Discurso no Senado Federal

ENCAMINHANDO A MESA PROJETO DE LEI DE AUTORIA DE S.EXA. QUE CRIA A RENDA MINIMA NA EDUCAÇÃO.

Autor
Ney Suassuna (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
Nome completo: Ney Robinson Suassuna
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
EDUCAÇÃO.:
  • ENCAMINHANDO A MESA PROJETO DE LEI DE AUTORIA DE S.EXA. QUE CRIA A RENDA MINIMA NA EDUCAÇÃO.
Aparteantes
Eduardo Suplicy, Pedro Simon, Sebastião Bala Rocha.
Publicação
Publicação no DCN2 de 17/08/1995 - Página 13994
Assunto
Outros > EDUCAÇÃO.
Indexação
  • ENCAMINHAMENTO, MESA DIRETORA, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, CRIAÇÃO, RENDA, GARANTIA, EDUCAÇÃO, CRIANÇA CARENTE.
  • COMENTARIO, ESTUDO, AUTORIA, JOSE MARCIO CAMARGO, PROFESSOR, PUBLICAÇÃO, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), DEMONSTRAÇÃO, VANTAGENS, CRIAÇÃO, RENDA MINIMA, EDUCAÇÃO, FUNDAMENTAÇÃO, PROJETO DE LEI, ORADOR.

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB-PB. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, lamentei profundamente não poder apartear meu companheiro, Senador Lúcio Alcântara. No entanto, aproveito os três minutos iniciais de meu pronunciamento para dizer que tenho certeza de que o pronunciamento de S. Exª fará eco no Senado Federal. Estou certo também de que as denúncias ventiladas, as que seriam feitas pelo Senador Antonio Carlos ainda o serão.

Com toda a certeza, um homem como o Senador Antonio Carlos Magalhães - espelho-me em S. Exª, na sua coragem, transparência, enfim, no patriotismo com que defende suas causas - não vai deixar de fazê-lo apenas porque o Banco Econômico teve a sua solução encontrada.

O Sr. Pedro Simon - V. Exª me permite um aparte?

O SR. NEY SUASSUNA - Com muito prazer, Senador.

O Sr. Pedro Simon - Felicito V. Exª pela sua presença na tribuna. Penso que V. Exª aborda, com muita competência, um assunto da maior importância. O Senador Antonio Carlos tem merecido a atenção do Brasil e a atenção do Senado Federal. E S. Exª faz por merecer essa atenção, por sua competência, por seu espírito de luta, pela sua garra e pelos assuntos que apresenta. O episódio que aconteceu na Bahia foi um deles. S. Exª teve uma ação que temos que respeitar. Por mais que alguém possa querer divergir, deve respeitar. S. Exª foi o grande vitorioso. Desde o início fazia um apelo ao Presidente, mostrava que a solução deveria ser algo parecido com o que saiu. O Presidente, inclusive, viu a proposta com simpatia, mas o Ministro da Fazenda e as autoridades do Banco Central não deixaram: tomaram outra decisão. O Senador Antonio Carlos vai ao Presidente, e há uma alteração de cento e oitenta graus. Inclusive, o Governo e o PFL, que defendem com garra a privatização, agora defendem a estatização de um banco da Bahia. Reparem a competência do Sr. Antonio Carlos!... Essa questão pode estar encerrada, mas há uma outra, a que V. Exª se refere: o Sr. Antonio Carlos mencionou que tem um dossiê, que tem documentos graves e sérios, envolvendo o Banco Central. Essa questão é diferente. Essa questão não encerrou; pelo contrário, está começando. Creio, primeiro, que o Senhor Fernando Henrique Cardoso, Presidente da República, tem a obrigação de pedir ao Sr. Antonio Carlos que traga esse dossiê. O Presidente Fernando Henrique Cardoso agora inclusive tem autoridade, porque está resolvido o problema da Bahia. O problema da Bahia é um problema de ontem, mas o problema do dossiê de corrupção no Governo é um problema de hoje. E o Sr. Antonio Carlos, que é um homem de coragem, um homem de garra - sei que é um homem de coragem -, haverá de entregar ao Presidente ou ao Congresso Nacional esse dossiê que envolve diretores, funcionários - sei eu lá quem - do Banco Central. Creio que não podemos dar essa questão por encerrada. O Senhor Fernando Henrique Cardoso que me perdoe. O Sr. Antonio Carlos já noticiou, já levou a Sua Excelência nomes de pessoas que teriam sido nomeadas para o governo e sobre as quais o Sr. Antonio Carlos tinha dúvidas. O Senhor Presidente da República até agora não deu os nomes nem as justificativas. Agora vem o Sr. Antonio Carlos e diz que tem um dossiê grave envolvendo o Banco Central, gente do Banco Central. Resolveram o problema da Bahia. Que bom! Resolvido o problema da Bahia, vamos olhar para o Banco Central. Penso que V. Exª tem razão: de um lado, o Sr. Antonio Carlos vai se oferecer para entregar o dossiê e, de outro lado, o Presidente da República vai exigir receber o dossiê. Sinceramente, se Sua Excelência não o fizer - conheço o Senhor Fernando Henrique Cardoso -, direi de público: não conheço mais o Sr. Fernando Henrique Cardoso!

O SR. NEY SUASSUNA - Obrigado, nobre Senador Pedro Simon. V. Exª acrescenta às minhas palavras a certeza da continuidade desse ato. Tenho certeza de que, com desassombro, com patriotismo, com a transparência da personalidade do Senador Antonio Carlos Magalhães, S. Exª dará continuidade à sua denúncia, assim como o Presidente da República, num tratamento idêntico para todos os Estado, com toda a certeza encontrará solução para que não seja gasto dinheiro público na solução do caso da Bahia, como não encontrou para o caso do Banco do Piauí e o Banco da Paraíba, que tiveram de arcar com recursos próprios dos respectivos Estados.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, disse que os três primeiros minutos seriam gastos apenas para dar um aparte, que não pude dar porque estava secretariando a Mesa do Senado.

O Sr. Sebastião Rocha - Permite-me V. Exª um aparte, nobre Senador Ney Suassuna?

O SR. NEY SUASSUNA - Peço a V. Exª que seja breve, porque agora entrarei no tema do meu discurso de hoje.

Concedo um aparte a V. Exª.

O Sr. Sebastião Rocha - Senador Ney Suassuna, agradeço a V. Exª o aparte. Nobre Senador, contribuindo com as colocações do Senador Pedro Simon, acredito que vamos ter que esperar um pouco mais para vermos se essa não será mais uma estratégia do PFL. Segundo o Deputado José Carlos Aleluia, do PFL da Bahia, em matéria no jornal de hoje, consta que o PFL usa como tática o blefe, e que S. Exª estaria blefando quando insinuou uma CPI contra o sistema financeiro. Vamos aguardar para ver se realmente o Senador Antonio Carlos Magalhães dispõe dessa relação e, se assim for, acredito que S. Exª a revelará ao público. Caso contrário, ficaremos preocupados em pensar que o Presidente tenha agido sob coação, ou seja, tenha negociado com o Senador Antonio Carlos Magalhães a solução para o Banco Econômico em contrapartida da desistência da denúncia que S. Exª se propôs a fazer. Então, espero que não pairem dúvidas sobre isso, que acredito não tenha acontecido. Se o Senador Antonio Carlos Magalhães não esclarecer essa denúncia que pretendia fazer deixará margem para esse tipo de suspeição, de que o Governo recuou sob a ameaça de S. Exª de fazer denúncias contra o Banco Central. Obrigado.

O SR. NEY SUASSUNA - Senador Sebastião Rocha, certamente isso não ocorrerá. Tenha a certeza de que haverá continuidade da denúncia.

O SR. PRESIDENTE (Júlio Campos) - Nobre Senador Ney Suassuna, lembro a V. Exª que já se passou mais da metade de seu tempo.

O SR. NEY SUASSUNA - Obrigado, Sr. Presidente.

Há três anos, da tribuna deste plenário, fiz uma proposta para que fosse criada uma renda mínima de educação e pedia outras providências. Isto complementava o Projeto de Renda Mínima do Senador Eduardo Suplicy, partindo das seguintes justificações:

A última pesquisa de indicadores sociais divulgada pelo FIBGE revela que, em 1988, cerca de 30% das crianças de famílias com renda familiar per capita de até um quarto de salário mínimo por mês, com idade entre 10 e 14 anos, trabalhavam. Para as famílias com renda familiar per capita compreendida entre um quarto e meio salário mínimo, essa percentagem era de 20%, sendo que no caso dos adolescentes entre 15 e 17 anos o percentual subia para mais de 50% e a carga horária superava 40 horas semanais.

Dessas crianças, 70% trabalhavam sem carteira assinada e percebiam remunerações iguais ou inferiores a um salário mínimo (81%).

Das crianças de 10 a 14 anos, provenientes de famílias cuja renda familiar se situa num patamar de até um terço do salário mínimo, 15% contribuíam com mais de 30% da renda familiar, ou seja, um terço da renda familiar era oriunda do trabalho dessas crianças. No caso dos adolescentes, a participação do salário do menor em patamares superiores a 30% da renda familiar chega a até 30% para esse grupo de famílias.

Ou seja, as crianças e adolescentes de famílias pobres brasileiras (40% da população ou 50 milhões de pessoas) ganham pouco, são exploradas economicamente e, no entanto, esse ganho é fundamental para a manutenção da família.

O resultado desse quadro desumano se traduz nas poucas horas destinadas à escola, nas taxas elevadas de repetência e na evasão escolar, principalmente na época das colheitas.

Segundo excelente estudo do Dr. José Márcio Camargo, publicado na Folha de S. Paulo sob o título "Os Miseráveis", cuja idéia foi a base deste meu projeto, a criação da renda mínima na educação apresenta vantagens que, por si só, justificam amplamente a relação custo/benefício, quais sejam:

1º) permite a extinção dos programas no estilo clientelista hoje existente, cujo ônus tem sido desastroso para o País e a eficácia praticamente nula (LBA, cestas básicas, tickets do leite), que muitas vezes são usados até por políticos mal-intencionados como elemento de troca de voto nas campanhas, como já aconteceu em vários Estados, inclusive no Rio de Janeiro;

2º) permite minorar o problema da pobreza no presente, ao mesmo tempo em que investe no futuro, através do engajamento real das crianças e adolescentes no processo educacional, de modo a erradicar o analfabetismo e capacitar mão-de-obra futura;

3º) atinge diretamente o público-alvo, eliminando a intermediação dos não-pobres;

4º) retira as crianças do mercado de trabalho e das ruas, reduzindo a violência e criando condições propícias às pressões para a elevação do salário real da mão-de-obra adulta.

No que tange aos custos de implementação e às fontes de financiamento, o Professor José Márcio Camargo estima que a cobertura total representaria gastos num montante de 5% do PIB, praticamente o mesmo que o Governo dispensa hoje com programas de compensação da pobreza, de natureza duvidosa e eficácia questionável.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o nosso objetivo com esse projeto é exatamente permitir que as crianças que hoje são forçadas a sair da escola para complementarem a renda familiar recebam até um terço do salário mínimo, desde que tenham freqüência e notas na escola.

Dessa forma, volto a apresentar essa idéia, que apresentei há três anos e que hoje já começa a ser posta em prática em algumas prefeituras do País, para que possamos dedicar à criança brasileira carente a atenção que ela merece, e excluir desse processo aqueles que se fazem de intermediários, principalmente com o intuito de lucrarem.

Por essa razão, reputo de uma importância enorme esse Projeto da Renda Mínima Escolar. Tendo a certeza de que, dessa forma, não haverá criança fora da escola, pois haverá a complementação da renda familiar, e estaremos construindo um país que queremos para o futuro. Isso virá complementar, com toda a certeza, o Programa de Renda Mínima, que foi tão brilhantemente apresentado pelo Senador Eduardo Suplicy.

O Sr. Eduardo Suplicy - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. NEY SUASSUNA - Pois não, nobre Senador Eduardo Suplicy.

O Sr. Eduardo Suplicy - Prezado Senador Ney Suassuna, considero da maior relevância a proposição que V. Exª apresentou há três anos, e que agora, voltando ao Senado, a renova, para a nossa apreciação e debate, qual seja, o Projeto de Garantia de Renda Mínima, relacionado a criar oportunidades melhores de educação, sobretudo para as crianças. Foi justamente em 1991, num debate realizado em Belo Horizonte sobre o Programa de Garantia de Renda Mínima, que o economista José Márcio Camargo ponderou que seria adequado garantir um mínimo de renda às famílias brasileiras, propondo que tivesse, como contrapartida, a obrigação de as crianças dessas famílias estarem freqüentando a escola. É fato também, conforme salientou V. Exª, que diversos Municípios e Governos, como o do Distrito Federal, iniciaram essa experiência. O Governador Cristóvam Buarque, do Partido dos Trabalhadores, quando ainda era candidato ao Governo do Distrito Federal, apresentou essa proposição, que se constituiu numa das idéias principais da sua campanha. Logo na primeira semana após sua posse, S. Exª disse que iniciaria esse programa na cidade satélite do Paranoá. Efetivou-o e já o estendeu para as cidades de Brazlândia e Varjão, no Distrito Federal, somando cerca de 3.600 famílias - para um total previsto de 20 mil até o final do ano - participantes desse programa, aqui denominado bolsa-educação. Nas últimas semanas, temos realizado diversos debates, com a participação inclusive do Prefeito José Roberto Magalhães Teixeira. A idéia desenvolve-se agora com extraordinária velocidade por todo o País. A Prefeita Lídice da Mata, de Salvador, sancionou lei na mesma direção, no dia 3 de agosto, e já chegam a dezenas os Municípios e as Assembléias Legislativas, como as de São Paulo e Pernambuco, que estão examinando propostas no mesmo sentido. A Secretária de Bem-Estar Social, Lúcia Vânia, anunciou sábado, em Campinas, que no Orçamento da União do próximo ano está-se prevendo a destinação de R$ 700 milhões para os Municípios que adotarem programas de garantia de renda mínima vinculados a oportunidades de educação. Na Câmara dos Deputados, está tramitando um projeto de lei de iniciativa do Deputado Nelson Marchezan que guarda relação com o propósito e o projeto de V. Exª, bem como o projeto de garantia de renda mínima, aprovado pelo Senado em 16 de dezembro de 1991, já com o parecer favorável do Deputado Germano Rigotto. Avalio que a iniciativa de V. Exª se constitui em mais um apoio para o exame por toda a Nação brasileira dessa proposição.

O SR. NEY SUASSUNA - Muito obrigado, Senador.

Complementando, Sr. Presidente, apresentei esse projeto há três anos atrás. Lamentei que não tivesse ido adiante, e volto hoje à carga exatamente porque creio que ele acaba com os intermediários e atinge diretamente o alvo, que é o estudante, evitando a evasão escolar. Enfim, é um projeto que dignifica o Brasil, dignifica o Governo.

Se todos fizéssemos assim, teríamos com certeza, em pouco tempo, a erradicação do analfabetismo e a freqüência maciça de todos os alunos carentes às escolas.

Claro que há uma gradação. Estou apresentando à Mesa o projeto completo, pedindo que seja aceita sua revitalização neste plenário, na certeza de que estou prestando um serviço ao País com a reapresentação dessa idéia.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 17/08/1995 - Página 13994