Discurso no Senado Federal

CONFLITO ENTRE O ESTADO DO ESPIRITO SANTO E PROPRIETARIOS NA AREA DE TERRENO DE MARINHA EM VITORIA.

Autor
José Ignácio Ferreira (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/ES)
Nome completo: José Ignácio Ferreira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA FUNDIARIA.:
  • CONFLITO ENTRE O ESTADO DO ESPIRITO SANTO E PROPRIETARIOS NA AREA DE TERRENO DE MARINHA EM VITORIA.
Publicação
Publicação no DCN2 de 30/06/1995 - Página 11385
Assunto
Outros > POLITICA FUNDIARIA.
Indexação
  • COMENTARIO, REALIZAÇÃO, ACORDO, DEPARTAMENTO DO PATRIMONIO DA UNIÃO, PROPRIETARIO, TERRENO DE MARINHA, ADIAMENTO, PRAZO MINIMO, PAGAMENTO, IMPOSTO MUNICIPAL, OCUPAÇÃO, AREA, PROPRIEDADE, UNIÃO FEDERAL, ESTADO DO ESPIRITO SANTO (ES).
  • DEFESA, NECESSIDADE, ALTERAÇÃO, LEGISLAÇÃO, CRITERIOS, DEMARCAÇÃO, TERRENO DE MARINHA, OBJETIVO, IMPEDIMENTO, OCORRENCIA, CONFLITO, PROPRIETARIO, OCUPAÇÃO, DEPARTAMENTO DO PATRIMONIO DA UNIÃO, PAIS, ESPECIFICAÇÃO, CAPITAL DE ESTADO, ESTADO DO ESPIRITO SANTO (ES).

O SR. JOSÉ IGNÁCIO FERREIRA (PSDB-ES.)- Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quando o Brasil foi descoberto em 1500, Pedro Álvares Cabral tomou posse das terras em nome e para o domínio do rei de Portugal. Com o decorrer dos anos, algumas dessas terras foram transferidas para particulares pela Coroa Portuguesa, através de doações. Constituíram-se assim as famosas sesmarias, passando essas glebas ao domínio privado. O estado brasileiro, sucessor da Coroa, mantém a presunção de ser o dono de qualquer solo existente no nosso território e que não seja jurídica e legalmente rotulado como do domínio privado.Segundo a Constituição de 1891, artigo 64, o particular ocupante de qualquer área deve provar pela cadeia de títulos sucessórios ou por documento hábil, o desmembramento da gleba que a destacou do patrimônio público. Algumas áreas, no entanto, ainda permanecem do domínio do Estado, como é o caso específico dos terrenos de marinha.

Inicialmente criados com a finalidade de facilitar a defesa da costa brasileira contra a incursão predatória de outras potências, os chamados terrenos de marinhas, hoje, têm sido utilizados pela União para a instalação de unidades militares, projetos de assentamento de comunidades carentes e alguns deles tornaram-se áreas de preservação ambiental. Sob esse aspecto, nada há a se condenar. Ao contrário, o trabalho desenvolvido p ela Secretaria de Patrimônio da União, gestora dos terrenos de marinha, é merecedor de rasgados elogios, principalmente no que diz respeito à conservação da nossa mata atlântica, mangues, morros, dunas e praias.

No entanto, a partir do crescimento desordenado das cidades litorâneas, com a ocupação indiscriminada do solo, partes desses terrenos de marinha passaram a ser ocupados por particulares, através do pagamento de taxas de aforamento. Os tributos pertinentes são recolhidos anualmente aos cofres da União.

Infelizmente, porém, em cidades-ilhas como Vitória, Capital do Espírito Santo, o conceito de terrenos de marinha acabou se transformando num permanente motivo de conflito entre o Estado, proprietário da área, e o cidadão comum, seu eventual ocupante. Como Vitória é uma ilha, subtende-se que todos os terrenos fronteiriços à costa pertencem ao domínio da União. Grande parte dessa gleba já foi dominada pelo asfalto, pelos espigões e outras construções, através de ocupação autorizada pela Secretaria de Patrimônio da União. O que nos preocupa é, pelo menos no caso típico de Vitória, o conceito de terreno de marinha defendido pela União continua sendo o mesmo de 80 anos atrás, quando o mar avançava sem nenhum obstáculo até o centro da cidade. Nesse período, através de inúmeros aterros, Vitória aumentou a sua área territorial, quase duplicando-a.

Aí é que surge a grande indagação. O que são terrenos de marinhas? Aqueles determinados pela fixação da Linha de Preamar Médio de 1831, representando uma configuração geográfica e territorial com mais de 150 anos, ou aqueles determinados pela explosão imobiliária da cidade? Aparentemente, a Secretaria de Patrimônio da União, objetivando acrescentar mais recursos ao Erário, continua raciocinando em termos do século passado, tanto que promoveu recentemente um recadastramento daquilo que considera terrenos de marinha no Estado. Como resultado desse cadastramento, os contribuintes capixabas passaram a receber notificações intimando-os a recolherem as taxas de foro e ocupação de áreas presuntivamente pertencentes à União. Para que se tenha uma idéia da magnitude dessa oneração, diga-se que o cadastramento elevou o número de propriedades atingidas de treze mil para trinta e três mil.

É evidente que uma considerável parcela desses contribuintes não está de acordo com o pagamento das taxas arbitradas e juridicamente não podemos deixar de lhe dar respaldo. Já se constatou e se comprovou junto à Secretaria de Patrimônio da União que muitos desses imóveis foram adquiridos de terceiros sem que a escritura correspondente registrasse ser terreno de marinha. Outros contribuintes citados ocupam terrenos que foram transferidos da União para o Espírito Santo, nos bairros do Parque Moscoso e Bento Ferreira, em Vitória, há alguns anos acrescidos por freqüentes aterros realizados pelo Governo do Estado e hoje separados do mar por mais de um quilômetro. E existem também os contribuintes que, não tendo sido informados dos critérios utilizados pela Secretaria de Patrimônio da União para avaliação dos seus imóveis, recusam-se a aceitar as taxas fixadas, por entendê-las acima do preço de mercado.

O mais grave de tudo, porém, é que a Secretaria de Patrimônio da União fixou um prazo mínimo, até o dia 30 de junho, sexta-feira, para que os proprietários desses imóveis recolham os impostos pretensamente devidos, regularizando a ocupação. Várias entidades vitorienses, entre elas a Associação Brasileira de Mulheres de Carreira Política - ABMCJ-ES e a Associação dos Moradores da Praia do Canto, com toda justiça, se levantaram contra a cobrança inusitada e, principalmente, contra o prazo rígido estipulado para o pagamento. Com efeito, se levarmos em consideração que o povo brasileiro está financeiramente asfixiado, a imposição desse novo e pesadíssimo ônus imediatamente após o recolhimento do Imposto de Renda deixará muitos desses contribuintes com grave dificuldades orçamentárias.

Hoje, pela manhã, tivemos oportunidade de estabelecer um contato com os dirigentes da Secretaria de Patrimônio da União e, nesse encontro, solicitamos que o prazo para recebimento das referidas taxas seja prorrogado por seis meses, permitindo a cada cidadão receber melhores informações quanto aos lançamentos contra ele feitos.

           A nossa interferência visa, inicialmente, evitar que se crie um grave problema social em Vitória. Mas, muito mais do que isso, objetiva despertar a atenção do poder público para uma situação jurídica, que, pelo seu anacronismo, não tem mais condições de sobrevivência nos tempos modernos que hoje vivemos. Estamos convencidos de que, diante da exaustiva exposição que fixemos sobre o assunto, os dirigentes da Secretaria de Patrimônio da União atenderão a reivindicação dos contribuintes capixabas, prorrogando o prazo para recebimento dos impostos e permitindo às duas partes envolvidas uma avaliação mais profunda do presente quadro.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 30/06/1995 - Página 11385