Discurso no Senado Federal

DEGRADAÇÃO DA MALHA VIARIA NO PAIS.

Autor
Valmir Campelo (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/DF)
Nome completo: Antônio Valmir Campelo Bezerra
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DE TRANSPORTES.:
  • DEGRADAÇÃO DA MALHA VIARIA NO PAIS.
Publicação
Publicação no DCN2 de 01/07/1995 - Página 11464
Assunto
Outros > POLITICA DE TRANSPORTES.
Indexação
  • ANALISE, CRITICA, PRECARIEDADE, SITUAÇÃO, SISTEMA VIARIO, PAIS, RESULTADO, OMISSÃO, INEFICACIA, ADMINISTRAÇÃO, EXCESSO, BUROCRACIA, GOVERNO, AUSENCIA, INVESTIMENTO, SETOR, CONSERVAÇÃO, RESTAURAÇÃO, RODOVIA, REDUÇÃO, MORTE, ACIDENTE DE TRANSITO, PREÇO, FRETE, POSSIBILIDADE, ESCOAMENTO, SAFRA, EXPORTAÇÃO, PRODUÇÃO AGRICOLA.
  • DEFESA, NECESSIDADE, URGENCIA, GOVERNO FEDERAL, ESTABELECIMENTO, POLITICA, INVESTIMENTO, SISTEMA VIARIO, PAIS.

O SR. VALMIR CAMPELO (PTB-DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, nas últimas décadas, líderes e representantes do Governo Federal têm anunciado projetos, planos e operações para recuperar a malha rodoviária brasileira. E nada acontece. Milhões de reais são perdidos por conta de buracos que dificultam o trânsito de caminhões, ônibus e carros de passeio. Algumas estradas, literalmente, acabaram. Não há como escoar a safra, não há como exportar a nossa grande e importante produção agrícola. Os preços dos fretes aumentam de maneira desproporcional e os acidentes de trânsito resultam em uma multidão de mortos e feridos.

O Brasil é um país continental que, nos anos sessenta, decidiu dar prioridade ao transporte rodoviário. Acabou com ferrovias deficitárias, parou de investir nesse setor e decidiu construir estradas. Esse projeto durou enquanto houve dinheiro para abrir novas fronteiras. O sonho acabou em 1982, no momento em que os banqueiros internacionais decidiram que o Brasil precisava parar de se endividar e iniciar o pagamento devido. A partir de então, o Governo Federal viu-se na situação de não dispor de recursos para abrir novos caminhos, nem para manter as suas rodovias já em funcionamento.

Alguns exemplos são demonstrativos dessa situação absurda. A ligação entre São Paulo e Paraná, por intermédio da BR-116, a chamada "estrada da morte", é responsável por uma quantidade inacreditável de mortos e feridos, além de redundar em ineficiência para o transporte de cargas. Não há uma estrada ligando Rio e São Paulo a Buenos Aires, assim como não há uma boa estrada ligando o Centro-Oeste ao litoral. Toda a produção agrícola dos Estados de Mato Grosso e Rondônia é escoada pelo Porto de Santos e trafega na BR-164, que não conhece conservação há muitos anos.

Essa situação, que resulta de ineficiência administrativa, de má gestão da coisa pública e de excesso de burocracia, prejudica enormemente o Brasil e dificulta seu desenvolvimento. O enorme esforço realizado no setor agrícola para alargar fronteiras, elevar produtividade e obter significativos ganhos de produção fica anulado quando o produto é colocado na estrada. Buracos, asfalto ruim, falta de policiamento, enfim, esse conjunto de ineficiências que indica má conservação, conspira contra o sucesso da agricultura e prejudica o brasileiro.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, cinco mil brasileiros morrem, por ano, em acidentes nas rodovias. O trânsito é o maior responsável pelas mortes no Brasil, superando doenças cardíacas, respiratórias, endêmicas e a AIDS. O trânsito mata, por ano, o equivalente, em vidas humanas, a queda de dez aviões Boeing 747, o Jumbo.

Em toda a Guerra do Vietnã, as Forças Armadas dos Estados Unidos da América perderam 50 mil homens. As rodovias no Brasil vão matar o mesmo número de pessoas em 10 anos. O trânsito no Brasil é uma doença que mata. Isso é o resultado, em grande parte, da falta de manutenção das estradas, da falta de sinalização e da inexistência de policiamento. Estamos falando aqui da omissão do Estado.

Aqui perto, na Rodovia BR-070, que liga Brasília a Cuiabá, o Departamento de Estradas e Rodagem registrou 340 acidentes de trânsito, no ano passado, praticamente um por dia. Naquele período, 111 pessoas morreram, quatro vitimadas por atropelamento e 107 em conseqüência de desastres. Ocorreram ainda 209 acidentes sem vítimas e cinco atropelamentos sem morte. Na Rodovia Régis Bittencourt, São Paulo-Curitiba, a chamada "rodovia da morte", ocorreram 2.500 acidentes em 1994. Neles 214 pessoas perderam a vida e 1.366 sofreram algum tipo de lesão.

A história do desmazelo com as rodovias federais começa em algum momento no final do anos 70, com o chamado segundo choque do petróleo. Naquele momento, iniciou-se um processo de debilitação do Fundo Rodoviário Nacional, através das políticas fiscais do Governo da União, que resultaram na redução das alíquotas do Imposto Único sobre Lubrificantes e Combustíveis Líquidos e Gasosos. Este imposto terminou sendo extinto pela Constituição de 1988. A conseqüência dessa decisão é visível a todos: a degradação da malha rodoviária federal, que hoje está numa situação lamentável. Somente 45%, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, das rodovias federais pavimentadas, segundo dados do GEIPOT, se encontra em boas condições operacionais. Dos 160 mil quilômetros hoje existentes, mais de 43 mil estão em situação deficiente de conservação.

Na malha rodoviária nacional circulam 95% dos passageiros, e mais de 60% da carga do País. A deficiência das estradas ocasionam custos operacionais adicionais da ordem de US$4,2 bilhões. Vou repetir, Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, US$4,2 bilhões. Os dados, torno a dizer, são citados em estudo recente, de abril de 1995, realizado pela Empresa Brasileira de Planejamento de Transportes, o GEIPOT.

Os problemas detectados, pelo estudo, nas rodovias brasileiras são, basicamente, os seguintes: a má conservação implica o consumo de 58% a mais de combustível; custo operacional adicional de 38%; número de acidentes até superior a 50% ao estimado; e tempo de viagem maior em 100% ao planejado. O desleixo na conservação das estradas é responsável por 60 mil acidentes por ano, um número seis vezes maior que os revelados pelos países da Comunidade Européia, Estados Unidos e Canadá.

A correta conservação das estradas poderia reduzir à metade os atuais níveis de acidentes nas estradas brasileiras. Esta situação dramática resultou dos baixos níveis de investimentos realizados nos últimos quinze anos no setor e decorre, também, da destruição do modelo de financiamento existente no antigo Fundo Rodoviário Nacional. É preciso, Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, que o Governo Federal inicie, em caráter de urgência, estudos para estabelecer uma política de investimento neste setor.

Para que V. Exªs tenham uma idéia do que está ocorrendo, o Governo investe hoje, em pavimentação, restauração e manutenção de estradas, a quarta parte do que fazia na década de setenta. Naquela ocasião a frota brasileira era de dois milhões de veículos, hoje é de mais treze milhões. Aumentou o número de veículos, elevaram-se as tonelagens de carga, cresceu o número de passageiros, e os investimentos nas rodovias foram reduzidos. Viajar, por rodovias nos dias de hoje, no Brasil, é uma aventura perigosa.

A experiência internacional demonstra que os programas de recuperação de rodovias dependem de um mecanismo financeiro eficiente, firme, confiável e estável para garantir os recursos condizentes com a necessidade do sistema. Para reverter o quadro de deteriorização de rodovias nacionais é necessário investir, por ano, US$5 bilhões.

Diversos países possuem um sistema de impostos que produzem receitas vinculadas a rodovias. Cito alguns deles: Estados Unidos, Bolívia, Colômbia, Islândia, Holanda, Suíça, África do Sul, Togo, Gana, Zaire, Mali, Japão e Austrália.

Nos Estados Unidos foi criado, em 1956, um fundo de crédito rodoviário, junto com um plano nacional para construir o sistema rodoviário interestadual. Esse programa é avaliado pelo congresso a cada cinco anos. Os recursos têm origem em impostos sobre combustíveis, pneus e vendas à varejo de caminhões. O programa financiou mais de 845 mil quilômetros de construção ou reconstrução de rodovias e 18 mil pontes.

Ainda, nos Estados Unidos, a prática da vinculação da receita originário de um imposto é muito difundida entre as unidades da federação. Dos 51 estados norte-americanos, 47 utilizam a vinculação de receita. Isso significa, na prática, que os Estados e a União utilizam um sistema de impostos para a construção e manutenção de rodovias. O resultado é que o contribuinte norte-americano dispõe de uma malha rodoviária enorme, bem conservada e capaz de suportar o tráfego de milhões de veículos. No Brasil, o contribuinte não paga impostos com receita vinculada à conservação e manutenção de rodovias, mas não desfruta de estradas confiáveis.

Há, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quem pense em privatização de rodovias. Há quem pleiteie a volta do Imposto Único Sobre Combustíveis. São caminhos e alternativas. A verdade é que o assunto precisa ser discutido, analisado e deliberado. É importante e urgente encontrar-se uma solução. Os 160 mil quilômetros de rodovias pavimentadas brasileiras estão se acabando por má conservação. Além do prejuízo em si, estradas mal conservadas significam maiores custos e um número expressivo de acidentes. Os brasileiros estão morrendo nas estradas por culpa do Governo Federal. É o momento de reverter esse quadro desolador e encontrar uma solução definitiva, objetiva e duradoura.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 01/07/1995 - Página 11464