Discurso no Senado Federal

PREOCUPAÇÕES CONCERNENTES AS ELEVADAS MENSALIDADES ESCOLARES.

Autor
João França (PP - Partido Progressista/RR)
Nome completo: João França Alves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
EDUCAÇÃO.:
  • PREOCUPAÇÕES CONCERNENTES AS ELEVADAS MENSALIDADES ESCOLARES.
Publicação
Publicação no DCN2 de 09/08/1995 - Página 13622
Assunto
Outros > EDUCAÇÃO.
Indexação
  • DEFESA, BUSCA, SOLUÇÃO, IMPASSE, ESCOLA PARTICULAR, PAIS, ALUNO, RELAÇÃO, CRITERIOS, FORMA, AUMENTO, REAJUSTAMENTO, VALOR, MENSALIDADE, PROPOSTA, MEDIDA PROVISORIA (MPV), GOVERNO FEDERAL.

           O SR. JOÃO FRANÇA (PP-RR.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, nunca é demais enfatizar que a educação, em qualquer país, deve ter prioridade máxima; deve constituir-se na maior preocupação de seus governantes e de sua população. O filósofo Chesterton definiu-a como "a alma de uma sociedade, passando de uma geração para outra".

           Também é oportuno dizer e repetir que o presente e o futuro de uma nação dependem, fundamentalmente, da educação. É ela que irá formar o cidadão e o dirigente de amanhã. Daí a necessidade de o Estado promovê-la, supervisioná-la, estar-lhe sempre atento, intervir o seu processo, quando for preciso, porque se trata de matéria prima de alto interesse nacional.

           Por outro lado, como sabemos, tem sido inócuo o fato de nossas constituições prescreverem que o ensino é direito de todos e dever do Estado e da família. Na prática, isso nunca ocorreu. O ensino público, no Brasil, nunca cumpriu o seu papel. Nunca abrigou, em suas salas de aula, todas as crianças em idade escolar. Lamentavelmente, sempre foi insuficiente e deficiente. Assim, tivemos sempre de recorrer ao ensino particular, que, sujeito às leis do mercado, não pode ter, realmente, uma visão social da questão.

           De qualquer maneira, o ensino não pode ser comparado a uma mercadoria que se coloca na prateleira de uma loja e seja oferecida e vendida aos consumidores. É essencial demais à vida da Nação, para ser mercadejada num balcão, visando apenas ao lucro.

           Como é o caso das mensalidades escolares que, há anos, vem se arrastando, sem uma solução definitiva, objeto das mais acirradas disputas, entre pais de alunos, de um lado, e donos de escolas particulares, de outro.

           Os pais questionam os sistemáticos aumentos das mensalidades, que consideram abusivas, tornando quase impossível manter um filho no colégio privado.

           Por sua vez, as escolas alegam que a inflação - intensificada no fim dos anos setenta e início dos oitenta - as tem obrigado a fazer uso dos reajustes constantes das anuidades para cobrir os aumentos reivindicados pelos salários dos professores e pelos demais custos.

           Diante do impasse, de uma verdadeira guerra declarada, o Governo tem de intervir para mediar as partes conflitantes. Entretanto, até agora, parece que tem intervindo mal. Porque não se resolveu o problema.

           Mas é necessário que o faça. Primeiro, porque é vital preservar o ensino particular do qual o País imprescinde. Segundo, porque é preciso acautelar os direitos e interesses de pais e alunos, para que o ensino, face ao seu preço elevado, não se torne inviável.

           Na verdade, o que se tem observado, ao longo dos últimos anos, é um crescente encarecimento do ensino, com os colégios cobrando taxas e mensalidades escorchantes e abusivas, no intuito tão-somente do lucro fácil e rápido.

           Diante desse quadro e da natural grita dos pais de alunos, o Governo anterior baixou uma medida provisória, regulando esses abusos e impedindo que as escolas majorassem, a seu bel prazer e conveniência, as mensalidades. As escolas, através de seu sindicato nacional, recorreram à Justiça - ao Supremo Tribunal Federal - e obtiveram uma decisão de inconstitucionalidade da referida medida.

           Mas, no meio do ano passado, quando da conversão do cruzeiro para o real, houve um acordo entre pais, escolas e Governo, no sentido de se congelarem as anuidades escolares por um ano. Frise-se que o congelamento se processou pelo seu pico.

           Esperou-se que, diante desta circunstância, favorável aos colégios, da estabilização da economia, com o Plano Real e, conseqüentemente, o fim da inflação, eles não reivindicassem reajustes imediatos e constantes, como vinham fazendo.

           Com a vitória, entretanto, das entidades escolares, na Justiça, voltaram elas a pressionar para reajustar suas mensalidades.

           Diante do impasse, Sr. Presidente, o atual Governo, logo no seu início, a seis de janeiro último, enviou ao Congresso outra Medida Provisória, sobre as mensalidades escolares, convalidada, depois, pelas Medidas nºs 817, 887, e 932, esta última baixada no dia primeiro deste.

           A nova Medida Provisória permitia, pelo seu artigo terceiro, que as escolas aumentassem as mensalidades, quando ocorresse majoração de seus custos operacionais, como os salários dos professores, a partir de sua data-base, geralmente em março de cada ano.

           Dispunha o referido artigo terceiro que os valores das mensalidades, convertidos em real, não poderiam sofrer reajustes até que fossem completados doze meses da conversão ou até a data-base dos professores do estabelecimento de ensino, em 1995, caso esta venha a ocorrer primeiro.

           Segundo as entidades de pais de alunos, a Medida Provisória oferecia todos os direitos e garantias às escolas e nenhuma a eles, que ficavam totalmente desprotegidos, abrindo caminho para que os colégios majorassem seus preços todos os meses. Argumentavam mais que o "Governo beneficiou as escolas que converteram as mensalidades para o real pelo pico, em julho, descongelando os valores quatro meses antes de completar um ano".

           Num outro dispositivo, a Medida Provisória estabelecia que, quando se verificasse uma das situações previstas no artigo terceiro, o valor da mensalidade escolar seria ajustado pela variação acumulada do IPC-r, ocorrida entre primeiro de julho de 1994 e no mês do reajuste. Este valor seria dividido em duas parcelas sucessivas, incidindo sobre o valor convertido em 1994, não podendo a primeira parcela ser superior a sessenta por cento da variação acumulada do IPC-r.

           Em São Paulo, por exemplo, os colégios vêm cobrando anuidade que inclui o IPC-r de julho a novembro, na base de 19,04 por cento; o IPC-r acumulado de julho de 1994 a março de 1995, calculado em vinte e cinco por cento; e mais o reajuste salarial dos professores, também em vinte e cinco por cento. Esses percentuais perfazem um reajuste de setenta por cento.

           A nova mensalidade, Srs. Senadores, será a soma de setenta por cento do reajuste salarial dos professores e mais trinta por cento dos demais custos das escolas. O que equivale a um aumento, para os pais, de cem por cento. Porque a partir do descongelamento, o aumento das mensalidades deve acompanhar a evolução dos custos da escola.

           As associações de pais de alunos argúem que a Medida Provisória não leva em consideração alguns aspectos importantes da questão. Os colégios particulares certamente aproveitarão, para auferir mais lucros, dos dois itens que permitem o reajuste: o aumento salarial dos professores e os custos de planilha. Os contra-cheques dos professores não deverão crescer, na sua data-base, além de trinta por cento, pois percebem baixos salários, geralmente o piso salarial.

           Por outro lado, torna-se difícil, para os pais de alunos, ter acesso às planilhas, ou mesmo checar e fiscalizar os seus custos e métodos. A Medida Provisória do Governo não estabelece nenhum tipo de fiscalização sobre as mesmas. "Há escolas que embutem professores fantasmas e despesas pessoais dos donos nos custos das planilhas. E outros expedientes. Como se apurar isto?"

           As contrário das Medidas Provisórias anteriores, que proibiam a punição do aluno inadimplente, a atual a autoriza. Assim, estabelece ela que são permitidas a suspensão das provas escolares, a retenção de documentos escolares, como os de transferência ou a aplicação de quaisquer outras penalidades pedagógicas ou administrativas, por motivo de inadimplência do aluno por mais de sessenta dias. Mas a verdade é que, mesmo antes deste prazo, já com trinta dias, as escolas descumprem a lei e recorrem às suas sanções.

           Ante os protestos e queixas das associações de pais e alunos e de entidades, como a União Nacional dos Estudantes, o Governo se defende, alegando que se trata de uma solução provisória.

           Tanto que dispôs na Medida Provisória 932, no seu artigo onze, o preceito de que o Poder Executivo, no prazo de cento e oitenta dias, encaminhará ao Congresso Nacional projeto de lei disciplinando a prestação de serviços escolares, por estabelecimentos particulares de ensino.

           A Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino tem se manifestado, continuadamente, contra a fixação de qualquer índice para as anuidades escolares, sob a alegação de que as escolas têm "particularidades de custos".

           Argumenta que não pode haver controle de preços nas escolas porque elas são regidas pela livre concorrência. O único controle possível é o dos pais, que, insatisfeitos, podem mudar seus filhos de escola.

           Mas, a esse argumento, as associações de pais de alunos respondem que nem as leis do mercado - a livre concorrência - estão sendo respeitadas. Pois está havendo a cartelização das escolas particulares, que, unidas, combinam preços, anulando a livre concorrência. Isso ocorre no Rio de Janeiro, São Paulo, Brasília, Belo Horizonte e em Porto Velho, o que caracteriza a oligopolização do ensino particular em todo o País.

           Sr. Presidente, Srs. Senadores:

           Esta é a nossa preocupação com relação à questão das mensalidades escolares, que, segundo os próprios proprietários das escolas particulares, terão aumento acima do IPC-r, referente ao período entre fevereiro de 1994 a março deste ano. Como aliás já examinamos acima. Entendemos que o reajuste correto e justo será o compatibilizado apenas com o aumento salarial dos professores na sua data-base.

           Não se compreende como um problema tão grave e de vital relevância para o País, como a educação e as anuidades escolares, pode ser tratado a toque de caixa, superficialmente, pelo Governo, principalmente em função do julgamento, pelo Judiciário, das Medidas Provisórias, editadas pelo Executivo, para regulamentar a questão.

           Até agora, as autoridades têm usado de maniqueísmo em abordar o assunto, ora privilegiando as escolas, ora beneficiando os pais dos alunos. E, na verdade, não resolvendo o problema, porque requer estudo, negociação, e decisão política clara e profunda. E não vacilações, dubiedades, tergiversações.

           A falta de definição de uma política global para as anuidades escolares tem provocado situações de constrangimento e desconforto para os estudantes e seus pais. A omissão do Governo obriga os pais, para preservar seus direitos e interesses, a recorrer à Justiça, o que leva as escolas a usar de retaliações com relação a eles e a seus filhos.

           Assim, trocam horários das crianças, sem ouvir os responsáveis, colocando-os em turnos diferentes, separando irmãos que estudam no mesmo colégio. Suspendem o horário integral, dificultando a vida dos pais, que trabalham fora e não têm com quem deixar os filhos.

           O resultado é que alguns alunos, os mais prejudicados, deixam, invariavelmente, a escola, transferindo para outra, o que acarreta mais despesas financeiras.

           Ou então os pais optam pela desistência da ação judicial que intentaram, para evitar problemas com filhos.

           É mister que o Governo e as entidades que representam as duas partes interessadas cheguem a um denominador comum, para acabar, de vez, com essa infindável polêmica.

           Ela é prejudicial ao ensino básico do País, já tão desorganizado e deficiente. Há que se manter o ensino privado, porque precisamos dele, dada a insuficiência do ensino público. Mas também temos de resguardar os interesses dos pais ou responsáveis, pagando um justo preço pela educação de seus filhos. Essas, Sr. Presidente, Srs. Senadores, as considerações que pretendíamos trazer a esta Casa sobre tão propalada matéria. Obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 09/08/1995 - Página 13622