação, quanto ao mérito do novo substitutivo.

Neste período, chegaram ao meu gabinete, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, dezenas de manifestos de associações profissionais das mais variadas áreas de trabalhadores em educação, de prefeituras, secretários municipais de educação e órgãos gerais ligados à Educação.

Não apenas no Estado do Rio Grande do Sul, mas no País todo, estudantes, alunos, professores, técnicos, professores universitários têm também manifestado a sua preocupação.

A propósito, gostaria de destacar que está em meu poder - pretendo passar às mãos do Presidente da Casa - um abaixo-assinado com oito mil assinaturas de alunos, pais, professores e cidadãos da comunidade, enviado pela Associação de Professores da Universidade de Rio Grande, no Rio Grande do Sul, manifestando preocupação quanto aos rumos do debate e em apoio ao substitutivo do Senador Cid Sabóia, já aprovado nesta Casa.

Tenho, também, e farei chegar às mãos do Presidente da Casa, um outro abaixo-assinado, com cerca de sete mil assinaturas, organizado pelos alunos da Escola Técnica Federal do Mato Grosso, em Cuiabá, que promoveu manifestações, inclusive greve por vários dias, em defesa de Lei de Diretrizes e Bases, particularmente do conteúdo e do mérito do Substitutivo do Senador Cid Sabóia.

Tenho, ainda, Sr. Presidente, inúmeros manifestos recebidos de diferentes recantos do Rio Grande do Sul e de todo o País. Não os lerei, para que não se torne enfadonho o meu discurso. Mas posso afirmar que são mais de 80 manifestos contrários ao substitutivo que está tramitando hoje na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania.

E temos, entre todos os que recebemos, apenas dois manifestos favoráveis, mas que também estamos incluindo no processo que faremos chegar às mãos do Presidente desta Casa: um vem da Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino (CONFENEN), que entende que as questões colocadas no último substitutivo favorecem a educação privada deste País e, portanto, se manifesta favorável; o outro diz respeito à sociedade Tradição, Família e Propriedade, um grupo conhecido nacionalmente por V. Exªs. Esse grupo faz alegações totalmente confusas, inclusive, em relação ao conteúdo do então substitutivo do Senador Cid Sabóia.

Os representantes da sociedade advertem para a tentativa de se invalidar o Substitutivo do Senador Cid Sabóia, aprovado pela Comissão de Educação do Senado, no final do ano passado, e resultado de um profundo processo de integração entre a sociedade e a Câmara dos Deputados e o Senado Federal.

Argumentam, com propriedade, que, em mais de quatro anos, através de audiências públicas, foram ouvidas centenas de autoridades, entidades ligadas à educação pública e privada, inclusive, e aos movimentos populares, entidades sindicais, estudantis e de educadores e pesquisadores.

E alertam para o fato de que, por outro lado, em pouco mais de um mês, após algumas poucas reuniões, e apenas uma audiência pública, foram produzidas seis versões diferentes de um mesmo substitutivo, que, além de desconhecer todo processo democrático anterior, não responde às atuais necessidades da educação nacional.

Antes de encerrar, Sr. Presidente, gostaríamos também de destacar que o descaso para com vários anos de debates, a urgência repentina com que se vem tratando esta questão e as condições de sua tramitação, contraria os objetivos finais da existência de uma Lei de Diretrizes e Bases para a Educação.

A sociedade brasileira precisa, com urgência, de uma legislação que defina rumos e diretrizes para a educação nacional, que sejam capazes de preparar as crianças para a educação, enfrentar o analfabetismo de jovens e adultos, oferecer um ensino fundamental de qualidade, formar mão-de-obra verdadeiramente qualificada, que os novos tempos exigem, e incentivar um ensino superior inovador e voltado para as necessidades estratégicas do país.

Tais objetivos, tanto do ponto de vista pedagógico, político, jurídico e, mesmo prático, no entanto, não podem ser atingidos contra a vontade da sociedade, e, mais grave, afrontando e desrespeitando exatamente aqueles que terão a responsabilidade direta de executá-lo na prática cotidiana das escolas e universidades.

A Lei de Diretrizes e Bases, Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, deve ser fruto do intercâmbio e do respeito aos agentes da Educação, sem o que se transformará em mero papel, sem força de mobilizar a Nação, porque, sem o debate, não há vida nem amor, valores que, apesar das autoridades, ainda mantêm brasileiros na heróica missão de educar.

Por isso, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, estamos em condições de lhes afirmar que a tramitação que vem acontecendo no Senado Federal não corresponde ao histórico trabalho desempenhado por esta Casa, que tem estado atenta e acompanhado os trabalhos feitos na Câmara Federal. Além das nossas atribuições específicas de Casa revisora, não podemos perder, em nenhum momento, a visão de que há um Regimento que deve ser cumprido e observado.

Alguns motivos alheios aos interesses da Educação deste País estão sendo colocados como prioritários na aprovação da Lei de Diretrizes e Bases. Com todo o respeito e consideração que temos com todos os Srs. Senadores, independentemente do Partido político a que pertençam, gostaríamos de dizer que este País deve ter um compromisso único com a Educação dos nossos jovens e das nossas crianças e com a valorização dos nossos profissionais de Educação.

É por isso que pedimos uma atenção especial de todos os Srs. Senadores: queremos uma Lei de Diretrizes e Bases, mas não podemos aprovar uma lei sem a devida avaliação por parte de cada um dos Srs. Senadores e pela sociedade.

Temos um projeto que já foi aprovado pela Comissão de Educação. Por que hoje se buscam outros canais para a apresentação de um substitutivo a esse projeto? Se há falhas, se há corporativismo demasiado, como é dito por alguns Senadores, vamos corrigi-lo, vamos estudá-lo, vamos verificar em que pontos estão acontecendo os entraves. Mas vamos trabalhar com o que é legítimo, legal, com o que já é de conhecimento da sociedade e que já é de conhecimento da Câmara e do Senado, através da sua Comissão de Educação, que fez um estudo no ano passado e o aprovou.

O que se está propondo hoje, em nome de algumas pessoas, ilustres até - com uma contribuição significativa para o País, sem dúvida - não pode ser aprovado, sob pena de se estar legitimando algo que não foi suficientemente debatido. Por que rejeitar o projeto apresentado sob a forma de substitutivo pelo Senador Cid Sabóia de Carvalho, onde ele formula uma organização mais abrangente da educação, com participação da sociedade, mais liberdade de expressão e pluralidade das idéias? É o que se tem visto nesta Casa: debates entre posicionamentos contrários, em que a liberdade e a participação são preservadas.

Este substitutivo traz uma divisão dos ciclos da educação, de forma a garantir um mínimo de oito anos de escola para todos, com a universalização da educação básica em todos os níveis e modalidades e com uma clara definição do dever do Estado em relação à Educação infantil. Se queremos um povo esclarecido, consciente, que realmente consiga vencer as dificuldades da sociedade injusta que aí está, precisamos começar desde cedo. Por isso a educação infantil deve ser priorizada.

Apresenta também este substitutivo uma definição de ensino médio não terminativo, quer dizer, sintonizado com a perspectiva da continuidade do estudo. Não podemos aprovar uma Lei de Diretrizes e Bases que menciona ser permitido aos filhos dos trabalhadores irem até o ensino médio. Temos que aprovar uma lei que dê futuro, esperança, mesmo àqueles que não possam chegar hoje à Universidade.

Precisamos de uma lei que garanta as nossas escolas técnicas. O Brasil fortalecer-se-á como um País quando tiver mão-de-obra qualificada e competente para ingressar no mercado de trabalho. Por que cogitar-se de terminar com as escolas técnicas federais neste País justamente no momento em que precisamos oferecer ensino de qualidade. Segundo constatações do Governo, o ensino de qualidade está sendo ministrado nas escolas técnicas.

Portanto, é incoerência, Srs. Senadores, pensar em aprovar nesta Casa um projeto que municipalizaria ou passaria para os Estados essa responsabilidade. A União deve preservar as suas escolas técnicas.

Temos também alguns outros aspectos a considerar. Essa lei assegura, claramente, o direito à gratuidade e a responsabilidade do Estado na educação de jovens e adultos trabalhadores. O Estado tem a responsabilidade de prover e acompanhar estudo público e gratuito aos jovens e adultos que não tiveram ocasião de estudar na idade correta. Por que garantirmos estudo gratuito apenas para o ensino fundamental e regular? Queremos diminuir o número de analfabetos deste País ou apenas nos limitar à retórica de que estamos preocupados com esse grande número de pessoas marginalizadas do conhecimento, da cultura e do esclarecimento maior?

O substitutivo aprovado por esta Casa contempla, sem subterfúgios, medidas objetivas e claras para a função do Estado no ensino de caráter especial. O contingente de pessoas portadoras de deficiência neste País é muito grande. Entidades estão clamando, batendo às portas dos gabinetes dos Senadores e dos Ministérios, perguntando como ficam os nossos jovens depois da extinção da LBA. Inúmeras creches, casas dedicadas a idosos e escolas para pessoas portadoras de deficiência são trabalhadas através desse instituto, já extinto. E não estamos sabendo que rumos tomarão esses convênios. Como podemos tirar do bojo de uma educação maior do nosso País a atenção e o compromisso do Estado para com o ensino especial?

Entendemos que um Estado democrático não pode legar apenas dois ou três artigos no final de uma lei, nas Disposições Constitucionais Transitórias, para dizer que existe um compromisso com a educação especial. Precisamos aprofundar esse debate, Srs. Senadores.

É necessário também garantir a autonomia da universidade pública e o princípio da gestão democrática, com o direito de escolha dos dirigentes, e define os requisitos mínimos para o credenciamento de universidades, bem como critérios abrangentes para avaliação das instituições. Falamos muito em qualidade de ensino. O Governo, aliás, se propõe em avaliar a qualidade de ensino que está sendo ministrado. Mas temos o entendimento de que esta avaliação tem que ser efetuada de forma ampla e abrangente. Não podemos avaliar apenas o quanto o aluno aprendeu, mas também todo o sistema e a estrutura das universidades, para sabermos quais as condições que estão sendo oferecidas dentro daquela universidade para que o ensino tenha a qualidade que todos desejamos.

A participação democrática de professores, alunos e funcionários na escolha dos dirigentes parece ser a forma mais correta. O projeto que está tramitando ultimamente, cujo Relator é o Senador Darcy Ribeiro, coloca nas mãos dos professores 70% da responsabilidade de decisão na escolha de seus dirigentes. Por que essa supervalorização dos professores? Vejam que são professores os que questionam, e às vezes somos acusados de corporativismo. Não! Nós queremos é democracia, queremos a garantia que a Constituição nos reserva. O art. 207 da Constituição Federal dispõe que "as universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e obedecerão ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão".

Precisamos ter cuidado. Não podemos apreciar de afogadilho uma matéria como a Lei de Diretrizes e Bases, da qual o País tem pressa, sob a argumentação de que já decidimos, já discutimos, porque se está começando um novo processo de discussão. Mas estamos engajados, preocupados, e temos dedicado muitas horas, tanto dos nossos dias de trabalho como das nossas noites, para estudar o que está sendo proposto.

Vejam, Srs. Senadores, como é importante o diálogo, o debate, a troca de idéias, mesmo as contrariedades: seis substitutivos surgiram de março deste ano até a presente data, cada um melhorando certos aspectos. Isso comprova que precisamos discutir um pouco mais.

Há entraves ainda do ponto de vista constitucional. E esse projeto já recebeu parecer favorável da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. Sob pena de sermos responsabilizados num futuro próximo, alertamos para o fato de que a pressa, neste momento, será, sem dúvida, inimiga da perfeição. É preciso, então, parar, refletir e verificar.

Haveria outros tantos pontos a considerar aqui, mas entendo que este assunto não pode ser esgotado num único pronunciamento.

Faço este apelo desta tribuna em nome da sociedade brasileira, que se levanta para ser ouvida e ter valorizada a sua participação, por meio do trabalho realizado na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, até o final do ano passado.

Pretendo, hoje ainda, encaminhar a V. Exª, Sr. Presidente, os abaixo-assinados, com um número de aproximadamente 15 mil assinaturas, e cópia dos mais de 80 manifestos oriundos de universidades, alunos, professores, prefeituras, secretarias de Educação de todo o País, solicitando que o Senado estude com cautela a questão da Lei de Diretrizes e Bases.

Já dispomos de uma lei que contempla muito do que a sociedade reclama. Se existem pontos que precisam ser revisados, vamos revisar, pois é função desta Casa. Não podemos, contudo, endeusar ninguém, porque esta Casa não foi concebida para isso, mas sim para defender os interesses da sociedade, do povo brasileiro e, sem dúvida alguma, projetar este País para a modernidade e o futuro.

A educação deve ser um dos pontos prioritários para que tenhamos condições de competir em termos de igualdade, não apenas aqui dentro, mas também fora do Brasil.

Muito obrigada. Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente. 


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 08/06/1995 - Página 9930