Discurso no Senado Federal

HOMENAGEM POSTUMA AO INTELECTUAL CEARENSE CLAUDIO MARTINS. A DECADENCIA DA PRODUÇÃO ALGODOEIRA NO NORDESTE.

Autor
Lúcio Alcântara (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/CE)
Nome completo: Lúcio Gonçalo de Alcântara
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. POLITICA AGRICOLA. :
  • HOMENAGEM POSTUMA AO INTELECTUAL CEARENSE CLAUDIO MARTINS. A DECADENCIA DA PRODUÇÃO ALGODOEIRA NO NORDESTE.
Aparteantes
Ney Suassuna, Osmar Dias.
Publicação
Publicação no DCN2 de 20/06/1995 - Página 10451
Assunto
Outros > HOMENAGEM. POLITICA AGRICOLA.
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, CLAUDIO MARTINS, PROFESSOR, ESTADO DO CEARA (CE).
  • COMENTARIO, VISITA OFICIAL, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, INSPEÇÃO, CENTRO NACIONAL, PESQUISA, CAMPO, REGIÃO NORDESTE, ESPECIFICAÇÃO, ESTADO DA PARAIBA (PB), RESULTADO, POSSIBILIDADE, REALIZAÇÃO, PARCERIA, GOVERNO ESTADUAL, GOVERNO MUNICIPAL, INICIATIVA PRIVADA, OBJETIVO, PROMOÇÃO, RECUPERAÇÃO, LAVOURA, ALGODÃO, DESENVOLVIMENTO TECNOLOGICO, PRODUÇÃO.
  • DEFESA, NECESSIDADE, URGENCIA, INVESTIMENTO, GOVERNO, LAVOURA, ALGODÃO, MOTIVO, AMEAÇA, CURTO PRAZO, DEPENDENCIA, PAIS, MERCADO INTERNACIONAL.
  • ANALISE, SITUAÇÃO, DEPENDENCIA, SETOR, LAVOURA, ALGODÃO, PAIS, ESPECIFICAÇÃO, REGIÃO NORDESTE.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB-CE. Para uma breve comunicação. Sem revisão do orador) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, sábado passado, em Fortaleza, o professor, escritor e intelectual Cláudio Martins, após um longo período de sofrimento, veio a falecer aos oitenta cinco anos, tendo em vida prestado grande serviços à educação e à cultura do Estado do Ceará.

Era Professor da Universidade Federal do Ceará, com especialidade em Direito Tributário, tendo vários livros publicados, e também em Direito Notarial, tabelião que foi de um dos cartórios de Fortaleza. Foi Secretário de Estado da Fazenda e da Educação por mais de uma vez; foi Membro Titular e Presidente, durante muitos anos, da Academia Cearense de Letras, poeta, escritor, homem de letras.

O Ceará perdeu um dos seus vultos mais brilhantes, uma das figuras mais destacadas no campo do Magistério, da Administração Pública, do Direito e das Letras.

Sr. Presidente, fazendo esse comunicado, presto a minha homenagem póstuma a esse que foi, apesar da nossa diferença de idade, um grande amigo e confrade na Academia Cearense de Letras.

Assim, quero que esta homenagem seja extensiva à viúva, D. Irene Martins, aos seus filhos e ao grande círculo de amigos que fez ao longo da sua atividade como professor, intelectual e administrador público.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, outro assunto quero tratar nesta oportunidade.

O Presidente Fernando Henrique Cardoso, por ocasião de sua última visita ao Nordeste, inseriu em sua agenda uma visita à Paraíba uma inspeção no Centro Nacional de Pesquisa do Agreste, da EMBRAPA, onde se trabalha no sentido de recuperar a cultura do algodão na região, através da criação de novas variedades e do desenvolvimento de novas técnicas de produção.

A cotonicultura se constituía em uma das bases principais da economia da Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará e tornou-se, com a sua decadência, em uma das principais geradoras do êxodo rural.

Com essa visita, não tenho dúvidas de que o Senhor Presidente da República sinalizou para que os resultados das pesquisas saiam do CNPA e cheguem ao campo em parceria com os governos estaduais, municipais e a iniciativa privada.

É bom lembrar que a virtual liquidação da cotonicultura nordestina, que teve resultantes sociais gravíssimas, também ocorreu em menor intensidade no País como um todo.

Maior exportador mundial de algodão na década de 80, o Brasil amarga hoje a posição de segundo maior importador, tendo contabilizado em 1994 uma produção de apenas 400 mil toneladas de pluma contra 960 mil toneladas registradas no ano de 1985, ou seja, nove anos antes.

O Brasil precisa voltar a investir na cotonicultura, sob o risco de se tornar, em breve, totalmente dependente do mercado internacional, tendo em vista o processo de industrialização por que vem passando os países do MERCOSUL, incluindo o próprio Brasil. Países como a Argentina e o Paraguai vêm reduzindo significativamente suas cotas de exportação do produto para o nosso País, uma vez que estão passando a utilizar matéria-prima em suas próprias indústrias.

O Brasil necessita produzir algodão para servir ao seu próprio mercado, cada vez mais crescente. O setor algodoeiro do País emprega cerca de 10 milhões de pessoas em toda a sua cadeia produtiva, o que representa 10% do PIB nacional, ou seja, algo em torno de US$50 bilhões. Estima-se que no ano 2000 a demanda da indústria brasileira será superior a 1 milhão de toneladas de pluma. Com uma área cultivada inferior a 1 milhão de hectares, o Brasil importa atualmente 600 mil toneladas de pluma de algodão por ano, enquanto produz apenas 400 mil toneladas.

O Brasil constitui-se hoje em um dos maiores mercados consumidores de manufaturados do mundo. Cerca de 80% das indústrias de manufaturados utilizam algodão, e o setor está hoje muito dependente do mercado internacional. No Ceará, a situação é semelhante ao quadro nacional. As 27 indústrias têxteis locais, consomem cerca de 100 mil toneladas de algodão em pluma/ano, enquanto a produção não ultrapassa 25 mil toneladas nos melhores anos.

Para se ter uma idéia da gravidade do problema, no Estado do Ceará, o de maior expressividade no contexto regional, a produção se reduziu de 100 mil toneladas de algodão em pluma, em 1973, para cerca de 13 mil toneladas em 1992 e, apenas 4 mil toneladas em 1993.

Em valores reais, a produção declinou de 150 milhões de dólares para 6 milhões de dólares, nesse período.

Em termos relativos, a cotonicultura cearense, de uma participação no valor bruto da produção da agropecuária de 31%, em 1973, declinou para 2,6% vinte anos depois, ou seja, em 1992. Esses números que praticamente se repetem em outros importantes Estados produtores do Nordeste evidenciam claramente a enorme decadência da produção algodoeira.

O consumo de algodão, no Ceará, passou de 11.600 toneladas, em 1977, para 84.700 toneladas, em 1992, e 100 mil atualmente, acusando um aumento de 630% no período de 15 anos. Ademais, considerando-se que o crescimento observado na indústria têxtil se tenha verificado também na de confecções, têm-se que o PIB atual das atividades em questão, no Ceará, se situaria em torno de US$650 milhões.

Atualmente, a questão principal que se coloca na economia cearense, paraibana e potiguar é o esvaziamento do semi-árido que coincide com a considerável redução nas atividades da agroindústria do algodão no Estado.

Nas últimas duas décadas, conscientes da problemática algodoeira, sucessivos governantes cearenses aplicaram diversas formas de incentivos, embutidos na distribuição de sementes, na mecanização, no crédito rural e na assistência técnica gratuita entre outros. O mais recente programa e o mais bem estruturado é o PRÓ-ALGODÃO. Porém, a gradativa perda de competitividade do algodão em relação ao produto importado e subsidiado no país de origem leva à necessidade de se adotar medidas de proteção ao produtor, mais amplas e consistentes, tal como uma política agrícola específica para o algodão, com base no modelo norte-americano de proteção à agricultura e à agroindústria, mediante a aplicação de subsídio direto ao produtor.

O Sr. Osmar Dias - Concede-me V. Exª um aparte?

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA - Ouço V. Exª com prazer.

O Sr. Osmar Dias - Senador Lúcio Alcântara, seu pronunciamento atinge um dos pontos mais cruciais da agricultura nesses últimos anos. A partir de 1991, a cultura do algodão sofreu uma queda vertical na área plantada, na produtividade e, em conseqüência, na produção. Os fatores foram vários. No Paraná, que é o Estado que produz 50% do algodão do País, plantamos o algodão herbáceo; e, no Nordeste e Norte, planta-se mais o algodão arbóreo, quase que de ciclo permanente. Tivemos duas causas principais que levaram à redução da área plantada em nosso Estado. A primeira foi o ataque do bicudo, que, igualmente, atacou a sua região. O algodão, que não oferecia uma produtividade pelo menos razoável, tonou-se inviável com o advento do bicudo já que se exigia uma aplicação numerosa de defensivos agrícolas, que encareciam o custo de produção. Prevaleceram, apenas, as lavouras de produtividade média e grande. Mas, tanto no Paraná quanto na sua região, fomos atacados por uma outra espécie de bicudo. Aliás, sou vítima de um processo na Polícia Federal movido pelo atual Ministro da Agricultura, que, na época, era Ministro da Indústria e Comércio, porque, num pronunciamento, eu disse que, mais do que todos os bicudos, o Ministro da Indústria e Comércio estava prejudicando o algodão brasileiro. A verdade é que a alíquota de 10%, que foi reduzida para zero naquela oportunidade, proporcionou a importação de algodão subsidiado na origem - como V. Exª está comentando neste momento - e de países onde a remuneração da mão-de-obra é tão baixa que esses países podem se dar ao luxo de exportar algodão a um preço muito abaixo do algodão produzido em nosso País. Competimos, dessa forma, com países que subsidiam a cultura do algodão, tais como, países da antiga União Soviética, Paquistão, China e outros e que remuneram minimamente a mão-de-obra empregada nessa cultura. Naquela oportunidade, em 1992, o Brasil tinha plantado a sua maior safra e colheu cerca de 810 mil toneladas. Pois bem, o Brasil, naquele ano, começou a importar vigorosamente algodão sem nenhuma necessidade o que desestruturou o sistema produtivo. Agricultores que antes se dedicavam ao cultivo do algodão passaram a plantar outras culturas e, dessa forma, desempregaram intensamente a mão-de-obra, pois a cotonicultura emprega cerca de quarenta trabalhadores por hectare na época da colheita. Esse problema social e econômico que se verificou no Paraná ocorreu, também, na sua região, no Nordeste e no Norte. Nunca mais pudemos recuperar a área de cultura do algodão. No Paraná, uma área média de 520 mil hectares caiu para uma área média de 245 mil hectares. Portanto, houve uma queda de 55% da área plantada nos últimos três anos depois dessa importação indesejável que ainda continua ocorrendo, agora por necessidade pois os produtores se afastaram da cultura. V. Exª faz um pronunciamento que - confesso - até me serviu de lembrança para formular uma proposta ao Governo, o que farei após o seu pronunciamento, no sentido de recuperarmos o plantio dessa cultura que é importante não apenas no que se refere à economia das regiões em que ele é plantado, mas, principalmente, para o emprego de mão-de-obra, como V. Exª frisou no início do seu discurso.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA - V. Exª, Senador Osmar Dias, que é um profundo conhecedor das questões da agricultura e do setor primário brasileiro, faz um aparte muito importante ao meu pronunciamento, V. Exª alerta para as importações danosas à economia nacional. Fala-se muito em dumping - dumping do preço - mas há, também, o chamado dumping social que é algo gravíssimo: mercadorias são exportadas a preço baixo à custa da exploração de seres humanos pois não há salário digno, não há condições de proteção ao trabalho, nem condições sociais. Conseqüentemente, alguns desses países conseguem produzir a preços extremamente baixos, cujos produtos entram aqui e desestruturam completamente a nossa economia. O Paraná é um Estado que tem um solo muito bom, fértil. E, se não se plantar algodão, pode-se plantar outro tipo de cultura. No nosso caso do Ceará, da Paraíba, do Rio Grande do Norte, de Sergipe, de Alagoas, o que acontece é que há solos em que a única cultura que pode se desenvolver é a do algodão, o algodão arbóreo, o mocó, que é uma cultura quase que permanente, inclusive no famoso ciclo do algodão e do boi. O que acontece, hoje, é o seguinte: como isso praticamente desapareceu, o segundo semestre era iniciado, tradicionalmente, quando o agricultor passava a se dedicar à colheita do algodão e à venda do seu produto. Com a renda conseguida, por menor que fosse, comprava alguma coisa para si e sua família, como por exemplo, vestuário, calçado, a melhora da casa onde mora, o pagamento da escola dos filhos, etc. No primeiro semestre já ocorria a cultura da subsistência, ou seja, a cultura do milho, do feijão, etc, e o agricultor tirava dessas culturas a sua subsistência do ano.

Como resultado disso, o segundo semestre é um período de miséria, de sofrimento. Hoje, no Ceará, praticamente só temos os tabuleiros costeiros com a produção da amêndoa do caju. Fora isso, há uma liberação enorme de mão-de-obra, criando uma situação de pobreza extrema e estimulando o êxodo rural, fazendo com que se torne praticamente impossível a sobrevivência das pessoas na região do semi-árido.

O Sr. Osmar Dias - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA - Ouço V. Exª com prazer.

O Sr. Osmar Dias - Gostaria de fazer apenas uma observação, qual seja, muitas vezes usa-se o argumento de que a importação vai reduzir o preço da roupa para os consumidores. Essa é uma mentira que pode ser verificada quando se levanta, por exemplo, a participação do produto "algodão" na camisa ou na calça que se utiliza. Não chega a 5%, porque os outros itens que compõem mais de 95% do preço de uma roupa vêm dos tributos, da mão-de-obra, do transporte, do custo industrial, etc. O algodão que sai da lavoura não chega a ter 5% de participação no preço. Portanto, o argumento da importação para que se reduza o preço ao consumidor não serve. Precisamos acabar com a cultura da importação, Senador Lúcio Alcântara, quando se está tentando novamente zerar a alíquota de mais um produto agrícola, qual seja, o trigo. Já estão quase conseguindo acabar com o trigo em nosso País, pois estão querendo baixar a alíquota de 10 para zero por cento. Com isso vai haver uma enxurrada de trigo importado em nosso País. Só estou colocando mais esse adendo

Será uma enxurrada de trigo importado. Estou trazendo mais esse adendo porque é realmente muito importante o assunto de que V. Exª trata na tarde de hoje.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA - É importante, Senador Osmar Dias, que V. Exª formalize essa sugestão para o fomento da cultura do algodão, porque o Presidente Fernando Henrique Cardoso está demonstrando boa vontade no sentido de fazer com que o Governo apóie novamente a cultura do algodão não só no Nordeste, mas também no resto do País. V. Exª, como especialista na área, certamente trará uma sugestão muito pertinente.

As políticas de proteção através de subsídios e taxações compensatórias flexíveis e ágeis são práticas crescentes nos países desenvolvidos, o que permite competirem em condições vantajosas no comércio internacional de produtos primários e manufaturados.

A política de subsídios à agricultura permite praticamente eliminar os concorrentes no comércio internacional, mesmo para produtos de demanda crescente e expressiva no âmbito mundial, como é o caso do algodão. Atualmente, apenas a China, os Estados Unidos, a Índia e o Paquistão apresentam taxas positivas e persistentes de variação na produção de algodão em pluma, graças às suas políticas de subsídios. No caso específico do Paquistão, conforme informações da imprensa especializada, o subsídio chega a 50% sobre o preço de exportação de artigos de confecção, enquanto nos Estados Unidos atinge 26% sobre o preço de algodão em pluma, o que permite a esse país colocar os seus produtos têxteis a preços inferiores aos custos de produção de outros países.

Conforme informações da imprensa especializada, o Governo norte-americano manteve um preço base para o programa de sustentação da economia algodoeira, fixada em 73 centavos de dólar por libra-peso, para a safra 1992/1993. Ao preço médio de 54 centavos de dólar por libra-peso, na venda de algodão em pluma Texas com especificações, na Bolsa de Mercadorias de New York, a diferença de 19 centavos de dólar é depositada na conta corrente do produtor como subsídio do Governo dos EUA. Esse algodão, acrescido de despesas com transporte e desembaraço alfandegário de 4 centavos de dólar, chega ao Porto de Mucuripe, em Fortaleza, a 58 centavos de dólar.

Pelos estudos recentes do PRÓ-ALGODÃO - Programa de Revitalização da Cotonicultura Cearense -, o custo variável médio de algodão herbáceo de sequeiro em pluma (97% da área e 92% da produção cultivada no Estado) situa-se em torno de 63 centavos de dólar por libra peso. Acrescentando-se 5 centavos de dólar por libra peso de custo de transporte e 2 centavos de dólar de FUNRURAL, o custo posto em Fortaleza de 70 centavos de dólar se situaria 20% acima dos 58 centavos referentes ao algodão americano.

A hipótese que se procura defender é, portanto, que os recursos financeiros públicos aplicados na concessão de incentivos e subsídios à agricultura teriam um efeito rápido e significativo sobre o nível de emprego, renda e sobre a receita tributária estadual, resultando, desse modo, em elevada relação benefício-custo.

O Sr. Ney Suassuna - V. Exª me permite um aparte?

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA - Com prazer, ouço V. Exª.

O Sr. Ney Suassuna - Queria congratular-me com V. Exª, que está abordando um assunto muito importante não só para a região nordestina, mas também para o País como um todo. A fibra do algodão é imprescindível à elaboração de diversos tipos de tecidos. Mesmo em caso de tecido sintético, é imprescindível que, misturado com a fibra sintética, haja o algodão. Infelizmente, na economia nordestina a queda da produção de algodão, seja por causa do bicudo, seja por outras pragas, levou regiões inteiras a um completo depaupério. V. Exª está abordando um assunto muito importante para o País e prioritário para o Nordeste.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA - Senador Ney Suassuna, V. Exª traz ao meu discurso uma contribuição que tem razão de ser em virtude da própria origem de V. Exª, que é da Paraíba, um dos Estados de grande importância para a cotonicultura do Brasil e do Nordeste. Na Paraíba, está situado o Centro de Pesquisa da EMBRAPA, no qual depositamos grandes esperanças, para que, juntamente com outros mecanismos, possamos reverter essa situação de decadência da cotonicultura do Nordeste.

Cabe afirmar que uma política de subsídios à produção algodoeira brasileira, em geral, e à cearense, em particular, não oneraria, de forma expressiva, as finanças públicas, dado que para uma demanda brasileira de cerca de 750 mil toneladas de algodão em pluma e uma demanda cearense em torno de 100 mil toneladas, em 1993, um subsídio de 20% sobre 70 centavos de dólar por libra peso levaria à redução de 14 centavos de dólar e permitiria colocar o algodão na fiação a 56 centavos. Isso tornaria o algodão nacional competitivo, sem prejudicar o produtor rural e a indústria têxtil. Para tal, calcula-se que o montante global de subsídios necessários seria da ordem de US$ 230 milhões em nível nacional e de US$ 30 milhões para o Ceará, cifras modestas se comparadas às demais políticas existentes de incentivo fiscal e de fomento a outras atividades não tão estratégicas quanto a cotonicultura.

Embora sejamos a favor da abertura da economia e da sustentabilidade das atividades econômicas, é consenso que todas as iniciativas até agora tomadas não resultaram na recuperação da cotonicultura nordestina por causa da competição internacional do algodão subsidiado na origem.

O Ceará produz cerca de 25 mil toneladas de plumas nos melhores anos e vende a arroba por R$ 23,00.

O algodão importado chega ao Estado a R$ 29,00 a arroba, com prazo para pagamento de 180 a 300 dias, com juros abaixo dos vigentes no Brasil. O algodão local é vendido somente à vista, e o custo do frete não é incluído ao preço final do produto. O presidente do Sindicato da Indústria de Fiação e Tecelagem do meu Estado afirma que existe comprador para o algodão cearense, inclusive a indústria local, mas falta apoio técnico e financeiro aos produtores e maquinistas.

A título de sugestão, o Governo Federal deveria estudar com maior profundidade essa situação que acabo de relatar e a solução que estudos sobre o assunto propõem, ou seja, a concessão do subsídio, recurso que, após tantas tentativas frustradas, constitui quase unanimidade no setor algodoeiro.

De nada adiantarão as técnicas desenvolvidas e empregadas na cultura de algodão nos centros de pesquisa se o Governo Federal não tomar uma iniciativa coerente de proteger a cotonicultura através de subsídios para fazer frente aos concorrentes internacionais.

Gostaria de salientar que a maioria dos países que adotaram a concessão de estímulos à cotonicultura tiveram retornos de curtíssimo prazo e atualmente conquistam fatias importantes e crescentes no mercado mundial.

Atualmente, a questão principal que se coloca na economia nordestina é o esvaziamento do semi-árido, que coincide com a considerável redução nas atividades da agroindústria do algodão na Região.

Em face da perfeita adaptação do algodão arbóreo às condições de semi-aridez, da adequação do algodão herbáceo aos solos de melhor qualidade e do grande poder de integração sobre as culturas de subsistência e a bovinocultura, a caprinocultura e a ovinocultura, além do complexo industrial têxtil, de tecidos e de confecções, torna-se urgente formular, aprovar e pôr em prática rapidamente um conjunto de políticas governamentais em âmbito federal e estadual voltado para a revitalização da cotonicultura em novas bases tecnológicas e de comercialização.

No tocante ao plano internacional devem-se tomar medidas de âmbito federal, dentro da política de abertura gradual da economia brasileira para enfrentar de forma madura e firme as regras do jogo do comércio mundial, aperfeiçoando a legislação comercial do País, de modo a tratar adequadamente os diversos parceiros estrangeiros, destacando-se entre outros mecanismos a legislação anti-dumping e anti-subsídios e a tarifa aduaneira, cuja reforma em curso deverá estar concluída brevemente.

É necessário salientar que o País deve liberalizar o seu comércio exterior, diminuindo a verticalização excessiva da economia, investindo mais em capital humano, pesquisa e desenvolvimento tecnológico, eliminando as barreiras internas à competição e revisando o sistema ultrapassado de incentivos concentrados em empresas que têm excessivo poder de mercado. Porém, paralelamente, é necessário aprimorar seus instrumentos de salvaguarda e de proteção contra a concorrência desleal, como as citadas leis anti-dumping e de direitos compensatórios. O momento é oportuno para que o Governo e a iniciativa privada incluam na própria revisão constitucional medidas de controle de fluxo internacional de produtos e serviços.

No plano mais geral, as empresas nacionais devem se fortalecer através de suas organizações para conquistarem novos mercados e intensificarem a presença nos mercados já alcançados. Convém que se aproveite a oportunidade da revisão na Carta Magna para estender a aplicação de subsídios à agricultura de forma mais ampla, envolvendo produtos alimentares e de significativa importância econômica e social.

Gostaria de concluir objetivamente, reiterando que uma política de subsídio à produção algodoeira brasileira, incluindo-se a nordestina e a cearense, em particular, não oneraria de forma expressiva as finanças públicas da União.

Um subsídio de 20% sobre o atual custo do algodão herbáceo permitiria colocar o algodão na fiação, com um preço paritário aos do mercado internacional, concessão que realmente poderá contribuir para o soerguimento da cotonicultura nacional e a nordestina, restaurando os postos de trabalho perdidos para os Estados Unidos, Paquistão e outros países.

Encerro, Sr. Presidente, agradecendo pela tolerância da Mesa.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 20/06/1995 - Página 10451