Discurso no Senado Federal

GRANDES PREJUIZOS ECONOMICOS E SOCIAIS CAUSADOS PELO ESTADO PRECARIO DAS RODOVIAS NO PAIS.

Autor
Júlio Campos (PFL - Partido da Frente Liberal/MT)
Nome completo: Júlio José de Campos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DE TRANSPORTES.:
  • GRANDES PREJUIZOS ECONOMICOS E SOCIAIS CAUSADOS PELO ESTADO PRECARIO DAS RODOVIAS NO PAIS.
Aparteantes
Carlos Bezerra, Esperidião Amin.
Publicação
Publicação no DCN2 de 22/06/1995 - Página 10625
Assunto
Outros > POLITICA DE TRANSPORTES.
Indexação
  • DEFESA, NECESSIDADE, URGENCIA, ADOÇÃO, GOVERNO FEDERAL, POLITICA, OBJETIVO, CONSTRUÇÃO, CONSERVAÇÃO, ADMINISTRAÇÃO, MANUTENÇÃO, ESTRADAS VICINAIS, RODOVIA, PAIS.
  • COMENTARIO, PRECARIEDADE, SITUAÇÃO, RODOVIA, PAIS, PROVOCAÇÃO, PREJUIZO, NATUREZA SOCIAL, NATUREZA ECONOMICA, IMPEDIMENTO, CIRCULAÇÃO, MERCADORIA, RISCOS, VIDA, PATRIMONIO, POPULAÇÃO.
  • DEFESA, PARTICIPAÇÃO, INICIATIVA PRIVADA, SETOR, RODOVIA, GARANTIA, DESENVOLVIMENTO, ECONOMIA NACIONAL.

O SR. JÚLIO CAMPOS (PFL-MT. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, cumpro o dever de trazer ao debate desta Casa do Congresso Nacional um dos mais graves problemas por que passa a economia brasileira, problema verdadeiramente de segurança nacional, com enormes conseqüências negativas sociais e econômicas. Reporto-me às ESTRADAS BRASILEIRAS, cuja situação de degradação está estrangulando a economia brasileira, impedindo a circulação de nossas riquezas e provocando o desaparecimento precoce de milhares de vidas humanas anualmente.

É impossível mensurar os enormes prejuízos sociais e econômicos decorrentes do caos que já se instalou na maior parte das estradas brasileiras, nas quais circulam 60% das mercadorias e 95% dos passageiros transportados.

Mais de seis mil pessoas foram mortas e mais de quarenta mil pessoas foram feridas nas estradas esburacadas do Brasil, no ano de 1994, situação verdadeiramente escandalosa - comparável ao número de mortos na guerra da Bósnia-Hezergovina -, por sua natureza brutal, inconcebível, lamentável e irresponsável, máxime num País que pretende ser a 10ª economia mundial.

A grande maioria desses desastres, sem dúvida, poderia ser evitada, poupando vidas de pessoas mutiladas para o resto de suas existências, caso o Governo Federal assumisse efetivamente suas responsabilidades e as suas obrigações constitucionais e políticas, decidindo construir, conservar e administrar com seriedade, responsabilidade e eficácia as estradas brasileiras.

O Sr. Carlos Bezerra - Permite-me V. Exª um aparte, nobre Senador Júlio Campos?

O SR. JÚLIO CAMPOS - Ouço, com atenção, o aparte do eminente Senador Carlos Bezerra.

O Sr. Carlos Bezerra - Senador Júlio Campos, o discurso de V. Exª retrata uma das realidades mais trágicas existentes no nosso País. Está praticamente acabado o sistema rodoviário nacional, que o País construiu durante tantos anos e com tantos sacrifícios. Erraram os legisladores brasileiros e o Executivo nacional quando extinguiram o Fundo Rodoviário Nacional e não criaram nenhum substituto para esse Fundo. Deixaram as estradas brasileiras sem nenhum recurso para investimento. E o que é mais grave: além de deixarem as estradas sem recurso para investimento, não procuraram investir em outras modalidades de transporte, fazendo o transporte intermodal. O Brasil, durante décadas, vive uma mentalidade rodoviarista. Desde o Governo de Juscelino Kubitschek, com a implantação da indústria automobilística, o Brasil descambou para o campo do "rodoviarismo", sem explorar os seus rios nem suas ferrovias. Na nossa Região, o Centro-Oeste, por exemplo, que V. Exª conhece tão bem quanto eu, são carretas e mais carretas trafegando nas estradas, sem balança ou qualquer outro tipo de controle, destruindo as precárias rodovias. Essa situação não existe apenas no Centro-Oeste, mas em todo o País. Portanto, o alerta de V. Exª neste instante é fundamental. Conversei com o Ministro Odacir Klein sobre esse assunto. S. Exª é favorável à criação de um fundo imediato voltado para a questão das rodovias. Recentemente, fiz aqui um pronunciamento a respeito do assunto. Portanto, para encerrar, parabenizo V. Exª pela propriedade do assunto que traz neste instante da tribuna do Senado.

O SR. JÚLIO CAMPOS - Agradeço a V. Exª e incorporo, com muita honra, o seu aparte ao meu pronunciamento.

Realmente, posso dizer que a política rodoviária do nosso País tem duas histórias: uma quando existia o Fundo Rodoviário Nacional, e outra, após a Constituição de 1988, quando esse fundo foi extinto, um grave erro do qual nós participamos. Digo nós porque eu também fiz parte da Assembléia Nacional Constituinte que extinguiu esse fundo de vital importância para a conservação e a melhoria das nossas estradas.

O Sr. Esperidião Amin - Senador Júlio Campos, permite-me V. Exª um aparte?

O SR. JÚLIO CAMPOS - Com muita honra, Senador Esperidião Amin.

O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros) - Senador Júlio Campos, a Mesa interrompe o pronunciamento de V. Exª para prorrogar por mais 15 minutos a Hora do Expediente, para que V. Exª possa concluir o seu pronunciamento.

O Sr. Esperidião Amin - Nobre Senador Júlio Campos, desejo participar do seu discurso com uma breve intervenção, que é pelo menos atual. Hoje, pela manhã, a Bancada do meu Partido, o PPR, seu Partido do coração - todos registraram aqui a anuência, ainda que não-verbal, mas gesticular, e o largo sorriso do nosso querido amigo Júlio Campos -, recebeu o Ministro Odacir Klein em uma reunião em que S. Exª apresentou seus planos e dificuldades. E a Bancada, que representa certamente todas as regiões do Brasil e boa parte dos Estados brasileiros, através de várias ponderações, inclusive de parlamentares do Mato Grosso do Sul e do Mato Grosso, fez ver o reconhecimento desse equívoco que V. Exª está apontando e, mais do que isso, está, com muita altivez e coragem, até assumindo na parte que lhe toca, qual seja, a dissociação da função "manutenção e construção de estradas" - e aí estamos falando da maior parte do sistema viário e do sistema de transporte nacional - de uma fonte supridora de recursos. Realmente a decisão da derrogação do Fundo Rodoviário Nacional e de seus supridores é a mãe - se V. Exª me permite dizer - de todos os buracos, de todas as mazelas e de todas as obras que, por pouco, ainda estão incompletas e, por isso, são sempre as mais caras, infernizando a vida do usuário e aumentando o Custo Brasil. Isso faz parte, grave e pesadamente, do Custo Brasil. De forma que me associo a V. Exª e trago esse dado adicional sobre a discussão profunda que tivemos hoje com o Sr. Ministro dos Transportes, no sentido de obter uma solução para esse grave problema que aflige a todos os quadrantes do Brasil.

O SR. JÚLIO CAMPOS - Muito obrigado a V. Exª, nobre Senador.

Continuando, Sr. Presidente e Srs. Senadores:

Os prejuízos econômicos representados por mercadorias perdidas, estragadas, deterioradas, roubadas e desaparecidas por caminhões e automóveis, carretas e outros veículos danificados, representam alguns bilhões de dólares, quando consideramos veículos danificados, partes e peças de reposição, despesas e consertos e gastos adicionais com combustíveis, sem falarmos do tempo perdido, do desgaste humano e do aumento no custo das empresas transportadoras.

A principal tarefa de qualquer governo sério é proteger, preservar e defender o bem-estar de sua população. Submeter o povo brasileiro a um risco permanente de perda de vidas e de patrimônio é, exatamente, inverter as prioridades governamentais e negar a ordem natural das coisas.

Num país em que o Judiciário funcionasse com rapidez, certamente a União já teria ido à falência, pois seria obrigada a indenizar as famílias das milhares de vítimas, diariamente imoladas em nossas estradas, por negligência, ineficiência, descaso e a falta de vontade política do Governo Federal.

Sr. Presidente, Srªs Senadoras e Srs. Senadores, o verdadeiro caos que se instalou nas estradas brasileiras, realmente um problema de segurança nacional, de transcendental importância para o desenvolvimento do País, vem sendo tratado como se fosse uma mera rubrica orçamentária, uma despesa adicional, descartável, eventualmente levada em consideração, na hipótese improvável de, num futuro remoto, se atingir o sonho do "equilíbrio orçamentário", num país não pertencente ao Primeiro Mundo.

Enquanto esse sonho e essa utopia orçamentária não se realizam, no Brasil real, no Brasil habitado por seres humanos, pobres em sua grande maioria, pessoas morrem, pessoas são mutiladas, motoristas perdem seus veículos e não têm como ganhar a vida; empresas transportadores sofrem grandes prejuízos; os custos do frete aumentam; a agricultura é fortemente castigada, recebendo um tratamento oposto ao dos países desenvolvidos: lá, os agricultores são subsidiados; aqui, são penalizados, têm sua produção estragada, por falta de estradas.

O Brasil se manterá no atraso, na condição de um país de terceira categoria, se continuar mantendo essa política suicida em relação às nossas estradas. Será alto, muito alto mesmo, o preço que esta e as gerações futuras serão obrigadas a pagar pelo descaso, negligência e ineficiência do Governo no setor rodoviário.

A desculpa de que "NÃO HÁ VERBA PARA AS RODOVIAS" é imperdoável, e nenhuma autoridade governamental responsável conseguirá se justificar perante a nação e perante os pósteros; não há como responder pela deterioração de um patrimônio que vale mais de US$100 bilhões, que é o valor da atual malha viária brasileira.

As perdas que os nossos agricultores estão tendo nesta safra ultrapassam 10 milhões de toneladas de grãos, o que poderia ser evitado com a simples manutenção das estradas e a conseqüente eliminação do desperdício na produção agrícola, o que certamente nos daria condições para alimentar os milhões de brasileiros esfaimados e erradicar, dessa forma, a miséria do Brasil. Talvez assim não precisássemos de programas como o Comunidade Solidária.

O Estado de Mato Grosso, que tenho a honra de representar no Senado Federal, produziu neste ano uma supersafra de grãos e está na iminência de perder cerca de dois milhões de toneladas das sete que foram produzidas, porque as nossas estradas estão praticamente acabadas.

Recentemente, na BR-364, a tão sonhada BR-29, lançada por Juscelino Kubitschek de Oliveira e asfaltada no Governo do Presidente João Baptista de Oliveira Figueiredo, cerca de 6 mil carretas ficaram paradas em decorrência de uma verdadeira cratera, de aproximadamente 10 metros de comprimento, num único trecho que liga toda a Amazônia brasileira, através do Mato Grosso, ao resto do Brasil.

Na BR-163, rodovia construída na gestão do Presidente Emílio Garrastazu Médici e asfaltada pelo Governo Estadual quando eu era Governador, no período de 1983 a 1986, entre o Posto Gil e Nova Mutum, um trecho foi simplesmente levado pelas chuvas, impedindo o escoamento da safra do Estado, com enormes perdas de produtos agrícolas e de veículos transportadores. Desde que a inauguramos, no dia 10 de dezembro de 1983, essa estrada nunca recebeu manutenção do DNER ou do Ministério dos Transportes. Ela foi paga com financiamento feito pelo Governo Estadual de Mato Grosso junto ao Banco Interamericano de Desenvolvimento - BID.

É comum encontrarmos, nesses trechos rodoviários, grandes atoleiros, erosões, quedas de barreiras, buracos e caminhões arrebentados, acidentados, capotados, com a carga avariada ou totalmente perdida.

Como o Governo não dispõe de recursos orçamentários para construir, melhorar, e nem mesmo manter a atual malha viária, precisamos encontrar urgentemente uma solução adequada a esse problema, para que o Brasil não tenha a sua economia estrangulada nem venha a morrer de inanição por falta de estradas.

A solução mais viável, econômica e politicamente, é a participação da iniciativa privada no setor de estradas rodoviárias, seja mediante concessão ou mediante privatizações efetivas, a fim de garantirmos o desenvolvimento da economia brasileira. Exemplo disso são determinados trechos de estradas do Estado de São Paulo, já privatizados ou sob concessão de exploração por empresas privadas, que constituem verdadeiro orgulho de todos os brasileiros.

O modelo de privatização que preconizamos contempla a manutenção das funções normativas, de planejamento estratégico e coordenação operativa do Governo Federal, com o fortalecimento do Ministério dos Transportes, ao qual devem ser dadas condições técnicas, materiais e orçamentárias para exercer adequadamente sua relevante função.

Os objetivos principais do modelo de privatização que defendemos são: a busca da eficiência, de menores custos operacionais, menores prazos de implantação dos projetos e melhor gerenciamento das rodovias, conferindo-se maior nível de segurança e melhores condições de serviços aos usuários.

A iniciativa privada certamente contribuirá para a geração de novos empregos, de novos postos de trabalho, na administração da empresa concessionária, na arrecadação de pedágios, na fiscalização e patrulhamento mais intenso e efetivo, na segurança e proteção do patrimônio dos usuários, com obras de manutenção de melhor qualidade, além da possibilidade efetiva de mais rapidamente incorporar inovações tecnológicas e oferecer melhores serviços, a menores custos e a um maior número de pessoas.

Tenho certeza absoluta de que se o Governo permitisse a privatização ou a concessão desses serviços de manutenção de rodovias federais à iniciativa privada, no meu Estado vários grupos empresarias estariam aptos a imediatamente fazer a reconstrução dessas rodovias, que estão praticamente acabadas no território mato-grossense. Foi na gestão do Ex-Presidente João Figueiredo, na década de 80, que houve o último asfaltamento de estrada em Mato Grosso.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a insuficiência de investimentos governamentais no setor rodoviário está inviabilizando o desenvolvimento regional e o desenvolvimento nacional, provocando o sucateamento de nossas estradas, um patrimônio avaliado em mais de US$100 bilhões.

E quando falo em estradas, em rodovias federais, volto o meu pensamento para a famosa BR-101, que liga São Paulo ao Rio Grande do Sul e que vive constantemente nas manchetes das televisões brasileiras, dos jornais e das rádios, que mostram as deficiências dessa estrada, a verdadeira carnificina que é essa rodovia nacional, que integra o MERCOSUL com o resto do Brasil e que, no entanto, até hoje, por falta de dinheiro, sequer tem a sua conservação permanente executada, quanto mais a tão sonhada duplicação.

Os custos do transporte rodoviário no Brasil chegam ao dobro dos países desenvolvidos, sem falarmos da ineficiência de nossa malha de transportes ou da saturação da capacidade de grande número de rodovias, cheias de pontos críticos. Para um país de grandes distâncias entre regiões, está demonstrada a falência do atual modelo de administração rodoviária que o Brasil implementa.

No Estado de Mato Grosso, hoje, já se vive uma situação de calamidade pública, pois nossas estradas estão praticamente acabadas e não dispomos de ferrovias nem de hidrovias que nos garantam alternativas viáveis de transporte para o escoamento de nossa crescente produção agrícola, pecuária e mineral.

Neste momento, faço um apelo a S. Exª o Sr. Ministro do Exército para que coloque a serviço de Mato Grosso a experiência, a competência e a capacidade de trabalho do Nono Batalhão de Engenharia do Exército, sediado em Cuiabá, que, certamente, muito poderá contribuir para a solução emergencial dos problemas por que passa o setor rodoviário de Mato Grosso.

Faço um apelo, também, ao eminente Ministro dos Transportes, que tem mostrado muito boa vontade, para que resolva os problemas rodoviários e hidroviários de Mato Grosso, e para que apóie o nosso DNER, para que esse organismo federal possa voltar a fazer a manutenção e a conservação dos trechos críticos das nossas estradas federais.

Estou convicto de que o eminente e competente Presidente da República, Senhor Fernando Henrique Cardoso, não nos faltará neste momento de dificuldades por que passa Mato Grosso, por que passa o Brasil e por que passa o setor rodoviário.

Tenho certeza de que o seu compromisso de campanha, feito na cidade de Sinop, no ano passado, quando prometeu a conclusão da BR-163, Cuiabá-Santarém, será, de fato, uma realidade a partir de agora que Sua Excelência ocupa a Presidência da República.

O povo de Mato Grosso, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, saberá responder, com trabalho e com aumento da produção, ao apoio que receber do Governo federal. Não desejamos nem pedimos mero adjutório. Tudo o que o Brasil fizer por Mato Grosso receberá mais que o dobro em riqueza, em trabalho, em alimento, em desenvolvimento para todo o País.

É o meu pensamento. Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 22/06/1995 - Página 10625