Discurso no Senado Federal

ALERTA AO GOVERNO PELAS ALTAS TAXAS DE JUROS NA ECONOMIA BRASILEIRA. CONSEQUENCIAS DANOSAS DESTA POLITICA MONETARIA.

Autor
Humberto Lucena (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
Nome completo: Humberto Coutinho de Lucena
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
  • ALERTA AO GOVERNO PELAS ALTAS TAXAS DE JUROS NA ECONOMIA BRASILEIRA. CONSEQUENCIAS DANOSAS DESTA POLITICA MONETARIA.
Aparteantes
Geraldo Melo, Ney Suassuna, Ronaldo Cunha Lima.
Publicação
Publicação no DCN2 de 06/06/1995 - Página 9456
Assunto
Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
Indexação
  • ADVERTENCIA, GOVERNO, EXCESSO, TAXAS, JUROS, RESULTADO, RESTRIÇÃO, POLITICA MONETARIA, INDUÇÃO, FALENCIA, PEDIDO, CONCORDATA, AUMENTO, DESEMPREGO, PRIORIDADE, SETOR, COMERCIO, METALURGIA, CRESCIMENTO, INDICE, INADIMPLENCIA, PREJUIZO, ESTABILIDADE, ECONOMIA.
  • SOLICITAÇÃO, ANEXAÇÃO, PRONUNCIAMENTO, ORADOR, EDITORIAL, JORNAL, O GLOBO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), ANALISE, CRITICA, MANUTENÇÃO, POLITICA, EXCESSO, TAXAS, JUROS.

O SR. HUMBERTO LUCENA (PMDB-PB. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, volto a esta tribuna, a exemplo de alguns Senadores, entre os quais os Senadores Josaphat Marinho, Geraldo Melo e João Rocha, para alertar o Governo sobre os altos juros cobrados no País.

Realmente, as condições atuais da nossa economia já começam a preocupar a todos, em face dos resultados da política monetária adotada pelo Governo, cujas restrições ao crédito levaram a que se tenha hoje no País uma das mais altas taxas de juros de curto prazo em todo o mundo, situando-nos em 3º lugar, abaixo apenas da Rússia e do México. Países que, à diferença do Brasil, enfrentam neste momento seríssimos problemas de desequilíbrio econômico e financeiro.

Com efeito, as taxas atuais no mercado estão em 18% ao mês. O que inegavelmente é algo escorchante, conforme o próprio Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, afirmou em recente reunião da SUDENE em Recife. E, logicamente, as conseqüências dessa política monetária não podiam ser outras senão a indução de uma onda de muitas falências, pedidos de concordata e aumento de desemprego, como já está acontecendo, sobretudo no comércio.

Por exemplo, em São Paulo, que é o centro dinâmico da nossa economia, registraram-se nesses últimos dias demissões de cerca de 7.646 trabalhadores no comércio, segundo informa o sindicato da categoria. No setor metalúrgico, estima-se que nas próximas semanas estarão em férias coletivas cerca de 6.720 operários, devendo-se ressaltar que 26 metalúrgicas paulistas já atrasam os salários dos seus 4.600 funcionários e 19 delas acabaram de cortar benefícios como vale transporte, vale-refeição e a distribuição de cestas básicas.

Ademais, o índice de inadimplência vem num crescente em todo o País. Dou meu testemunho em relação à Paraíba e a todo o Nordeste. Por sua vez, a Federação das Indústrias de São Paulo - FIESP, para ilustrar a gravidade do fato, o setor industrial de eletro-eletrônicos, que até o mês de abril vinha funcionando em plena carga, teve o seu percentual de inadimplência aumentado de 2,5% naquele mês para 10% nos dias atuais.

Ou seja, esses são os números de uma amostra significativa, e bastam, para que se tenha uma idéia clara do quadro preocupante, a que me antes me referi. Exigindo, portanto, que analisemos detidamente essa situação, em busca de uma saída plausível para o processo de estabilização de nossa economia. Uma solução que não venha a promover um exagerado desaquecimento das atividades produtivas no País. Pois, todos conhecemos as mazelas que as recessões sempre nos trouxeram, sem que se resolvesse o problema da inflação, mas, sim, alimentando-o ainda mais, configurando o que os economistas denominam de estagflação, ou seja, estagnação econômica combinada com altas taxas inflacionárias.

Na verdade, minha preocupação e meu alerta a esse respeito, Sr. Presidente, está vinculada a toda uma experiência dolorosa dos últimos anos. Particularmente, no que se refere à implementação de políticas restritivas, de teor semelhante à atual, como foi, por exemplo, especialmente o Plano Collor II, com o que se agravou seriamente o processo recessivo no País, sem que se pudesse estancar a inflação, conforme disse antes.

Naquela época, eu era Líder do PMDB e da Oposição, no Senado. Quantas e quantas vezes levantei minha voz, para chamar a atenção do Governo, a respeito dos descaminhos de sua política econômica!

Evidentemente, não me passa despercebido um fato auspicioso, que, de certo modo, deve servir para amenizar essas preocupações. A nossa indústria e a economia produtiva, como um todo, a partir de outubro de 1992, apesar de todas as dificuldades a que me referi, conseguiram empreender uma retumbante recuperação, chegando a deixar perplexos os analistas econômicos de dentro e de fora do País.

Afinal, daquele momento em diante, pôde-se verificar concretamente que o setor produtivo do País - refiro-me ao Plano Real - havia dado um salto de qualidade muito significativo. Deslocando-se do âmbito paternal do Estado e mostrando um dos menores níveis de endividamento do mundo, esse setor se encarregou de mostrar categoricamente que a crise do País não se encontrava na área empresarial. Mas que estava, como continua a estar, enraizada justamente na falência financeira do setor público.

O Plano Real, para o qual não faltou, com justiça, o apoio de todos nós, especialmente pela engenhosidade com que os seus mentores o implementaram, conseguindo fazer declinar vertiginosamente a inflação, veio, portanto, em ótima hora. E aqui não devo mais delongar-me sobre seus aspectos diferenciais, com relação aos planos anteriores, já analisados suficientemente, mas sim devo dizer sobre a sua importância para a consolidação do referido processo de recuperação, demonstrada claramente nos níveis excelentes de crescimento econômico verificados a partir do lançamento do Plano.

Com efeito, em todo o ano passado, as nossas empresas conseguiram dar solidez a um processo de recuperação de suas vendas, retomando, assim, suas margens históricas de lucro. O Produto Interno Bruto cresceu 5,7%, acima do ano anterior que já surpreendera, com o aumento desse indicador da ordem de 4,1%, atingindo o valor em moeda de 1993, que é três vezes o da Argentina e duas vezes o do México.

Além disso, a taxa de investimento bruto na economia, que é também um importante indicador econômico, chegou a 16% em relação ao PIB, confirmando a nítida recuperação dos investimentos produtivos no País, que haviam declinado para 13% no início desta década. Devendo-se salientar, contudo, que mesmo assim ainda se está longe dos 25% registrados na década de 70, que é o nível compatível com as nossas potencialidades e nossas expectativas. E a dinâmica que se vinha imprimindo à nossa economia mostrava que seguramente poderíamos chegar aos 20% este ano, e mesmo um pouco mais, não fossem as restrições da política monetária atual.

Pois bem, Sr. Presidente, Srs. Senadores, é esse crescimento que, a meu ver, equivocadamente, de repente, vem sendo combatido como um vilão perante a sociedade. A concepção é a de que ele estaria sendo demasiado. Significaria um superaquecimento do consumo e, assim, estaríamos novamente diante do perigo de uma forte inflação de demanda. E o remédio a ser usado teria que ser aquele que os manuais da Ciência Econômica indicam para esses casos, qual seja, promover a purgação do mercado, desaquecer a economia, para a inflação não tenha condições de uma recidiva.

Ora, Sr. Presidente, Srs. Senadores, em que pese todo o respeito que tenho e todos nesta Casa têm, pelos membros da equipe econômica do Governo, sabidamente da mais alta competência, não me parece que proceda objetivamente esse diagnóstico. Compreendo a preocupação que lhes atinge, à medida que se lembram do Plano Cruzado, que supostamente teria também naufragado por falta de uma política de juros altos que barrasse a temível explosão do consumo. Mas, seguramente, há elementos passos e atuais a demonstrar que as coisas não são bem assim.

Falo, primeiramente, de uma situação histórica, tantas vezes lembrada nesta Casa. Ou seja, o fato de que nos últimos quarenta anos de nossa histórica econômica, comprovado pelas séries estatísticas relativas aos índices de inflação e de crescimento industrial do País, levantadas e publicadas pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), a inflação quase que religiosamente esteve baixa, ou relativamente baixa, ao mesmo tempo em que se dava o aquecimento de nossa economia e vice-versa. Demonstrando-se, desse modo, que o caráter hegemonicamente oligopolista de nossa economia tem se encarregado de desmantelar a lógica simplista dos que através de medidas monetaristas altamente restritivas pretendem estabilizar a nossa economia.

E hoje, da mesma maneira, com todo o crescimento notável dos últimos onze meses, a inflação pôde permanecer em torno de 2% a 3% ao mês, o que constitui uma faixa de variação muito baixa, se comparada com a das vésperas do Plano Real que beirou os 50%.

Certamente, não quero dizer que um crescimento fortemente acelerado não possa trazer problemas para nossa economia. Mas, convenhamos em que os nossos números ainda estão muito aquém dos que representam o avanço econômico dos chamados Tigres Asiáticos. Estes hoje apresentam taxas de investimento bruto da ordem de 30%. E sua renda per capita, como é o caso da que se registra para a Coréia do Sul, de cerca de 7.000 dólares, é mais do que o dobro da nossa, apesar de que nas décadas de 60 e 70, este país e o nosso tinham a mesma renda por habitante e taxas de crescimento semelhantes.

Desse modo, o Plano Real e todo o esforço compreendido pelas medidas complementares a ele que o Governo deve encetar neste momento não podem servir para abortar uma importante dinâmica do crescimento que já vinha se consolidando, sobretudo no sentido de permitir que o nosso mercado interno possa crescer e ser o sustentáculo básico de nossa saída para o mercado externo. Dando-se toda prioridade para que ele se desconcentre e seu nível concorrencial aumente, de modo que se facilitem as medidas ordinárias de combate à inflação.

Significa, então, que as pequenas e médias empresas, por exemplo, não podem ser submetidas a terem que arcar com juros exorbitantes no mercado financeiro, para poderem resolver os seus problemas de capital de giro e de investimentos. Hoje, uma pequena empresa está enfrentando juros da ordem de 103% ao ano, que dispensam maiores comentários sobre sua perversidade.

O que é mais grave é que essa situação configura, ao mesmo tempo, uma tremenda injustiça para com essas empresas, que representam, nada mais nada menos, do que 98,3% dos negócios registrados no País, 59,4% da mão-de-obra ocupada, 20,6% do Produto Interno Bruto e 42% dos salários pagos. Pois, enquanto elas têm que amargar encargos financeiros inconcebíveis, os grandes grupos empresariais são beneficiados com custos financeiros em torno de 1% ao mês, através das linhas de crédito a longo prazo do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Sem falar que esses grandes grupos, que constituem a grande maioria das empresas exportadoras, conseguem beneficiar-se também com o adiantamento dos contratos de crédito, as chamadas ACCs, para financiamento de sua produção.

Isso, evidentemente, não pode continuar por muito tempo. As falências, os pedidos de concordata, as demissões, que também já estão afetando alguns grandes grupos da área comercial, como é o caso da Casa Centro, estão levando a que as pequenas e médias empresas comecem a ser inevitavelmente absorvidas pelos setores oligopolizados, contribuindo para a debilitação do mercado concorrencial do País, o que só contribuirá para dificultar ainda mais a luta do Governo pela estabilização do País.

É bem verdade que, diante da grita nacional e das mobilizações, que estão a reunir hoje empresários e trabalhadores, contra o absurdo das atuais taxas de juros, o Governo já começa a dar sinais de compreensão. Como ficou claro na recente decisão do Conselho Monetário Nacional (CMN) de promover uma pequena redução dos compulsórios dos bancos, que estavam obrigados a recolher ao Banco Central o equivalente a 15% dos seus empréstimos e, agora, tiveram esse percentual reduzido para 12%. Além das declarações das autoridades econômicas de que, em junho próximo, as referidas taxas já deverão estar em declínio.

O Sr. Ney Suassuna - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. HUMBERTO LUCENA - Ouço V. Exª, Senador Ney Suassuna.

O Sr. Ney Suassuna - Nessa questão de juros e de aperto, o grande problema está sendo exatamente a combinação do compulsório com o juro extorsivo. Como se não bastasse isso, há ainda o câmbio. Ainda nesta semana, eu ouvia os fabricantes de automóveis, no caso a Chevrolet - que completa agora 50 anos de existência - dizer que os fabricantes estão com 100 mil carros no pátio e não venderam nenhum, neste mês, às autorizadas, que, por seu lado, também estão com mais de 100 mil carros nos seus negócios. Então, a economia praticamente parou. Ouve-se que o mesmo aconteceu à agricultura e, agora, atinge a indústria. V. Exª está tocando num ponto muito importante, e o comando central do Governo Federal tem de estar atento para não paralisar completamente a economia, senão teremos uma moeda forte com uma grande recessão.

O SR. HUMBERTO LUCENA - Ninguém mais do que V. Exª poderia dar esse testemunho, nobre Senador Ney Suassuna. Além de Senador, político, V. Exª é sobretudo um empresário vitorioso em diversos setores da atividade econômica. Portanto, conhece o problema melhor do que eu, que sou apenas um homem público, interessado no estudo dos problemas nacionais. V. Exª bem colocou a questão ao dizer que a grande crise atual advém não só dos altos juros, mas também do problema dos compulsórios.

Ainda bem que o Governo começa a acordar, pelo menos, com relação aos compulsórios, na medida em que baixa 3% do que os bancos estavam recolhendo, para que se aumentem, assim, os recursos à disposição da economia produtiva, a fim de que possamos ter financiamentos maiores. Mas isso não adianta nada, se as taxas de juros continuarem altas como estão.

O Sr. Ronaldo Cunha Lima - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. HUMBERTO LUCENA - Ouço V. Exª com prazer, nobre Senador.

O Sr. Ronaldo Cunha Lima - Nobre Senador, quero felicitá-lo pelo pronunciamento que faz. O nobre orador aborda um dos temas mais atuais e preocupantes. Estou chegando agora do nosso Estado, onde tive oportunidade de conversar com presidentes de associações, entidades de classe, associações comerciais, clube diretor de lojistas e comerciantes industriais, que manifestaram profunda preocupação com a política de juros em vigor. Eu dizia do nosso entendimento, na semana passada, inclusive com o próprio Ministro da Fazenda. S. Exª buscava nos tranqüilizar com relação às medidas adotadas, mas não deixávamos de ter, como V. Exª faz agora, a oportunidade de manifestar essa preocupação. Por isso, somo o pronunciamento de V. Exª aos já feitos aqui por outros Senadores. Felicito-o pela oportunidade do seu discurso.

O SR. HUMBERTO LUCENA - Muito obrigado, Senador Ronaldo Cunha Lima. Quero deixar bem claro, como fez o nobre Senador Geraldo Melo, por exemplo, no seu brilhante pronunciamento, há poucos dias, sobre o mesmo tema, que, sobretudo o Senado, onde há um ambiente mais adequado para o grande debate em torno dos problemas nacionais, deve fazer reflexões mais profundas em torno de temas como esse. E mesmo nós, que pertencemos a Partidos que apóiam formalmente o Governo, temos que dar nossa contribuição, temos de trazer nossa advertência, porque, acima dos interesses do Governo estão os interesses do País. E não podemos abdicar de sua defesa, porque costumamos dizer que não há apoios incondicionais. Temos que fazer com que o Governo escolha bem os caminhos que percorre, a fim de evitarmos conseqüências mais danosas não só no plano econômico-financeiro, mas também no plano social.

No que tange às taxas de juros da agricultura, tenho um projeto aprovado no Senado, que se encontra na Câmara, em que estabeleço taxas diferenciais de juros para pagamento dos financiamentos dos pequenos e médios produtores e pequenas e médias cooperativas, em relação aos juros praticados no resto do País, pelo menos no semi-árido nordestino.

Entretanto - voltando ao discurso que fazia -, Sr. Presidente, convenhamos que essa sinalização ainda é simbólica, pois, na verdade, não poderão representar, na prática, uma significativa redução das taxas que continuam, em média, em termos anuais, na casa de 88%. Trata-se de um verdadeiro acinte, se considerarmos que, mesmo se elas baixassem imediatamente para metade disso, nossas empresas, especialmente as pequenas e médias, ainda assim, estariam no pior dos mundos.

Ademais, há outro aspecto que gostaria de trazer à tona e que, a meu juízo, vem ao encontro de minha argumentação contra a manutenção das altas taxas de juros. Trata-se do seguinte: as autoridades econômicas, para justificar a política monetária restritiva atual, alegaram como fator preponderante o suposto crescimento exacerbado do consumo. Ao mesmo tempo em que, mesmo sem muita ênfase, dava-se conta da necessidade de se manterem as taxas em níveis altos, no sentido de se evitar grande evasão de capitais e manter a atração para a volta dos que haviam saído por conta da crise mexicana.

Pois bem, hoje, nenhum desses fatores está mais em evidência. O consumo efetivamente nunca foi exacerbado, se considerarmos seus níveis históricos de pico. E, agora, nota-se claramente que está perfeitamente contido. Já os capitais externos não estão tão arredios, conforme atesta o mercado das Bolsas. Particularmente, porque o chamado efeito tequila, referente aos reflexos negativos da crise financeira mexicana, foi efetivamente arrefecido. De modo que o ingresso desses capitais no País voltou aos níveis em que vinham normalmente acontecendo, antes da citada crise, quando as taxas de juros estavam em patamar mais baixo do que o do momento. Logo, pergunto: o que impede uma atitude mais imediata e concreta do Banco Central para reverter essa situação incômoda de fortíssimas restrições ao crédito?

O Sr. Geraldo Melo - V. Exª me permite um aparte?

O SR. HUMBERTO LUCENA - Concedo o aparte a V. Exª, Senador Geraldo Melo.

O Sr. Geraldo Melo - Agradeço a oportunidade, Senador Humberto Lucena. Desejo associar-me ao trabalho que V. Exª apresenta hoje, com pronunciamento oportuno e importante como sempre o faz. Queria ponderar duas coisas: primeiro, a questão do apoio ao Governo que deve incluir a participação no debate e na formulação de suas políticas. Seus Ministros e auxiliares participam das reuniões internas do Poder Executivo e, naturalmente, cada um deles apresenta sua contribuição, suas idéias, proposições, concordâncias e discordâncias. Não pertencemos ao Poder Executivo, mas podemos ajudar o Presidente da República que apoiamos, por cujo êxito torcemos - êxito que, hoje, se confunde com o êxito do Brasil - aqui, no Congresso Nacional, pois pertencemos ao Poder Legislativo, que é onde podemos encontrar uma boa política e formular soluções. Em segundo lugar, quero assinalar que, a meu ver, houve um excesso de dosagem na taxa de juros que não está contribuindo mais para arrefecer uma demanda que entrou em clara recessão; por outro lado, seria temerário que houvesse uma velocidade excessiva na redução dessas restrições, porque isso poderia sinalizar para a população, equivocadamente, algum tipo de estímulo que ensejasse uma manifestação inflacionária explosiva, instantânea que seria perigosa. Acredito que hoje a tendência dos juros é de queda. A questão é que a velocidade da descompressão precisa ser tal que não estimule novo surto inflacionário; precisa também não ser tão lenta que só apresente resultados quando todos estivermos mortos. Essa é minha respeitosa contribuição ao importante discurso de V. Exª no debate dessa questão que hoje preocupa todos os brasileiros.

O SR. HUMBERTO LUCENA - Muito grato a V. Exª pelas suas palavras, nobre Senador Geraldo Melo. Devo dizer que a visão de V. Exª, como a minha, é a visão dos sociais-democratas. Evidentemente, essa visão não pode ser a mesma dos neoliberais que estão aí, porque, se o neoliberalismo ortodoxo desse certo, não teria havido o desastre da Venezuela. V. Exª sabe que a inflação naquele país desceu ao máximo possível; entretanto, como não houve a justa distribuição da renda nacional, o final foi aquele conhecido, inclusive com a prisão do Presidente da República, e a Venezuela entregue a uma das crises sociais mais sérias de que se tem notícia na América Latina.

De outra parte, entendo, como V. Exª acaba de dizer, que a manipulação da taxa de juros pelo Governo é um instrumento adequado e eficaz no combate à inflação. A questão é saber dourar a pílula. V. Exª tem razão. A baixa deve ser gradual, e o reajuste das taxas de juros deveria ser seletivo, para que determinados segmentos da economia, como é o caso das micro e pequenas empresas, certas regiões, como o Nordeste, sobretudo seu semi-árido, tivessem um tratamento mais compatível com a realidade que representam na economia do País.

Por outro lado, Sr. Presidente, há que se tocar também na questão do endividamento mobiliário interno e seu custo. Como se vai resolver a questão dos encargos desse endividamento, se as taxas de juros permanecerem nesse patamar por muito tempo? Como se sabe, o perfil desse endividamento é todo alinhado no curto prazo, forçando, assim, o Governo a alimentar permanentemente a chamada ciranda financeira para poder pagar os juros mensais que, no momento, se situam na casa de R$3 bilhões.

Logicamente, esse fato, que é tão grave ou mais do que a perspectiva de um processo recessivo, já seria o suficiente para que se buscasse reverter o quadro atual da política monetária, forçando-se a baixa acentuada das taxas de juros. Mas compreendo que é justamente nesse ponto que está o cerne do impasse. Enquanto não se resolver a questão fiscal do País, dificilmente o setor público poderá deixar de continuar induzindo as altas taxas de juros no mercado financeiro, para colocar seus títulos e fazer, como se sabe, a chamada rolagem da dívida interna do País.

Desse modo, ao lado de clamar por medidas imediatas que arrefeçam o impacto dessas taxas exorbitantes, fazendo-me porta-voz dos trabalhadores e dos empresários, sobretudo dos pequenos e médios do Nordeste, através da abertura de linhas de crédito de longo prazo para financiamento de seu capital de giro e de investimentos, venho também insistir no fato de que é necessário avançarmos, como já estamos fazendo nas reformas do Estado, particularmente na questão tributária e patrimonial, com vistas ao desafogo definitivo das finanças públicas do País, sem o que, dificilmente, poderemos divisar, na urgência necessária, uma perspectiva de verdadeira prosperidade nacional.

Sr. Presidente, requeiro a V. Exª que considere como lido o editorial de O Globo, do dia 19 de maio próximo passado, sob o título "O Limite de Juros", para efeito de sua publicação em anexo a este pronunciamento no Diário do Congresso Nacional.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 06/06/1995 - Página 9456