Discurso no Senado Federal

ANIVERSARIO DA INSTALAÇÃO DOS CURSOS JURIDICOS NO PAIS. REGISTRANDO O LANÇAMENTO, NESTA DATA, DE CAMPANHA DE UM REFERENDUM POPULAR AS EMENDAS CONSTITUCIONAIS. O CASO DALLARI. A EVENTUAL PRIVATIZAÇÃO DA VALE DO RIO DOCE.

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. REFORMA CONSTITUCIONAL.:
  • ANIVERSARIO DA INSTALAÇÃO DOS CURSOS JURIDICOS NO PAIS. REGISTRANDO O LANÇAMENTO, NESTA DATA, DE CAMPANHA DE UM REFERENDUM POPULAR AS EMENDAS CONSTITUCIONAIS. O CASO DALLARI. A EVENTUAL PRIVATIZAÇÃO DA VALE DO RIO DOCE.
Aparteantes
Bernardo Cabral, Júlio Campos.
Publicação
Publicação no DCN2 de 12/08/1995 - Página 13841
Assunto
Outros > HOMENAGEM. REFORMA CONSTITUCIONAL.
Indexação
  • COMEMORAÇÃO, ANIVERSARIO DE FUNDAÇÃO, CURSO JURIDICO, PAIS, LOCAL, SEDE, ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE IMPRENSA (ABI).
  • DEFESA, REALIZAÇÃO, REFERENDO, PROPOSTA, REFORMULAÇÃO, ALTERAÇÃO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, PAIS.
  • OPOSIÇÃO, VONTADE, GOVERNO FEDERAL, EXECUÇÃO, PRIVATIZAÇÃO, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS), COMPANHIA VALE DO RIO DOCE (CVRD), SISTEMA, TELECOMUNICAÇÃO, PAIS.
  • CRITICA, ARQUIVAMENTO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, DESTINAÇÃO, HORARIO, RADIO, TELEVISÃO, DISCUSSÃO, PROPOSTA, PARTIDO POLITICO, REFORMULAÇÃO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB-RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, hoje, dia 11 de agosto, é uma data muito importante na história deste País: a data em que festejamos a instalação dos Cursos Jurídicos da nossa Pátria. É uma data que é muito marcada na história brasileira. Eu, que sou Advogado, que fui um jovem estudante de Direito, Presidente do Grêmio estudantil do Centro Acadêmico da Faculdade de Direito no Rio Grande do Sul, Presidente do Conselho da União Nacional dos Estudantes, da UNE, aprendi a respeitar e a ver a importância e o significado desta data.

Hoje, 11 de agosto, na sede da ABI, no Rio de Janeiro, sob a presidência desta figura extraordinária que é o Presidente da Associação Brasileira de Imprensa que, com a morte do nosso querido amigo Florestan Fernandes, acredito seja hoje o homem mais importante, o de maior representatividade e credibilidade em nosso Brasil, estarão reunidas várias personalidades. Comparecerá o Presidente da UNE, um rapaz que me procurou em Porto Alegre e tive o prazer de conhecer.

Esse Presidente da UNE, um jovem baiano, inspirou-me, pela sinceridade, pela exposição, pela análise que fez, muito respeito. Senti-me bem quando ele me visitou no meu apartamento. Ficamos longo tempo conversando, eu dizendo para ele o que era a UNE no meu tempo, quando eu tinha sido Presidente, naquela época em que o Juscelino Kubitschek era Presidente da República. A nossa época de UNE foi maravilhosa, porque lutávamos pelas reformas de base, pelas reformas da estrutura. Este País era uma democracia. Talvez um dos melhores instantes de democracia vividos neste País, vivemos naquela época de Juscelino Kubitschek. O Brasil crescendo, desenvolvendo, avançando, e nós no grande debate defendendo a chamada reforma na estrutura da economia deste País.

Pois, hoje, na sede da Associação Brasileira de Imprensa, lá estarão várias autoridades, se não me engano, o Brizola, o Lula, para lançar uma campanha sobre a realização de um referendum relativo às reformas que estamos votando nesta Casa.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, vejo com muita simpatia essa tese do referendum. Acho que é o que temos de melhor na democracia, o que temos de melhor na sociedade brasileira, a figura do referendum. E acho fundamental que seja proposto, num projeto que está tramitando nesta Casa, para que nessas reformas que estamos fazendo, nessas mudanças na nossa Constituição, a sociedade participe, a sociedade venha para o debate e dê a palavra final.

Tenho dito, Sr. Presidente, que votei, e tenho votado todas as emendas, a favor de que elas saiam da Constituição. E não concordo, acho que a imprensa está equivocada quando diz que Senado votou o término da estatização e as privatizações de petróleo, de telecomunicações etc. Na minha opinião, não é isso.

O que o Congresso votou foi tirar da Constituição e remeter para a lei ordinária. A PETROBRÁS, por exemplo, nunca esteve dentro da Constituição. Ela foi criada por uma lei ordinária, a Lei nº 2004, de 1953, votada pelo Congresso Nacional. E, diga-se de passagem, quando o Dr. Getúlio Vargas mandou o projeto criando a PETROBRÁS, esta não detinha o monopólio. Foi uma emenda de um Parlamentar da UDN, foi o Congresso Nacional que criou a PETROBRÁS da maneira como ela se encontra até hoje.

Ela cresceu, desenvolveu-se, progrediu, e os Constituintes de 1988 resolveram colocar na Constituição o monopólio da PETROBRÁS. Entendo que podemos tirá-lo da Constituição, mas penso que teremos o grande debate agora, na hora de votarmos as leis, os projetos. Portanto, devemos tirá-lo da Constituição, no que divirjo da esquerda.

Porém, antes de votarmos as leis, podemos ir para o referendo, porque este vai dizer como o povo quer, o que pensa, o que deseja. Poderemos fazer um grande debate com a sociedade brasileira, com o qual teríamos um respaldo daquilo que queremos.

Por exemplo, o Presidente Fernando Henrique, em termos das telecomunicações, mandou um projeto para a Câmara, onde mantinha nas mãos do Estado a rede básica das comunicações. Esse é o pensamento do Presidente Fernando Henrique - na minha opinião, correto.

A Câmara foi além: rasgou o projeto do Presidente Fernando Henrique e acrescentou a privatização total.

Ontem, o Senado fez algo fantástico. Não se trata de uma emenda do PT ou do Senador Roberto Requião, ou seja lá de quem for, que votamos ou deixamos de votar. O Senado é a Câmara Revisora e, portanto, tem que revisar, interpretar o que vem da Câmara dos Deputados.

Ontem tínhamos duas posições, a do Presidente Fernando Henrique Cardoso e a da Câmara, que alterou o pensamento do Presidente. Eu queria votar com o Presidente Fernando Henrique Cardoso - e, nesse caso, o projeto voltaria para a Câmara -, mas os Parlamentares argumentaram que não seria possível voltar para a Câmara, porque isso demoraria muito tempo.

Um projeto a respeito de comunicações demora 2, 3, 10 anos. Na Itália, está levando um longo tempo. É um longo debate. Na minha opinião, muito mais profundo do que esse debate que estamos travando aqui.

Estamos criando uma comissão para debater televisão e telecomunicações. É um mundo novo que está aí. Ontem, a RBS nos convidou, aos membros da Comissão que debate televisão, para assistirmos a uma conferência com relação ao futuro da mídia das comunicações. E o futuro é imprevisível, o futuro do mundo digital. São coisas fantásticas que existem por aí.

Temos que entrar nesse debate, nessa discussão. Baseado nisso, é que eu iria ao Rio de Janeiro, estaria presente na sede da ABI, mas, infelizmente, hoje tenho que ir a Porto Alegre, por um outro acontecimento, que vou salientar aqui, que me impede de lá estar.

O meu querido e bravo amigo, o Presidente da ABI, foi o braço fundamental na hora do impeachment, quando teve coragem, bravura, dignidade. Hoje, a figura mais marcante no Brasil é a do Presidente da ABI. Lá está ele, firme, com sua posição. Quero dizer a ele e ao Presidente da UNE que venho a esta tribuna, neste momento, levar meu abraço à reunião na Associação Brasileira de Imprensa, ao Presidente da ABI, ao Presidente da UNE e a todos os que lá estiverem. Faço, da tribuna do Senado, o pronunciamento que faria se lá estivesse. Penso que o referendo sobre essa matéria é a grande saída.

No início do ano apresentei um projeto, que não foi levado a sério. O meu projeto dizia que, de janeiro até a votação das emendas, o horário político que existe no rádio e na televisão, uma ou duas vezes por semana, com uma hora de duração - alguns partidos são até muito bons, mas, às vezes, ninguém diz nada com nada -, fosse ocupado sob a organização do Presidente do Senado, do Presidente da Câmara e do Presidente do Tribunal Superior Eleitoral, para debaterem, com a sociedade, quais seriam as reformas, para que delas o povo tomasse conhecimento.

Lamentavelmente, meu projeto ficou engavetado numa comissão e não veio a plenário. Não tenho qualquer dúvida de que a maioria do povo brasileiro não tem idéia alguma do que estamos votando. Há uma enorme mobilização da grande imprensa, um lobby, no sentido de se votarem os projetos como estão sendo votados na Câmara. Já tenho visto manchetes importantes, debates muito importantes com relação a se a tal da liberal-democracia, da maneira que estão falando, serve para a América Latina; se temos meios de nos defender dessa abertura que está sendo feita no Brasil, como se faz na Europa ou nos Estados Unidos. Dizem eles que o México foi o exemplo.

O Brasil viveu as suas crises. Chegamos até aqui, com mil defeitos, mas entre as nossas questões, bem ou mal, tínhamos um enorme patrimônio: PETROBRÁS, ELETROBRÁS, petroquímica, aços etc. Estamos nos desfazendo desse patrimônio. Daqui a um par de anos, se vier uma nova crise, o que terá o Estado brasileiro para manter as suas posições? Essa é a pergunta que um economista da maior importância fez, tendo sido publicada no The New York Times, na semana passada.

Por isso, manifesto-me absolutamente favorável a que se faça um ad referendum ao povo brasileiro sobre essas reformas que estamos votando.

Estiveram ontem aqui, na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania - e lamentei não estarem mais do que cinco Senadores presentes -, o Sr. Aureliano Chaves e mais dois ilustres representantes da PETROBRÁS discutindo a posição deles sobre a empresa.

O Sr. Aureliano Chaves é uma dessas figuras que admiramos permanentemente, independente de concordar ou discordar dele. A sua dignidade, o seu caráter, a sua seriedade, a beleza dos seus sentimentos, empolgam o Brasil inteiro. Aprendi a ter o maior carinho pelo Sr. Aureliano Chaves, desde aquela época em que ele era da ARENA, Governador nomeado da ARENA, Vice-Presidente da República da ARENA. Mesmo naquela ocasião, nas horas mais drásticas, ele mantinha a sua dignidade, o seu caráter, a beleza do seu sentimento.

Foi triste ver o pronunciamento do Sr. Aureliano Chaves, as divergências que ele tem com relação às privatizações. Fiz-lhe uma pergunta, dizendo-lhe que tinha estranhado o fato do nome do General Geisel ter sido apresentado para depor na Comissão da Câmara e a maioria dos Parlamentares do Governo ter excluído o seu nome, não concordando com esse convite.

Ninguém mais do que eu debateu, discordou, divergiu, abriu as baterias contra o então Presidente Geisel. Porém, ele é um homem que entende desse assunto de petróleo, é um patriota, é um homem cujo caráter e dignidade temos que respeitar. No entanto, a Câmara não aceitou que se convocasse o General Geisel, ex-Presidente da República e ex-Presidente da PETROBRÁS.

Eu, que fui o autor do requerimento que trouxe o Sr. Aureliano Chaves e demais técnicos para o depoimento de ontem, havia colocado também o nome do ex-Presidente Geisel. Retirei-o, porque no momento em que ele teria que vir estava num hospital, com a sua saúde abalada, e eu não tinha como manter o convite naquela circunstância.

Por isso, perguntei ao Sr. Aureliano Chaves qual seria o pensamento do ex-Presidente Geisel em uma outra situação, com relação à Vale do Rio Doce. Quando o Senador Ademir Andrade, do Partido Socialista Brasileiro, representante do Pará, disse que o Sr. Aureliano tinha garantido que não passava por sua cabeça que se privatizasse a Vale do Rio Doce, que ele achava ser uma hipótese completamente irreal. Quando um Senador do Pará disse: " Olha, Dr. Aureliano, quero lhe dizer que o edital para escolher a empresa que vai fazer a avaliação do capital da Vale do Rio Doce já saiu.", senti uma lágrima no canto dos olhos de Aureliano Chaves. E ele respondeu, comovido mesmo: " Isso me deixa muito triste. Eu não pensava, eu não imaginava que essa pessoa por quem tenho tanto carinho, que é o Presidente Fernando Henrique Cardoso, fosse a essa circunstância."

Volto a dizer aqui, Sr. Presidente, desta tribuna, que o Congresso fez um escândalo. Num final de legislatura, sob aquele impacto do Presidente Collor, que tinha recém-assumido e lançando o Plano Collor, com aquela mídia fenomenal, o Congresso votou uma lei que, para mim, é um escândalo, dando um cheque em branco ao Presidente da República, ao Governo para privatizar o que bem entender, não precisando passar por esta Casa. Isso é um absurdo!

Mas duvido que o Sr. Fernando Henrique Cardoso, o Presidente da República, vá se valer de uma lei que é um escândalo e tente privatizar a Vale do Rio Doce, sem debater com esta Casa e com a sociedade.

Como dizia o Sr. Aureliano ontem: "Privatizar a Vale do Rio Doce é o mesmo que privatizar o subsolo do Brasil." Podem privatizar, se quiser, o Porto de Tubarão, no Espírito Santo, a Estrada do Aço, que é da Vale do Rio Doce. A Vale do Rio Doce tem cerca de vinte e tantas empresas...Se querem privatizar, privatizem. Mas, nos últimos cinqüenta anos, todos os estudos, toda a ciência, tudo que temos acumulado em termos de subsolo e de minerais está lá, na Vale do Rio Doce.

Perguntei ao Sr. Aureliano Chaves: "O senhor, quando foi Ministro das Minas e Energia, ou o atual Ministro, sabia de alguma coisa referente ao subsolo ou a minério no País?" Ele me respondeu: "Tudo que temos está na Vale do Rio Doce." Quando o Ministro das Minas e Energia quer saber algo com relação a subsolo ou a minério, chama a Vale do Rio Doce e os seus técnicos.

Privatizar a Vale do Rio Doce é maluquice! Qual é o valor que essa empresa que eles estão chamando vai dar à Vale do Rio Doce? Qual é o preço da Vale do Rio Doce? Daqui a pouco, no meio da Floresta Amazônica, descobre-se uma outra Carajás? Aí pertencerá a uma firma privada? É imprevisível o que pode acontecer. Porque as nossas reservas minerais, pelo nosso tamanho, pela nossa extensão, dizem todos, são as maiores do mundo. Como vamos privatizá-la? Considero maluquice. Estou disposto até, pessoalmente, como cidadão, entrar no Supremo Tribunal Federal com uma ação popular no sentido de impedir que isso aconteça.

Enquanto isso, lá na sede da ABI, hoje, dia 11 de agosto, Dia do Pendura, Dia dos Advogados, Dia dos nossos juristas - e está aqui o bravo Senador Bernardo Cabral, que foi um dos grandes Presidentes da Ordem dos Advogados do Brasil, naqueles momentos em que ela se distinguiu na luta pela democracia e pela liberdade; ele cassado, expurgado, mas que manteve a sua dignidade, a sua firmeza nessa luta e hoje está aqui representante exatamente essas entidades - reúnem-se ABI, OAB, UNE, figuras importantes da política brasileira para defenderem um ad referendum com relação à reforma.

Se o Senhor Presidente Fernando Henrique houver por bem privatizar a Vale do Rio Doce, é típico da atitude de Sua Excelência entender que a sociedade tem direito a ter um ad referendum.

O Sr. Júlio Campos - Permita-me V. Exª um aparte?

O SR. PEDRO SIMON - Com o maior prazer, Senador Júlio Campos.

O Sr. Júlio Campos - Nobre Senador Pedro Simon, estamos ouvindo, com muita atenção, o seu pronunciamento na manhã de hoje e lembro-me perfeitamente que quando eu, como Vice-Presidente do Senado, presidia uma das sessões no início desta Legislatura, V. Exª propôs realmente um projeto para que fosse utilizado não só o horário político, às quintas-feiras, com um debate amplo com a sociedade civil brasileira sobre a política de privatização e as emendas constitucionais que foram encaminhadas a esta Casa, como também para que fosse feito um referendum com relação às emendas que nós estamos aprovando no Congresso Nacional. E, lamentavelmente, até hoje, esse projeto não chegou ao plenário. E era um projeto que deveria ser aprovado porque não vejo qualquer dificuldade. Há países que fazem votação de referendum, permanente, sem nenhum gasto...

O SR. PEDRO SIMON - É verdade...

O Sr. Júlio Campos -...e no Brasil, poderíamos também fazer. Hoje a Justiça Eleitoral está aparelhada para mobilizar a sociedade e fazer um referendum a qualquer instante sobre decisões importantíssimas como esta que nós estamos tomando, agora, nessa Legislatura, através da discussão dessas emendas que podem fazer com que mude a política das telecomunicações no País, da Petrobrás e da Vale do Rio Doce. Neste instante, solidarizo-me com V. Exª pela verdade com que se expressa com relação às figuras dos dois grandes brasileiros, que são o ex-Presidente Ernesto Geisel e o ex-Ministro das Minas e Energia, Dr. Aureliano Chaves, em quem tive a honra de votar nas eleições presidenciais de 1989, como seu correligionário do PFL à época. Compartilho com V. Exª desta dúvida: qual o preço que se vai cobrar para vender um patrimônio como a Vale do Rio Doce? Nós temos lá em Mato Grosso a Mineração Urucum, que é uma subsidiária da Vale do Rio Doce. Nós podemos até concordar que se venda a Urucum, mas a Vale do Rio Doce, no seu todo, com o seu patrimônio, seu potencial e os seus estudos, julgo que jamais deveria ser vendida.

O SR. PEDRO SIMON - Exatamente. V. Exª foi um ilustre Governador do Mato Grosso. Eu fui Governador do Rio Grande do Sul. O que nós sabemos sobre o nosso subsolo, em termos de minério, se nós não conversarmos com a Vale do Rio Doce?

O Sr. Júlio Campos - Perfeito. V. Exª faz uma advertência muito importante para o Governo Federal, para o Presidente Fernando Henrique Cardoso e para o povo brasileiro. Concordo que patrimônios como a Petrobrás, a Vale do Rio Doce e o Sistema Telebrás não podem ser privatizados sem a concordância da sociedade civil brasileira. Dou o meu apoio a V. Exª e ao seu pronunciamento, e concordo plenamente que para fazer referendum neste País só basta querer. E para nós que dispomos do veículo de comunicação social, com rádio, televisão e jornais que circulam por todo o território nacional, é muito fácil mobilizar a sociedade civil a dar o seu ponto de vista com relação às decisões do Congresso Nacional e do Governo Federal.

O SR. PRESIDENTE (José Eduardo Dutra) - Senador Pedro Simon, seu tempo está esgotando.

O SR. PEDRO SIMON - Estou concluindo, Sr. Presidente. Fico muito emocionado com o aparte e com o apoio de V. Exª, Senador Júlio Campos, de quem, pelo fato de ser um homem que apóia o Governo, recebo o aparte com muita simpatia e com muito respeito.

Aliás, quero dizer a V. Exª que eu também apóio o Governo, mas a minha posição é mais delicada do que a de V. Exª, porque o meu Partido tinha um candidato nas últimas eleições presidenciais, de quem divergi desta tribuna, dizendo que tinha diferenças profundas no campo da ética e que ia votar no Sr. Fernando Henrique Cardoso, porque o conhecia e sabia que seria uma grande solução para este País.

Continuo tendo o maior respeito pelo Fernando Henrique, o meu amigo, Presidente da República. Existem pessoas que têm dito para mim que eu tenho feito oposição ao Presidente Fernando Henrique. Eu não considero que esteja fazendo oposição ao Presidente Fernando Henrique. E atrevo-me a dizer que, hoje, aqui no Congresso, o maior amigo do Presidente Fernando Henrique Cardoso chama-se Pedro Simon. Olhem o que estou dizendo! Se eu estivesse no lugar de Sua Excelência, preferiria que um amigo, com sinceridade, de coração aberto, com espírito público, sem tentar atingir, ofender nem humilhar, tentando ajudar, dissesse as coisas, do que batesse nas minhas costas e dissesse que estava tudo muito bem, quando a minha consciência dizia que não estava bem.

O meu querido Malan, por exemplo, não poderia dizer que a mágoa que tem é do vazamento do caso Dallari. O Sr. Malan não poderia dizer que está revoltado pelas acusações e porque houve vazamento de informações no Ministério da Fazenda. Em primeiro lugar, meu amigo Malan, a imprensa diz que faz um ano que a Receita está investigando o cidadão. Investigar por um ano é muito tempo!

Digo ao Presidente Fernando Henrique Cardoso que Sua Excelência tem uma responsabilidade muito séria - e estou falando como seu amigo. Outro amigo, que sei que é muito mais íntimo, muito mais ligado ao Governo do que eu, embora mais novo, que é o Senador Antonio Carlos, está nos jornais de hoje dizendo que se alguém pedir uma CPI para investigar o caso Dallari, S. Exª quer ser uma das primeiras assinaturas. Reparem como o assunto é sério.

Eu, como Líder do Governo, enfrentei uma questão dessas aqui, com um homem de bem, sério, do Governo Itamar Franco, que era o Chefe da Casa Civil, o Sr. Hargreaves. Todo o Congresso o conhecia, porque ele era um funcionário da Câmara, e todos os partidos o respeitavam. O Sr. Hargreaves não fazia parte do meu Partido, era do PFL, mas tinha a simpatia generalizada. De repente, estoura a CPI do Orçamento, e aparece uma papelada onde consta o nome do Sr. Hargreaves, Chefe da Casa Civil.

Reparem que não se trata de um cargo de terceira grandeza, como o do Sr. Dallari. Era o Sr. Hargreaves, Chefe da Casa Civil e amigo íntimo do Presidente da República. E não era uma questão isolada, mas uma CPI sobre a qual o Brasil inteiro tinha os olhos arregalados e da qual exigia esclarecimentos.

Fui ao Presidente Itamar Franco e ao Ministro Henrique Hargreaves e disse: "Eu acho, Hargreaves, que você tem que sair, se afastar da Chefia da Casa Civil para fazer a sua defesa. Não vejo nada contra você, estou dizendo isso do fundo do coração; faço parte da CPI e pelo que sei, não há nada que o atinja. Mas você deve se afastar. Afaste-se e vá depor. Não como Chefe da Casa Civil, mas como cidadão, buscando dar os esclarecimentos."

O SR. PRESIDENTE (José Eduardo Dutra. Faz soar a a campainha.)

O SR. PEDRO SIMON - Estou encerrando, Sr. Presidente.

Foi um impacto. Muitos disseram que eu estava louco, que queimariam o Sr. Hargreaves, por ele sair, renunciar à Chefia da Casa Civil. E ele saiu, renunciou à Casa Civil, e assumiu um outro no seu lugar. Ele veio depor, e como não havia qualquer fato que o comprometesse, por unanimidade, com o aplauso de todos, inclusive do PT, ele saiu limpo, tranqüilo, com o seu nome "nota 10", e voltou para a Casa Civil.

E hoje são vários os editoriais que estão fazendo a comparação Itamar Franco e Hargreaves com Fernando Henrique Cardoso e José Milton Dallari. E estão dizendo que naquela ocasião era o Chefe da Casa Civil, era um íntimo amigo do Presidente, era uma CPI que apurava corrupção no Orçamento, que ocupava manchetes diárias em todos os jornais e televisões. Pois nós aceitamos afastar o Chefe da Casa Civil para ver o que estava acontecendo.

Estou falando como amigo do Presidente Fernando Henrique Cardoso. Sua Excelência, como amigo de Milton Dallari, não devia deixá-lo exposto como está. Ainda mais que é o próprio Ministro da Fazenda que diz que ele está sendo investigado há um ano. E querer apurar quem vazou a informação!?

Lembro-me de quando o Sr. Antonio Ermírio de Moraes depôs na CPI e fizeram-lhe uma pergunta: "Sr. Antonio Ermírio, o senhor é a favor ou contra a quebra do sigilo bancário?" E ele respondeu: "Quero dizer que sou a favor". E todo mundo achou bacana, o Sr. Antonio Ermírio de Moraes, o maior empresário do País, ser a favor da quebra do sigilo bancário! E ele disse: "Quero dizer que não estou dizendo nada excepcional; desde que o PT entrou em tudo que é canto, em tudo que é repartição, e desde que se inventou o xerox, não há mais sigilo bancário; que se abra de uma vez". Quer dizer, sigilo bancário não existe mais. Quando querem pegar informações, pegam onde quiserem.

Agora o Sr. Pedro Malan querer fazer uma CPI interna para investigar quem vazou informação!? Pelo amor de Deus! Pode-se até investigar quem vazou e quem não vazou, mas o que é necessário apurar é o caso do Sr. Milton Dallari.

O Sr. Bernardo Cabral - Permite-me V. Exª um aparte, nobre Senador?

O SR. PEDRO SIMON - Sr. Presidente, darei só um aparte ao nobre Senador Bernardo Cabral e já encerrarei.

O SR. PRESIDENTE (José Eduardo Dutra) - Com o maior prazer.

O Sr. Bernardo Cabral - Senador Pedro Simon, penso que V. Exª não faz oposição ao Governo, V. Exª dá uma grande contribuição ao Governo. Esta é que é a diferença. E quando realiza esse tipo de contribuição o faz calcado não apenas na amizade que existe entre ambos, pelo convívio que houve no Senado, mas por ter V. Exª exercido o cargo de Governador do Rio Grande do Sul, que lhe dá prática, experiência para o tipo de contribuição que V. Exª dá.

O SR. PEDRO SIMON - Senador, amizade que existiu nos tempos difíceis, antes de ser eu Governador, quando todos nós, V. Exª, eu e Sua Excelência éramos oposição e não sabíamos o que aconteceria no dia de amanhã. Ali foi que nos conhecemos.

O Sr. Bernardo Cabral - Lembro-me de que tão logo readquiri os meus direitos políticos, porque a minha punição eu a cumpri toda, não fui beneficiado pela anistia, estive com o Presidente Ulysses Guimarães no Palácio Piratini. V. Exª chefiava o Executivo e, naquela altura, V. Exª alertava a Nação para a convivência com auxiliares que podem, desta ou daquela forma comprometer, o Governo. Quando V. Exª vem à tribuna e registra que o Ministro Malan está profundamente agastado porque se faz a revelação de um assunto que ao longo de um ano se tenta apurar, V. Exª procede muito bem. O homem público não deve temer jamais que alguém pesquise, desta ou daquela forma, a sua atuação. Aliás, em nosso País, até a invasão já se faz na privacidade de cada um. Os que não temem é porque nada devem. V. Exª é um dos que nada devem e, portanto, não teme assomar à Tribuna para fazer a contribuição que faz. Continue assim, Senador Pedro Simon, porque a admiração que já vem de longe confirma a que virá amanhã.

O SR. PRESIDENTE (José Eduardo Dutra) - Senador Pedro Simon, V. Exª já ultrapassou o tempo em 13 minutos. Há outros oradores inscritos.

O SR. PEDRO SIMON - Estou encerrando, Sr. Presidente, até porque o meu querido Vice-Presidente está esperando para entrar e eu, para aplaudi-lo.

Agradeço o aparte de V. Exª e recebo-o com muito carinho e com muito respeito. Digo, com toda a sinceridade, sou um homem que sabe fazer crítica, que sabe elogiar, que sabe analisar. Se eu quisesse fazer crítica, se eu quisesse fazer oposição, modéstia a parte eu saberia fazê-la. Mas quero dizer que não é o meu objetivo. Não sou daqueles - e tenho dito isto para as chamadas esquerdas - que querem lançar o Presidente Fernando Henrique no colo do Dr. Antonio Carlos, empurrá-lo para a direita, como em 1964, naquela discussão de Jango e Brizola.

Penso que o Senhor Fernando Henrique é um homem progressista, um homem de bem, um homem digno, é um homem que tem boas idéias e temos que ir lá debater com Sua Excelência, sentar à mesa e tentar nos identificar, porque somos a mesma coisa. Porque há os que acreditam que se tem que fechar as portas, que Sua Excelência os traiu, e vão para o outro lado. Não concordo com isso.

O meu objetivo é ajudar. Digo isso, porque assim agi quando Governador. Vejo agora, com tristeza, o que se fala do Tribunal Regional no Rio Grande do Sul, justiça que é das mais dignas, das mais sérias e mais corretas do Brasil, que é a do Rio Grande do Sul, por questões de parentesco. No meu Governo, proibi. Parente de ninguém podia fazer parte do Governo, nenhum parente de governador, de secretário de Estado poderia ter cargo no meu Governo. Ninguém! Foi uma decisão minha. Não era questão de lei. Chegou o Chefe da Casa Militar, cujo filho era capitão, dizendo que gostaria que o filho fizesse parte da Casa Militar. "Não posso puni-lo por ser meu filho", disse-me ele. Eu disse para ele: não tem nenhum problema, se o seu filho é tão bom assim, ele fica, o senhor sai, não vai ser o Chefe da Casa Militar.

Agi assim, e fiz injustiças algumas vezes a amigos meus. Mas, na dúvida, na interrogação com relação ao que estava acontecendo no Governo, afastei-os. E eu dizia para a imprensa que não tinha nada contra eles. Sabia que eram homens de bem, mas se imprensa estava fazendo aquela campanha, eu preferi afastá-los para analisar a situação do que deixar permanecer a interrogação que eles estavam levantando. Isso pelo próprio respeito que tinha por eles.

Portanto, isso que estou dizendo ao Presidente Fernando Henrique foi o que pratiquei. Acho muito delicado. Claro que não podemos nos basear no que sai na revista Veja. Isso é verdade, muitos Senadores dizem isso. Não vamos nos guiar pela imprensa. Outro dia, fizeram tremendas injustiças ao Senador do Rio Grande do Norte, injustiças enormes ao Senador do Maranhão, no sentido de se inventarem coisas com relação a S. Exªs. Eu não sou daqueles que se guiam pela televisão, pelo jornal ou pela Veja. Tremendas injustiças são feitas, e não estamos aqui para aceitá-las. Injustiça não! O que pode existir é dúvida. Eu, que gosto deste rapaz - considero o Sr. Dallari um belo rapaz, não o estou condenando, não estou afirmando que ele cometeu um delito e que é culpado. Politicamente, ele deve ser afastado. Politicamente, ele perdeu as condições para se manter no cargo. É como dizem os jornais de hoje. Pois bem, ele vai permanecer no cargo. Se vemos, no jornal, uma fotografia ligando-o a sete empresários - que nem precisam ser aqueles a quem ele presta assessoria -, todos vão ficar de olho: o que será que ele vai fazer? Será que é funcionário, amigo, assessor, ou ele está fiscalizando os preços.

Senhor Fernando Henrique, afaste o Sr. Dallari. Senhor Fernando Henrique, não cometa o equívoco de querer, sem mais nem menos, privatizar a Vale do Rio Doce. Senhor Fernando Henrique, como sociólogo, aceite a tese de fazermos um grande referendo para debater o que pensa a sociedade brasileira.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 12/08/1995 - Página 13841