Pronunciamento de Osmar Dias em 07/08/1995
Discurso no Senado Federal
IRREVERSIBILIDADE DO DESCASO DO GOVERNO COM O AGRICULTOR BRASILEIRO. ATRASO NA LIBERAÇÃO DOS RECURSOS DESTINADOS AO FINANCIAMENTO DO PLANTIO DA NOVA SAFRA AGRICOLA.
- Autor
- Osmar Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
- Nome completo: Osmar Fernandes Dias
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
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POLITICA AGRICOLA.:
- IRREVERSIBILIDADE DO DESCASO DO GOVERNO COM O AGRICULTOR BRASILEIRO. ATRASO NA LIBERAÇÃO DOS RECURSOS DESTINADOS AO FINANCIAMENTO DO PLANTIO DA NOVA SAFRA AGRICOLA.
- Aparteantes
- Carlos Bezerra, Casildo Maldaner, Geraldo Melo, Romero Jucá, Vilson Kleinübing.
- Publicação
- Publicação no DCN2 de 08/08/1995 - Página 13533
- Assunto
- Outros > POLITICA AGRICOLA.
- Indexação
-
- CRITICA, GOVERNO, ESPECIFICAÇÃO, JOSE SERRA, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DO PLANEJAMENTO E ORÇAMENTO (MPO), IMPEDIMENTO, LIBERAÇÃO, RECURSOS, DESTINAÇÃO, FINANCIAMENTO RURAL, SAFRA, PRODUTO AGRICOLA.
- CRITICA, INCOERENCIA, POLITICA, GOVERNO, PRIVILEGIO, NEGOCIAÇÃO, INDUSTRIA AUTOMOBILISTICA, SIMULTANEIDADE, IMPEDIMENTO, LIBERAÇÃO, RECURSOS, FINANCIAMENTO AGRICOLA, RESULTADO, REDUÇÃO, OFERTA, EMPREGO, AUMENTO, INDICE, DESEMPREGO, PAIS.
O SR. OSMAR DIAS (PSDB-PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, eu li há alguns dias um artigo de jornal que pregava o fim da Voz do Brasil, porque senadores e deputados discursavam com o plenário vazio para serem ouvidos por seus eleitores.
Eu não vou pedir que os meus eleitores ouçam a Voz do Brasil, mas vou pedir que o Governo a ouça, para que eu possa, devido às dificuldades que estou tendo de pessoalmente alertar o Governo, ser ouvido. Venho falando sobre o assunto desde o primeiro semestre, mas a situação é mais grave agora. Trata-se de uma situação presente que vai se tornar, num futuro muito próximo, irreversível, refletindo o descaso com que está sendo tratado o agricultor neste momento.
Quero me inspirar aqui numa posição assumida na semana passada pelo Senador Jefferson Péres que, mesmo sendo do partido governista, se posiciona como crítico do Governo para tentar contribuir. Essa é também a minha intenção.
Li também no jornal que o Ministro do Planejamento, José Serra, não conhece uma vaca. Se ele falou, eu acredito. Lá no Paraná, pediram-me que mandasse uma fotografia de uma vaca ao Ministro José Serra. Fiquei preocupado, pois podia assustar o Ministro com a fotografia. Por isso, numa primeira etapa, se ele me conceder uma audiência, vou descrever o que é uma vaca; depois, mando uma fotografia; depois, quem sabe, ele aceite um convite para ir ao Paraná conhecer pessoalmente uma vaca - lá temos muitas, como há no Mato Grosso do Sul, como há, aliás, no Brasil inteiro.
O Ministro do Planejamento, talvez por não conhecer uma vaca e a sua importância, está segurando o dinheiro que poderia hoje estar financiando o plantio da safra de verão.
Sr. Presidente, fui pessoalmente às agências do Banco do Brasil. Fui como produtor rural, para que não confundissem a minha presença com a de um Senador investigando o que está acontecendo. Como produtor rural, falei com o superintendente do Banco do Brasil no Paraná hoje de manhã, para não cometer aqui nenhuma injustiça. Disse-me o superintendente que, a respeito do crédito rotativo divulgado pela imprensa, desconhecia se existia esse dinheiro, e, existindo o dinheiro, quais as normas para sua liberação.
Senador Vilson Kleinübing, juntamente com o Senador Casildo Maldaner, com o Senador Lúdio Coelho, acompanhados pelo Senador Elcio Alvares, Líder do Governo, e pelo Senador Carlos Bezerra, nós temos tentado conversar com o Governo a respeito do calendário agrícola e da oportunidade de se liberar o dinheiro para a safra ou não.
O superintendente me disse que para o trigo ainda há algum recurso, mas para plantar milho, feijão, soja, algodão, ou seja, para a safra de verão, não há dinheiro e nem normas para liberá-lo. No meu Estado, que produz 60% do trigo nacional, já estamos pensando na colheita do trigo.
Enquanto o trigo já está em desenvolvimento, estão falando ainda em liberar dinheiro para o trigo. Ora, o calendário do Governo está desajustado com a realidade da agricultura brasileira. Tanto é que não há recursos nem normas nos bancos em relação aos R$3,2 bilhões que foram anunciados e que ninguém viu até agora.
Enfim, quanto ao trigo, o desastre está aí. Temos que colocar alguns números para que aqueles que não vivem diretamente ligados à agricultura entendam sua importância. Quando falamos, não é simplesmente para sermos ouvidos na Voz do Brasil, mas sim porque temos responsabilidade com o nosso Estado, com aqueles que representamos.
Há dez anos, desde que o Brasil atingiu a sua auto-suficiência em 1988, estamos alertando o governo. Ou o governo diz que o produtor deve plantar trigo ou diz que vai importar, porque sai mais barato. Às portas fechadas, ele fala isso, mas o barato do Governo está saindo caro.
Vejam que o Governo negou - o termo é esse - aos triticultores um preço de garantia de US$150 dólares a tonelada. Hoje o desabastecimento já está ocorrendo, não há trigo para os próximos três meses no País, e o pãozinho já subiu de dez para quinze centavos de real.
Estamos vendo as conseqüências da inconseqüência do Governo, que julgou ser mais barato importar do que plantar e se esqueceu dos seguintes números: importando o suficiente para o abastecimento do próximo semestre, chegaremos a quase US$1 bilhão de dispêndio, ou seja, teremos de jogar para fora do País US$1 bilhão.
Com esse dinheiro, poderíamos plantar exatamente 4 milhões de hectares e, pela produtividade média do Brasil - 1.800 quilos por hectares -, poderíamos produzir 7.200 milhões toneladas com o mesmo dinheiro que compraríamos 5 milhões de toneladas - talvez nem isso -, porque argentinos, canadenses e americanos, que não são bobos, já elevaram a tonelada do trigo de US$160 para US$210 e já querem US$270. E vamos ter de pagar o preço, porque não planejamos a produção interna do trigo.
O que aconteceu com o trigo vai acontecer na safra de verão, mas o trigo traz reflexos econômico-sociais que já são irrecuperáveis. Deixamos de ver circular na economia, com a venda de insumos, US$270 milhões de dólares. Deixamos de abrir vagas para 600 mil empregos.
Entretanto, o Ministro do Planejamento - que confessou não conhecer uma vaca - assenta-se, por longos dias e horas, com a indústria automobilística para resolver o problema das quotas e da produção, a fim de gerar dois, três ou quatro mil empregos. E 600 mil empregos não serão gerados, nos próximos seis meses, em nosso País, em virtude da lavoura de trigo não ter sido plantada.
Parece-me que há um desvio não apenas de conhecimento mas, até, de inteligência das pessoas, neste momento, que estão enxergando a solução para os problemas como se estivessem sentadas nos bancos de universidade ministrando uma aula para uma classe de alunos. Muito professor atrapalha! O Governo precisa conversar com as pessoas que vivem o drama do dia-a-dia, porque a crise não está só na agricultura. Esse alerta do trigo irá ocorrer na safra de verão, ocasião em que estaremos colhendo 65 milhões de toneladas, ou seja, 15 milhões a menos do que foi colhido nesta safra.
Ninguém avisou o Governo de que para abastecer o País precisamos das 80 milhões de toneladas que colhemos e precisaríamos aumentar cerca de 20 milhões de toneladas, neste ano, para que o abastecimento seja tranqüilo, porque iremos importar mais do que exportar. As exportações brasileiras atingem 10 milhões de toneladas por ano. Este ano, iremos atingir mais de 10 milhões de toneladas de importação a um custo elevado porque os exportadores, lá fora, verificaram que não plantamos trigo e irão nos oferecer uma quantidade muito grande desse produto. Não iremos plantar a safra de verão. Quando dizem que a safra irá cair 10%, é boato.
Analisem os dados: está sendo utilizado 40% a menos de calcário - 20 milhões de toneladas no ano passado e 12 milhões este ano - e 25% a menos de fertilizantes. Isso significa produtividade menor. Não é só a área que está sendo reduzida. Os tratores não estão sendo substituídos de forma adequada e nós estamos com um parque de máquinas com uma vida média de dez anos. Nós estamos sucateando a agricultura e nos entregando, porque a soberania está sendo perdida no trigo, com 80% já importado para o consumo. E nós vamos entregar a soberania na safra de verão, porque alguém de dentro do Governo pensa que é mais barato importar do que produzir aqui. O custo é muito alto.
O Sr. Vilson Kleinübing - Permite-me V. Exª um aparte?
O SR. OSMAR DIAS - Concedo o aparte a V. Exª.
O Sr. Vilson Kleinübing - Em primeiro lugar, Senador Osmar Dias, eu queria lhe fazer um apelo como amigo e admirador. Como amigo do passado, que já somos, porque trabalhamos juntos em Estados vizinhos e como admirador porque cada vez o admiro mais pelos seus pronunciamentos aqui no Congresso Nacional. Não diminuamos a estatura do nosso Ministro do Planejamento com essa história, que não sei onde apareceu, de que ele não conhece uma vaca. Aliás, esse não é um pré-requisito para o cargo de Ministro do Planejamento. Fui Secretário da Agricultura e sou engenheiro eletricista. Meus adversários diziam que eu não sabia distinguir um poste de um pé de milho. E fui eleito Governador depois disso. Ele tem que ser um bom Ministro do Planejamento, tem que administrar um Orçamento gigantesco em termos de despesa e pequeno em termos de receita. Estou fazendo a defesa em nome do Governo. O Ministro do Planejamento que for querido e adorado por todos os Senadores e Deputados deve ser demitido, no dia seguinte, pelo Presidente da República. Não vai ser um bom Ministro. Na segunda parte de meu pronunciamento, digo que V. Exª tem toda razão nessa questão. Ninguém nunca lutou tanto quanto V. Exª e alguns companheiros nossos para dar uma alternativa barata, de custo pequeno e de solução eficaz, como foi dada para o projeto da agricultura neste ano. Infelizmente, o Governo assumiu um compromisso sem ter recursos suficientes para pagar a conta desse compromisso. O nosso pequeno agricultor, que está atrás dos R$30 mil, não consegue encontrar, no Banco do Brasil, nem o gerente, para entregar os R$30 mil a 16%. Temo que daqui a pouco ele tenha um acesso de raiva e quando não conseguir parte desse dinheiro, ao invés de plantar, aplique em caderneta de poupança em uma taxa de rendimento até muito maior do que essa. Então, faço esta observação: o Ministro Serra tem que cortar muito, porque o Governo gasta demais, nós gastamos demais aqui. Dou uma informação a V. Exª e a todos os Senadores aqui presentes: nos últimos 12 meses, aumentamos em US$12 bilhões a dívida pública dos Estados brasileiros e pagamos, por dia, US$25 milhões de dívida pública, de títulos públicos, pagando um hospital de 350 leitos por dia. De quanto V. Exª acha que precisa a agricultura brasileira neste momento? Então, temos os nossos compromissos para resolver aqui internamente. Faço este aparte, em primeiro lugar, para registrar que continuo seu admirador profundo. Em segundo lugar, é bom que ele não conheça uma vaca mesmo; é bom que ele conheça onde arranjar dinheiro para a agricultura.
O SR. OSMAR DIAS - Senador Vilson Kleinübing, vou aceitar a sua repreensão, dizendo o seguinte: no dia em que colocarem uma vaca e uma cabra diante do Ministro do Planejamento e ele apontar para a cabra e disser que é a vaca, não vou me importar nem um pouquinho, desde que ele cumpra aquilo que, pela imprensa, foi prometido. No dia em que ele fizer isso, não me importo se ele não sabe diferenciar uma cabra de uma vaca, ou uma mula de uma égua. Daí, não vai fazer diferença para mim. Agora, S. Exa. tem que cumprir o que não está sendo cumprido.
Estou no Partido do Governo e, no dia em que me convidaram para fazer parte desse Partido, coloquei só uma exigência: que, em troca, jamais me veriam em uma roda, discutindo indicação para qualquer cargo dentro do Governo. Não faço e não farei isso, mas cobro e exijo minha independência para expressar e dizer o que penso. O Governo, que acenou com soluções, está trazendo dificuldade aos produtores.
Quero aproveitar a presença do Presidente do Congresso Nacional, Senador José Sarney, para dizer que um dia voltarei a esta tribuna para lançar-lhe não um desafio, pois penso que, com a experiência, o conceito e o respeito internacional que S. Exª tem, poderá ajudar o Presidente Fernando Henrique Cardoso no maior desafio da agricultura brasileira. Isso não está sendo feito porque estamos discutindo picuinhas e problemas domésticos quando o problema maior - e isso vou abordar aqui, Sr. Presidente José Sarney - é lá de fora. Precisamos resolver a questão do protecionismo, que só poderá ser solucionada com conceito internacional e altas autoridades. Como temos um diplomata na Presidência da República e uma pessoa de alto respeito nacional e internacional, na Presidência do Congresso Nacional, este é o momento para a solução dessa questão. Estes, sim, podem negociar uma redução do protecionismo que toma conta hoje dos blocos econômicos mais fortes, responsáveis pela derrubada dos preços de meio por cento ao ano dos commodities agrícolas. É de se notar o café e o cacau, que o Senador Antonio Carlos Magalhães, como sabemos, tem feito aqui a defesa desses produtos. Não venceremos esse desafio internamente apenas se não nos voltarmos à economia internacional e procurarmos uma integração competitiva desse setor, que oferece maiores vantagens comparativas do que qualquer outro setor da economia. Entretanto, o Governo está tratando a agricultura como se o problema fosse apenas as dívidas que não foram pagas por maus pagadores ou por aqueles que são bons pagadores, mas não conseguem quitá-las.
Concedo o aparte ao Senador Geraldo Melo, com satisfação.
O Sr. Geraldo Melo - Nobre Senador, quero congratular-me com V. Exª, apesar de reconhecer que se trata de um pronunciamento duro que V. Exª está fazendo à Nação. Considero-o, entretanto, duro e necessário, pois é preciso que o grito que V. Exª está dando em nome da agricultura brasileira seja ouvido. Eu, o País e o Senado conhecemos muito bem os argumentos que os cientistas econômicos usam e insistem em usar para defender essa enlouquecida taxa de juros como forma de enxugamento da demanda, de desaquecimento da economia. Por que é necessário desaquecer a demanda? Porque ela é maior do que a oferta. O depoimento de V. Exª junta-se ao de tantas outras pessoas que têm trazido o testemunho de que a agricultura brasileira está seguindo ladeira abaixo, o que significa que com a taxa de juros alta, alguns se preocupam em reduzir a demanda, não se preocupando que a política de redução de demanda esteja reduzindo também a oferta. E o que vamos fazer? Não conheço economia, não conheço pressão sobre os preços em ascensão numa atmosfera de abundância. Também não conheço qualquer instrumento de gerenciamento da economia capaz de manter baixos os preços numa economia de escassez. Se não estamos sendo capazes de manter a oferta agrícola, estamos preparando uma bomba de efeito retardado, que vai explodir quando a escassez de produtos agrícolas começar a pressionar os preços. Creio que o Presidente Fernando Henrique Cardoso, que sempre se manifestou com extrema cautela em relação a essa política de juros altos, deve estar consciente de que algo muito enérgico precisa ser feito, num país em que, de repente, o sistema bancário passou a cobrar taxas de juros mais altas do que os agiotas. Volto da minha terra, sabendo que, neste País em que o crédito pessoal está sendo onerado em aproximadamente 16% ao mês, existem agiotas cobrando 8%. Houve tempo em que tomar dinheiro emprestado de agiota era sinal de que alguém estava às vésperas da falência. Parece que agora tomar dinheiro emprestado de banco é que significa que alguém está às portas da quebradeira. O Senador José Agripino fez a mesma constatação que fiz e confirmou-me ter obtido as mesmas informações. Partindo, portanto, das preocupações de V. Exª, penso que está na hora de chegar ao Presidente da República a nossa voz, o nosso apelo para que esse assunto seja encarado de frente, com a responsabilidade e a competência deste Governo.
O SR. OSMAR DIAS - Meu caro Senador Geraldo Melo, li nos jornais o Presidente da República tem reafirmado e concordo com Sua Excelência que há hoje, com o Plano Real, uma transferência de dinheiro para os trabalhadores que, segundo alguns dizem, foi de 8, 10, 14 ou 22 bilhões de reais para os consumidores. Mas, se estivéssemos no setor produtivo transferindo recursos apenas para os trabalhadores, nós nos conformaríamos e acreditaríamos que essa crise teria o seu retorno até pelo melhor poder aquisitivo dos trabalhadores que poderiam pagar melhor pelo preço da comida, dos produtos agrícolas e, desta forma, poderíamos ter compensado esse sacrifício momentâneo. Mas, não. Essa transferência de recursos ocorre também e continua historicamente ocorrendo em relação àquele setor que mais absorveu o dinheiro do setor produtivo nacional, que é o sistema bancário.
Atualmente, há uma participação do sistema financeiro de 16% em relação ao PIB. São cinqüenta bancos que movem 16%, enquanto sete milhões de propriedades rurais no País ficam com 12% do PIB, e a massa de trabalhadores, todos os trabalhadores somados juntos ficam com apenas o dobro daquilo que os bancos estão conquistando em relação ao PIB.
Quando falo de socialdemocracia no interior, as pessoas não entendem muito bem. Procuro, então, explicar dizendo que socialdemocracia é permitir que também aqueles que ganharam menos até agora possam ter uma vida mais digna, ganhar um pouco mais. No setor produtivo, ganhar porque se trabalha e se produz e não porque se especula. Transferir dinheiro do setor produtivo para a especulação não é socialdemocracia aqui ou em qualquer parte do mundo. Temos que alertar o Governo para os fatos que talvez cheguem ao conhecimento do Presidente da República não coincidem com aquilo que está ocorrendo realmente em todos os Estados brasileiros.
Pergunte ao Senador Iris Rezende quanto valia a terra do seu Estado há seis meses e quanto ela vale hoje. S. Exª vai dizer que vale um terço. Pergunte ao Senador Lúdio Coelho quanto valia a terra no seu Estado e quanto vale hoje. Isso está acontecendo com todos os Estados brasileiros. Houve, portanto, uma derrubada no patrimônio e, além disso, uma derrubada na receita e uma transferência de dinheiro para os especuladores, os agiotas.
V. Exªs podem perguntar por que estou falando do Ministro do Planejamento e não do Ministro da Agricultura. Faço isso porque falar do Ministro da Agricultura é chover no molhado. Estamos vendo um sistema perverso, no qual os banqueiros estão rindo à toa e os que produzem estão chorando. Pensamos que o Ministro José Eduardo, como Ministro da Agricultura, é um ótimo banqueiro e, já que não está do lado dos produtores, não vou mais falar em S. Exª, pois está muito satisfeito com a política dos juros altos.
O Sr. Carlos Bezerra - Permite-me V. Exª um aparte?
O SR. OSMAR DIAS - Ouço V. Exª com prazer.
O Sr. Carlos Bezerra - Senador Osmar Dias, quero solidarizar-me com o pronunciamento de V. Exª e dizer que há um equívoco na colocação do Senador Geraldo Melo, quando diz que a agricultura está indo ladeira abaixo. No meu entender, o que está indo ladeira abaixo é o Real. O primeiro a ser atingido com a crise da agricultura é o Real, que é necessário ao País e fundamental para a estabilização da vida econômica. Já disse aqui várias vezes e vou repetir novamente: a questão da agricultura é política, é um jogo do poder o fato de o Brasil não estar ao lado da agricultura, pois o poder do Brasil hoje está com os banqueiros e com as grandes indústrias do Sudeste. São eles que mandam no País. Quando há um problema com uma grande indústria, os Ministros se esforçam para resolver. Os banqueiros nunca lucraram tanto neste País como agora. Por que não se procura uma solução para a dívida interna do País? Porque não interessa aos banqueiros mexer na estrutura da dívida interna, pois estão muito bem acomodados ganhando o que querem, o País todo trabalhando para eles. O Presidente Fernando Henrique Cardoso é um grande democrata, nós acreditamos em Sua Excelência. Meu partido, o PMDB, apóia seu Governo aqui, mas está esperando uma definição com relação às questões da agricultura e da dívida interna. A FAO nos diz que precisamos de 100 milhões de toneladas de grãos para abastecer apenas o Brasil. Produzimos 80 este ano. V. Exª nos informa que essa produção deve cair para 60 milhões de toneladas. Isso significa que teremos que importar em grande quantidade, e o País não terá condições para isso, porque, às vezes, o produto não está disponível, como é o caso da soja, do milho e do trigo, este último tendo o seu preço elevado aos píncaros, em razão da frustração de safra nos principais países produtores. O setor agrícola, Senador Osmar Dias, deve unir-se para tornar-se forte, e os políticos empenharem-se em embates duros, porque nesta guerra que aí está com diplomacia nada vai se resolver. Tem-se que bater duro em todo o segmento econômico do Governo, que é composto pelos mesmos homens de vinte anos atrás. No Banco do Brasil, no Ministério da Fazenda, por exemplo, o perfil do pessoal é mais ou menos o mesmo. E os que entraram mais recentemente já o fizeram porque estão aliados a esses setores econômicos, aliados dos banqueiros, das grandes indústrias do Sudeste, são homens de confiança deles. Por isso é que estão ocupando esses cargos importantes de assessoria nestes ministérios, que são fundamentais para a vida do País. Observo, com tristeza, a grande imprensa denominar o agricultor brasileiro de picareta, oportunista, chantagista, quando, na realidade, ocorre uma crise grave na agricultura brasileira. As cooperativas sérias do Rio Grande do Sul, do seu Estado, Paraná, estão falidas, com dificuldades enormes; pequenos produtores, que há anos cultivam a terra, nunca enfrentaram problemas como agora. Isso porque houve uma descapitalização do campo, com o Plano Real, e os representantes do Governo não querem reconhecer esse fato e levam ao Presidente uma posição equivocada, errada. A agricultura tem que ser salva de qualquer modo, porque não é a agricultura que está afundando, volto a dizer, mas sim o Plano Real é que está indo por água abaixo. Isso é danoso, altamente prejudicial para o País, porque, se entrarmos em outra crise inflacionária e se tivermos que procurar um outro plano, não sei onde é que vamos parar. Parabéns a V. Exª pelo seu brilhante pronunciamento.
O SR. OSMAR DIAS - Muito obrigado, Senador Carlos Bezerra.
A respeito desta união que deve haver entre o setor agrícola e a classe política, gostaria de fazer uma consideração. Fiquei analisando por que na Europa e nos Estados Unidos os agricultores têm tanta força no Congresso e junto ao Governo a ponto de conseguirem tantos subsídios por ano, equivalente a cerca de 80% do PIB brasileiro. Será que lá eles vivem, a maioria das pessoas e eleitores, no campo a ponto de ter tanta força política? Não. Lá a sociedade percebeu que a agricultura é estratégica, é o fundamento da economia, e não adianta o setor de máquinas agrícolas tentar sobreviver sem a agricultura, os insumos. Não adianta. Os próprios consumidores não reclamam de pagarem 7% do seu salário, que vai direto ao subsídio agrícola, porque sabem que é em função desse subsídio que o preço da cesta básica ou o preço da alimentação caiu de 50 para 20% em relação ao salário nesses países mais desenvolvidos.
Então, o lobby que se forma não é do produtor rural, mas de todos os negócios que se envolvem com a agricultura, inclusive dos consumidores que acreditam num preço baixo permanente da alimentação com a contribuição de 7% que eles dão.
A sociedade brasileira precisa acordar. O problema da agricultura não é só dos agricultores, mas da sociedade brasileira e em especial do Governo, que até o momento está devendo muito aos agricultores.
O Sr. Romero Jucá - V. Exª me concede um aparte?
O SR. OSMAR DIAS - Pois não, Senador Romero Jucá.
O Sr. Romero Jucá - Gostaria de registrar, Senador Osmar Dias, a importância das colocações de V. Exª. É fundamental que o Congresso Nacional e o Governo Federal tomem uma posição em relação à agricultura. A agricultura do Norte está falida, especialmente em Roraima. Os agricultores estão saindo do Estado, inclusive o abastecimento está passando por um problema gravíssimo. Reitero a a importância das colocações de V. Exª e lembro a necessidade de reforçar o apelo para que os Fundos Constitucionais do Governo - o FNO, o Fundo do Centro-Oeste e o Fundo do Nordeste - voltem a operar em regime de urgência, porque a não operação desses fundos está trazendo sérios problemas para a agricultura do Norte. O BASA não está recebendo a proposta dos agricultores. A sociedade de Roraima e os agricultores do Norte estão passando por uma situação de extrema dificuldade, esperando uma posição do Governo Federal. Quero apoiá-lo e dizer que faço minhas as palavras e as reivindicações de V. Exª.
O Sr. Casildo Maldaner - Permite-me V. Exª um aparte?
O SR. OSMAR DIAS - Concedo o aparte a V. Exª.
O Sr. Casildo Maldaner - Nobre Senador Osmar Dias, gostaria de cumprimentá-lo e dizer que quando V. Exª aderiu ao partido do Presidente da República, pela nossa amizade de muitos e muitos anos - somos vizinhos de Estado - e pela postura de V. Exª ao longo da vida, já que é muito ligado aos negócios da agricultura neste País, fiquei pensando em como V. Exª se portaria neste momento para não criar conflitos. Teria V. Exª coragem de ser aquilo que sempre foi? Hoje V. Exª demonstra que não se curvou, que continua o mesmo, que, embora pertencendo ao Partido do Governo, faz uma autocrítica, uma auto-reflexão sobre temas como esse. Com isso, cada vez mais, até mesmo devido à nossa identidade, analisando o profundo e sério problema por que passamos, cresce V. Exª em nosso conceito. Não há a menor dúvida de que a cesta básica não se alterou durante este ano porque alguém aguentou essa situação. Há uma lei da Física que diz que a toda ação corresponde uma reação; se não houve inflação, isso deveu-se à agricultura, porque o preço dos produtos da cesta básica permaneceram congelados de julho do ano passado para cá. Em alguns casos, houve queda de preço. V. Exª dá hoje, nesta Casa, uma demonstração de que segue levando aquilo que sempre aprendeu na vida: ser coerente com a postura pública e o seu cumprimento.
O SR. PRESIDENTE (José Sarney) - Senador Osmar Dias, peço a V. Exª que conclua o seu discurso, porque já está com o seu tempo bastante esgotado. Prorrogo o expediente por mais 15 minutos.
O SR. OSMAR DIAS - Vou finalizar, Sr. Presidente.
Quero responder ao Senador Casildo Maldaner que cometeu um equívoco quando pensou que eu pudesse mudar, mudando de partido. Eu vim para o PSDB com essa exigência de continuar falando o que penso. Se eu servir ao PSDB dessa forma, permaneço, caso contrário, o PSDB que use os seus estatutos e me expulse, mas eu vou continuar falando a verdade.
Lá no Paraná, o PSDB disse: "o que o Osmar está fazendo no partido, se está criticando o Governo?" Ou me expulsam, ou sai do partido quem não está satisfeito com a minha forma de falar.
E quero acrescentar ainda, Sr. Presidente, que para a agricultura brasileira seria mais barato pagar os compromissos de campanha do Presidente da República com o atual Ministro da Agricultura e não tê-lo no cargo. Custaria, sim, mais barato. Eu tenho que ser sincero, porque os agricultores têm esse sentimento. Se os agricultores pagassem a conta com o Presidente e dissessem: "está paga a conta, e nós não podemos mais conviver com um ministro banqueiro no Ministério", sairia mais barato. Eu seria o primeiro agricultor a contribuir.
Eu tenho ainda um pedido de aparte, Sr. Presidente.
O SR. PRESIDENTE (José Sarney) - Infelizmente, o tempo de V. Exª está esgotado.
O SR. OSMAR DIAS - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Encerro meu pronunciamento. (Muito bem!)