Discurso no Senado Federal

CRITICAS AS SOLUÇÕES DADAS NO CASO DO BANCO ECONOMICO. NECESSIDADE DE UMA REFORMA NO SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL E NO BANCO CENTRAL DO BRASIL.

Autor
Roberto Freire (PPS - CIDADANIA/PE)
Nome completo: Roberto João Pereira Freire
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
BANCOS.:
  • CRITICAS AS SOLUÇÕES DADAS NO CASO DO BANCO ECONOMICO. NECESSIDADE DE UMA REFORMA NO SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL E NO BANCO CENTRAL DO BRASIL.
Publicação
Publicação no DCN2 de 17/08/1995 - Página 14008
Assunto
Outros > BANCOS.
Indexação
  • CRITICA, DECISÃO, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN), DECRETAÇÃO, INTERVENÇÃO, BANCO PARTICULAR, ESTADO DA BAHIA (BA).
  • QUESTIONAMENTO, INCOERENCIA, POSIÇÃO, GOVERNO FEDERAL, DEFESA, PRIVATIZAÇÃO, ECONOMIA, SIMULTANEIDADE, DECISÃO, ESTATIZAÇÃO, BANCO PARTICULAR, MANUTENÇÃO, VIABILIDADE, GOVERNO, CONGRESSO NACIONAL, PROVOCAÇÃO, AUSENCIA, CONFIANÇA, OPINIÃO PUBLICA, POLITICA, PAIS.
  • COMENTARIO, SOLUÇÃO, BANCO PARTICULAR, ESTADO DA BAHIA (BA), PROVOCAÇÃO, DISCUSSÃO, DEFINIÇÃO, POLITICA, PRIVATIZAÇÃO, NECESSIDADE, URGENCIA, REFORMULAÇÃO, SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN).

O SR. ROBERTO FREIRE - (PPS-PE. Para comunicação inadiável.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, todos nós que nos acostumamos à vida política no meio das esquerdas conhecemos um velho chavão: "na prática, a teoria é outra".

Pois bem, é exatamente esse velho chavão surrado, mas cheio de sabedoria, que emerge da recente e lamentável crise do Banco Econômico, uma empresa privada que, pela incompetência gerencial e suspeitas de corrupção suscitadas inclusive pela imprensa, sofre intervenção preparatória de falência; e, agora, embalada pela pressão de políticos de grosso calibre, se socorre das muletas generosas do Estado.

Fatos como esse desmoralizam a política no Brasil, esgarçam a sociedade, que deixa de acreditar no padrão ético de seus representantes nos Poderes, corroem as entranhas do Estado, tornando-o fraco, inoperante e submisso aos interesses dos grupos privados dominantes. Como se pode acreditar, por exemplo, em um Governo - pelo qual todos nós alimentamos fortes esperanças, em que pese nossas diferenças - que decide questões centrais da vida financeira nacional e, logo em seguida, sem balizamentos técnicos mais claros, dá meia volta e atende a pressões aparentemente com medo de perder alguns votos no Congresso?

A crise do Econômico, a nosso ver, é a evidência maior de como o Estado no Brasil não é público, apropriado que está pelos interesses privados - uma espécie de cartório - e o que é pior, pelos interesses dos grandes grupos privados. Faz transparecer o falso liberalismo que embala a esmagadora maioria de nossas elites: clama pela liberdade de mercado quando este movimento interessa a engorda fácil de seus lucros e não tem nenhum escrúpulo em recorrer às famosas torneiras do Estado quando suas empresas encontram-se em dificuldades. Conjuga um outro nosso velho chavão, hoje tão novo, qual seja, o de privatizar os lucros e socializar os prejuízos.

Se antes já colocávamos sob suspeita a atitude de certos partidos e grupos no Congresso Nacional quanto ao real conteúdo da reforma do Estado, posicionamentos como esse do Governo fragilizam também a sua própria ação reformista que tem como centro, particularmente, uma proposta agressiva de privatização. A privatização, neste novo contexto, soa como uma espécie de assalto ao Estado já que não estaria estribada em uma política estratégica e séria de redimensionamento do poder público e de suas funções no Brasil. Os liberais de fachada e estatizantes de conteúdo dispararam uma seta venenosa contra o próprio neoliberalismo.

O debate sobre as reformas ficará, de agora em diante, mais tumultuado e impreciso, o Governo perde credibilidade para levar seus projetos a bom termo, generaliza-se na opinião pública a desconfiança. Os que acreditam na estatização como transição para forma de organização social superior julgam-se fortalecidos, o que evidentemente não ajuda a esquerda na busca de uma reforma democrática do Estado.

O Banco Central - e não estamos dizendo isso agora -, uma verdadeira caixa preta que sempre esteve a serviço do sistema financeiro privado, tem talvez a maior parcela de culpa em toda a crise em curso. E aqui eu gostaria de imaginar o dossiê que o Senador Antonio Carlos Magalhães disse tinha e que S. Exª hoje diz que não tem. De qualquer forma seria importante todos começarmos a ter esse dossiê porque o Banco Central precisa ser reformado neste País. Várias pessoas já disseram isso, inclusive um fraseador-mor como o Sr. Delfim Netto.

O Banco Central, em primeiro lugar, demonstrou incompetência ou má-fé ao permitir que instituições privadas entrassem em verdadeiro estado falimentar só para depois agir.

No caso específico do Econômico, conglomerado de peso nacional e banco que compõe a coluna vertebral da economia baiana, soluções precisavam ter sido encontradas há mais tempo.

Praticou-se a política da conivência, do jeitinho, do fisiologismo, do deixa para lá, desconsiderando a vida de milhares de correntistas e pequenos aplicadores que não estavam, e ainda não estão, aparelhados para acompanhar o jogo de interesses escusos que se fazia no seio do Estado brasileiro.

Errou o Banco Central, a nosso ver, ao decretar a intervenção, ao mesmo tempo, no Econômico e no Mercantil. O primeiro, a serem verdades as informações até aqui divulgadas, tem um passivo de quase 2 bilhões de reais. O Mercantil, ao contrário, com passivo inferior a 60 milhões de reais, se passou a recorrer ao redesconto, tinha recursos suficientes retidos no Banco Central para cobrir suas operações. O primeiro fazia parte de um conglomerado falido e sem patrimônio para ressarcir seus aplicadores. O segundo, cujos controladores são de idoneidade reconhecida, daí a unidade pernambucana na busca de esclarecimentos e novos encaminhamentos para a intervenção, não se encontrava e nem se encontra em situação de insolvência, demandando outro tipo de solução para sua crise conjuntural. Tudo isso é a demonstração da falta de critérios do nosso Banco Central.

O Governo erra quando procura manter sua base de governabilidade no Congresso Nacional a todo custo. Historicamente - e o Presidente na condição de ex-Congressista sabe disso - o Congresso nunca deixou de aprovar propostas do Executivo, quando fundadas na seriedade e nos interesses nacionais.

A negociação no Congresso, necessária e própria do Parlamento, deve ser operada com limites, até em nome da ética na política. Transformar o Congresso em um mercado persa, submeter-se a chantagens de grupos, bancadas e lideranças é o primeiro passo para a desmoralização. E o Presidente Fernando Henrique Cardoso não precisa enlear-se neste tipo de cipoal, pois tem a afiançá-lo, além de seu passado íntegro e de democrata, uma legítima e inquestionável representatividade.

O desfecho do Banco Econômico paradoxalmente pode gerar algo produtivo: uma discussão séria sobre a política de privatização, definindo-a melhor quanto aos objetivos e procedimentos e, ainda mais, a urgente necessidade de uma profunda reforma do sistema financeiro brasileiro e do próprio Banco Central.

Por último, e isso seria importante aqui salientar, esperamos - acredito que a Nação também a espera - pelo menos uma atitude do Governo: que do Tesouro Nacional e dos cofres públicos não saia um tostão para financiar a irresponsabilidade e a incompetência da iniciativa privada.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 17/08/1995 - Página 14008