Discurso no Senado Federal

FAVORAVEL AS REFORMAS NO SETOR ELETRICO, INCLUSIVE A SUA PRIVATIZAÇÃO.

Autor
Gilberto Miranda (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AM)
Nome completo: Gilberto Miranda Batista
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PRIVATIZAÇÃO.:
  • FAVORAVEL AS REFORMAS NO SETOR ELETRICO, INCLUSIVE A SUA PRIVATIZAÇÃO.
Publicação
Publicação no DCN2 de 09/08/1995 - Página 13624
Assunto
Outros > PRIVATIZAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, APROVAÇÃO, EMENDA CONSTITUCIONAL, INCENTIVO, CRESCIMENTO, PARTICIPAÇÃO, CAPITAL ESTRANGEIRO, NAVEGAÇÃO DE CABOTAGEM, PAIS.
  • COMENTARIO, DECRETO FEDERAL, AUTORIZAÇÃO, TRANSFERENCIA, PROPRIEDADE, SETOR PUBLICO, INICIATIVA PRIVADA, SETOR, PRODUÇÃO, ENERGIA ELETRICA.
  • DEFESA, PRIVATIZAÇÃO, CENTRAIS ELETRICAS DO SUL DO BRASIL S/A (ELETROSUL), CENTRAIS ELETRICAS BRASILEIRAS S/A (ELETROBRAS), FURNAS CENTRAIS ELETRICAS S/A (FURNAS), OBJETIVO, CONCLUSÃO, PROJETO, AUMENTO, CAPACIDADE, PRODUÇÃO, ENERGIA ELETRICA, INCENTIVO, CRIAÇÃO, EMPREGO, ATIVIDADE ECONOMICA, DESENVOLVIMENTO ECONOMICO.

O SR. GILBERTO MIRANDA (PMDB-AM.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o modo como tem sido conduzido, na Câmara e no Senado, pelas respectivas Comissões de Minas e Energia, o debate sobre a privatização das atividades no setor elétrico, induz-me a crer que as lideranças políticas brasileiras querem de fato prover o País das reformas indispensáveis à aceleração do progresso sócio-econômico.

Estudos das áreas de sociologia e ciência política primam na avaliação positiva dos efeitos sociais produzidos pelas reformas econômicas. Têm tido bastante divulgação os resultados de pesquisas realizados nesses campos.

Em discurso que tive a ocasião de proferir, neste recinto, procurei demonstrar que o uso amplo da cabotagem, no transporte de gêneros alimentícios de portos do Sul para o Nordeste e Norte, de Rio Grande a Manaus, proporcionaria uma dieta mais barata e sem dúvida mais rica às populações das regiões metropolitanas, em expansão, ao longo da nossa extensa costa marítima. Percebe-se claramente a escala dos benefícios sociais resultantes de uma reforma desse porte.

Depois de tramitar na Câmara dos Deputados, há de também ser aprovada, no Senado, a atracação de navios de bandeira estrangeira em nossos portos, fazendo o transporte de mercadorias em substituição parcial do transporte rodoviário, de custo infinitivamente mais elevado. Trata-se de uma reforma econômica de efeito social inapreciável.

Esperemos que a regulamentação dessa emenda constitucional corresponda à aspiração que de longa data acalentam os brasileiros dos grandes centros urbanos situados à beiram mar.

A energia elétrica é de alcance sócio-econômico ainda maior. Pois a escassez e o racionamento de eletricidade comprometem o sistema econômico e a vida social como um todo. O abastecimento irregular de energia elétrica desorganiza o setor industrial, pertuba ao extremo o setor comercial e causa desordem indescritível nos lares de todo o País.

Diante da crise financeira que vem provocando a paralisação ou a execução em marcha lenta de numerosos projetos do setor elétrico, o País sente a necessidade de descobrir novas fontes de recursos para superar esse obstáculo.

Considero, pois, da maior importância a colaboração do capital privado para restaurar o ritmo anterior das obras e garantir o suprimento de eletricidade, afastando-se, por esse meio, a ameaça do racionamento, cujas consequências são nefastas.

Essa colaboração poderá ser oferecida, e aceita, em três áreas bem definidas:

                       1) a associação de capital na execução de muitos ou de todos os dezesseis projetos hidrelétricos, cuja construção está paralisada ou avança em ritmo muito lento, por falta de recursos financeiros;

                       2) a permissão ao capital privado para assumir a responsabilidade pela execução de projetos novos; e

                       3) a aquisição por empresas privadas das redes de distribuição de eletricidade nos centros de consumo.

É justamente a previsão de que, em futuro próximo, estará totalmente absorvida a capacidade do nosso parque produtor de eletricidade, que torna obrigatório o apelo à colaboração do capital privado. Se não há previsão da entrada em funcionamento de dezesseis unidades hidrelétricas, cujas obras estão paralisadas não se sabe também quando estarão operando as usinas nucleares de Angra II e III. Nos Estados do Sul, não saíram do papel vários projetos de energia elétrica com base no emprego do carvão mineral da região.

Sr. Presidente, Senhoras e Senhores Senadores, no dia 5 de maio passado veio a público o decreto presidencial, que incluiu a Eletrobrás no programa de privatização. Passou a ter base legal a transferência para o setor privado das grandes centrais elétricas de Furnas, Eletronorte, Eletrosul e Chesf, além da participação acionária da Eletrobrás nas empresas estaduais de eletricidade.

Considero louvável a decisão oficial de tornar o mais amplo possível o programa de privatização no setor de exame. Conforme declarou o ministro das Minas e Energia, Sr. Raymundo de Brito, a Eletrobrás será dividida em duas empresas, uma das quais, a Eletropar, passaria a ser detentora das ações que a holding possui nas empresas elétricas do País. Essas parcelas do capital total da Empresa holding seriam transferidas ao setor privado em leilões públicos. Continuaria a existir uma empresa com o nome de Eletrobrás, cuja atividade ficaria restrita à regulamentação do setor elétrico, conservando a União, como sua propriedade, a rede nacional de transmissão de energia.

A Eletrobrás forma um poderoso bloco de empresas com as suas associadas e subsidiárias regionais e estaduais. Do ponto de vista contábil, conforme o seu Relatório de 1994, o patrimônio líquido da Empresa está avaliado em soma superior a cinquenta bilhões de reais. No entanto, o valor verdadeiro desse empreendimento grandioso supera de muito a casa dos cem bilhões de reais.

Quando se fala no ingresso do capital privado no setor da energia elétrica, ocorre lembrar, de início, as diversas áreas consideradas propícias à atuação da livre iniciativa.

Fiz referência aos dezesseis projetos hidrelétricos paralisados ou em ritmo lento de construção. E não posso deixar de considerar altamente significativa a decisão adotada pelo Governo Federal cancelando trinta e três concessões dadas a empresas estaduais de energia elétrica. Esse decreto amplia o rol de aproveitamento oferecidos ao setor privado, o qual poderia desfrutar de mais trinta e três oportunidades de investimento.

A análise qualitativa e quantitativa da oferta de bens e serviços numa economia de grande porte, como a dos Estados Unidos, permite ao observador testemunhar a incomensurável capacidade da livre iniciativa, quando o ambiente é favorável ao seu desenvolvimento. É naquele país abundante a oferta dos serviços básicos (energia elétrica, telecomunicações, transportes, distribuição de combustíveis, operações bancárias, comércio, etc.), que estão entregues ao capital privado.

Não duvido, portanto, de que a iniciativa privada solucionará os problemas ligados à insuficiente oferta de serviços de toda natureza em nosso País. Tudo dependerá das condições institucionais que forem estabelecidas para cada setor. Isso quer dizer que o Congresso Nacional tem um compromisso com a sociedade, pois cabe aos parlamentares dos mais diferentes partidos a elaboração das leis, complementares ou ordinárias, para regular o funcionamento das telecomunicações, da energia elétrica e de outros serviços de importância vital.

Surge, depois dessas considerações, uma questão pertinente. Por onde devemos começar a privatização do setor elétrico? Como fixar, nessa área, prioridades que produzam o maior rendimento para a economia nacional?

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, políticos e técnicos voltados para o tema conferem prioridade máxima ao aumento da potência instalada do sistema elétrico. Significa, que devemos encontrar meios para concluir as dezesseis centrais de construção já iniciada. Significa, outrossim, mobilizar recursos para executar vários dos projetos relativos às trinta e três concessões recentemente canceladas pelo Poder Executivo. Nos referidos dois grupos de projetos está implícito um programa de grande envergadura.

A mobilização de recursos financeiros e de mão-de-obra para executar um tal programa e a amplitude da coordenação de todas as atividades envolvidas em sua execução, inclusive as compras de materiais e equipamentos, permite-nos antever de tudo isso um generalizado efeito positivo sobre a economia nacional.

Seria desnecessário chamar a atenção para a importância da escolha acertada das prioridades. Que devemos preferir, o programa acima referido, ou a simples venda de furnas, da Eletrosul ou da Chesf?

A venda de Furnas, por exemplo, não acrescentará nada à capacidade de geração do sistema elétrico. Podem surgir interessados na compra de empresas, cuja potência instalada esteja concluída. Mas uma transferência dessa espécie não parece ter relação com o objetivo essencial de se prover a economia de meios para seu desenvolvimento constante.

Não há dúvida de que a substituição do setor público pela iniciativa privada dará maior eficiência à operação de empresas elétricas ou de qualquer outro setor. Mas esse ganho de eficiência, no caso em exame, não daria a menor contribuição à realização do objetivo essencial de incremento da geração de eletricidade. Essa é a questão primacial em jogo.

Verifica-se, portanto, que a conclusão de obras em andamento e o lançamento de projetos novos geram novos empregos e estimulam a atividade econômica. Em contraste, a venda de empresas prontas e acabadas não aumenta a capacidade instalada e provocará inevitável onda de desemprego.

Ora, os referidos dezesseis projetos paralisados ou em execução lenta, somados aos trinta e três aproveitamentos, cujas concessões foram canceladas, dão substância a um programa de expansão do sistema elétrico de vulto considerável.

Suponhamos que a afirmação contida no parágrafo anterior seja contestada por pessoas que pensem num programa de dimensão ainda maior.

Sim, é perfeitamente possível elaborar um tal programa. O Plano 2015, da Eletrobrás, aponta, em um dos seus dezesseis volumes, a existência de trinta e quatro aproveitamentos cuja capacidade de geração varia de 100 mil a 400 mil kilowats. Há mais vinte e seis aproveitamentos cujo potencial elétrico varia de 400 mil a um milhão de kw. Existem, ainda, vinte e um com capacidade de um milhão a três milhões de kw, indicando a possibilidade de uma safra excepcional de usinas de grande porte.

Concluo essa referência a esse novo lote de mais de cem oportunidades de investimento privado com um destaque para o aproveitamento da Altamira, no Estado do Pará, que asseguraria uma energia firme da ordem de cinco milhões e 720 mil kw. Também no Pará, em Belo Monte, uma segunda Itaipu está à espera de construção para oferecer ao País uma capacidade geradora que se eleva a onze milhões de kw, isto é, pouco abaixo dos 12 milhões e 600 mil kw da Bi-Nacional.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, muitos de nós temos visitado obras hidrelétricas em andamento. A preparação do leito dos reservatórios e a construção das barragens envolvem grandes contingentes de trabalhadores e verdadeiras frotas de máquinas pesadas em operação. Tratores, escavadeiras, britadoras, caminhões pesados rompem o silêncio de lugares ermos em sinfonia ensurdecedora.

Comparo o turbilhão dessa atividade empolgante com a silenciosa negociação que permite uma simples troca de pessoas nos gabinetes de administração das empresas do grupo Eletrobrás, que venham a ser transferidas para o setor privado.

São múltiplos os prismas pelos quais se poderá examinar o ingresso do capital privado no setor da energia elétrica, a partir da construção de novas centrais. Destaco, primeiramente, o alívio que dará às finanças públicas a atração de capitais de outras fontes em substituição a recursos do Erário. Claro é que, dispensando-se de tal responsabilidade, o Estado poderá cuidar melhor de áreas prioritárias, como a saúde, a educação, a habitação popular. O resgate da dívida social ganhará, assim, alta prioridade.

Outro efeito, imediato será a mobilização de mão-de-obra no interior do País, retardando o afluxo de contingentes que aumentam os transtornos na periferia dos grandes centros urbanos.

Há, entretanto, outra área a merecer a maior atenção. Refiro-me à indústria de bens de capital sob encomenda, que se expandiu e criou uma formidável capacidade de produção, a partir dos anos 70, para ser totalmente abandonada nos últimos anos.

A falência do Estado provocou situações de desespero para empresários de todas as especialidades, que surgiram e cresceram em função dos investimentos crescentes no setor elétrico. Empresas dedicadas a estudos de viabilidade e elaboração de projetos, formando e reunindo técnicos altamente especializados, ao lado dos fabricantes de variada gama de equipamentos, sofreram graves prejuízos com a suspensão dos investimentos do setor público em energia elétrica.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a entrada do capital privado na produção e distribuição de energia elétrica oferece ao Governo a ocasião de resgatar a dívida que tem para com a variada gama de empresas particulares dedicadas ao Setor. O resgate dessa dívida tem implicações variadas e profundas em todo o sistema econômico nacional e em importantes segmentos da sociedade.

Se forem seguidas as linhas acima indicadas, começará logo a reconstituição das equipes das empresas de projeto e de montagem de instalações elétricas, assim como dos fabricantes de bens de capital sob encomenda. Nos trabalhos de campo, as empresas de construção estarão mobilizando grupos sucessivos de trabalhadores e melhorando por essa via as condições sociais no interior do País. Serão inumeráveis os benefícios daí resultantes.

Não há dúvida de que o lançamento de um grande programa de construção de centrais hidrelétricas marcará o início de um novo ciclo de desenvolvimento da economia brasileira. Um programa dessa natureza se refletiria na ocupação de grande parte da capacidade instalada das indústrias voltadas para o setor elétrico, que nos últimos anos amargam a falta de encomendas.

O setor industrial demonstrou alta competência em sua expansão desde os primeiros anos do decênio de 1970. Conforme dados da Agência Especial de Financiamento Industrial - FINAME, do BNDES, em 1978, já era bastante elevado o índice de nacionalização dos seguintes itens: pontes rolantes e pórticos - 91%; equipamentos hidromecânicos - 98%; chaves seccionadoras até 230kv - 91%; transformadores de potencial, até 138 kv - 82%; disjuntores até 138 kv - 75%; pára-raios até 230 kv - 78%.

O progresso da capacitação industrial do País foi realmente extraordinário. Itens que em 1978 ainda não eram fabricados aqui, como os transformadores de corrente, de 345 e 500 kv, chegavam a 1981 com índice de 81%. As turbinas Kaplan, por exemplo, já apresentavam em 1981 índice de nacionalização de 82%. Prosseguiu nos anos seguintes, em ritmo promissor, o crescimento de todos esses índices. Bastaria lembrar que chegou a 85% a participação dos equipamentos eletromecânicos de produção brasileira na gigantesca usina de Itaipu Bi-Nacional. Pode-se afirmar, sem receio de erro, conforme dados oficiais, que a indústria instalada no País possui uma capacidade de produção de turbinas equivalente a dez milhões de kw a cada ano.

De acordo com fontes do BNDES, sempre que puder contar com financiamento interno de longo prazo e com taxas de juros equivalentes às do mercado internacional, a indústria brasileira de máquinas e equipamentos para o setor elétrico oferecerá preços altamente competitivos.

Chego a um ponto do meu discurso que considero de particular importância. Pois reproduzo a apreensão das mencionadas fontes quando se trata do ingresso do capital privado na construção e operação de centrais hidrelétricas. Todos concordamos em que deverão ser definidas condições tão favoráveis quanto possível, para que seja crescente o volume de recursos financeiros privados aplicados no setor elétrico.

No entanto, não podemos deixar de ter uma política de desenvolvimento industrial capaz de refletir o interesse das empresas nacionais de engenharia, de montagem e de fabricação de equipamentos. Na era da terceirização, são inumeráveis as empresas que participam na produção de bens e serviços destinados ao setor elétrico.

Suponhamos que um grupo investidor estrangeiro assuma a responsabilidade de construir e operar projetos do setor elétrico. Não se poderia admitir uma liberdade de ação que excluísse a participação das mencionadas empresas no fornecimento de seus bens e serviços. Em linguagem mais clara: em nome de uma abertura econômica irresponsável, seria inadmissível uma política industrial que fechasse os olhos à importação de projeto executivo, de especialistas em montagem e de equipamentos eletromecânicos estrangeiros, em detrimento das empresas nacionais que operam no setor. Ao contrário de perspectiva tão sombria, a privatização do setor elétrico dará ao País a oportunidade de reparar erros cometidos contra o mencionado segmento de empresas.

Espera-se, portanto, de uma política vinculada ao interesse nacional em seu conjunto, que venha a ocorrer uma progressiva utilização da capacidade produtiva das empresas industriais do setor elétrico.

Não se pode deixar de reconhecer que o Estado deu forte contribuição à implantação e expansão dessa indústria. No entanto, a perda de capacidade financeira governamental, refletindo-se na paralisação de obras e no adiamento de novos projetos, teve efeito desastroso na vida de muitas empresas, que assim foram levadas à concordata e à falência.

Nos últimos anos, as empresas estatais dispensaram um tratamento imerecido ao setor privado. Atrasos de pagamento, alterações bruscas das regras do jogo econômico, imposições de vária natureza no que tange à interpretação da fraseologia dos contratos, imposição aos fornecedores de modificações nas linhas de projetos básicos em execução - tudo isso acarretou prejuízos de vulto ao empresariado privado.

Acredito, portanto, que a privatização do setor elétrico só produzirá resultados satisfatórios para todos os segmentos da economia nacional, se a política industrial assegurar participação crescente à indústria de máquinas e equipamentos na formação bruta de capital fixo. Essa participação tem sido inconstante ao extremo.

Recorda-se a Agência Especial de Financiamento Industrial - Finame que, em certos anos a indústria de bens de capital sob encomenda chegou a registrar faturamento bruto superior a nove bilhões de dólares. Em anos recentes, esse faturamento não ultrapassa a casa dos três bilhões de dólares.

Se a privatização ensejar a execução de um amplo programa de construção de centrais elétricas, espera-se que não demore a colheita dos resultados da política fiscal que o Governo promete lançar, com apoio do Congresso Nacional.

Há pleno consenso no que tange à necessidade de ajuste fiscal como ponto de apoio da retomada do desenvolvimento. Conta-se não só com a eliminação do deficit orçamentário, mas principalmente com a apuração de superavit suficiente para permitir à União destinar maior volume de recursos ao sistema BNDES, com vistas ao financiamento à indústria.

A elevação da poupança do setor público poderá oferecer suporte a uma extensão do setor privado, fortalecido este com a incorporação de investidores em projetos decorrentes do processo de privatização.

Gera, portanto, novas esperanças a reforma do sistema tributário, através de emenda constitucional que será proposta pelo Executivo no segundo semestre do corrente ano. Não se pode deixar de assinalar a relação direta entre as sobras de recursos públicos para maciços financiamentos de longo prazo, à indústria e a substituição dos deficits consecutivos por superavits orçamentários constantes.

É essa mudança que determinará a queda das taxas de juros, hoje asfixiantes. O custo do dinheiro se desenha como um espantalho diante dos investidores privados, que têm projetos industriais de viabilidade técnica e econômica comprovada. Ao mesmo tempo, esse custo representa um bloqueio ao investimento público, de vez que os juros altos consomem boa parte dos recursos orçamentários da União. Desse modo, não há sobra de recursos a empregar, direta ou indiretamente, na retomada dos investimentos.

Do mesmo modo que a taxa de juros baixa facilita a execução de projetos industriais novos, a taxa elevada afugenta os investidores e desvia os capitais disponíveis para aplicações financeiras de curto prazo.

As taxas elevadas, vigentes no mercado financeiro nacional, podem atrair capitais estrangeiros, caracterizados por sua volubilidade, que se incorporam de súbito à reserva cambial, mas que também podem sair do país sem aviso prévio, causando transtornos desastrosos.

Esse quadro de condições gera anomalias financeiras que devem ser extintas o quanto antes. Quando o capital especulativo, que não esquenta lugar, ingressa no País, seus portadores recebem grande massa de moeda nacional.

Para contornar os efeitos desfavoráveis da expansão da base monetária e dos meios de pagamento, vê-se a autoridade monetária compelida a emitir títulos públicos para "enxugar" o mercado, oferecendo aos tomadores remuneração cada vez mais alta.

Finalmente, essa remuneração compromete as disponibilidades orçamentárias, dado o aumento dos encargos da dívida pública. Esses fatos já baixaram à consciência da sociedade.

Voltando a tratar do sistema elétrico, devo salientar que a nossa capacidade instalada se caracteriza pela predominância hidrelétrica. As fontes hidráulicas fazem do Brasil uma terra abençoada e o colocam ao lado da Noruega entre as nações com os mais elevados índices mundiais no uso de recursos hídricos para a produção de eletricidade. Noventa e sete por cento da energia elétrica produzida no País provêm de nossas quedas d'água.

Esse índice forma contraste perfeito com o que ocorre em países como o Japão, onde a totalidade da eletricidade consumida resulta do consumo de carvão e petróleo. Pode-se avaliar o custo financeiro das instalações antipoluentes quando há total dependência de combustíveis fósseis.

Aqui, as usinas termelétricas são utilizadas somente para complementar a geração dos sistemas interligados nos períodos hidrológicos secos, nas horas de maior demanda ou quando ocorrem situações de emergência nos sistemas de transmissão.

Em seu Relatório de 1994, a Eletrobrás anuncia um crescimento do mercado nacional de energia da ordem de 3,7% em relação ao ano anterior, significando que no ano passado a demanda nacional de eletricidade correspondeu a 275 bilhões de Wh (Watts/hora). A cifra comporta volume invejável de energia hidrelétrica dentro do conjunto de eletricidade produzida no País.

Lê-se no Plano 2015 da Eletrobrás que o sistema nacional apresenta, entre suas principais características, as seguintes: reservatórios com regularização plurianual, ou seja, com capacidade de armazenar água para utilização durante vários anos em períodos de afluências reduzidas; grandes distâncias entre as fontes produtoras e os centros de consumo; bacias hidrográficas com diversidade hidrológica, isto é, que apresentam diferenças entre suas distribuições de vazão ao longo do ano; elevado grau de interligação elétrica entre sistemas de bacias; e grande parte do potencial hidrelétrico ainda disponível.

Sr. Presidente, Senhoras e Senhores Senadores, antes de encerrar desejo convalidar a opinião de técnicos brasileiros que chamam a atenção da sociedade para tendências perigosas no que diz respeito ao aproveitamento de nossos recursos hídricos. Sobretudo, avolumam-se as restrições contra a utilização dos situados na Região Amazônica.

A esse respeito, a experiência de Itaipu demonstra que o Brasil dominou a tecnologia do transporte de grandes blocos de energia a longas distâncias. Isso quer dizer que estamos autorizados, tecnicamente, a pensar na Amazônia como uma grande fonte de energia elétrica.

É crescente, entretanto, um movimento dito preservacionista cujo principal objetivo é impedir a construção de usinas hidrelétricas na Grande Região Norte, onde o potencial é estimado em cento e cinquenta milhões de kw, três vezes a potência hidrelétrica hoje instalada em todo o País.

Diz-se que seriam inundadas muitas terras, que teriam melhor destino se fossem reservadas às tribos indígenas nômades. Vejamos o seguinte: as reservas dos ianomâmis, no Amazonas e em Roraima, totalizam cento e oitenta e oito mil quilômetros quadrados. Essas imensas extensões estão ocupadas por cerca de doze mil índios dessa tribo, metade em cada estado supra citado. No Amazonas, a reserva Waimiri-Atroari, ocupada por apenas 380 índios, se estende por vinte e cinco mil km². Não se pode imaginar maior desperdício de solo e de recursos florestais e minerais, pois é vedada a atividade econômica regular nas reservas indígenas demarcadas.

Surge uma pergunta obrigatória: quantos quilômetros quadrados ocupam os reservatórios das grandes hidrelétricas?

Resposta: cerca de quatro mil kw². Vê-se a enormidade da incongruência. Pois o resultado de toda essa campanha nacional e internacional contra as hidrelétricas amazônicas, será a construção de usinas atômicas nas proximidades dos grandes centros urbanos.

Tomo a iniciativa de convidar os meus ilustres pares a uma série meditação sobre o assunto. Pois a substituição de 150 milhões de kw de usinas na Amazônia por 150 usinas atômicas perto dos grandes centros de consumo representa uma troca demoníaca.

Nessa permuta estão contidas potencialidades ameaçadoras às populações de cidades densamente povoadas, nas proximidades de suas usinas nucleares, substitutivas.

Sr. Presidente, Senhores Senadores, abrigo a crença de que as idéias que lancei ao longo deste discurso representem a confluência de intenções de importantes círculos da opinião nacional, tanto na esfera do setor público como em diferentes áreas do setor privado.

Agradeço a generosa atenção.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 09/08/1995 - Página 13624