Discurso no Senado Federal

CONSIDERAÇÕES SOBRE ASPECTO DITATORIAL DO PROGRAMA 'A VOZ DO BRASIL'.

Autor
Mauro Miranda (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/GO)
Nome completo: Mauro Miranda Soares
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
TELECOMUNICAÇÃO.:
  • CONSIDERAÇÕES SOBRE ASPECTO DITATORIAL DO PROGRAMA 'A VOZ DO BRASIL'.
Publicação
Publicação no DCN2 de 09/08/1995 - Página 13621
Assunto
Outros > TELECOMUNICAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, RETORNO, DIVULGAÇÃO, NOTICIARIO, IMPRENSA, PROPOSTA, EXTINÇÃO, PROGRAMA, RADIO, VOZ DO BRASIL, MOTIVO, DITADURA, ORIGEM, CONTEUDO.
  • DEFESA, MANUTENÇÃO, VOZ DO BRASIL, EMPRESA BRASILEIRA DE COMUNICAÇÃO S/A (RADIOBRAS), MOTIVO, IMPORTANCIA, REALIZAÇÃO, FUNÇÃO, NATUREZA SOCIAL, DIVULGAÇÃO, ATUAÇÃO, CONGRESSISTA, LEGISLATIVO.
  • DEFESA, POSSIBILIDADE, DISCUSSÃO, ALTERAÇÃO, CONTEUDO, DURAÇÃO, PROGRAMA, VOZ DO BRASIL, DESTINAÇÃO, EXECUTIVO.

O SR. MAURO MIRANDA (PMDB-GO. Para uma comunicação. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a proposta de extinção do programa Voz do Brasil está voltando ao noticiário. O assunto não é novidade. O que há de inovador é a força e a consistência da campanha atual, com seus largos espaços na mídia. O movimento começou timidamente, por iniciativa da Rádio Eldorado, uma emissora de grande prestígio nas áreas mais intelectualizadas de S. Paulo, e já alcançou grande repercussão entre os empresários do setor de telecomunicações. Pelo tom e pelo volume do debate, acho que o Governo não poderá escapar a uma decisão negociada.

Em todas as suas aparições bissextas, ao longo das últimas décadas, a origem ditatorial do programa vem sendo o argumento mais poderoso dos que o condenam à extinção. Criado no primeiro Governo Vargas, ao tempo em que funcionava no País o poderoso Departamento de Imprensa e Propaganda, o noticiário, de transmissão obrigatória, foi impingido sem protestos. Ainda não existia a televisão. Os jornais e as emissoras de rádio viviam período cruel de amordaçamento, e a censura não tinha limites. A ditadura impunha o noticiário que lhe conviesse. Foi o grande vício de origem da Voz do Brasil, tida hoje como a única herança que resiste àquele período negro da História do Brasil.

Excluídos de julgamento os seus pecados genéticos e deixadas de lado as avaliações dos Governos a que serviu, é inegável que o programa tem uma grande história de serviços à integração nacional. A vasta rede capilar de estações de rádio, no País, é um fato relativamente novo. Não tínhamos emissoras plantadas em quase todos os municípios de médio ou grande porte, como temos hoje. A grande população do nosso vasto interior tinha na Voz do Brasil a sua referência de Nação. Sua transmissão era aguardada com grande curiosidade, em todos os recantos. Era pela Voz do Brasil que Juscelino Kubitschek convocava o povo ao otimismo. O período áureo do programa foi vivido no Governo Jânio Quadros, ele mesmo ouvinte assíduo. O próprio Presidente direcionava o impacto de seus famosos bilhetinhos para o programa, exigindo prioridade para a Voz do Brasil.

A campanha de agora tem respaldo nas realidades que se incorporaram à dinâmica do País. A mais importante é a de que, para o Executivo, a necessidade de espaço obrigatório no rádio é uma verdade pelo menos duvidosa. Primeiro, porque legislação específica garante a convocação de tempo no rádio e na televisão para mensagens de emergência, assim consideradas pelo Governo. Segundo, porque o Executivo tem espaço permanente para divulgação de mensagens de seu interesse durante a programação normal dos veículos eletrônicos. Terceiro, porque a criação da RADIOBRÁS, no início dos anos 70, abriu uma grande rede de telecomunicações exclusiva para a divulgação dos fatos gerados pelo Palácio do Planalto e pelos ministérios, com grande alcance por todo o território brasileiro. A rede de televisão educativa cumpre o mesmo objetivo. Quarto, porque a antiga Agência Nacional, hoje Rede Brasil, tem estrutura de serviço e de distribuição altamente capacitada para divulgar as atividades do Executivo. Finalmente, porque a influência de qualquer fato gerado em Brasília sobre a vida dos brasileiros alcança a mídia em questão de segundos, graças aos modernos instrumentos de comunicação de hoje. A própria importância dos atos do Governo determina a sua divulgação natural, ágil e intensa, por todos os poros da gigantesca máquina de informar distribuída entre os sistemas privado e estatal. Um espirro que acontece em Brasília é notícia em todo o País.

Já com o Congresso, a situação é radicalmente oposta. O Legislativo não tem instrumentos próprios para a divulgação de suas atividades, seu poder gerador de fatos é grande, mas é o Executivo que produz as decisões que mais interessam à imprensa. O Congresso é uma casa de debates mais que uma casa de decisões. E são esses debates que fazem a média do pensamento nacional. Aqui estão os partidos que apóiam o Governo, mas aqui também estão as agremiações de oposição, como o PT, o PDT, o PPS e o PSB. Para esses partidos, a Voz do Brasil funciona como o espaço mais democrático para o registro de suas teses, porque o tratamento é igual para todos no noticiário. Assim, os trinta minutos finais do Programa Voz do Brasil representam hoje a única ponte de comunicação formal entre os Parlamentares e a população. Creio que a privação desse vínculo teria o significado de perda de cidadania para os brasileiros distantes que sintonizam o programa com o seu radinho de pilha nos locais onde a energia elétrica ainda não chegou. É assim que esses cidadãos humildes acompanham a atuação de seus representantes no Congresso. E é assim que a Voz do Brasil cumpre a sua função democrática de distribuir igualitariamente as informações.

Creio sinceramente que há espaço para discussão e para negociações em torno da permanência da Voz do Brasil, ou de um novo formato na sua duração e no seu conteúdo. Em princípio, pelas razões já expostas, considero que a meia hora do Legislativo tem importante função social, e não deve ser colocada em discussão. Quanto à meia hora do Executivo, eu gostaria de avançar numa proposta a ser avaliada pelas áreas competentes do Governo Federal. Começaria pelo entendimento de que o Executivo pode prescindir desse espaço de divulgação, passando a dar-lhe um caráter de serviço dirigido ao cidadão, mantendo-se o atual tempo de trinta minutos ou reduzindo-o à metade. O programa ganharia o novo título de Jornal do Cidadão, incluído o tempo do Congresso, para conferir-lhe imagem correta dentro do novo formato.

Acredito que a utilização inteligente do tempo administrado pelo Executivo poderá atrair grande força de audiência. Deixaríamos de ouvir as informações anacrônicas sobre viagens, audiências e inaugurações do primeiro escalão do Governo. No lugar disso, o cidadão que não lê jornal e não tem acesso a informações de seu interesse passaria a ter o instrumento sistematizado de conscientização sobre os seus direitos, como questões sobre aposentadoria urbana e rural, saneamento básico, direitos sociais, previsões do tempo, cuidados preventivos de saúde, condições das estradas e desestímulo às migrações desordenadas que ampliam o caos social, são exemplos de extensa pauta de assuntos que poderia ocupar o noticiário. O grande volume de correspondência que chega diariamente à Presidência da República e aos Ministérios inspiraria a pauta das informações dirigidas a pessoas ou a grupos de pessoas.

Estou convicto de que teríamos um grande leque de efeitos positivos. O primeiro deles seria o de tornar a população brasileira mais participante, ao sentir-se valorizada pelas respostas. A sobrecarga de correspondências que onera e emperra a burocracia federal poderia reduzir-se, pela diminuição de dúvidas, com resultados positivos no replanejamento das rotinas dos gabinetes. Com a valorização desse horário radiofônico, tanto o Presidente da República, quanto os seus Ministros conquistariam um novo espaço nobre para esclarecer a população ou solicitar seu apoio na sustentação de suas políticas. Os efeitos educativos do programa contribuiriam fortemente para melhorar a qualidade de vida dos brasileiros. E tudo isso sem ampliar a invasão sobre o domínio privado das concessões, mas, pelo contrário, podendo até reduzi-lo.

Creio que ganhariam todos. O Governo ganharia reconhecimento político ao abrir mão de um instrumento que pouco lhe acrescenta, mas que pode valorizar-se através da nova concepção de serviço, o cidadão, pela conquista de novo canal, capaz de aproximá-lo das decisões nacionais, a administração federal, pelo provável alívio da sobrecarga das pressões sociais e os empresários, pela possibilidade de negociações que levem à redução do tempo que é subtraído à sua programação normal. São considerações pessoais que eu gostaria de acrescentar ao debate sobre este assunto, que tem seus vínculos diretos e indiretos com as preocupações normais do Legislativo.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 09/08/1995 - Página 13621