Discurso no Senado Federal

CONSIDERAÇÕES ACERCA DA MATERIA INTITULADA 'LABIRINTO MORTAL' DO ARTICULISTA CLOVIS ROSSI, PUBLICADA NA SEÇÃO 'OPINIÃO', DO JORNAL FOLHA DE S.PAULO, EDIÇÃO DE HOJE, SOBRE A MOROSIDADE E O EXAGERO FORMAL DO PODER JUDICIARIO, QUE PREJUDICAM CRUELMENTE OS CIDADÃOS BRASILEIROS.

Autor
Ney Suassuna (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
Nome completo: Ney Robinson Suassuna
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
JUDICIARIO.:
  • CONSIDERAÇÕES ACERCA DA MATERIA INTITULADA 'LABIRINTO MORTAL' DO ARTICULISTA CLOVIS ROSSI, PUBLICADA NA SEÇÃO 'OPINIÃO', DO JORNAL FOLHA DE S.PAULO, EDIÇÃO DE HOJE, SOBRE A MOROSIDADE E O EXAGERO FORMAL DO PODER JUDICIARIO, QUE PREJUDICAM CRUELMENTE OS CIDADÃOS BRASILEIROS.
Publicação
Publicação no DCN2 de 30/06/1995 - Página 11343
Assunto
Outros > JUDICIARIO.
Indexação
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), AUTORIA, CLOVIS ROSSI, JORNALISTA, DENUNCIA, DEMORA, ANDAMENTO, JULGAMENTO, PROCESSO JUDICIAL, PAIS, PREJUIZO, CIDADÃO.
  • CRITICA, DEMORA, ANDAMENTO, JULGAMENTO, PROCESSO JUDICIAL, EXECUÇÃO, JUSTIÇA, PAIS, EXCESSO, BUROCRACIA, TRAMITAÇÃO, AMBITO, JUDICIARIO, PROCESSO, PREJUIZO, CIDADÃO, EXERCICIO, CIDADANIA.

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB-PB. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, na Folha de S.Paulo, na sessão de "Opinião", Clóvis Rossi, escreve o seguinte artigo:

      "São Paulo - Imaginei que, ao relatar neste espaço do início do mesmo o drama do aposentado Luiz Galli, estivesse contando o máximo de crueldade que a burocracia poderia infligir às suas vítimas.

      Errei. O Advogado A. Fernando Mattos encaminha, acompanhado de completa documentação, uma caso ainda mais terrível.

      É a história de José Ramos da Silva, um auxiliar de caldeira que, pelas condições insalubres de trabalho, ficou totalmente inválido. Entrou, então, com um processo 724/79. O último número indica o ano em que se inicia a nossa história.

      Seis anos depois, em setembro de 1985, depois de idas e vindas foi julgado procedente a ação pedindo a aposentadora por invalidez.

      Dois meses depois, José Ramos da Silva morreu sem receber coisa alguma. Sua viúva, Auta Ramos Costa, habilitou-se no processo no mesmo instante.

      Recursos de parte a parte para cá e para lá, e o processo 724/79 foi parar no STF (Supremo Tribunal Federal). Já era 1991 ou 12 anos após o início do caso.

      No dia 6 de junho de 1991, o STF nega, "agora definitivamente", diz o advogado, o último recurso do INSS. Terminou? Que nada. Mais protelações arrastaram o 724/79 até o corrente ano. Ou seja 16 anos após o seu início.

      Muito bem: as partes chegam, em conjunto, ao valor do pagamento, aliás nada elevado em se considerando o tempo decorrido. Exatos R$6.763,71. O INSS pagou?

      Nada. Recorre com base numa lei (8.213/91), que diz que, a partir de dado valor, o pagamento tem que ser requisitado por "via precatório".

      É um ofício enviado ao INSS pela Presidência do Tribunal de Justiça do Estado em que a ação foi impetrada, solicitando a inclusão da verba para o ano seguinte, acredite o leitor se quiser.

      No último dia 3 de junho, Auta Ramos Costa morreu, "vítima não só de insuficiência respiratória, mas também da absurda lentidão e do exagerado formalismo do Poder Judiciário, da ganância dos procuradores autárquicos, que ganham por recurso ajuizado, tenha ou não fundamento", lamenta o advogado.

      Agora, os quatro filhos do casal entraram no 724/79. Sobreviverão?"

Sr. Presidente, Srªs Senadoras e Srs. Senadores, essa é a constatação da morosidade e do exagero formal do Poder Judiciário, que entrava a vida do cidadão comum que necessita de qualquer tutela do Estado. A insensibilidade social característica do aparato burocrático, com graves conseqüências na qualidade de vida do cidadão no seu relacionamento com o Estado, está aqui patenteado.

O Estado foi criado para servir ao cidadão, para proteger o cidadão. É direito do cidadão e dever do Estado dar a cada um que forma a comunidade as coberturas necessárias à sua segurança, à sua educação, à sua saúde. E o que vemos: um Estado transformado num monstro que, pura e simplesmente, age dessa forma, com tamanha insensibilidade com brasileiros que pagam, com o seu suor, o INSS - o mesmo que deixa de pagar a dois necessitados que morreram, mas que se deixa roubar com a conivência de muitos. São dois ou três, no máximo, na cadeia, quando milhões de reais foram roubados e centenas de pessoas envolvidas.

O quadro de corrupção vertical e horizontal que se estabeleceu ao longo de muitos anos e a certeza da impunidade são elementos determinantes da baixa qualidade dos serviços prestados. O pequeno e até o grande burocrata agem com a insensibilidade de quem não tem nada a ver com o cidadão, que é o seu cliente. E o que é pior, agem com toda rapidez quando os seus interesses estão em jogo.

Temos visto a tentativa de desmonte dessa estrutura de corrupção e esperamos que se finalize brevemente. Mas deve o Governo, rapidamente, fazer uma boa reengenharia de todos os setores, para que o cidadão volte a ser o ponto central, o fulcro do interesse do Estado, e não o seu escravo.

Por essa razão, Sr. Presidente, Srª Senadora e Srs. Senadores, venho hoje à tribuna para denunciar o status quo em que o cidadão é massacrado, em que o cidadão vale absolutamente nada. Foram dezesseis anos para se pagar R$6 mil, que não foram pagos - morreram os dois interessados. Sabemos de tantos casos de pessoas que lesaram o País em milhões e estão impunes graças à morosidade da Justiça, enquanto, do outro lado, em função dessa mesma morosidade, os que têm o direito são injustiçados.

Venho, enfim, denunciar esse quadro de dicotomia, de brutal diferença entre uma elite poderosa, que cada vez ganha mais, e uma massa, que cada vez ganha menos. Somos um Estado e uma economia extremamente fortes no contexto mundial - somos a oitava ou décima economia do mundo - e, no entanto, as massas que dão o seu suor, a sua saúde e a sua vida para engrandecer o Brasil estão vivendo em condições cada vez piores.

Quando li essa matéria hoje, lamentei e envergonhei-me de estar vivendo em um país onde o povo, os humildes são tratados dessa maneira pela nossa burocracia, como se não fosse esse povo que pagasse a burocracia, sustentasse e levasse o País nas costas.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 30/06/1995 - Página 11343