Discurso no Senado Federal

PROGRAMA DE DEMISSÃO VOLUNTARIA DO BANCO DO BRASIL. SITUAÇÃO DEFICITARIA EM QUE SE ENCONTRA A INSTITUIÇÃO, EM VIRTUDE DE OPERAÇÕES FINANCEIRAS DANOSAS E DIVIDAS DO TESOURO NACIONAL.

Autor
Epitácio Cafeteira (PPR - Partido Progressista Reformador/MA)
Nome completo: Epitácio Cafeteira Afonso Pereira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
BANCOS.:
  • PROGRAMA DE DEMISSÃO VOLUNTARIA DO BANCO DO BRASIL. SITUAÇÃO DEFICITARIA EM QUE SE ENCONTRA A INSTITUIÇÃO, EM VIRTUDE DE OPERAÇÕES FINANCEIRAS DANOSAS E DIVIDAS DO TESOURO NACIONAL.
Publicação
Publicação no DCN2 de 08/08/1995 - Página 13559
Assunto
Outros > BANCOS.
Indexação
  • CRITICA, PROGRAMA, INCENTIVO, DEMISSÃO, FUNCIONARIO PUBLICO, BANCO DO BRASIL, MOTIVO, RESPONSABILIDADE, GOVERNO, TESOURO NACIONAL, DESCUMPRIMENTO, PAGAMENTO, DIVIDA, EFEITO, EXECUÇÃO, POLITICA, RESULTADO, DEFICIT, BANCO OFICIAL.

O SR. EPITACIO CAFETEIRA (PPR-MA. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, ontem, fiz pronunciamento sobre o chamado Programa de Demissões Voluntárias do Banco do Brasil.

Na ocasião, demonstrei, de forma clara e insofismável, que, após haver contratado uma empresa para fazer um diagnóstico do Banco do Brasil, qualquer funcionário do Banco faria este diagnóstico: há um excesso de despesa sobre a receita. É preciso, portanto, ou aumentar a receita ou diminuir a despesa. O Banco optou por diminuir a despesa, ou seja, por demitir funcionários, por incentivar pedidos de demissão, e, claro, para que pudesse alcançar o equilíbrio nas contas, elegeu para os pedidos de demissão os funcionários que recebiam mais, os funcionários mais antigos que tinham de 12 a 28 anos de casa. Ao fazer isso, o Banco está abrindo mão dos melhores funcionários. Aqueles que pensavam estar dedicando sua vida a uma carreira chegaram agora à conclusão que aquilo não passa de um emprego. Na realidade, o que aconteceu deixa patenteado que as regras do Banco Central são dramáticas com relação aos bancos estaduais, que não podem emprestar dinheiro a mando do governador ou mesmo para empresa de governo de Estado. Mas isso é só para os bancos estaduais. Na presidência do Banco do Brasil só falta estar sentado o Presidente da República, porque Sua Excelência diz o que quer, o Ministro da Fazenda aciona o presidente do banco, e é feito aquilo que é determinado.

Então, o Governo vem procedendo dessa forma desde tempos imemoriais, acentuadamente na década de 80. O Banco do Brasil, naquela época, tinha a conta-movimento do Governo e obedecia prazerosamente às ordens: emprestava dinheiro a fulano, emprestava a tal setor, concedia juros subsidiados para aquela operação, emprestava a usineiro, emprestava a determinada industria; mas havia dinheiro do Governo, que era da conta-movimento.

Depois, criou-se o Banco Central, que nasceu de dentro do Banco do Brasil; nasceu da Superintendência da Moeda e do Crédito, do Banco do Brasil.

De repente, depois de independente, qual Nero, terminou por "tentar matar Agripina"; qual Nero, o Banco Central resolveu acabar com o Banco do Brasil, porque ficou com o dinheiro, mas não com a obrigação de pagar às suas ordens.

O Governo manda emprestar recursos com garantia de produto, mas, no vencimento, quando isso não ocorre, quem fica com o produto é o Banco do Brasil, não é o banqueiro do Governo, que é o Banco Central.

Portanto, o Governo tirou o dinheiro do Banco do Brasil e depositou-o no Banco Central; mas não perdeu o mau hábito de mandar o Banco do Brasil atender a sua parte política - política no bom sentido e política no mau sentido. Política no bom sentido ao encaminhar operações num determinado setor; política no mau sentido quando escolhe determinados amigos para se fazer empréstimos - empréstimos esses que o próprio Governo sabia, não seriam liquidados.

Na realidade, Sr. Presidente, se o Banco do Brasil pudesse cobrar do Governo Federal, se pudesse cobrar do Tesouro Nacional o dinheiro que está em lucros e perdas ou em operações de liquidação, a instituição teria dinheiro suficiente para - emprestando a juros altos que hoje so ocorre no Brasil - pagar todo o seu funcionalismo, não ter nenhum prejuízo e ter lucro permanente.

Mas acontece que o Presidente do Banco do Brasil e os seus Diretores recebem ordens do Ministério da Fazenda e só fazem o que o Ministério manda. Como é que o Presidente do Banco do Brasil vai cobrar do Ministro da Fazenda? Qual é a autoridade que tem a diretoria do Banco do Brasil para cobrar do Tesouro Nacional, se essa diretoria foi escolhida pelo Ministério da Fazenda?

Aí está a verdadeira causa de toda essa situação.

Fiz um pedido de informação ao Banco.

Ontem, no meu pronunciamento, referi-me à resposta que recebi. À pergunta: qual era o total do débito do Tesouro Nacional para com o Banco do Brasil - relacionando as instituições - houve respostas do "arco da velha". Veio à baila um débito do extinto IAA, cuja conta continua no Banco do Brasil, no "pendura".

Como está na moda falar em calote e caloteiro, parece-me que o Tesouro Nacional quer assumir a função de caloteiro, porque não paga! Quando fala em pagar, quer fazê-lo com títulos da dívida pública - como se fosse possível emprestá-los! A função do Banco é exatamente a de receber dinheiro - dinheiro vivo - e emprestá-lo. É nessa intermediação que o Banco do Brasil tira o seu lucro.

O Sr. Lúcio Alcântara - V. Exª me permite um aparte, Senador Epitacio Cafeteira?

O SR. EPITACIO CAFETEIRA - Ouço, com muita alegria, o nobre Senador Lúcio Alcântara. Sei que S. Exª é autor de requerimento para trazer o Presidente do Banco do Brasil a esta Casa.

E eu gostaria, nobre Senador Lúcio Alcântara, que, juntamente com o Presidente, também comparecesse o Ministro da Fazenda, que pode fazer o que o Presidente do Banco do Brasil não pode.

Concedo o aparte a V. Exª.

O Sr. Lúcio Alcântara - Ainda ontem, trocávamos idéias, informalmente, em conversa que mantínhamos, sobre a impossibilidade de os bancos estaduais - quer dizer, os bancos nos quais os governos estaduais são majoritários - operarem com os governos estaduais e também com as empresas de economia mista, nas quais os governos estaduais são majoritários. Essas empresas só podem operar com os bancos estaduais na linha de desconto e duplicata; em mais nenhuma. E muito menos podem fazê-lo os governos estaduais. E essa vedação, esse impedimento, que visa a preservar a saúde financeira do banco, que visa a impedir que os governos estaduais controladores utilizem o banco predatoriamente, no sentido de resolver os seus problemas de caixa, deve ser estendida ao Banco do Brasil. V. Exª, no seu pronunciamento, está mostrando que grande parte desse passivo resulta de débitos do Tesouro Nacional ou de operações danosas ao banco, que foram realizadas por determinação do seu controlador, que é justamente o Governo Federal. Então, a explicação e a solução de todos esses problemas do Banco do Brasil é muito mais profunda do que simplesmente fechar agências e demitir funcionários. Todos nós - V. Exª, que inclusive é um funcionário aposentado do Banco do Brasil, portanto conhece a instituição por dentro no seu dia a dia - estamos de acordo com o fato de o banco ter de se adaptar às novas condições da economia, da competição, da estabilidade econômica, etc. Mas, daí a se lançar num programa desvairado de transferência, de remoção de funcionários e de coação para levá-los a pedido de desligamento, não faz nenhum sentido. Comparo esse episódio a um navio que está em alto-mar, à deriva, e precisa diminuir o seu peso. Para isso, deveria diminuir a carga. É como se ele lançasse ao mar o seu combustível, por exemplo, e ali ficasse sem ter como viajar. O Banco do Brasil está se desfazendo do seu capital humano, justamente aquele mais preparado, porque são funcionários que tinham mais de 15 anos de casa, e toda a vida a filosofia do banco era a de dizer que o funcionário tinha de se profissionalizar, tinha de se dedicar totalmente à instituição, fazer cursos. Enfim, o banco investiu muito no seu quadro de funcionários e, agora, abandona essas pessoas à própria sorte, causando-lhes problemas, traumas e grande inquietação. Portanto, o intuito do meu requerimento é de que o Presidente venha a esta Casa e debata com os Senadores, discuta e apresente as suas razões, o seu programa, a sua proposta, para que possamos dar a nossa opinião e defender esse grande patrimônio que é o Banco do Brasil.

O SR. EPITACIO CAFETEIRA - Agradeço a V. Exª o aparte.

Houve uma época, nobre Senador Lúcio Alcântara, em que o Banco do Brasil tinha entre os seus diretores um representante dos acionistas minoritários. Isso acabou. Hoje, existem apenas os acionistas majoritários que, como eu dizia a V. Exª, usam e abusam do banco.

Nessa relação que recebi, Sr. Presidente - são pouco mais de R$3,8 bilhões e sem levar em conta os que ali não estão mencionados - verificamos que, quando o Governo quer fazer uma operação no exterior, ele mesmo se socorre do aval do Banco do Brasil, porque, lá fora, não importa se é o Governo Federal ou o Governo de Estado que está pedindo o empréstimo, e sim quem vai garantir a dívida. E, quando se diz que é o Banco do Brasil, as portas se abrem.

Na operação do Iraque, R$806 milhões foram garantidos pelo Banco do Brasil. Veio a guerra, a Mendes Júnior não pagou, e o Banco do Brasil teve que pagar. As máquinas estão no Iraque. O Banco do Brasil pagou porque, seguindo orientação do Governo Federal, deu aval. Mas o Governo não relacionou esses R$806 milhões entre os débitos que assumiu perante o Banco do Brasil.

Por isso, quero esclarecer - vou ler para os nossos colegas um novo Requerimento de Informação que apresentei ontem e que faço questão que conste do meu pronunciamento, onde questiono três pontos que se referem àqueles R$3,8 bilhões. Primeiro: os valores assinalados representam o inicial dos empréstimos ou pagamentos feitos pelo Banco do Brasil, ou tais quantitativos sofreram algum tipo de reajuste? Segundo: em caso de ter havido correção, quais foram as taxas de juros aplicadas? Não tendo havido correção, quais serão as taxas aplicadas quando da possível liquidação? Segundo a informação que temos, tata-se de pouco mais de R$3,8 bilhões, que pode corresponder ao valor histórico. E qual é o valor de hoje?

O que se vê em relação aos Estados endividados é uma coisa interessante: às vezes um Estado toma empréstimo em dólar. Mas o Governo, habilmente, transformou dólar em real - e o real corre a um juro alto. Portanto, o real se valoriza com o dólar desvalorizado. Ou seja, as dívidas dos Estados caminham para ser impagáveis, porque o lucro nessas operações passa a ser do próprio Governo Federal.

O Sr. Sebastião Rocha - Permite V. Exª um aparte?

O SR. EPITACIO CAFETEIRA - Ouço, com alegria, o aparte do Senador Sebastião Rocha.

O Sr. Sebastião Rocha - Senador Epitacio Cafeteira, solidarizo-me com V. Exª em relação a esse tema. Desde ontem eu pretendia fazer um aparte, mas infelizmente não houve oportunidade. Esse drama realmente está atingindo os trabalhadores do Banco do Brasil. Vou um pouco além: a crise que hoje tomou de assalto o Banco do Brasil atinge também várias empresas de nível nacional. Temos estampado nos jornais de hoje o pedido de concordada da Mesbla, por exemplo. Começo a imaginar que de fato as medidas que o Banco do Brasil está tomando, assim como a quebradeira geral das empresas no Brasil, é resultado da política econômica do Governo. Parece-me que o Banco do Brasil está sendo forçado a tomar medidas para atender aos objetivos do plano econômico. Realmente, resta-nos - para a sociedade, para o Governo, para o trabalhador - um grande dilema: conviver com a inflação, que é maléfica e com a qual jamais podemos concordar, ou conviver com a quebradeira, com o desemprego. Estamos diante de um plano que praticamente estabilizou a moeda, que combateu a inflação, mas, por outro lado, está provocando um índice de desemprego elevadíssimo, a exemplo do que acontece também na Argentina. Começamos a ficar sem definição: apoiar o plano, sabendo que, em decorrência dele, inúmeros desempregos irão acontecer, inúmeras empresas irão quebrar, ou optar pela volta da inflação? É um dilema que se apresenta para a equipe econômica e para todo trabalhador. Acredito que o Plano Real ainda tem apoio popular exatamente porque o trabalhador coloca como item primeiro, na ordem de importância, o combate à inflação, a estabilidade da moeda. Temos que admitir, no entanto, que essas repercussões tanto no Banco do Brasil como nas empresas são decorrentes do plano econômico. Esse é o meu pensamento. Realmente temos que estudar, no Senado Federal e no Governo, o que fazer para conviver com a inflação baixa e um índice aceitável de emprego, de crescimento da nossa economia.

O SR. EPITACIO CAFETEIRA - Nobre Senador Sebastião Rocha, quero dizer a V. Exª que o plano deveria ser discutido não em petit comité, como só acontece. Estupefato, eu lia, em jornais, há dois dias, que a nossa balança cambial é deficitária e a nossa reserva sobe. Não dá para entender. Como é que a entrada de dólares no Brasil é maior do que a saída se estamos importando mais do que exportando? A resposta é clara: desde ontem eu dizia que, se está entrando capital neste País, é para, aproveitando os juros altos, especular. Li hoje nos jornais que o Governo agora está preocupado em não deixar entrar mais dinheiro no País. Ora, mas só se falou nisso depois da entrada de US$7 bilhões, só no mês de julho. Não se reparou que estamos como o dono de uma lagoa de peixes que convida alguém - no caso, o capital estrangeiro - para tirar o peixe de dentro de sua represa. Na realidade, o que estamos fazendo é isso.

É importante - e V. Exª falou agora - o pedido de concordata da Mesbla. Começa a haver um susto. Falaram da situação ao Presidente da República e Sua Excelência disse: ou se demitem os funcionários do banco, ou o banco vai quebrar.

O SR. PRESIDENTE (Teotonio Vilela) - Senador Cafeteira, lamento comunicar a V. Exª que seu tempo está esgotado.

O SR. EPITACIO CAFETEIRA - Sr. Presidente, ontem, o nobre Senador Dutra pediu-me um aparte e eu não pude conceder. Hoje, S. Exª já se encontra com o microfone na mão. Portanto, faço um pedido a V. Exª: permita que o Senador faça o aparte. Logo em seguida, encerrarei minhas considerações.

O SR. PRESIDENTE (Teotonio Vilela) - A Presidência concorda. Pede, no entanto, ao Senador Dutra que seja sucinto no aparte.

O Sr. José Eduardo Dutra - Procurarei ser o mais sucinto possível, Sr. Presidente. Solidarizo-me com V. Exª em relação ao que aborda neste pronunciamento - tentei fazê-lo ontem. A nossa preocupação é que, ao analisar o processo de enxugamento do Banco do Brasil, o que salta aos olhos é que aparentemente existe o objetivo de enfraquecimento do banco, sobretudo nas regiões carentes deste País, onde ele se faz mais necessário. Além do processo de demissões por "livre e espontânea pressão", houve - como V. Exª registrou ontem - mediante comunicado oficial do banco de 26 de julho, processo de transferência, de remanejamento de funcionários. Segundo esse comunicado, o Nordeste tem 2.423 funcionários em excesso. Quer dizer, a região Nordeste será a mais prejudicada com esse processo, com essa reestruturação do Banco do Brasil. Lamentamos que essa reestruturação esteja sendo feita como se o Banco do Brasil fosse um mero banco comercial. É lógico que o Banco do Brasil tem que ser eficiente, dar lucro, mas também tem a tarefa histórica - como sempre teve -, de ser um banco de fomento. Preocupa-nos, inclusive, que futuramente isso possa vir a ser utilizado como justificativa para a privatização do banco. Qual é a lógica? Bom, se o Banco do Brasil transformou-se em um banco comercial, não tem sentido o Estado manter um banco comercial, já que existe BRADESCO, Itaú, Real, etc. Se a lógica for efetivamente essa, preocupa-nos se isso, no futuro, não vai ser uma justificativa a mais para a privatização do Banco do Brasil. Agradeço a oportunidade desse aparte e solidarizo-me com o seu pronunciamento.

O SR. EPITACIO CAFETEIRA - Muito obrigado, nobre Senador Dutra, mas penso que o Governo não pretende privatizar o banco; o coxo não joga fora a muleta, e o Banco do Brasil tem sido a muleta desse coxo, que é o Governo Federal - não deste Governo, mas de todos os governos - na oferta de cargos a políticos e muito mais na oferta de dinheiro, de empréstimos, de várias benesses que não têm sentido.

Ao concluir, lamento que tenham induzido o Presidente da República a dizer: "ou se demite ou o Banco do Brasil vai falir". Não, o banco não vai falir. O Governo é que precisa pagar o Banco. Se pagar, o Banco terá saúde.

Sr. Presidente, estou buscando encontrar uma forma de fazer com que o Governo Federal obrigue os bancos estaduais, no que concerne ao seu comportamento com os governos estaduais, a não entregarem dinheiro, aja da mesma forma e não transforme o Banco do Brasil em caixa-dois em elemento que o Governo Federal usa até para aliciamento político.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 08/08/1995 - Página 13559